terça-feira, 24 de junho de 2014

As Lajes e a sua História

Notas do meu cantinho


Todas as Terras têm orgulho da sua História. Recheada de factos notáveis ou apenas registando vivências simples do seu passado, não há quem esqueça ou procure ignorar os acontecimentos mais relevantes das suas localidades de origem. Por mais simples que eles sejam, são geralmente motivo de prazer para os seus naturais. Seja em que parte for do mundo. Sempre assim foi e há-de continuar.
Deixemos de deambular e vamos ao que de concreto é.
Os lajenses, como aliás qualquer outro povo, amam a sua terra e têm prazer em falar da sua História, muito embora ela não se encontra totalmente escrita mesmo que tenha vindo até à geração actual, trazida por uma tradição respeitável.
Segundo a tradição, existem na margem direita da Ribeira da Burra, anteriormente conhecida por Ribeira de Fernão Alvares, as ruínas de uma pequena casa que, segundo a tradição, foi nela que viveu o primeiro povoador, o dito Fernão Alvares, que deu o nome à Ribeira. Portanto, uma construção, embora em ruínas, com mais de cinco séculos. Há duas ou três dezenas de anos a Câmara Municipal adquiriu essas ruínas no intuito de as perseverar, convenientemente, e de assinalá-las como é devido. Mas isso não aconteceu e as ruínas vão-se naturalmente degradando, até que venham a desaparecer, a menos que a tempo, se promovam trabalhos acautelares.
No ano de 1940 celebrou a Nação o Duplo centenário da Independência e Restaurarão de Portugal – 1140-1640.
Para assinalar o festivo acontecimento a Câmara de Lisboa ofereceu à Ilha do Pico uma estátua do Rei D. Dinis que, depois de muita controvérsia, acabou por ser colocada no antigo porto do Cais do Pico. Para dar uma satisfação ao concelho das Lajes, dado que foi o primeiro e durante mais de cem anos o único da ilha, a Comissão dos Centenários concedeu um subsídio ao município lajense para a construção de um cruzeiro à semelhança do que estava a fazer em diversos concelhos do País. O cruzeiro, projecto de Armando Garcia que nesta vila se encontrava fazendo parte da Secção de Fiscalização das obras da Estrada Lajes-Piedade, ao tempo em construção, foi executado, em basalto da ilha, pela companhia de pedreiros do Mestre Manuel Macedo. No pedestal, entre a cornija e a base, foi colocada uma lápide indicativa que, infelizmente, chegou partida mas que mesmo assim foi possível colocar no sítio próprio - dado ou plinto.
Com a remodelação do largo foi-lhe atribuido o nome de Edmundo Machado Ávila, homenagem merecida a quem, na primeira metade do século passado, mais contribuíu, na ilha do Pico, para o seu desenvolvimento, progresso e estabilidade económica, quer no comércio, na indústria e até mesmo na vida social. Uma grande figura de cidadão probo e de picoense dedicado. Mas outras figuras houve, no passado, que já haviam merecido a homenagem dos lajenses. Refiro somente os nomes de Garcia Gonçalves Madruga e do vigário Gonçalo de Lemos, ambos exceptuados do perdão concedido por Filipe de Castela aos açorianos por haverem sido partidários de D. António. “Por dar favor ao Senhor Dom António pretendente da Coroa deste Reino de Portugal, foram-lhe confiscadas suas riquezas e escravos pelas Justiças de El-Rei Dom Filipe."(1)
Ambos tem seus nomes em placas toponímicas nas ruas da vila muito embora, ao que julgo, a do Vigário Gonçalo de Lemos esteja duplicada com a de Edmundo Machado Ávila, havendo que evitar que isso aconteça por representar uma indevida confusão.
A primeira Igreja da ilha foi um pequeno templo dedicado ao Apóstolo São Pedro. Hoje a ermida tem o nome do seu primeiro pároco Frei Pedro Gigante. A ele se deve a introdução da vinha Verdelho, no sítio que hoje se denomina Silveira. Foi esse vinho do Pico que chegou à mesa dos Czares e que agora foi para Roma, como oferta da Diocese ao Papa Francisco.
A indicar o primeiro templo da Ilha foi colocada no frontispício da secular ermida uma placa em mármore que, por motivos desconhecidos, foi há anos, não muitos, dali retirada. Quando volta a placa a indicar aos visitantes que aquela ermida tem tantos anos como o povoamento da ilha e que foi sua primeira igreja e paroquial, possuindo ainda a pia baptismal?
Há acções administrativas que não têm quaisquer explicações e esta é uma delas, que exige seja reparada. É tão simples!

1) Lacerda Machado, F.S. “Os Capitães - Móres das Lages”, 1915 – pág.22.

1-6-2014

E. Ávila

A “NOVA” IGREJA MATRIZ

NOTAS DO MEU CANTINHO



29 de Junho é o dia litúrgico de S. Pedro, o primeiro Papa da igreja Católica. Nesse dia, por uma velha tradição que, no entanto, havia–se perdido e que, em 1940, o ano do Duplo Centenário da Restauração e Independência de Portugal, foi restaurado e sempre tem continuado, setenta e quatro anos são decorridos.
Acerca desta igreja, a primeira da ilha e que, felizmente, se conserva na sua traça antiga, escreve Frei Diogo das Chagas:
Já temos dito o como se começou a povoar, e por onde, agora havemos de estar, em que a principal e primeira povoação foi a Vila das Lajes, que fica na parte Sul ao pé de uma serra que a cerca pela banda do Norte, a modo de meia lua, em uma planície que ao longo do mar faz rio razo (...) e muitos anos não teve esta ilha outra freguesia mais que esta, e de todas as partes aonde moravam os povoadores vinham a ela, que foi uma pequena igreja do apostolo San Pedro (que hoje é ermida) sua paróquia que fica a um cabo da vila, a Nordeste da barra, e porto dela, pegado a um braço do mar , que ai entra, e faz rio morto...
Verifica-se que o único porto da vila era a Barra, na enseada do Castelete, por onde entrou o primeiro povoador, Fernão Alvares Evangelho.
A ermida ainda hoje se mantém com a mesma traça, embora por volta de 16????. houvesse recebido algumas beneficiações.
Mas continua o autor do “Espelho Cristalino”: (...) a qual (ermida) por ser pequena trataram de fazer outra em o meio da Vila, como de facto fizeram, no lugar que agora está 1646 ?), do Orago da Santíssima Trindade, para cujo efeito lançaram finta em todos os moradores da Ilha, e nas fazendas dos Ausentes, conforme cada um tinha de Cabedal.
Os moradores somaram 45 e a finta ou colecta rendeu 28 011 reis. O maior contribuinte foi Fernando Alvares que possuía 450 mil reis de fazenda e foi colectado em 6.216 reis de taxa. Outros dois de maior fazenda foram Pedro Alvarez, Diogo Alvarez e Jorge Alvarez, residentes na Almagreira e, possivelmente, filhos do povoador. Afinal, na Almagreira residiam cinco contribuintes. O contribuinte de menor taxa foi o criado do Vigário, que contribuiu com vinte reis.
Entre os quarenta e cinco colectados encontra-se um sapateiro, um carpinteiro, um alfaiate, um pedreiro, um tecelão e um caiador. Faziam parte dos contribuintes, duas mulheres, uma viúva e uma casada.
Neste mesmo ano de 1506 fizeram uma postura em Câmara, em que assentaram que era bem, que trouxessem um ferreiro para a terra, por não haver ainda na ilha nenhum oficial deste oficio...” Com um carpinteiro, pedreiro e ferreiro, ficavam aptos a iniciar a construção da nova igreja. E assim aconteceu.
No dizer do Governador Santa Rita, era uma igreja com 19 metros de cumprimento até à capela - mor, e 10,3 de largura. A capela – mor tinha 13 metros de comprimento e 5,3 de largura.
A igreja e a freguesia tinha como titular a Santíssima Trindade, denominação que ainda conserva.
No citado Relatório diz Santa Rita: “Acha-se por tal forma arruinada que se torna indispensável a construção de um novo templo. Por esse motivo entendi conveniente nomear uma comissão especial que tratasse de indicar o local onde deve ser edificada a nova igreja, bem como os meios possíveis de obter para essa obra.”
Por alvará de 29 de Agosto de 1867 do Governador Santa Rita foi nomeada uma comissão para tratar da reedificação da igreja matriz.
O Bispo diocesano D. João Maria, que aqui esteve em 1875, no relatório que exarou no livro das Visitas Pastorais, com data de 11 de Fevereiro daquele ano, escreve; “...ficamos magoados por ver uma Vila tão antiga, nobre e piedosa que tem uma Igreja Matriz insuficiente para conter o numeroso povo da freguesia e tão velha que não é susceptível de aumento...”
A Comissão nomeada pelo Governador tentou encontrar local para a edificação da nova Matriz. Pensou mesmo nos terrenos que existiam em frente da rua nova, onde existia a antiga e demolida ermida dos Remédios, mas optou por construi-la no local da velha matriz, muito embora com a fachada principal voltada a norte, quando a anterior igreja era voltada a leste.
O projecto é da autoria do Padre Ouvidor Francisco Xavier de Azevedo e Castro e a execução da obra foi dirigida pelo Vigário Manuel José Lopes.
A primeira pedra foi colocada e benzida em 7 de Julho de 1895 e a inauguração só veio a acontecer setenta anos depois!...
A obra foi suspensa, com a implantação da República, e recomeçou em 1954. O projecto foi actualizado pelo Engenheiro Manuel Costa, e uma comissão dos bens cultuais, tendo à frente o P. António Cardoso, a concluiu e inaugurou em 1967.

Vila das Lajes,
Junho de 2014

Ermelindo Ávila

segunda-feira, 2 de junho de 2014

UM ANIVERSÁRIO A NÃO ESQUECER

NOTAS DO MEU CANTINHO


Uma vez mais estou a assinalar, no meu modesto dizer, o aniversário de “O DEVER”. Faço-o com um misto de simpatia e saudade, recordando a memória do seu fundador e director, durante dezenas de anos, o Pe. João Vieira XAVIER MADRUGA.
Ele partiu mas teve a inspiração de deixar o jornal em boas mãos. Entregou-o, por quantia simbólica, à sua Paróquia, para que não mais desaparecesse. E ele aí está a atingir quase o século de existência. Em idade cronológica sou dois anos mais velho somente...
O DEVER” apareceu a primeira vez, em S. Jorge, onde paroquiava o seu Fundador, em 1 de Junho de 1917. Dois anos mais e atingirá os cem anos. Publicou-se, durante algum tempo, na Minerva Calhetense, da vila da Calheta e teve como Editor e Administrador o P. José Joaquim de Matos, pároco daquela vila. Com o seu falecimento sucedeu-lhe o poeta e jornalista Samuel da Silveira Amorim, dali natural.
Ainda nos primeiros anos, o jornal passou a imprimir-se em tipografia própria, havendo adquirido o prelo que, parece, pertencera ao jornal “O Tempo”, de Angra.
Entretanto, o P. Xavier Madruga é transferido da Vila do Topo para a Candelária do Pico e pediu para que “O Dever” passasse a ser editado na terra da sua naturalidade, onde fixara residência devido ao seu precário estado de saúde. E assim aconteceu. Estávamos no ano de 1938. O P. Madruga encontrava-se na Europa, fazendo parte da peregrinação portuguesa ao Congresso Eucarístico de Budapeste. Aguardou-se a sua chegada para que se publicasse o primeiro número nesta vila. No cabeçalho passou a existir, como Editor e Administrador o meu modesto nome, por escolha deferente e amiga, do Pe. Xavier Madruga.
Mas, desde alguns anos antes, vinha o jornal publicando, por deferência do Director, os meus modestos e incipientes escritos. O primeiro deles saiu no jornal de 16 de Abril de 1932. Oitenta e dois anos são decorridos! E foi publicado por deferência do P. Xavier Madruga, que não só o corrigiu como estimulou o autor a continuar. Bem ou mal assim tem acontecido. São milhares de escritos que o jornal arquiva. E disso não me arrependi nunca. Foi como que um “vício” contraído e do qual nunca mais me curei. Ainda hoje, decorridos que são tantas dezenas de anos. Mas está a chegar ao fim... O Dever continuará, deixo aqui esse modesto voto, para glória da Igreja que serve, e em benefício da Terra que sempre tem sabido, com mais ou menos brilho da minha parte, defender e enaltecer.
Em”O Dever” estão arquivadas as crónicas que o seu Fundador escreveu, das viagens que fez a Roma, em 1925, aquando da canonização de Santa Teresinha, e à Hungria, aquando do Congresso Eucarístico ali realizado em 1938. Estão reunidas em volumes: “Dos Açores a Roma” e “...até ao Danúbio”, ambos já esgotados. Falta publicar as “Cartas da América”, escritas daquele País, quando ali esteve de visita a familiares, em 1945-47. Um trabalho excelente que dá conta, não somente do sistema de vida social, económico e político dos Estados Unidos em geral como, e principalmente, dos emigrantes açorianos radicados naquele País que a esse sistema se adaptaram com alguma facilidade e onde um bom número desempenha posição de relevo, no comércio, na indústria, nos serviços públicos e até na Política.
Vivia, então, a nação americana no rescaldo da última guerra que não deixou de a influenciar profundamente.
Quando em São Jorge, “O Dever” mantinha uma crónica quinzenal desta vila, onde eram assinalados os acontecimentos mais relevantes e, igualmente, as ocorrências políticas. O mesmo sistema foi aplicado – e continua a sê-lo! - aos acontecimentos e aos problemas económicos e sociais que vão ocorrendo nesta terra.
Recordo a construção da estrada Lajes-Piedade, e o estratagema do empreiteiro para não a calcetar como estava previsto no projecto. O jornal denunciou a tempo a intenção e a estrada foi calcetada. E não só este caso como tantos outros que se encontram tratados a tempo e com veemência nas páginas do “Jornal do Pe. Madruga”, como era conhecido. Mas isso não evitou uma denuncia judicial que, no tempo, lhe custou, com a defesa, mais de uma dezena de contos.
A pesar das facilidades de comunicação hoje existentes, os leitores não dispensam o jornal, principalmente os emigrantes, que nele têm um meio de comunicação com a terra de origem, muito apreciado.
Parabéns e votos de uma longa vida a bem da Terra e das suas Gentes.


E.Ávila