quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

CRÓNICA NATALÍCIA

Chegados somos ao Natal. Uma época diferente em que se deseja viver com alegria, paz e conforto.

Nem todos, porém, vêem esse prazer satisfeito por razões as mais díspares. Algumas delas bastante angustiosas e tristes.

Mas, deixemos esse recordar de tristezas e passemos ao Natal. Um Natal que muitos nem sabem o significado real. E é bem simples: a comemoração do aniversário de Jesus Menino, num estábulo dos arredores da cidade de Belém, há 2009 anos!

Isaías havia anunciado: “Brotará uma vara do trono de Jessé, e um rebento brotará de suas raízes. Sobre ele repousará o espírito do Senhor: espírito de sabedoria e de entendimento, espírito de conselho e de fortaleza, espírito de ciência e de temor do Senhor... Julgará os pobres com justiça e com equidade os humildes da terra...”

O Evangelista Lucas, por seu lado, narra: ”José, deixando a cidade de Nazaré, na Galileia, subiu até à Judeia, à cidade de David, chamada Belém, por ser da Casa de David, afim de recensear-se com Maria, sua mulher, que se encontrava grávida. E, quando ali se encontravam, completaram-se os dias de dar à luz, e teve o seu filho primogénito (e único) que envolveu em panos e recostou numa manjedoira, por não haver lugar para eles na hospedaria.”

Entretanto, o Anjo do Senhor apareceu aos pastores da região e anunciou-lhes o nascimento do Salvador, que é o Messias, o Senhor.

E uma multidão do exército celeste juntou-se ao Anjo, cantando: GLÓRIA A DEUS NAS ALTURAS E PAZ NA TERRA AOS HOMENS DO SEU AGRADO.

Este o relato evangélico.

Durante muitos anos, talvez séculos, o aniversário do maior acontecimento da humanidade andou quase esquecido, embora a Igreja, desde os seus primórdios, o recordasse na celebração eucarística da Grande Noite.

Aqui vale a pena recordar São Francisco de Assis, o verdadeiro instituidor do Presépio. Assim o descreve o escritor Agostinho das Silva, em vida de Francisco de Assis: ”Perto de Greccio passou a noite de Natal; e tão grande era o seu desejo de Jesus, de tal modo a figura do Mestre lhe enchia os sonhos e a vida que decidiu adorar o Menino, como outros pobres tinham feito na remota noite de Belém; arranjaram-lhe os amigos uma gruta à maneira de estábulo, com manjedoira em que comia um boi e um jumento; mais abaixo, numas palhas, estava deitada a imagem do Menino; à roda as velas lançavam a sua claridade, doce, trémula, enquanto num altar, ao fundo, um padre dizia missa.” Era o primeiro Presépio. (S. Francisco de Assis viveu entre 1182 e 1225.)

O Presépio é a recordação mais sensível e cristã do Nascimento do Salvador. Infelizmente, porém, passou a ser substituído, em algumas nações, pela árvore do Natal, oriunda dos Estados Unidos da América, onde se abrigam as prendas trazidas pelo Pai Natal, outra inovação dos Países nórdicos.

Nos lares cristãos, sempre se recordou o nascimento do Menino, cuja imagem era – e é ainda – colocada num pequeno trono na sala principal. Poucos faziam o presépio, tal como o idealizou Francisco de Assis, porque desejavam adorná-lo com figuras várias, e outros adereços a lembrar a cidade de Belém, mas não tinham posses para os adquirir.

Ainda hoje ele se arma por estas terras, tendo valido a iniciativa da antiga Comissão de Turismo em promover, anualmente, concursos de presépios, que tiveram larga aceitação. Mais recentemente e para substituir o Presépio, já houve concursos de árvores de natal !...

Plausível é a actividade de certas instituições de solidariedade social em promoverem a angariação de bens para serem distribuídos, nesta época natalícia, pelos pobres e necessitados. Mas fazem-no arredadas da inspiração cristã e da recordação do Salvador do Mundo, que assim foi anunciado pelos anjos na Noite Silenciosa de há 2009 anos.

Até mesmo a própria Igreja foi simplificando a liturgia daquela Noite Santa, deixando de celebrar a Novena preparatória e de promover as Matinas solenes no princípio da Noite que agora está limitada à Eucaristia, pois o próprio dia passou, em algumas paróquias, ao esquecimento litúrgico.

Vale, pois, a pena recordar a atitude de Francisco de Assis, ante o improvisado Presépio: “Francisco, prostrado ante as palhas, adorava Jesus, via-o sorrir e agitar-se, como se na grande noite, tivesse desfilado na turba de lavradores e pegureiros; mais uma vez, na branda língua provençal, entoou os louvores do Senhor piedoso; depois, levantando-se, pregou à gente que se juntara, emocionada, a presenciar a estranha cena.”

Que todos tenham um Santo Natal!

Vila das Lajes, Dezembro de 2009

Ermelindo Ávila

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Cartão de Boas Festas

Vamos entrar na semana do Natal. Uma época memorável que todos procuram celebrar com alegria e boa disposição.

Desde há semanas que vêm sendo realizadas as ceias do Natal promovidas pelas instituições sociais e pelas diversas classes operárias, num gesto amigo de convívio e fraternidade. Se bem que haja instituições que cobram dos comensais a respectiva quota, outras, ao contrário, escolhem esse dia para distribuir prendas pelos sócios e seus filhos.

Antigamente, como soe dizer-se, realizava-se a consoada na ante - véspera do grande Dia. Uma ceia frugal onde pontificava o queijo caseiro, curado, muitas vezes oferta de um lavrador amigo. E que delicioso era.

Depois, apareceu o bacalhau, importado do continente, quando para as ilhas começaram a vir alguns continentais, normalmente para serviços públicos. E a tradição do queijo desapareceu.

Para a noite ou dia de Natal preparava-se a caçoila para a seja, uma maneira especial de guisar a carne de vaca, só usada na noite da consoada.

É que, raramente se utilizava a carne de vaca durante o ano. Três festas eram especiais e nelas a carne era o prato forte. Um pouco pela Páscoa. Nas funções de Coroa, era a base das, ainda hoje, apetecidas sopas do Espírito Santo. E, como disse, pelo Natal.

Os talhos forneciam alguma carne, mas a maior parte era conseguida através do sistema de “vacas de sócios”. Um grupo de indivíduos adquiria um bovino e era dividida a carne pelos comparticipantes na compra, os chamados “sócios”. Um sistema comunitário que tinha a vantagem de se adquirir um animal de boa carne; e, porque não havia lucros de intermediários, tornava-se mais barata.

Hoje já isso não acontece. Todo o ano se usa carne nas emendas familiares, embora, por vezes, de duvidosa qualidade.

Mas que deliciosa era a caçoila do Natal! Havia pão de trigo para aquela refeição mas não se falava em bolo do Natal, que só apareceu com os emigrantes retornados dos Estados Unidos. E ainda hoje é esse tipo de bolo de frutas que se usa, ao contrário do continente onde predomina o bolo rei.

Vem aí o Natal. Ainda se trocam os cartões de Boas Festas, até que esse hábito de saudar familiares e amigos, também desapareça.

Antes, eram os “cartões de visita”. Hoje são os postais. Amanhã tudo será feito através da Internet

E depois?...

Feliz e Santo Natal !

Bom dia!

14 de Dezembro de 2009-12-14

Ermelindo Ávila.

(crónica lida nas Manhãs de Sábado da RDP-A)

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

CONVENTO FRANCISCANO

Reza a tradição que uma tal Mor Pereira fundara numa propriedade que possuía no sainte da vila, uma ermida dedicada a Nossa Senhora da Conceição para dar cobertura ao local onde havia sido sepultado seu pai, falecido em circunstâncias trágicas e por isso seu corpo fora impedido de ser sepultado em terreno sagrado. (Nessa época as sepulturas eram no corpo das igrejas e capelas.)

Em 1629 foi fundado o convento dos frades franciscanos junto da referida ermida.

Frei Diogo das Chagas, diz, porém, que “o convento dos frades nossos se fundou em Agosto de 1641 em uma ermida de Nossa Senhora da Conceição tão grande e formosa, e de tão boas paredes, que, alevantada mais 5 palmos em roda, ficou servindo de igreja”.

O convento foi sendo ampliado mais tarde (1768). A nova igreja, construída pelo lado norte, ficou, interiormente, um dos mais belos templos da ilha, pelo primor da escultura dos retábulos e perfeição do douramento, possuindo já os ornamentos necessários, vasos sagrados, uma lâmpada de prata, coroa e resplendores em todas as imagens.”

“Dois anos antes de os conventos serem extintos pelo decreto (de 17-5-1832) de Dom Pedro, Duque de Bragança, um violento incêndio, na noite de um de Fevereiro de 1830, destruiu totalmente a igreja e seus haveres.”

O convento, entregue interinamente à Câmara, pela Junta de Crédito Público, em 3 de Janeiro de 1840, para nele se estabelecerem as Repartições Públicas, foi restaurado pelo Município, em 1947.A igreja serviu de paroquial desde 1902 (Provisão do Governador do Bispado de 16-1-1902) até à inauguração da Matriz, em 28 de Maio de 1967. Foi devidamente restaurada após o sismo de 1998, que bastante a havia danificado.

Tal como em Portugal continental, é muito antiga a devoção dos picoenses a Nossa Senhora da Conceição, mesmo antes da proclamação do Dogma da Imaculada Conceição (1854).

Na freguesia da Piedade há uma ermida de “Nossa Senhora da Conceição da Rocha, mandada construir pelo Pe. Manuel Inácio da Silveira Campelo no lugar do Calhau, em 1864. Encontra-se sem tecto e em ruínas. Nela se fazia, habitualmente, a Festa de Nossa Senhora da Conceição no dia 15 de Agosto.

Em São Mateus, cuja freguesia pertenceu ao concelho das Lajes até 1723, data da criação do concelho da Madalena, existe a ermida de Nossa Senhora da Conceição, ao porto, que foi mandada construir pela família do General Lacerda Machado em cujas casas anexas passava o verão. Encontra-se bem conservada e ainda nela se celebra, anualmente, a festa da titular.

O Historiador Fortunato de Almeida diz: “Na primeira metade do século XVIII em diversos sínodos diocesanos se jurava defender a Imaculada Conceição. Mas já em 1439, pelo Consílio de Basileia, Maria é considerada a nova Eva, Mãe da humanidade, Imaculada desde a concepção, livre de qualquer pecado.

São vários os decretos da corte portuguesa que consagram a Imaculada Conceição como Padroeira de Portugal. No entanto há que realçar o decreto de Dom João IV, de 16 de Janeiro de 1646 que elegeu Nossa Senhora da Conceição Padroeira de Portugal, coroando com a coroa real a Sua Imagem em Vila Viçosa. A partir de então, mais nenhum Rei de Portugal usou coroa.

A solenidade da Imaculada Conceição tem uma tradição muito forte na ilha do Pico e na Diocese de Angra. Há várias freguesias consagradas à excelsa Mãe de Deus, sendo de realçar as das antigas capitais de distrito: Angra do Heroísmo e Horta. Nesta Vila a Festa de Nossa Senhora da Conceição, na igreja do convento franciscano, sempre foi sempre celebrada com a maior pompa litúrgica. Era precedida de novenário cantado e, na véspera, cantavam-se Matinas com uma partitura de sabor clássico. Era o dia destinado, na Paróquia, à celebração da Comunhão solene das crianças (não era habitual a primeira comunhão) e anos houve em que se realizava a procissão externa com a veneranda Imagem, uma das três do mesmo escultor existentes nos Açores.


Vila das Lajes, 2 de Dezembro de 2009

Ermelindo Ávila

domingo, 13 de dezembro de 2009

EXTERNATOS

As Aulas de Latim existentes em diversos concelhos do Arquipélago e que preparavam os alunos para os cursos superiores, pois, além do Latim, leccionavam o Português e o Francês, terminaram com a criação dos Liceus nas capitais dos Distritos.

A aula de Latim desta vila teve vários mestres. Um deles foi o Pe. António Lúcio, que ficou na história e na tradição desta terra como homem de grande cultura. Sucedeu-lhe António Lourenço da Silveira de Macedo, autor da “História das Quatro Ilhas que formam o Distrito da Horta”.

Com a criação do Liceu da Horta, por decreto de 20 de Setembro de 1844, mas apenas aberto no ano de 1851, António Lourenço da Silveira Macedo, foi transferido para o novo estabelecimento de ensino. Era seu reitor, quando faleceu. E assim terminou a Aula de Latim. Quem desejasse continuar a estudar, para além da Instrução Primária, tinha de deslocar-se para uma das capitais de distrito. E alguns foram. Mas era uma situação que só permitia a famílias abastadas ter os filhos a estudar fora de casa, mesmo assim, com sacrifícios monetários. Outros por cá ficavam, aprendendo um ofício para caminharem na vida: carpinteiro ou pedreiro, ferreiro, sapateiro, barbeiro ou alfaiate, etc.

A meados do século passado houve quem tivessem a feliz ideia de criar aulas do ensino secundário particular, nos respectivos concelhos. Uma grande solução para a causa do Ensino.

Creio que o mais antigo desses estabelecimentos secundários terá sido o Externato de Vila Franca do Campo. Depois foi o da Ribeira Grande e ainda o Externato Maria Isabel do Carmo Medeiros, da Povoação, em S. Miguel. Na vila das Velas, em São Jorge, foi criado o Externato Cunha da Silveira. Nas Lajes do Pico, o Externato General Lacerda Machado. Em São Roque, o Externato Coronel Linhares de Lima. Na Vila da Madalena, o Externato da Madalena. Em Santa Cruz das Flores, o Externato Pe. Maurício Freitas. Se outros houve, desconheço.

Hoje todos os concelhos, incluindo o Corvo, estão providos de Escolas Preparatórias e Secundárias, algumas mantendo os nomes dos antigos patronos. É pena que nem todas tenham seguido esse critério .

Antes do externato General Lacerda Machado, existiu uma escola particular, criada pela professora Olga Soares, no ano lectivo de 1951-1952, mas que só preparava para os 1º e 2º anos do Liceu. Tanto nessa escola como, depois, no Externato, os alunos eram inscritos no Liceu da Horta, como sendo do Ensino Doméstico e, no fim do ano lectivo, tinham de ir àquele estabelecimento fazer os respectivos exames. Uma situação que se manteve vários anos, mesmo quando a escola tomou a designação de Externato Secundário e passou a preparar até ao segundo ciclo, reunindo para tal um grupo de professores – professores primários e sacerdotes, além de outros - de notável gabarito cultural e intelectual, embora com diminutas remunerações, o que permitia aos alunos desembaraçarem-se, satisfatoriamente, nos respectivos exames. Infelizmente, porém, a esses beneméritos da Instrução nunca foi prestada a homenagem individual ou colectiva que bem mereciam.

Reconheça-se, no entanto, que era uma situação precária que só veio a ser resolvida com a visita do antigo Ministro Veiga Simão, que lhes deu o paralelismo pedagógico, além de outras mais regalias.

Actualmente a Escola Secundária das Lajes do Pico, como as outras da ilha, são frequentadas por algumas centenas de alunos e dela têm saído muitos para as Universidades, que, depois, assumem posições de relevo na vida nacional e até nas próprias Universidades.

E trazendo hoje aqui os Externatos não posso deixar de lembrar o nome de D. Inês Soares de Melo da Silva Azevedo, falecida a última semana e que foi uma distinta professora daquele estabelecimento, com seu marido o também professor José da Silva Azevedo e tantos outros, uns felizmente vivos outros já falecidos, e que tanto se empenharam pelo brilhante êxito do já histórico estabelecimento de ensino. Pois se se chegou a tratá- lo como a Universidade das Lajes...


(crónica para o Manhãs de Sábado da RDP-Açores)

Vila das Lajes, 8-12-2009

Ermelindo Ávila

sábado, 5 de dezembro de 2009

Chegou Dezembro!|

Chegados somos ao mês de Dezembro. Um mês que e para muitos um mês de encantos. Vem as férias, vem o Natal com as suas guloseimas, jantares de classes, pantagruélicas ceias, os bolos reis, os doces para os mais novos e as prendas para todos, grados e miúdos, que todos as esperam e apreciam.

Mas é também um mês de dificuldades, por vezes, para aqueles que têm de fechar as contas e dar balanço às suas actividades comerciais do ano. E até os serviços públicos, depois de discutirem os programas de actividade do próximo ano, procuram encerrar as gerências com equilíbrio financeiro.

É pois um mês de contrastes. Um mês que nem sempre é de alegria e de felicidade. Mas não deixa de ser também um sempre desejado e querido. As famílias esquecem, por vezes, os infortúnios e as arrelias, para se juntarem no dia do Natal, na comemoração do Nascimento do Salvador, para u8ns, ou a chamada festa da Família, para outros.

Para os mais entrados na idade, os da chamada terceira idade, os velhos, afinal, são dias de recordações nem sempre alegres. Alguns, recolhidos aos seus pequenos quartos de dor e sofrimento, volvem-se para o passado distante e trazem à mente uma juventude buliçosa e despreocupada, alegre e folgazã, em que não se pensava no futuro mas se viviam dias de despreocupação e de felicidade. Outros, um pouco mais recolhidos, lembram a família, a mulher e os filhos, os dias de alegria vividos na infância deles, com alguma despreocupação, julgando o futuro muito distante e sem preocupações. Hoje, que todos se foram,uns para a sua viagem final, outros para meios diferentes, encontram-se sós, mesmo abandonados, num chamado “lar da terceira idade”, os antigos asilos de velhos e de velhas. E vivem numa tristeza, numa nostalgia, num desconforto moral, esperando que a viagem final também lhes chegue...

É, pois, um mês de contradições. Um mês de alegrias e tristezas. Um mês de saudades sem fim.

Mas, mesmo assim, é o mês em que se comemora o nascimento do Menino Jesus no Presépio de Belém. Há mais luzes e decorações nas casas. As ruas são melhor iluminadas. As Igrejas vestem as mais ricas ou vistosas galas para a grande noite, e as salas das sociedades recreativas enchem-se de festões e luzes para as grandes noites dos bailes e reuniões dançantes, folgas ou entretenimentos teatrais

Apesar de tamanhos contrastes,vale a pena viver estes dias de contrastes tamanhos. Vivê-los com ALEGRIA, PAZ E ESPERANLÇA, esquecendo o passado e preparando com alegria o futuro temporal-eterno.

Está a chegar o Natal. As crianças aguardam com um frenesim incontido, as prendas do Menino Jesus, para uns; ou do Pai Natal, para outros. Os pais e os mais adiantados na idade vão adquirindo as prendas, pondo-as a recato, para as trocarem no grande dia. Uma tradição que fica bem e ameniza, ao menos por horas, as agruras da vida.

Aqui e ali já se vêm os anúncios para os encontros das classes. Professores, funcionários dos diversos serviços, amigos de perto e de longe. Um movimento de confraternização que deve ser acolhido e vivido com alegria respeito mútuo.

Que venha o Natal e que todos o celebrem em paz, alegria e amor.

Bom dia!

(Crónica para o programa Manhãs de Sábado de 4-12.09)

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

SOLENIDADE DE C RISTO-REI

Há três quartos de século que se vem realizando na matriz desta vila (primeiro na antiga igreja conventual de São Francisco, que serviu de matriz durante cinquenta e seis anos ), a solenidade de Cristo - Rei. Uma desta de natureza interna, pois não havia actos externos, ou fora do Templo. Passou a ser, todavia, uma das principais festas litúrgicas da Paróquia, à qual se associava a quase totalidade da população.

O Papa Pio XI, instituiu a Festa de Cristo - Rei na Encíclica Quas Primas de 11 de Dezembro de 1925.

Foi na paroquial de São João Baptista, da extinta Ouvidoria das Lajes do Pico que, por iniciativa do respectivo Pároco, Pe. Ignácio Coelho, de boa memória, se realizou a primeira festa de Cristo - Rei na Ilha do Pico. Daí só ser possível realizar-se a festa na Matriz, no domingo seguinte, por falta de pregadores.

Foram seus iniciadores os organismos da Acção Católica, recentemente criada na Paróquia. Um grupo de jovens fundou a JOC; um outro, feminino, a JIC. As senhoras fundaram a LAC.

Estes organismos estavam filiados nas Direcções Diocesanas e reuniam apreciáveis números de membros.

Todavia, nem sempre a Acção Católica foi bem aceite pela generalidade das pessoas, principalmente por aquelas que, dizendo-se católicas, tinham práticas agnósticas. Até houve uma autoridade administrativa que, em certa ocasião, notificou um dos dirigentes para se apresentar na Administração do Concelho, afim de explicar quais os fins do organismo que ele classificava de “sociedade secreta”. Enganou-se, porém, pois aquilo que ele entendia como “sociedade “ e demais “secreta”, era uma instituição da Igreja, com estatutos aprovados pelo Governo Central, de então. E o nosso homem ficou por aí...

No número de 5 de Novembro de 1938 de “O Dever”, encontra-se a seguinte notícia: Cristo - Rei. É já amanhã que, na nossa paroquial se realiza a solene festa de “Cristo - Rei”, a que nos referimos a semana finda. O tríduo tem sido bastante concorrido, dando a esperança de uma inúmera afluência de fieis às solenidades do dia de amanhã. A Missa da Comunhão Geral terá lugar pelas 7 horas, às 11 h. haverá missa solene com sermão, exposição, ficando o Santíssimo no trono à adoração dos fieis até ao anoitecer, em que terá lugar a consagração, imposição dos emblemas às Senhoras da L.A.R.C.F. e bênção.

Curiosamente, era nesta solenidade que as Senhoras lajenses passavam a exibir as suas vestes domingueiras do inverno. E faziam-no com primorosa gala...

As festas de Cristo - Rei, que, com maior ou menor brilho, nunca deixaram de ser celebradas na Matriz da Santíssima Trindade, apesar dos organismos da A.C. se terem extinto por razões diversas – apenas dois dos membros da JOC de há 71 anos, se encontram ainda vivos... - não deixa de ser realizada como festa paroquial e sempre teve o melhor e mais salutar acolhimento dos lajenses.

O presente ano não deixará de o mesmo acontecer. Assim esperamos.


Vila das Lajes. Nov. de 2009

Ermelindo Ávila


sábado, 28 de novembro de 2009

Clamar no deserto...

Vai chegando o Inverno. A Vila vai-se despovoando pois os visitantes já quase não existem por aí e eram eles que animavam, nos meses de estio, as ruas do Burgo.

Por outro lado teima-se afrontosamente, retirar do centro urbano serviços e pessoas. As pessoas vão desaparecendo e deixando as casas quase devolutas. Os serviços mudam-se, num gesto de desfaçatez política, retirando-nos instituições seculares que aqui se instalaram inicialmente e sempre funcionaram, mercê dos seus gestores, com ordem e equilíbrio e a contento de todos.

O mal vem de trás e a “perseguição”, entre aspas, continua. Ninguém parece ter coragem de obstar a esses desvarios políticos ou sociais.

Resulta daí que, principalmente a juventude, abala de maneira sinistra, a encontrar emprego, já que por cá os empregadores vão desaparecendo.

É desolador o que por aí vai. Há que tomar providências cautelares e imediatas para que não aconteça o pior.

Fecham estabelecimentos de utilidade pública e nem a lei nem as pessoas são capazes de impedir esse desmoronar de actividades que, além de serem instituições de emprego, beneficiavam aqueles que visitavam a vila, principalmente os turistas.

Retiram-se serviços – pelo menos anunciam-se tais medidas de mera conveniência política, esquecendo-se o bem estar e o progresso e desenvolvimento que devem merecer todas as terras, principalmente aquelas que têm tradição de séculos.

Toda a minha vida, que já vai no fim e que não deixou de ser longa, tenho pugnado pelo desenvolvimento e progresso desta terra. O meu vozear nem tem merecido a escuta de quem tem a responsabilidade de promover e acautelar o desenvolvimento harmónico do todo regional. Basta olhar para o que nos rodeia, no dia-a-dia, para termos a amarga certeza de que somos um povo quase ignorado e esquecido, E até, ao que consta, muito fazem sorriso alarve do nosso reclamar e do pugnar pelos nossos direitos legítimos. Não importa. Continuaremos a bradar, até que os homens nos escutem e atendam aos nossos clamores.

E hoje ficamos por aqui, esperando que haja alguém que nos escute e pense a sério nos nossos direitos de povo simples mas honesto e trabalhador. Ou continuaremos a clamar no deserto?


Vila das Lajes, 9 de Novembro de 2009

E.-A.

(crónica lida no programa Manhãs de sábado)

Uma lenda

Vão passando ao esquecimento as lendas e os contos que os antigos tinham por hábito contar aos mais novos, aos serões das noites invernosas.

Alguns ficaram na memória outros passaram ao esquecimento.

Excelente trabalho empreendeu a Doutora Ângela Furtado - Brum, ao recolher por estas ilhas as “Lendas e Outras Histórias” que publicou há anos e cuja 2ª edição, já vem de 1999. Afinal um valioso trabalho que regista narrativas populares, sobretudo lendas diversas recolhidas em todas as Ilhas dos Açores.

A Ilha do Pico, donde é natural a ilustre Autora, mais propriamente da Calheta de Nesquim, está representada no importante trabalho com 29 lendas.

Uma dessas histórias populares refere-se à ermida de Santa Catarina de Alexandria das Lajes do Pico; lenda que há séculos anda na tradição popular.

A ermida, que ainda existe no primitivo local, está situada no promontório entre o subúrbio da Ribeira do Meio e a Vila das Lajes, numa propriedade que pertenceu ao antigo morgado Manuel Cardoso Machado Bettencourt, por herança de seus antepassados e que nem sempre andou na posse de seus ascendentes pois, promovida pela Paróquia, nos finais do século XVIII, uma demanda andou na barra do Tribunal Judicial da Ilha, só não sendo decidida a favor da Autor por razões que não convém trazer a esta nota. Os últimos proprietários, num gesto louvável, legaram recentemente a ermida e casa anexa à Paróquia da Santíssima Trindade da Vila das Lajes.

Todavia, desde há muito que é ali se realiza a festa da Titular, cuja imagem é de grande devoção, principalmente dos povos de São João, Lajes e Santa Bárbara, pois Santa Catarina é considerada a protectora do juízo.

No dia da sua Memória é celebrada Missa cantada na Ermida, com larga concorrência de devotos. Muitos vão ali pagar promessas. Entre estas aparecem algumas figuras de massa sovada representando cabeças de pessoas.

Mas a lenda, segundo a Doutora Ângela Brum, reza assim:

Há muitos anos atrás andavam uns pescadores ma Ponta da Prainha do Galeão, quando viram uma bonita \imagem de Santa Catarina que tinha sido trazida pelo mar. – As pessoas juntaram-se e alguém disse que a trouxessem para as Lajes, para a igreja mais imponente dos arredores. A igreja do convento dos Franciscanos. Assim aconteceu. Mas no dia seguinte, quando os frades se aproximaram do altar para contemplar a santa, já não a viram ali. Vieram a saber que ela, sem ninguém lhe ter tocado, tinha ido outra vez parar à Ponta da Prainha . Voltaram a levar Santa Catarina de volta para a Vila das Lajes. - Este vai e vem repetiu-se várias vezes até que as pessoas começaram a dizer que Santa Catarina

queria ficar perto de São Caetano. Não querendo os das Lajes separar-se da imagem, decidiram construir uma pequena ermida onde a santa pudesse, ao menos, ver a freguesia do Pico que tinha escolhido para morada - Assim se fez .Num terreno mais alto, sobranceiro ao centro da vila das Lajes, mesmo por cima da lindíssima costa com o nome de Lajedo ergueram a pequena ermida e como sua padroeira ficou Santa Catarina. –(...) – Mas o altar ficava no interior, sem qualquer vista para a rua e a santa ainda não estava satisfeita e, por isso, continuou a fugir para a Prainha. - (...)- Alguém, então, se abrissem uma Janelinha voltada para os lados da Prainha lembrou que talvez Santa Catarina descansasse.”

A janela ou fresta foi feita e lá está permitindo ver-se dali a Ponta da Prainha. E Santa Catarina não mais abandonou o seu altar. Lenda? Uma coisa é certa: a ermida lá se encontra com a imagem de Santa Catarina e a devoção à milagrosa santa não mais terminou.

No dia 25 é a festa da Padroeira. Ainda me lembro de, na véspera à noite, se fazer uma iluminação, lá no alto, com rocas de pinheiro, que tinha um bonito efeito e que os lajenses muito admiravam.

Outros tempos!...

Vila das Lajes, 22/ ll /2009

Ermelindo Ávila

Alojamentos turísticos

Estão a surgir na Ilha diversos estabelecimentos classificados como rurais ou destinados ao turismo rural. Julgo que se trata de empreendimentos algo insuficientes.

Se há turistas que procuram esses alojamentos, e alguns deles, ao que consta, são bastante cómodos e asseados, nem todos os visitantes que aqui chegam desejam ir para eles mas antes procuram os hotéis. Nem mesmo as residenciais ou pensões são procuradas pois essas designações ou classificações não existem nos dicionários dos idiomas estrangeiros. É pena que os industriais investidores nessa actividade não procurem adaptar-se ao regime internacional. Seria uma mais valia para eles próprios e para a ilha, uma vez que as divisas estrangeiras vêm, normalmente, desses visitantes.

Enquanto nas ilhas açorianas o turismo baixou na última época, parece que a ilha do Pico fez excepção, pois a procura de camas foi superior à das épocas anteriores. Houve estabelecimentos que, no princípio da época passada, já estavam totalmente ocupados até ao final do verão. E isso de facto aconteceu.

Se o turismo é a indústria do futuro, e será através da entrada de divisas, vindas desses visitantes estrangeiros ou mesmo nacionais, que a economia da Região se equilibrará, importa ter em consideração esse facto e estar atento ao seu desenvolvimento.

A indústria do Turismo não se reduz àquela que é praticada nas casas rurais e nos Parques. Esse é um turismo que, embora deva ser acolhido com carinho e atenção, não é suficiente para a promoção da Região e, consequentemente das suas parcelas, as ilhas. Importa estar atento e preparar a ilha com as estruturas suficientes e capazes de acolherem todas as classes de turistas, que aqui chegam, seja para percorrer a ilha pelo seu interior, utilizando as veredas e os trilhos, seja para visitar as baleias ou para gozar alguns dias de lazer.

A vila das Lajes carece imediatamente de um estabelecimento turístico classificado de hotel de duas, três ou quatro estrelas. Mas situado no interior da zona urbana. E, igualmente, de um restaurante, visto que, aquele que possuía e que de boa qualidade era, incompreensivelmente, ao que consta, acaba de encerrar as portas. Afinal um prejuízo grave para a vila das Lajes pois o “Lagoa” gozava de prestígio nacional e internacional.

Importa criar um estabelecimento congénere e estar acautelado para novas investidas que em nada prestigiam a terra.

E se não houver quem tome a iniciativa, impõe-se à Câmara Municipal, à semelhança de outros organismos congéneres por esse País fora, assumir prioritariamente, esse encargo, associando-se a outros investidores ou, depois de concluído o/os empreendimentos, associar-se ou trespassá-los em condições condignas a quem se comprometa explorá-los, quer individualmente quer em sociedade. Repito: Não será novo o sistema. Trata-se de uma iniciativa de promoção e de desenvolvimento, comercial e laboral da terra e do seu futuro. “Cruzar os braços”, como soe dizer-se, ante tão precária situação, é promover o aniquilamento, e não só, da terra lajense.

Estou uma vez mais a repisar um assunto já aqui tratado bastas vezes. Não importa. Como diz o adágio: água mole em pedra dura..

Vila das Lajes, Nov.2009

Ermelindo Ávila

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Vai chegando o Inverno

A Vila vai-se despovoando pois os visitantes já quase não existem por aí e eram eles que animavam, nos meses de estio, as ruas do Burgo.

Por outro lado teima-se afrontosamente, retirar do centro urbano serviços e pessoas. As pessoas vão desaparecendo e deixando as casas quase devolutas. Os serviços mudam-se, num gesto de desfaçatez política, retirando-nos instituições seculares que aqui se instalaram inicialmente e sempre funcionaram, mercê dos seus gestores, com ordem e equilíbrio e a contento de todos.

O mal vem de trás e a “perseguição”, entre aspas, continua. Ninguém parece ter coragem de obstar a esses desvarios políticos ou sociais.

Resulta daí que, principalmente a juventude, abala de maneira sinistra, a encontrar emprego, já que por cá os empregadores vão desaparecendo.

É desolador o que por aí vai. Há que tomar providências cautelares e imediatas para que não aconteça o pior.

Fecham estabelecimentos de utilidade pública e nem a lei nem as pessoas são capazes de impedir esse desmoronar de actividades que, além de serem instituições de emprego, beneficiavam aqueles que visitavam a vila, principalmente os turistas.

Retiram-se serviços – pelo menos anunciam-se tais medidas de mera conveniência política, esquecendo-se o bem estar e o progresso e desenvolvimento que devem merecer todas as terras, principalmente aquelas que têm tradição de séculos.

Toda a minha vida, que já vai no fim e que não deixou de ser longa, tenho pugnado pelo desenvolvimento e progresso desta terra. O meu vozear nem tem merecido a escuta de quem tem a responsabilidade de promover e acautelar o desenvolvimento harmónico do todo regional. Basta olhar para o que nos rodeia, no dia-a-dia, para termos a amarga certeza de que somos um povo quase ignorado e esquecido, E até, ao que consta, muito fazem sorriso alarve do nosso reclamar e do pugnar pelos nossos direitos legítimos. Não importa. Continuaremos a bradar, até que os homens nos escutem e atendam aos nossos clamores.

E hoje ficamos por aqui, esperando que haja alguém que nos escute e pense a sério nos nossos direitos de povo simples mas honesto e trabalhador. Ou continuaremos a clamar no deserto?


Vila das Lajes, 9 de Novembro de 2009

E.-A.

(Crónica lida nas "Manhãs de sábado da RDP-Açores)

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

As apanhas dos milhos e as desfolhadas

Nesta época que decorre, era sempre agradável assistir às apanhas dos milhos e às desfolhadas. Eram autênticos dias de festa nas casas dos lavradores.

Quando os milhos estavam maduros e o pasto seco, era a ocasião própria para proceder à apanha e recolha das maçarocas nas “atafonas” ou lojas das residências. E esse dia era um dia especial. Grados e miúdos, todos se dedicavam à derrocada das maçarocas, ao preparar os carros de bois com as sebes bem acauteladas para as receberem e ao trazer os carros, normalmente tirados por dois bovinos, por caminhos algo perigosos, até ao local da recolha. Era um dia grande com jantar (hoje seria almoço) melhorado, preparado em casa e levado, na hora certa, até ao serrado onde se colhia o milho.

Mas, antes, haviam os trabalhos preparatórios. Cortavam-se as espigas que eram encostadas às paredes para secar ao sol, pois construíam bom alimento do gado, no Inverno. Esperava-se, depois, que as maçarocas secassem e era então o tempo da recolha, ou apanha dos milhos, antes que viessem as chuvas.

Aí principiava um trabalho doméstico, de grande importância. Era o descascar das maçarocas. Aproveitava-se o serão e a ajuda de amigos e vizinhos. Para essa ocasião preparavam-se os figos passados ao sol, ou secos no forno, e uma ou mais garrafas de genebra ou aguardente, geralmente de produção caseira. E, quando aparecia uma maçaroca de grãos vermelhos, era uma festa rija, principalmente se havia gente nova no ajuntamento.

Embora no meio de esganiços a praxe tinha de cumprir-se... Não era correcto negar o beijo ao feliz contemplado.

Manhã cedo, a dona da casa acendia o forno da cozinha e preparava a massa de milho, algumas vezes de trigo, para o bolo ou pão para o sustento da família e, depois, aproveitava o calor para secar o milho. Por cá não havia o hábito de deixarem as maçarocas com as capas ou folhas, em burras, no quintal, como é tradição em algumas ilhas do Arquipélago.

Antigamente, quando tudo era cozinhado no lar de fogo e as cozinhas (pequenos casebres construídos fora das habitações, para evitar os incêndios) eram providas de fornos, algumas das casas dos lavradores mais abastados, tinham dois fornos: um para as cozeduras domésticas e um outro maior para a secagem dos milhos ou, mais raramente, para as cozeduras do pão e das rosquilhas, nos gastos do Espírito Santo. Com a modernização das cozinhas, e utilização dos fogões e máquinas eléctricas ou a gás e outros electrodomésticos, vão rareando esses fornos de cozer.

Retiradas as maçarocas do forno, era a debulha, o joeirar o grão no crivo e, depois, arrumá-lo em barricas, arquibancos ou, mais modernamente, em depósitos de latão. E estava, normalmente, garantido o sustento da família durante o ano. Por vezes a produção era fraca e isso colocava o dono da casa em apuros...

Um pormenor é de registar: Quando se procedia à descasca das maçarocas, escolhiam-se aquelas que eram mais sadias e eram dependuradas geralmente nos tirantes dos quartos superiores para aí se conservarem, sem perderem o viço. O milho assim conservado era utilizado no ano seguinte nas sementeiras.

Presentemente, quase ninguém semeia milhos. A quase totalidade do que se consome, é importada. Desmantelaram-se as atafonas, os moinhos de vento que tanto alegravam a paisagem, e as moagens quase não existem. É caso para se dizer: Tudo o vento levou! Ficou-nos a saudade dos tempos da juventude distante.

Quão diferente são os hábitos e os costumes da vida de hoje!


Vila das Lajes, 7 de Nov. de 2009

Ermelindo Ávila

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

DIA DE SÃO MARTINHO

A Igreja Católica celebra no dia 11 do corrente mês a memória do Bispo São Martinho, nascido na Hungria no ano de 316 e falecido em Tours, em 397 da Era Cristã.

Porque a celebração do dia de São Martinho ocorre a meio do mês de Novembro, o povo, na sua tradição popular, instituiu esse dia como aquele em que devia provar o vinho da colheita anterior. Daí o provérbio popular: “No São Martinho vai à adega e prova o vinho”.

Verdade que o Santo Bispo nada tem a ver com as colheitas dos vinhos mas tão somente porque o seu dia litúrgico ocorre a meio de Novembro, época das provas é que assim lembrado.

Já o mesmo não acontece com o nosso Frei Pedro Gigante. Como refere o escritor faialense Ernesto Rebello, numa das suas crónicas de ficção, publicadas no “Arquivo dos Açores”, sobre as Uvas da Ilha do Pico: Dizem que foi um padre, Fr. Pedro Gigante, que há muitos anos introduziu no Pico, nos terrenos mais próprios para semelhante cultura, alguns bacelos de vinha proveniente da ilha Madeira.

Este padre foi, efectivamente, um grande gigante no nome e na ideia um filósofo às direitas. Viu que a ilha do Pico era extensíssima, ainda pouco povoada e todos os casais dispersos à beira mar: - quis secundar a poderosa acção química dos mariscos sobre a organização humana, aumentar o nervosismo, o amor, (...), reconhecia a necessidade de mais gente na nova ilha e disse de si para si: - Se aqui houvesse bastante vinho, mas bom, dum certo que eu conheço, daquele que dá força e vida, realizava-se o milagre.

As cepas vieram, uns dizem que da Madeira, outros da ilha de Chipre, propagaram, cresceram, espalharam-se por toda a parte, chegando a dar-se com mais facilidade um copo de vinho do que de água, e, efectivamente, o Pico povoou-se, apesar da sua extenção, rápida e poderosamente.

Eram milhares de pipas que anualmente se produziam e exportavam para o estrangeiro.

Mas um dia a desgraça aconteceu. O oidium destruiu as vinhas e houve que importar novas castas. E assim vieram outras castas, de menor valor mas não menos produtivas.

O Pico continua a produzir bons vinhos. A orla costeira está cheia de pequenos currais onde se abrigam as videiras da

Isabela” ou americana. E junto se construíram as adegas, ou pequenas casas de veraneio, onde os proprietários se acolhem na época estival para gozarem a amenidade do clima e tratarem das vinhas, limpando-as, levantando-as e colhendo, depois, os belos cachos, para serem esmagados e guardado o seu sumo nos balceiros, onde permanecem alguns dias, sendo depois o vinho armazenado nas barricas – quintos, meias pipas ou pipas, conforme a produção.

E é então que, pelo São Martinho, se vai à adega e se prova o vinho, uma prova que se estende aos amigos e vizinhos.

A meados do século passado os vinhateiros da Criação Velha iniciaram a festa de São Martinho, numa capela improvisada, no ramal que liga aquela freguesia à Areia Larga. Hoje já ali está construída uma pequena capela para, no seu dia próprio, ser festejado o santo protector das vinhas e dos vinhateiros.

Bom seria que não se esquecesse também Frei Pedro Gigante, o introdutor da vinha na ilha do Pico, ali no lugar da Silveira, desta vila.


Vila das Lajes, 5 de Novembro de 2009

sábado, 7 de novembro de 2009

"AOS NOVOS" -Memórias de um centenário

É o título de um opúsculo publicado em Angra em 1927 pela Comissão Aloisiana que promoveu na Igreja de São Francisco daquela cidade, as comemorações do 2º Centenário da Canonização de São Luís Gonzaga.

A Comissão era constituída por alunos finalistas do Seminário e por outros jovens angrenses. Dela faziam parte, entre outros, os futuros Sacerdotes ordenados nesse ano: Francisco Vieira Soares, e Manuel Azevedo, picoenses, António Correia de Escobar, faialense, Manuel Rocha graciosense, Luís Cota Vieira, terceirense, além de outros que já não me foi possível identificar na foto que vem incerta no opúsculo citado. Lá está o Sargento Ferreira e António Machado Bettencourt, também picoense.

Manuel Rocha, terminado o curso, seguiu para Roma, onde se formou em Teologia e, depois, esteve em Lovaina a estagiar com o Cónego Cardijn para, depois, vir fundar em Lisboa a JOC. No entanto, acabou por deixar o Patriarcado e emigrar para os Estados Unidos da América, fundando ali uma paróquia junto de uma das Comunidades Portuguesas.

Tive o prazer de assistir à Missa Nova do Pe. Francisco V. Soares que, embora natural desta Vila, a celebrou no dia 31 de Julho de 1927, na freguesia da Piedade onde era pároco o tio Pe. Francisco Soares. Mas voltemos a Angra. Um dos números das comemorações centenárias foi a apresentação, no Teatro Angrense, do orfeão ensaiado e dirigido pelo Padre José de Ávila.

Acerca desse acontecimento artístico escreveu para o “Correio dos Açores” o Dr. Luís Ribeiro, jurisconsulto e grande crítico musical, além de ser um bom executante de violino (fazia parte da Orquestra que acompanhava o Te Deum do fim do ano, na Sé):

O Padre Ávila mais uma vez adivinhou, mais uma vez achou a interpretação conveniente e justa sem ninguém lha ensinar nem nunca a ter ouvido!” (Aqui um simples reparo: O Padre José de Ávila, na sua juventude, foi aluno aproveitado do notável maestro Padre João Pereira da Terra que a vários ensinou a arte de Euterpe, mas nenhum soube aproveitar os ensinamentos como o Padre Ávila).

E só mais esta transcrição: “E pena é que este isolamento a que cada ilha está condenada pela força das circunstâncias, não permita a açorianos de todo o arquipélago virem gozar o raro prazer que o Orfeão proporcionou aos terceirenses.”

Enganou-se o erudito Dr. Luís Ribeiro. No ano seguinte o Padre José de Ávila preparou o Orfeão de Angra, com alunos do Seminário e outros jovens angrenses, cerca de oitenta elementos, e rumou a Ponta Delgada, onde a actuação do Orfeão foi um autêntico êxito cultural e artístico.

Antes da chegada do orfeão a Ponta Delgada, a Imprensa fez largas referências às qualidades artísticas do agrupamento.

O referido Dr. Luís Ribeiro publicou no “Correio dos Açores” um excelente artigo referindo a execução, pelo Orfeão, do “Aleluia” do compositor alemão Félix Mendelssohn.

Em Ponta Delgada, foi constituída uma “Comissão de Recepção” pelas seguintes personalidades: Pe. Herculano Romão Ferreira, Vigário de São Pedro, Anibal Bettencourt Barbosa, Rodrigo Rodrigues, Artur J.V. May, Dr. Manuel C. Pereira, Dr. Armando Côrtes Rodrigues, Domingos Rebelo, Aníbal Bicudo, Dr. António Melo, José da Luz Celeste do Nascimento, Pe. Dr. José Vieira Alvernaz, Luís Maria Xavier, Licino Costa, Augusto Correia de Teves, Pe. Francisco José Ferreira, Prior da Matriz, Capitão-capelão José Cabral Lino e Pe. José Augusto Pacheco.

Com o grupo seguiram, também, de Angra diversas personalidades. Entre elas o Dr. Garcia da Rosa, que pronunciou no primeiro concerto, realizado no antigo Teatro Micaelense, uma conferência sobre “Origem, Decadência e Restauração da Polifonia Sacra”, com apresentação do Dr. Guilherme de Morais.

No segundo concerto o Tenente-Coronel Frederico Lopes, fez uma conferência cuja apresentação esteve a cargo do Dr. Agnelo Casemiro.

Antes da terceira parte do último concerto o Vice-Reitor do Seminário, Dr. Manuel Cardoso do Couto agradeceu o acolhimento dispensado ao orfeão de Angra.

O terceiro concerto realizou-se no Coliseu Micaelense, tendo a Imprensa classificado o mesmo de “apoteóse triunfal”.

Depois desta digressão triunfal, repito, o orfeão nunca mais saiu da Terceira, ficando limitado ao Seminário. Que eu saiba, apenas uma vez foi ao Teatro Angrense, em 1932, para fazer a primeira parte do espectáculo dos alunos do Terceiro Ano Médico de Coimbra, em digressão pelos Açores. E que difícil foi demover o somítico vice-reitor de então!...

Só muito mais tarde, na década de sessenta e sob a regência do Maestro ribeiragrandense Edmundo M. Oliveira, o Orfeon do Seminário de Angra voltou a São Miguel, numa digressão, igualmente, memorável.


Lajes do Pico, 1 de Novembro de 2009


Ermelindo Ávila


quinta-feira, 29 de outubro de 2009

BIBLIOTECAS

Estão a terminar, no corrente ano, as visitas às Baleias. Não sei quantos foram os visitantes, pois não tive oportunidade de investigar junto dos respectivos armadores, se isso permitissem, quantos foram aqueles que, aproveitando a frota local, foram junto dos cetáceos que abundam na baía das Lajes. Mas, a julgar pelo movimento diário que se observava no porto das Lajes do Pico, devem ter atingido alguns milhares.

É uma nova modalidade de turismo que está a valorizar esta terra, há cerca de duas dezenas de anos. Aliás um turismo com força cultural e que vem reforçar o ambiente que se vive desde há muito por esta ilha picoense.

E já agora convém recordar: A Vila das Lajes possui alguns estabelecimentos de leitura importantes pelo seu recheio e pelo número de obras que neles se consultam.

E principiemos pela Escola Secundária cuja biblioteca já atingiu cerca de 6.700 exemplares.

O Museu dos Baleeiros, nas Lajes do Pico, possui uma biblioteca especializada com algumas centenas de exemplares de obras clássicas, nacionais e estrangeiras.

A Biblioteca Municipal é bastante antiga e conta com cerca de 10 mil volumes. Mas tem uma história que vale a pena recordar.

Entre 1874 e 1879 andou por Coimbra a estudar Teologia aquele que , depois, seria Bisco de Macau, Dom João Paulino de Azevedo e Castro. Durante esses anos conseguiu recolher, nos alfarrabistas, algumas centenas de livros que enviou para a Vila das Lajes, sua terra natal, ao irmão Manuel Joaquim de Azevedo e Castro. Este, amante da leitura, havia solicitado a alguns cavalheiros a sua colaboração no sentido de fundar um Gabinete de Leitura. E foi para este gabinete que o irmão João enviou os “centos de livros” que havia recolhido. A Câmara Municipal de então concedeu ao Gabinete o subsídio de 18$000.

O Gabinete funcionou com regularidade durante vários anos até que, em 28 de Outubro de 1895, foi fundado o “Grémio Literário Lajense”, instituição de recreio, para o qual transitou o espólio do Gabinete. (Por exigências legais da Ditadura, o Grémio teve de alterar a denominação para Sociedade Literária e Recreativa Lajense, já nos anos quarenta do século 20.

A biblioteca do Grémio foi passando de instituição para instituição, chegando a nossos dias já bastante diminuída. Essa circunstância levou um pequeno grupo de jovens lajenses, na década de trinta, a fundar a Biblioteca Popular Lajense que, para garantia da sua existência viria a ser entregue, nos princípios dos anos quarenta, à Câmara Municipal das Lajes do Pico.

Actualmente denomina-se Biblioteca Municipal Dias de Melo em homenagem ao escritor picoense, recentemente falecido. Possui uma existência superior a dez mil exemplares. Dela faz parte uma biblioteca infantil, muito frequentada.

Em formação e contando já algumas centenas de exemplares existem os núcleos do Posto de Turismo Municipal, ao Castelo, e o Centro de Ciências do Mar, na antiga SIBIL.

Além das indicadas, encontram-se na vila das Lajes algumas pequenas bibliotecas particulares que acrescentam uma nota de verdadeira cultura ao velho e secular burgo.

Na Madalena, existe uma Biblioteca Municipal, fundada com os restos da biblioteca do escritor Nunes da Rosa, mas agora bastante enriquecida com mais de 15.000 volumes da biblioteca particular do falecido Dr. Lopes Correia e que o Filho, num gesto altruísta, acaba de doar ao Município da sua terra. Fica assim a Vila da Madalena a possuir uma das maiores bibliotecas picoenses.

Em S. Roque do Pico um grupo de cavalheiros, tendo à cabeça o notável João Bento de Lima, criou o Gabinete de Leitura Marques de Pombal, inaugurado em 8 de Maio de 1882.

A nossos dias pouco ou nada chegou da antiga biblioteca. No final do século XX, a Família do malogrado Poeta Almeida Firmino entendeu entregar à Câmara Municipal de São Roque a biblioteca do Poeta. Hoje a instituição possui mais de 3.600 volumes e está devidamente instalada, em edifício próprio.

Afinal um ambiente cultural que importa perseverar com cuidado e esmero pois só valoriza e em muitos aspectos a terra picoense.

Vila das Lajes, 24/Set./2009

Ermelindo Ávila