sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Nota do meu retiro

Salvo dos antropófagos


Jovem ainda, embarcou numa noite escura, da costa atrás do Castelete, para um barquinho, que saíra do porto da vila para a pesca de fundo, no alto mar.

Tinha havido a habitual combinação, com a antecedência indispensável, com o individuo (engajador), que se entendera na Horta com o comandante da Baleeira, que àquela cidade aportara para fazer aguada.

Outras baleeiras lá estavam no habitual descanso, mas aquela é que fora a escolhida, visto o comandante ser já conhecido do engajador. Além disso e não era a primeira vez que transportava rapazes, alguns para complemento da tripulação, outros somente com o destino de alcançarem as costas do Novo Mundo.

Cá em terra, só o pai sabia das intenções do José, que há muito desejava dar “o salto”, e caminhar para as Terras do ouro, pois por nada desejava servir o Rei.

Um dos tripulantes do barquinho, que fez a ligação, era também jovem mas nunca pensou “dar o salto”, pois o pai era um doente e necessitava da sua ajuda nos trabalhos do campo.

Aqueles que , naquela noite, fugiam à pobreza da terra e às obrigações militares, insistiram com o António para que os acompanhasse, mas ele resistiu ao convite até que, já junto da baleeira, se resolveu a embarcar também. Descalçou as albarcas que levava e pediu aos companheiros do barco que as trouxessem ao Pai, porque resolvera também embarcar. E lá foi... A mãe nunca lhe perdoou aquela aventura e chorou a vida inteira pelo seu António. E foi uma vida longa de cem anos...

O António ficou pela América. Constituiu família e nunca mais voltou. Seus descendentes por lá andam, integrados na vida Americana, como verdadeiros naturais da grande nação. Mas este caso verídico é igual ao de tantos outros jovens que daqui partiram para não mais voltar. As suas descendências, em muitos casos, desconhecem as origens. Outros vão por aí aparecendo, interessados em conhecer os parentes, que nem sempre encontram.

O José não mais deixou a baleeira. Viajou pelo Pacífico onde abundavam os cardumes de baleias. Dizem Donalde Warrin e Geoffrey Gomes (“Os Portugueses no Faroeste – Terra a Perder de Vista” 2008, p. 351), que “Em meados da década de 1850, os próprios portugueses estabeleceram uma correnteza de pequenos portos de caça à baleia ao longo da costa da Califórnia...”.” Foi pois a actividade baleeira que providenciou o impulso para que os homens e os rapazes abandonassem as ilhas do Atlântico...”

O escritor Manuel Greaves, (embora, naturalmente por lapso, trocando o nome do herói pelo do genro deste), diz que “Houve um antigo baleeiro, de apelido Domingos (afinal trata-se de José Vicente, sogro de José Domingos), natural das Lajes do Pico, que contava a sua aventura numa ilha do Pacífico, onde o seu navio aportou para aguada. Habitavam-na selvagens, pretos como amora madura. Extensos areais cercavam a ilha.”

Alguns dos tripulantes desembarcaram na ilha, entre eles o José Vicente. Penetrando na Ilha foram encontrar um grupo de pretos antropófagos, que os prenderam e ataram com tiras de filamento a uma árvore, para com eles se banquetearam no dia seguinte. Entretanto, para festejar a presa, iniciaram danças macabras e quando já era noite alta, adormeceram. Foi então que os prisioneiros conseguiram soltar-se e correram para o areal, onde os esperavam os companheiros. Estavam salvos de serem comidos pelos selvagens.

O Vicente regressou mais tarde às Lajes, onde constituiu família. E nas tardes solarengas, ao abrigo dos salgueiros que rodeavam a entrada do Porto, contava a sua aventura.

José Vicente era filho de Manuel Vicente Pedro e de Maria Perpétua. Um dos filhos, Francisco, que também emigrou para a Califórnia, regressou viúvo e sem filhos. Por cá ficaram D. Maria Olímpia, que casou com José Domingos e Manuel Vicente, casado com Maria Silva. Parece que um outro filho do José Vicente emigrou para o Brasil. Nesta Vila o nosso herói tem larga descendência.

Não é fácil narrar em pormenor o acontecimento nem a todos os descendentes referir, pois tornaria muito extenso este texto.

Vila Baleeira,

20-Fevº.- 2009

Ermelindo Ávila

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Muralha de defesa da Vila das Lajes

Deram-se por concluídas as obras do molhe de defesa da vila das Lajes. Na generalidade as pessoas ficaram algo satisfeitas com os trabalhos realizados, se bem que uma dúvida a algumas continuasse. E dela já aqui nos fizemos eco. A defesa da vila não ficou completa. Importa tomar isso em consideração.

O projecto, que foi apresentado aos lajenses, incluía mais do que uma hipótese de execução dos molhes. Aceitou-se a que foi construída, se bem que sempre se considerou que não era o suficiente para a defesa da vila. E até mesmo o troço de muralha de ligação ao molhe construído e que serviu para o empreiteiro transportar os materiais, ficou como que abandonado. Pelo lado sul foram deixados blocos, sem qualquer alinhamento ou segurança e aquele percurso vai-se desfazendo aos poucos. No entanto, a JAP colocou uma placa, no seu início, avisando que era proibido por ele passar.

Julgámos que o Plano e Orçamento da Região previsse a conclusão da defesa da vila mas isso não acontece. Nada ali se refere às Lajes. Não admira. O Pico, e especialmente o concelho das Lajes, não está considerado no programa das ilhas de coesão. Nem sei porquê, se é uma das mais atrasadas da Região...

Papel decisivo cabe aos representantes do povo no Parlamento. Foram eleitos para velar e defender os interesses dos eleitores. Mas, passemos adiante...

A Muralha de defesa da Vila ocupa as coluna dos jornais locais há quase dois séculos. Algo se tem feito, após tanto reclamar, mas nem sempre com presteza nem mesmo com a técnica desejadas. E as reclamações não vão mais atrás, porque a vila, anteriormente, estendia-se para o Juncal e a costa era resguardada por uma cortina de pedra que, a pouco e pouco, foi desaparecendo.

Mas tenhamos um pouco de atenção para o que diz a “História das Lages”:

A veiga magnifica sobre que assenta a vila das Lages era então sensivelmente dupla; e a floresta virgem que vicejava nesses terrenos fecundos, estendia-se até ao mar, segundo uma linha de penedias que o ciclone de 1893 arrasou.

Nos bens da casa morganática do capitão Manuel Machado Soares, ainda em 1 de Março de 1641 foram incluídos ‘a terra do Juncal, a partir com a terça de André Rodrigues’ e ‘dois cerrados de terra com uma eira, detrás desta vila no Biscoito dos juncos’, que o testador houve de compra ao padre Pedro Rodrigues Vieira, a Jerónimo Pereira e Gaspar de Azevedo. Hoje só existe o Lagedo da eira, para os lados da Lagoa do Cão

A confirmar o que diz o autor, General Lacerda Machado, (l936) existe ainda um postal muito antigo (1900 ?), daquela zona, onde se descobrem alguns cerrados que já desapareceram. E muito mais destruíram os temporais de Inverno que assolaram a vila.

A Câmara Municipal reclamou, em diversas ocasiões, a construção de uma muralha em torno da Vila. (sic). Silveira de Macedo, in História das Quatro Ilhas... (vol. 2, pág 175), diz que em 1848 a Câmara das Lages fez essa reclamação. E pelos anos fora as reclamações foram contínuas.

Em 1849 começou-se a construir uma muralha no sítio de Santa Catarina, sainte da Vila das Lajes; e por alvará de 18 de Setembro de 1851 foi mandado continuar a muralha.

Segundo informa o jornal “As Lages”, de 15 de Maio de 1914, (noventa e quatro anos são decorridos) a muralha já estava em construção. No entanto, o articulista diz que “Seguindo vagarosamente por cima do último lanço de alicerces (nessa época não era proibido visitarem-se obras publicas...) e de pouco a pouco fomos notando o estreitamento sensível da muralha; chegados que fomos ao fim da mesma , deparou-se-nos um murosito que nos pareceu uma destas paredes de vedação de quintais. Para satisfazer a nossa curiosidade e a dos leitores, arranjamos uma fita métrica e medimos: largura da muralha que ia seguindo 2 m., largura da muralha que vai seguir, 1,50m. Portanto uma diferença de meio metro a menos.”

No projecto de modernização da Vila apresentado à Câmara Municipal pelo General Lacerda Machado, em sessão da C.M. de 14 de Julho de 1913, alvitrava o seu Autor que a muralha tivesse início no redondo do muro do caneiro, conquistando-se assim uma grande parcela de terreno, outrora arável, e que estava a ser ocupado pelo junco. Demais permitia-se o lançamento da avenida e um novo arruamento a ligar as ruas transversais. Tudo foi esquecido.

No jornal “As Lages”, já citado, nº 163 de 15 de Abril de 1919, encontramos esta simples local que muito nos diz:” Procede-se à reparação do muro da Lagoa, desta Vila, cujo estado há muito reclama tal benefício. A Propósito: quando é que uns olhos de misericórdia se volverão sobre nós e atentem sobre o estado estacionário da muralha de defesa desta Vila, que em alguns sítios ameaça ruína?”

Nascendo defeituosa, a muralha de 1914 nunca foi de defesa da Vila. Servia, quase só, para bancada dos assistentes aos jogos realizados no campo, construído pelos lajenses em 1925.

Em 9 de Fevereiro de 1936 um violento ciclone destrui a muralha que circundava a Lagoa. Duarte Pacheco, Ministro das Obras Públicas, a pedido do Governador de então, Dr. Freitas Pimentel e com o empenho do lajense Gen. Lacerda Machado, determinou que a obra tivesse imediato início, concedendo para o efeito 500 contos ao Director das O.P. Eng. Ângelo Corbal. Entretanto o projecto eorçamento foram elaborados, as verbas complementares chegaram e a obra conclui-se em dois anos, salvo erro. Ela ali está e representa de verdadeiro monumento em obras hidráulicas. Mas foi só!

Na década de 1960, houve quem tivesse a peregrina ideia de construir, a meio do juncal, uns muretes (o tal muro da vergonha, como o classificou o povo) que os enchentes do ano seguinte derrubaram. Veio depois o alteamento do muro construído em 1914, que pouco resolveu.

Agora a engenharia optou pela construção de um molhe no exterior e dele, sem projecto, nasceu uma lagoa. Mas tudo continua incompleto. O lanço de muro de ligação àquele molhe foi improvisado pelo empreiteiro para permitir o acesso dos seus veículos às obras e, apesar de se reconhecer que a sua manutenção éra importante para garantir a eficiência do molhe, nada se faz.

O Plano e Orçamento da Região nenhuma verba prevêem para o porto desta Vila. Naturalmente não é esquecimento mas com certeza o propósito de considerar a defesa da Vila completa. Se assim é, continuamos como dantes a ficar com obras incompletas e a sofrer os efeitos desastrosos dos temporais que vierem. Será que haverá o propósito de nos reduzir à “ínfima espécie?” Não acredito!


Vila das Lajes,

9 de Fev. de 2009

Ermelindo Ávila

domingo, 22 de fevereiro de 2009

Gabinete de Leitura

O Centro de Artes e Culturas do Mar, está a promover um ciclo de palestras, conferências colóquios e mesas-redondas sobre aspectos actuais, vinculados à história e ao presente açoriano, bem como de outras geografias e temáticas – da política ao desporto, passando pela ciência, arte e cultura - Conferências das Lajes, retomando uma tradição do Concelho.

No passado dia 14 o conferencista, Dr. Carlos Martins, do Algarve, tratou do tema “Tendências e oportunidades no Turismo”, que foi bastante apreciado, uma vez que o conferencista soube enquadrar o aliciante tema na realidade da ilha do Pico.

Estão anunciadas outras conferências para os meses seguintes. Desta forma o Centro vai cumprindo o seu programa, largamente distribuído e que, apesar de tudo, tem merecido bom acolhimento da população.

Realmente a Vila das Lajes tem uma tradição cultural. Já o dissemos diversas vezes, apoiados nos documentos que nos chegaram até agora. O Arquivo dos Açores, no volume nono, diz que o Gabinete de Leitura Lajense data de 1876. O gabinete foi aberto com livros cedidos, temporariamente, pelos frequentadores do mesmo e a Câmara Municipal, desejando patrocinar, quanto ao seu alcance, aquele útil melhoramento, concedeu-lhe o subsídio anual de dezoito mil reis.

E continua a notícia do Arquivo dos Açores: Como estivesse em Coimbra, a cursar a Universidade, um distinto e talentoso lajense, o actual Dr. João Paulino de Azevedo e Castro, hoje lente do Seminário de Angra do Heroísmo e sacerdote respeitado pelas suas virtudes e erudição, secundou, poderosamente, os esforços literários dos seus conterrâneos, angariando dádivas de alguns centros de volumes, que para as Lajes do Pico foram logo remetidos.

E acrescenta o Arquivo dos Açores: Durante alguns anos manteve-se com regularidade este Gabinete de Leitura, mas a falta de uma casa apropriada ao fim a que se destinava, foi-lhe afrouxando a concorrência, até passar quase desapercebido.

Mo entanto, em 28 de Outubro de 1895 era fundado uma nova instituição cultural, embora também recreativa, o “Grémio Literário Lajense.”

Hoje a vila das Lajes possui algumas instituições de carácter cultural, que muito a prestigiam: Além da Filarmónica Lajense, fundada em 14 de Fevereiro de 1864, do Museu dos Baleeiros, Biblioteca Municipal Dias de Melo, Posto de Cultura e Turismo, no antigo Forte de Santa Catarina, o Centro de Artes e de Ciências do ar, aonde não faltam os acervos literários quer ara leitura quer para aquisição pelos interessados.

(crónica lida em 21-02-2009, no programa Manhãs de sábado da RDP-A


quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

OS ANTIGOS PREGADORES

Todas as antigas igrejas e capelas ou ermidas eram providas de púlpitos, destinados à pregação em cerimónias litúrgicas solenes. Muitas delas, aquelas que vêm de séculos passados, ainda hoje os conservam. Algumas tinham dois púlpitos, como era o caso da Sé de Angra, antes do incêndio. E até um, em estilo de pedestal, era colocado quase no centro do templo, para melhor ser ouvido o pregador.

A tradição dos púlpitos foi abandonada e até, alguns, retirados sem nenhuma valia para a arquitectura do conjunto do templo respectivo, como foi o caso da Matriz da Santíssima Trindade, desta Vila, cujo púlpito estava já numa das colunas, em pedra de basalto mas tinha somente os degraus de acesso e o patamar.

O celebrante, nas missas dominicais, fazia “à grade” as homilías.

Com a reforma litúrgica introduzida pelo Concílio Vaticano II, surgiram os ambãos, retomando-se o antigo móvel das “primitivas igrejas cristãs com função decorativa e litúrgica, pousado sobre o pavimento e que servia para o canto e predicação”. Mas, porque dali a audição do orador é, normalmente, diminuta, vá de instalar-se em quase todas as igrejas, aparelhagens sonoras.

Os pregadores, para as solenidades, eram escolhidos entre os melhores oradores sacros. Recordo Mons. José Pereira da Silva, um dos mais distintos oradores do seu tempo. Lembro-me da homilía que fez, em francês, dedicada a tripulantes de um barco de guerra francês, que aportou à Horta durante a II Grande Guerra mundial e que, de véspera, procuraram saber a hora da missa dominical. Um feito que causou certo assombro na cidade.

Na primeira metade do século passado tornaram-se célebres pela sua pregação erudita e linguagem vernácula, o Pe. Ouvidor Nunes da Rosa, pároco das Bandeiras, o Pe. José Maria Fernandes, que esteve alguns anos em Macau e foi Deão da respectiva Sé, o Pe. Ouvidor Domingos Ângelo, o Pe. Xavier Madruga, o Pe. Ouvidor José Vieira Soares e o Pe. Manuel Vieira Feliciano. Igualmente, embora um pouco mais tarde, o Pe. Francisco Vieira Soares e depois o Pe. José Idalmiro Ávila Ferreira.

Os sermões, para alguns, eram escritos e decorados, para outros, estudados e apenas elaborados ou esboçados os tópicos que levavam para o púlpito, como era o caso do Pe. Xavier Madruga.

Pe. Feliciano era bom orador, de linguagem correntia mas elegante. Os seus sermões eram escritos e decorados, pois tinha memória privilegiada. Poucos fazia. Decorava-os e repetia-os em ocasiões oportunas. Normalmente, pregava na Matriz das Lajes o sermão de Enterro, na sexta-feira santa.

De S. Jorge vinha ao Pico, em tempos idos, e pregava em diversas solenidades um padre que era conhecido pelo “Padre bebe-água”, simplesmente porque, quando ia para o púlpito, levava um copo de água para se dessedentar durante a pregação, atitude que hoje qualquer orador assume.

De vários pregadores a peça oratória era, geralmente, escrita e decorada ipsis verbis e constituída pelo exórdio, corpo do discurso e súplica final. No entanto, a maioria dos pregadores somente escrevia o exórdio , em sermões de maior responsabilidade.

O Pe. Dr. Fernando Maciel fez o curso do Seminário em Macau e a licenciatura em Filosofia na Universidade Gregoriana de Roma. Completado o curso veio para esta vila, onde vivia a Família, afim de ser ordenado presbítero e celebrar a Missa Nova, na antiga igreja de São Francisco a servir de Matriz. Ordenou-o o então Bispo de Macau, Dom José da Costa Nunes. O Pe. Dr. Fernando Maciel ficou por cá mais algum tempo. Na festa de Cristo-Rei, foi convidado para pregar na solenidade e aceitou. Escreveu todo o discurso e, no púlpito fez a sua leitura, declamando-o com emoção e vivacidade. Mas, infelizmente, as críticas não lhe faltaram. O povo não estava habituado a ver o pregador ler um sermão...

Era tão importante a pregação das solenidades principais que, v.g., na festa de Lourdes era quase sempre convidado um orador estranho, muitas vezes do continente, que fazia a pregação do novenário e da festa solene.

Um antigo orador, dos mais célebres da ilha, dizia nos últimos anos de vida, que estava arrependido de pregar com tanto floreado e eloquência, deixando muitas vezes a parte doutrinaria na penumbra...

Bons oradores por aqui passaram, principalmente nas festas de verão, quando eles para cá vinham em férias, como era o caso do Pe. Dr. Francisco Garcia da Rosa, do Pe. António Cardoso Machado, do Pe. João Goulart e outros mais.

E só mais esta referência: Havia um sacerdote que era várias vezes convidado para o serviço da sexta-feira Santa, nas paróquias da ilha, que celebravam os Mistérios da Paixão do Senhor. Quando novo, havia escrito dois sermões para a ocasião, um mais extenso (levava mais de uma hora) outro menor. Na ocasião do convite, perguntava sempre: Queres o sermão grande ou o pequeno? E era assim, sempre que recebia um convite.

Afinal, tempos diferentes que não deixaram de ser BONS TEMPOS!


Ermelindo Ávila


terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Centro de Artes e Ciências do Mar


No dia 27 de Janeiro o Centro de Artes e de Ciências do Mar, da Empresa Municipal CULTURPICO, desta Vila Baleeira comemorou festivamente o seu primeiro aniversário. Afinal um acontecimento cultural que teve a presença de bom numero de convidados.

Trata-se de uma instituição que, como o nome indica, se dedica às Artes e Ciências do Mar, no seguimento de uma actividade que tanto prestígio e valor trouxe à terra picoense – a baleação.

O Centro foi instalado na antiga fábrica da baleia, como é ainda hoje conhecida, pertencente que foi à antiga Sociedade SIBIL.

As instalações fabris, cuja construção se iniciou em 1947, com projecto de arquitectura do engenheiro Mário Jorge ao tempo chefe dos Serviços das Obras Públicas na Ilha, não foi em nada alterado. No entanto, os espaços vazios foram objecto de uma artística adaptação que mereceu uma Menção Honrosa da Categoria de Novo Projecto Público, no âmbito dos Prémios de Turismo de Portugal de 2008, entregue na última Bolsa de Turismo realizada em Lisboa.

O equipamento da antiga Fábrica mantém-se inalterável e nos respectivos locais: Caldeira, guinchos, auto claves, secção de farinação e até a respectiva chaminé, com mais de duas dezenas de metros de altura, construída em pedra basáltica e que por si só constitui quase um autêntico monumento.

O Centro dispõe de recepção, bar, livraria, sala de conferências e convívio e exposições.

No ano findo foi visitado por cerca de dez mil pessoas, e nele se realizaram diversos inventos: lançamento de livros, conferências, serões de arte e visitas de estudo. É realmente umlocal aprazível e que, para além da sua actual função artística, nos trás à lembrança, lembrança saudosa, os antigos tempos da baleação em que a Vila das Lajes foi escola e oficina. Daí ser actualmente cognominada de Vila Baleeira. Um título que, podem crer, muito nos enaltece.

Na realidade foi um período de relativa prosperidade aquele que, em cerca de uma centena de anos, viveram os lajenses, mensageiros de uma actividade que outros quiseram igualmente explorar, nas diversas ilhas, dos Açores, na Madeira e em Setúbal, no continente.

Agora ficou o Centro de Artes e Ciências do Mar, como ficou o Museu dos Baleeiros, (nas antigas casas dos botes) o mais visitado estabelecimento museológico da Região e que foi acertadamente ampliado, cujas obras foram, há meses, inauguradas.

A culminar este conjunto de arte e de interesse turístico impõe-se trazer aqui o antigo Forte de Santa Catarina, adaptado a posto de turismo com esplanada para eventos culturais e recreativos. Ficou assim restaurada, e bem, a única edificação de natureza militar existente na Ilha do Pico.

E foi também a recuperação de um passado de certo esplendor, que se projecta no futuro, para prestígio e louvor das gentes desta avoenga vila baleeira.

BOM DIA!

Ermelindo Ávila

14-Fevereiro-09

(Crónica para Manhãs de Sábado da RDP-A)

NOTAS DIVERSAS


LOJA DA CULTURA

O Director Regional da Cultura, através da RTP-Açores, anunciou há dias a criação de diversas Lojas da Cultura, em algumas Ilhas da Região. A Ilha do Pico é uma das que vai beneficiar da instalação, muito em breve, de uma dessas instituição que, segundo a mesma comunicação, ficará instalada nas Lajes do Pico. Não foi indicada a localidade mas cremos que se trata da vila sede do concelho.

Segundo os técnicos trata-se do centro com maior vocação cultural da ilha. Afinal, uma prerrogativa que não é nova mas que lhe vem do século dezanove ou mesmo, mais de trás.

Primeiro foram os frades franciscanos que estimularam a cultura, ensinando a juventude que desejava adquirir os conhecimentos das letras e ciências. Com a extinção do convento, a aula de latim teve uma função muito meritória, preparando aqueles que desejavam seguir cursos universitários. A propósito, lê-se no Arquivo dos Açores (Vol. IX, págs. 54) a propósito da criação do Gabinete de Leitura das Lajes do Pico: “Como estivesse, então, em Coimbra, a cursar a Universidade, um distinto e talentoso lajense, o eventual Dr. João Paulino de Azevedo e Castro, hoje lente no Seminário de’Angra do Heroísmo e sacerdote respeitado, pelas suas virtudes e erudição, secundou, poderosamente, os esforços literários dos seus conterrâneos, angariando dádivas de alguns centos de volumes, que para as Lajes do Pico foram logo remetidos.” E acrescenta: “Durante alguns anos manteve-se com regularidade este Gabinete de leitura, mas a falta de uma casa apropriada ao fim a que se destinava. Foi-lhe afrouxando a concorrência, até passar quase desaparecido”.

Igual Gabinete foi criado ma vila de São Roque, o qual teve também viva efémera.

Em sessão extraordinária de l de Maio de 1876 a Câmara Municipal, então presidida pelo negociante José Silveira Peixoto, “deliberou atribuir, por proposta do Presidente, ao Gabinete de Leitura Popular Lajense, por julgar ser uma instituição civilizadora, e que, possuindo à roda de 500 volumes, de muito pode servir à mocidade estudiosa da freguesia, principalmente quando for Lei do Estado, a reforma da instrução pública.”

Nos anos de 1881 e 1882 a Câmara deliberou conceder ao Gabinete o subsídio de 18$000, em cada um desses anos.

Ao Gabinete de Leitura, fundado por Manuel Joaquim de Azevedo e Castro, irmão do Dr. João Paulino, que viria a ser Bispo de Macau, sucedeu o Grémio Literário Lajense, fundado em 28 de Outubro de 1895, e onde foram recolhidos os livros do Gabinete.

O Grémio continuou, passando, na década de trinta do século findo, a denominar-se Sociedade Literária e Recreativa Lajense, a qual deixou de funcionar nos anos setenta por falta de sede.

Entretanto em Setembro de 1935 a Imprensa distrital anunciava a fundação da Biblioteca Popular Lajense, que recebeu uma parte do espólio literário do P. António Ávila, da Horta, e funcionou até à sua integração, em 1940, na Biblioteca Municipal. Interessante registar os nomes dos jovens que constituíam a Comissão organizadora da biblioteca: Raul Xavier, João José de Azevedo e Castro, Francisco António Rodrigues de Simas Melo Ferreira, Manuel Vitorino Nunes Júnior e E. S. Machado Ávila. Este o único vivo

A Biblioteca Municipal, que recebeu também, o depósito da Biblioteca Gulbenkian, existente nesta vila, está em funcionando, em edifício próprio, mas tem-se dedicado ultimamente, com maior interesse, à juventude infantil .

Aplaudo às duas mãos a criação da Loja da Cultura, nesta Vila, onde não existe uma Livraria que permita aos interessados a aquisição, além de outros, principalmente de edições de autores açorianos. É um acto de valorização cultural, que muito dignifica a Direcção Regional da Cultura e, com certeza, vai prestar inestimável contributo para a formação cultural dos novos e mesmo velhos desta terra a qual, assim, vai poder continuar a manter a sua prestigiosa acção cultural.

É bom que o Governo Regional traga até nós iniciativas em todos os sectores - culturais, científicos, sociais e económicos, promovendo o desenvolvimento, como lhe cumpre, das terras que estão sob a sua jurisdição administrativa. Só assim a Região Autónoma dos Açores conseguirá o crescimento harmónico de todas as Ilhas, como um todo. Demais, foi esse o slogan que esteve na base da instituição da Autonomia.

Vila das Lajes,

Janeiro de 2008

Ermelindo Ávila




segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

"NASCIDO DO MAGMA - Por Ruben Rodrigues"

Há muito que este livro devia estar à disposição dos leitores, nas vitrinas das Livrarias. Este e outros mais.

O seu Autor tem se escusado a público trabalhos literários do género de “Nascido do Magma” ou outros de temas diferentes. É que (opinião minha)não basta escrever, e tão bem como o Prof. Rúben Rodrigues sabe, apenas para jornais de diminuta tiragem. E que grande fosse.! Os jornais passam. No dia seguinte à publicação são “guardados” nos recipientes do lixo. Poucos ou raros são os leitores que os conservam. E, mesmo assim, com o perigo de lhes encherem as estantes ou baús de ruim traça...

Modestamente desejo incentivar – se isso me é permitido - o ilustre Jornalista - escritor à publicação dos seus escritos, embora muitos deles conservados cuidadosamente com o método que é peculiar ao seu Autor, a aguardar um “despacho de deferimento”.

Conheço há muitos anos o professor Ruben Rodrigues. Sei do que é , literalmente, capaz. Não me surpreendeu aparecimento de “NASCIDO DO MAGMA”.

Admirei a maneira simples mas brilhante, atenta e precisa, como soube desenvolver o tema do seu trabalho: observador atento e escritor brilhante, tratando um tema aliciante mas que nem todos aqueles que vem escrevendo tiveram, até agora, a coragem e talvez a competência para o fazer. Bem haja por isso!

Mas, mais do que estas “mal notadas regras”, vamos tentar debruçarmo-nos sobre o “Nascido do Magma”.

O livro não “nasceu”, com certeza, de uma “miscelânea confusa” mas de uma realidade concreta que se vai descobrindo à maneira que voltamos cada uma das suas recheadas 259 páginas. E só pode compreender todo o entrecho quem um dia teve oportunidade de viver na Fronteira, conviver com as suas gentes e interiorizar os seus problemas, a sua vida dura mas singela nesta ilha em que habitam, porque aqui nasceram, aqui viveram e aqui desejam – a grande maioria – terminar seus dias.

O trabalho duro do corte dos cacetes e das achas; o transporte em cestos à cabeça de homens e mulheres, de novos e velhos, para os primitivos carros de bois que os hão - de despejar no cais; os transportes em “barcos de boca aberta”

para a outra banda e, ali, o descarregar, tudo isso é uma parte dura da vivência do trabalhador que, neste mister, arrecada (va) valiosa importância da subsistência familiar.

Nas épocas próprias as deslocações para a ilha vizinha, onde se cultivava o milho, por contra própria (bastante limitada), ou dando dias para fora, por conta dos senhores nem sempre correctos no trato e no pagar o soldo. Quando o Outono chegava era o transporte do milho, em maçaroca, para o cais da Fronteira.

E, por entre todo este penar, o idílio de um tal Manuel que, apaixonado por nova moça, prefere fugir rocambolescamente para um dia poder voltar à terra e realizar o seu sonho de juventude.

Entusiasma e comove por vezes a leitura deste livro – romance, muito embora não deixe de pesar o abandono da primeira namorada – a Fátima - , aquela que lhe havia conquistado o coração desde os tempos da adolescência... Mas o mundo tantas voltas dá...


De realçar o velho pároco, há tantos anos a exercer o seu múnus na freguesia e muito querido pela generalidade dos paroquianos…

Agora era a Felicidade aquela que ocupava o coração e foi por ela que, aproveitando a oportunidade única da estadia no porto da cidade, onde havia estabelecido base, o Manuel fez o propósito de partir para junto dos tios.

A guerra, “aquele monstro...” estava a chegar ao fim. A cidade vivia quase só dos negócios escuros do porto... E Manuel, habilmente preparada a fuga, partiu... Não nas antigas baleeiras, como tantos o haviam feito dezenas de anos decorridos, mas num dos “Liberty” americanos que à cidade aportavam com certa regularidade.

Já instalado, junto dos tios, nas Terras do Tio Sam, escreveu à Felicidade. Justificou a “fuga” e prometeu que havia de voltar.

A “estória” do Manuel é, afinal, a de tantos outros que um dia, pela calada da noite, abalaram ... Uns por lá ficaram para sempre... Outros voltaram a cumprir a promessa com determinação.

Afinal um tema de gritante acuidade que só agora aparece tratado com mestria, em vernácula linguagem romanesca.

*

Um bem haja, ex corde, ao Professor Ruben Rodrigues pela gentileza da oferta de “NASCIDO DO MAGMA” e, mais do que isso, a deferência gentil de se deslocar a este “cantinho” e aqui autografar o livro, deixando nele palavras amigas mas imerecidas.

Reconhecidamente!


Vila das Lajes,

Janº de 2009

Ermelindo Ávila

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Manhãs de Sábado - Carnaval

Carnaval ou Entrudo, é o período que antecede a Quaresma.

Por cá é habitual iniciar-se o Carnaval quatro semanas antes e em cada semana fazer-se uma comemoração amiga. Quinta-feira de amigos, de amigas, de compadres e comadres.

Recolhido como ando a este meu “retiro”, nem sei se, actualmente, esses dias são assinalados.

Há meio século passado, os jovens e aqueles menos jovens mas que não sentiam a velhice chegar, trajavam-se e mascaravam-se para visitar amigos e conhecidos e, afinal, todas as casas que se preparavam para “receber mascarados”. E isso não só às quintas-feiras, mas igualmente nos sábados e domingos das quatro semanas. E de tudo aparecia: aqueles que iam imitar algum (a) parceiro (a) que chegasse de pouco, e eram raros, ou ao qual houvesse sucedido qualquer imprevisto; ou pequenos ranchos de jovens exibindo as últimas canções nacionais. Tudo servia para passar um serão normalmente agradável.

Nos intervalos, e se a sala tinha espaço, organizava-se uma “folga,” havendo sempre quem tocasse guitarra ou viola da terra. E logo apareciam, aos primeiros dedilhares dos instrumentos, quem de fora entrasse a “deitar a sua cantiga”. Era o começo do baile que, muitas vezes, se prolongava noite dentro.

Havia mesmo quem pelas ruas escuras (não havia ainda iluminação pública, pois os candeeiros de petróleo haviam sido destruídos, anos atrás, por um indivíduo louco) deambulasse na espreita de surgir um bailarico na habituais casas que se dispunham a receber “mascarados”.

Depois, e já nos últimos tempos, foram os bailes da Filarmónica e do Grémio que vieram a acabar ou a substituir as reuniões familiares do Carnaval. Mas tudo isso teve o seu fim. Deixaram de existir esses agradáveis e singelos serões para serem, praticamente, substituídos pela TV. Afinal um modernismo que só contribuiu para, em certa medida, provocar o desagregamento das famílias e amigos. E julgo que jamais retornarão esses bons tempos...

Hoje há outras maneiras da juventude se divertir ou de ocupar a noite. Refiro as ”boîtes”que nem sempre resultam em positivo...

Não sou contra os modernos meios de divertimento. Na minha juventude também apreciava os bailes ou serões dançantes, como então eram por alguns chamados. Mas, com a minha experiência de Vida ainda sou capaz de distinguir o bem do mal.

Muitos dos modernismos actuais provocam a degradação moral e até social das pessoas, principalmente, dos jovens imaturos e impreparados para enfrentar o futuro. E, o que mais grave é, nem todos estão dispostos a aceitar a experiência e os conselhos dos mais avançados na idade.

Aí vem o Carnaval. Pois que todos o gozem a seu jeito e o passem com ordem, em paz e respeito.

Vila das Lajes,

Fevereiro de 2009

Ermelindo Ávila

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

CAPELAS E COROS

Deve-se à Igreja Católica a existência da música polifónica ou vocal. Enquanto existiram os conventos, eram os frades que se encarregavam de ir pelas igrejas e capelas solenizar as liturgias com o então chamado “Cantochão”. No ano de 1677, foram inaugurados os melhoramentos introduzidos na primitiva ermida de São Pedro, nesta vila, incluindo a reformulação do Santo. A confraria do Apóstolo São Pedro despendeu da pregação e música aos frades (franciscanos, pois eram os únicos que existiam), a quantia de mil reis.
Com a extinção dos conventos, os próprios párocos tomaram sobre si o encargo de organizar e ensaiar capelas próprias e elas foram surgindo em todas as paróquias. Com as capelas foram aparecendo os órgãos, que acompanhavam os coros ou capelas. O órgão da Matriz das Lajes, - ainda hoje em normal funcionamento, depois do restauro do organeiro Dinarte Machado, aqui há uma dúzia de anos, - foi executado pelo organeiro António Xavier Machado Cerveira, no ano de 1804, e tem o número 66. De concluir que foi o 66º instrumento construído pelo referido Cerveira.
Outras igrejas possuíam órgãos, como a Piedade, a Calheta de Nesquim, São João, e Silveira. O da Piedade foi construído, em 1874, por Tomé Gregório, das Velas, que já havia construído, em 1874 o da Matriz daquela Vila; o da Calheta pelo mesmo organeiro, é datado de 1859. O da Piedade, porém, foi dos três, o melhor, segundo o historiador a que me reporto.
O órgão de São João foi construído em 1884 pelo organeiro António Nicolau Ferreira, de São Miguel. Tem 478 tubos.
Na Matriz das Lajes celebrizou-se como organista a professora de Instrução Primária Dona Maria Adelaide Silva, natural da Ilha Terceira e que aqui se fixou e veio a falecer. Senhora de porte distinto e grande cultura, foi a professora daquela outra distinta Senhora, que lhe havia de suceder, como organista da Matriz por largos anos, Dona Adelaide de Azevedo e Castro. Por sua vez esta Senhora transmitiu seus conhecimentos musicais a seu primo, Francisco Xavier de Azevedo e Castro, organista da Matriz durante dezenas de anos.
Antes fora organista D. Maria Xavier, quando seu pai, o Maestro Manuel Xavier Bettencourt, foi regente da capela da Matriz E lembro aqui, ainda, os regentes Gilberto Paulino de Castro, seu pai Manuel Joaquim de Azevedo e Castro e Gil Xavier Bettencourt. Bons músicos da capela foram Manuel Avelino de Castro e Manuel de Brum Quaresma.
No Seminário de Angra os futuros sacerdotes aprendiam o cantochão e a música polifónica que, depois, transmitiam nas respectivas paróquias a jovens com “voz e ouvido”...
Mais tarde, com uma reforma litúrgica, o cantochão foi substituído pelo canto gregoriano.
Nesta vila tornou-se célebre o Pe. João Pereira da Terra, do qual escreve o Pe. José Carlos:Nesta localidade (Silveira das Lajes do Pico) veio a entusiasmar pela Musica um bom número de rapazes e fundou uma esplêndida capela que regeu com acentuada mestria. Dos seus discípulos de então sobressaiu, de forma especial, o grande maestro Pe. José Silveira de Ávila.” (1)
Vários dos seus alunos foram distintos músicos de capela.
E não falo agora do notável Mestre e Maestro Pe. José d’Ávila, o introdutor dos coros ou orfeões nestas ilhas e até em Coimbra onde não pode ser esquecido o seu antigo Maestro, Raposo Marques, que foi aluno do Pe. Ávila.
Realmente, não pode falar-se em grupos corais nos Açores sem recordar aquele que foi seu iniciador – recorde-se a visita do Orfeão de Angra a Ponta Delgada em 1928 – e que havia de transmitir esse gosto e sensibilidade musical a outros que se tornaram grandes Maestros.
Na ilha do Pico, como em todas as Ilhas Açorianas, quase todas as paróquias tinham as respectivas capelas. Todavia, nas festas principais, era tradição convidarem elementos de outras paróquias para as “reforçarem”, diziam. E é assim que, em nosso tempo de juventude, festa principal que houvesse, tinha a presença de músicos valorosos, como o Dr. Garcia da Rosa, distinto organista pela Escola de Milão, e professor do Seminário que, quando em férias na freguesia de S. João, donde era natural, se dedicava à capela paroquial e à Filarmónica local, não deixando de prestar a sua valiosa colaboração, como organista, às solenidades das paróquias picoenses. No canto são de salientar o Pe. Domingos Ferreira da Rosa Ângelo, ouvidor de S. Roque, óptimo soprano e o Pe. Joaquim Vieira da Rosa, excelente baixo, o David Leal Ferreira, o João Barroso e o Tomás Ganhado, músicos com magníficas vozes e bons conhecedores de música, pertencentes à Capela de São João. O Mestre David compunha algumas músicas. Foi pena que tivessem desaparecido...
Das Lajes iam até à Piedade e Calheta, auxiliar nas festas da Padroeira e do Bom Jesus, respectivamente, o Xico (Francisco) Castro, e o Gil Xavier muito embora ali existissem bons músicos, como o Tomé Freitas e o José Laranjeira. Em Santa Cruz lembro-me do João Homem da Silveira, mestre da capela e da filarmónica, o Jacinto Homem, e outros mais. (É difícil enumerar todos aqueles que ao longo dos anos, se dedicaram à música e abrilhantaram com excelentes vozes, as solenidades religiosas). De registar também que os Párocos – e raros eram os que não sabiam música ou não cantavam – tinham a preocupação de preparar os elementos da capela, ensinando-lhes música e solfejo, segundo o método do Pe. Tomás Borba.
Alguns ainda se lembram das “Matinas” do Natal, da Conceição e da Quinta e Sexta-Feira Santas, nas quais se executavam partituras de assinalado valor. Igualmente as partituras das Missas solenes: Frei José Marques, Caghlieri(?), Homo, Perosi, e outros mais. Depois apareceu Tavoni, talvez a última partitura executada pela Capela, e que para aqui foi trazida, aquando da Missa Nova do Pe. Manuel da Rosa, pelo Maestro Emílio Porto, ainda estudante mas já distinto músico.
Hoje desapareceram, praticamente, as chamadas “capelas” e até os coretos onde se exibiam.
Substituem-nas os grupos corais que executam músicas mais ligeiras. De assinalar, por último, mas com o devido e merecido relevo,o aparecimento dos Grupos Corais, que, embora não actuando, geralmente, nas cerimónias litúrgicas, não deixam de contribuir, mercê da competência, entusiasmo e cultura dos respectivos Maestros, para o cultivo artístico da arte de cantar e de solenizar muitos eventos culturais.

(1)Carlos, Pe. JoséPadres da Ilha do Pico – 1970, pág. 55/56

Vila das Lajes, 24-Janeiro-2009

Ermelindo Ávila


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