sábado, 31 de maio de 2008

OBRAS EM DESTAQUE

A propósito da utilização do antigo edifício do matadouro, tive ocasião de trazer aqui algumas das obras executadas pelo Município, naquela zona da vila das Lajes. Nesse texto fiz alguns reparos sem destinatário aparente, muito embora as entidades responsáveis hajam, naturalmente, “enfiado a carapuça”, como soe dizer-se…
Deixei de referir a velha “Casa da Maricas do Tomé”, não por esquecimento, porque esse lapso não seria possível perante um mamarracho que, todos os dias, está na nossa frente. É que não compreendi ainda qual a entidade responsável por tão dramática situação. O prédio foi adquirido, há anos passados, pelo Município, para, ao que constou, ali serem instalados serviços públicos, parte deles da responsabilidade da Região. Hoje desconhece-se qual o destino que lhe vai ser dado, pois parece que a Região, por aquilo que se vai vendo por aí, não está interessada em ocupar aquele e nele construir qualquer imóvel.
Demais, há edifícios que, embora pertencentes à Região ou ao Estado(?) estão igualmente a caminhar para o abandono. Concretamente, refiro a antiga casa da Alfândega, adquirida na década de trinta para instalação do Posto Aduaneiro. Extinto este, com a abolição das barreiras alfandegárias, para ali foi a Secção da Guarda-Fiscal, posteriormente extinta, concentrando-se os respectivos guardas em São Roque do Pico .
Quando o edifício foi adquirido, o Estado restaurou-o e mobilou-o. Não faltaram os utensílios de cozinha, as louças e outros equipamentos da sala de jantar, as roupas dos quartos, etc. Qualquer funcionário que para aqui fosse transferido encontrava a residência completamente recheada do necessário para a sua vida doméstica. Onde tudo isso foi parar?
Naquele “rico” imóvel, agora desocupado, porque não instalar os Serviços de Finanças, que ainda ocupam instalações acanhadas do antigo Convento Franciscano? Centralizavam-se esses serviços no centro da vila, com grande comodidade para os contribuintes, tal como aconteceu recentemente com os Serviços dos Registos e Notariado, e dava-se uma ocupação condigna a um edifício de excelente traça, construído no século dezanove por família morgadia.
E a casa da Maricas do Tomé? Um óptimo imóvel do princípio do século dezanove, mandado construir por João Pereira de Lacerda, pai do Dr. João Soares de Lacerda. Foi, depois, adquirido por José Joaquim Machado, pai da referida Maricas do Tomé, assim conhecida por haver casado com Tomé Vieira Alves. Neste prédio, na ala do Norte funcionou durante muitos anos a escola primária do sexo masculino e, depois, do sexo feminino. No rés-do-chão esteve a oficina de funileiro de Arnaldo Silva.
Situada, como fica, no centro histórico da Vila, bem merece um melhor tratamento. Causa pena o abandono e o aspecto que apresenta. Pelo que nos é dado observar, parece ameaçar ruína. E quando esta se der, vítimas haverá a lamentar! Que me engane no presságio…
E aqui deixo uma sugestão: Porque não construir no local, embora aproveitando a traça primitiva, edifício condigno para instalação dos Paços do Concelho, já que o edifício do antigo Convento Franciscano é propriedade do Estado, ao que se sabe? Uma maneira excelente de trazer para a Vila os Serviços Municipais, com grandes vantagens para o respectivo funcionamento. (A Câmara voltava, assim, ao “Meio da Vila”, onde foi construída, pelos povoadores, a primeira Casa da Câmara.)
Nas “Grandes Opções do Plano do Município para 2008”, constato que estão previstas diversos empreendimentos não apenas para a sede do concelho mas sobretudo para as outras freguesias. Congratulo-me. Nas vila das Lajes está prevista “a construção de um Mercado Municipal (centro de comércio de produtos locais e estrutura de apoio à realização de feiras ou mercados de produtos locais em diferentes pontos do Concelho); projecto com execução em 2008 e construção a iniciar-se em 2009”. Onde ficará situado? É a pergunta que deixo. No Plano é referido o “Teatro na Vila”. Já está definido o local? E porque não sujeitar o projecto ao debate público?
E as indústrias hoteleiras, estruturas básicas do desenvolvimento turístico?
A Vila é a sala de visitas do concelho e, como tal, merece um tratamento adequado. Não se esqueça…
Vila das Lajes,
Maio de 2008
Ermelindo Ávila

quinta-feira, 15 de maio de 2008

QUAL O DESTINO DO ANTIGO MATADOURO?

Encontra –se a funcionar, com bons resultados, embora haja quem se atreva a achar-lhe defeitos de concepção e funcionamento, o novo Matadouro Regional da Ilha do Pico. Daí ter sido desactivado o Matadouro, instalado na antiga fábrica de conservas, para o efeito devidamente adaptada.
Creio que até aqui não há quaisquer objecções a opor ao novo estabelecimento construído numa zona morta e que merecia ser aproveitada, como o foi, não somente com o matadouro como ainda com a Fabrica de Lacticínios , actualmente pertencente à sociedade LAZA- Produtos Lacteos, Lda. também instalada no Mistério da Silveira. Foi na realidade uma forma inteligente de aproveitar aquela zona, completamente abandonada desde os vulcões de 1718 e 1720.
Nos terrenos confinantes com o Mistério, pelo Sul, diz-se há muito que a respectiva proprietária pretende construir um complexo turístico, tendo o respectivo projecto sido já apresentado à entidade licenciadora. Não se compreende, pois, a demora em aprovar o projecto ou, se aprovado, iniciar a construção. É tempo de o fazer pois, na época que decorre, um marcar-passo pode ser fatal, dado que há sempre quem esteja à espreita para ocupar o lugar…
E deixo de referir, por hoje, o famigerado campo de golfe…
Mas, voltando ao antigo edifício do matadouro: que destino lhe vai ser dado? Aquele espaço, segundo estou certo, pertence ao património regional. Assim sendo, importa que lhe seja encontrada uma aplicação condizente com o local.
A zona de Santa Catarina está a ser convenientemente ocupada. Primeiro, foi o quartel dos Bombeiros. A seguir, veio o restauro do antigo castelo, transformado acertadamente num espaço turístico. Depois, foi a recuperação da velha fábrica da baleia, SIBIL, que, sem alteração das respectivas instalações industriais, foi transformada em Centro de Artes e de Ciências do Mar. Já está a ser utilizado o novo campo de jogos, também instalado nos terrenos de Santa Catarina e que, dizem os que disso entendem, é um dos melhores da Região para a sua categoria. Na mesma zona está há anos em construção o edifício para a instalação de um super-mercado. Resta olhar pelas ruínas da casa, já adquirida pelo Município que pertenceu a Fernão Alvares Evangelho, primeiro povoador da ilha, e que bem perto fica…
E é ainda nesta zona que se situa o desocupado edifício onde esteve instalado o matadouro. Que destino lhe vai ser dado, volto a repetir?
Nas outras sedes de concelho da Ilha está o Governo a construir, ao que consta, edifícios de natureza turística. Na Madalena foi deitado a baixo o edifício do Hotel Pico para no local ser construído um novo hotel de quatro ou cinco estrelas. Mas naquela vila já existe um outro hotel que foi construído pela Região…
Nesta Vila limitaram-se os gestores regionais a adquirir uma parcela de terreno para um hotel, ou casa de hóspedes, mas por aí se ficou e ao terreno não foi dado nenhuma ocupação. Parece que é zona protegida pelo Ambiente…
Não será viável adaptar o edifício do matadouro a hotel, seja qual for o número de estrelas? A Vila não tem um estabelecimento hoteleiro classificado como tal. Na Silveira existe a “Aldeia da Fonte”, mas fica extra-muros. Disso resulta serem os visitantes encaminhados ou mantidos noutros locais, pois só desejam instalar-se em hotéis e não em simples casas de hóspedes, apesar de existirem excelentes residenciais .
As Lajes dispõem actualmente do melhor porto de recreio da Ilha. Mesmo hoje vi um barco de recreio, originário de Lisboa, tripulado por um casal que teve de sair porque a zona do porto de recreio, cujas obras parece que estão concluídas, ainda não foram entregues pela empresa empreiteira à respectiva entidade tutelar. E lá saiu o barquinho, mar fora, até ao horizonte…
Só a exploração da indústria turística pode equilibrar a nossa decrépita economia. E, embora não esteja o Pico incluído nas ilhas de coesão, não pode nem deve ser esquecido pelas instâncias governamentais.

Lajes do Pico
3 de Maio de 2008
Ermelindo Ávila

domingo, 4 de maio de 2008

O CENTENÁRIO DO NASCIMENTO DE DOM JAIME GARCIA GOULART

Foi a 8 de Janeiro de 1908 que, na freguesia da Candelária desta Ilha do Pico, nasceu o emérito Bispo de Timor, Dom Jaime Garcia Goulart.
Devo à memória de tão distinto Filho da Ilha do Pico uma referência homenageante, não só pela amizade que sempre me dispensou mas, sobretudo, pela obra de extraordinário vulto que nos deixou, principalmente na Diocese de Timor, de que foi o primeiro Bispo, e igualmente pelos notáveis dotes de Bispo e de Homem de Deus.
Dom Jaime foi para Macau, afim de ingressar no respectivo Seminário de São José, em 1921.Nesse ano havia sido sagrado Bispo de Macau, na Matriz da Horta, seu tio, que viria a ser o Cardeal Dom José da Costa Nunes-
Ainda seminarista, acompanhou Dom José na sua viagem aos Açores, em 1930. Trazia o terceiro ano de Teologia e, no Seminário de Angra, completou o Curso. Foi aí que nos conhecemos. O Seminário vivia um período de transformação pouco adequado à formação dos alunos. Era um ambiente pesado, fiscalizado constantemente por um reitor ao qual faltavam talvez qualidades diria pedagógicas e humanas, para dirigir e orientar cerca de cento e cinquenta jovens das mais diversas idades.
O Seminarista Jaime Goulart vinha de um estabelecimento muito diferente, aberto e humano, sem deixar de ser disciplinado. Desconhecendo o ambiente, passou a viver dentro das normas da casa mas, aqui e ali, procurava expandir-se nos contactos com os colegas, no confraternizar amigo com todos, embora respeitando a disciplina e as separações dos cursos em prefeituras. Nos recreios, jogava, saltava a vara e praticava desportos com alegria e jovialidade, passando a ser uma referência que todos admiravam e respeitavam. ( Presentemente, sou talvez o único “sobrevivente” a dar este testemunho.)
Ordenado em 10 de Maio de 1931 na Paroquial da Candelária pelo tio Dom José, seguiu no fim do verão para Macau, viajando de barco, único transporte que então havia. A viagem, pelo Cabo da Boa Esperança, durava algumas semanas, tempo que, para uns era de férias e, para outros, de algum martírio. Ao partir recebeu do seu Bispo instruções para, semanalmente, enviar para “O Dever”, - que então se publicava em São Jorge sempre sob a direcção Pe. Xavier Madruga, antigo colega de curso e intimo amigo de Dom José - crónicas da viagem que ia fazer. E assim cumpriu. Elas aí estão nas páginas já amarelecidas do jornal, a revelarem já o que viria a ser “a acção pastoral de J.G.G. como padre e Bispo missionário – acção pautada pelo comando do cérebro, nos compromissos livremente assumidos e fielmente cumpridos”. Isto escreveu o Padre Tomás Bettencourt Cardoso na “Nota prévia” de “Textos de D. Jaime Garcia Goulart” por ele coordenados e publicados a quando da sua estada em Macau, em 1999.
E é ainda do P. Tomás este excelente comentário: “A simplicidade e subtileza destas linhas – o começo da VI crónica de Em viagem para a China – são o suficiente para se ficar ciente de que tais crónicas são de um valor inestimável, porque, antes de mais, fruto do esforço ingente do A. para as dar à estampa”.
Ao chegar a Macau o então Pe. Jaime Goulart assumiu as funções de professor de Latim no Seminário e no Liceu, até que, em 1933 foi destacado para Timor onde se conservou até 1937. Voltou a Macau para ser secretário do Prelado, e professor no Liceu e no Colégio de Santa Rosa de Lima. Decorridos dois anos, foi novamente destacado para Timor, primeiro como Vigário Geral e, a seguir, como Administrador Apostólico da nova Diocese, criada em 1940 pelo Papa Pio XII. E aí ficou, para sofrer o doloroso calvário que foi a invasão japonesa, que o obrigou a refugiar-se na Austrália. Penosa e arriscada foi a fuga de Timor pois, além de ser obrigado a descer por rochas altas até ao local de embarque, teve ainda de amparar uma religiosa já de avançada idade e doente. Uma odisseia que D. Jaime contava com algum humor.
Na Austrália recebe a notícia da eleição para Bispo da mesma Diocese. É sagrado na Capela do Colégio Eclesiástico de S. Patrício em Manly, Sydney, na Austrália, no dia 30 de Outubro de 1945, pelo Delegado Apostólico, D. João Panico, com a assistência do Arcebispo de Sidney, D. Normano Gilroy e o Bispo de Armidale, D. João Colemau. Na cerimónia estiveram presentes os Cônsules de Portugal e do Brasil, além de outras entidades civis e religiosas. (A crónica do faustoso acontecimento está em “O Dever” de 12 de Janeiro de 1946 e é da autoria do Pe. Ezequiel Pascoal. )
Dom Jaime governou a Diocese de Timor desde 1940 a 1967, ano em que resignou devido a problemas de saúde. Passou então a residir nos Açores, primeiro na Candelária e Horta e, depois, em Ponta Delgada onde se fixou definitivamente e veio a falecer em 15 de Abril de 1997. Está sepultado no Cemitério de São Joaquim, daquela cidade.
Em 1964 recebeu do Governo Português a Ordem do Infante, no grau de Oficial, modesto galardão para quem levou uma vida a trabalhar, em Terras do Oriente, procurando sempre engrandecer o Padroado, e, sobretudo a ainda terra portuguesa de Timor. Bem mais merecia.
A freguesia natal, a Candelária do Pico, erigiu-lhe uma estátua junto da Paroquial, onde Dom Jaime foi baptizado, fez a profissão de fé, foi ordenado e celebrou a primeira Missa.
Falta a derradeira homenagem: a trasladação dos seus restos mortais para a Candelária, “cuja humilde pacatez não trocava por nada deste mundo”. Este ano centenário seria a ocasião propícia para se promover esse acto de elementar justiça a Alguém que tanto prestigiou e engrandeceu, com a sua nobilitante acção missionária Portugal e, sobretudo, esta Ilha que sempre o respeitou e admirou e orgulho sentia por esse “barão assinalado”, que “em perigos esforçados”, “edificou Novo Reino, que tanto sublimou”, parafraseando Camões..

Vila das Lajes,
15 de Abril de 2008
Ermelindo Ávila.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

UM GESTO NOBRE

Emigrou bastante novo para a Califórnia. Por lá andou a vigiar ovelhas e, depois, em ranchos a tratar de vacas.
Não frequentava festas nem mesmo ia ao “Taum” ao domingo, seu dia de folga. Ficava na pequena casa, que o “bosse” lhe havia distribuído, a descansar, para retomar o trabalho na madrugada da segunda-feira.
A sua vida de trabalho era igual à de tantos outros imigrados, só com uma diferença: enquanto eles aproveitavam o domingo para ir divertir-se na cidade ele ficava a retemperar forças para o trabalho da semana seguinte. E assim continuou pelos anos fora.
O dinheiro da féria quase nem lhe tocava. Apenas uns “pesos” para algum fato mais estragado, e só quando o patrão lhe pagava alguma hora extraordinária, porque o cheque da semana ia inteirinho para o Banco.
Fora à América juntar uns dólares para, depois, regressar à sua terra. Tinha deixado moça apalavrada e não queria faltar à sua palavra.
De tempos a tempos, pois os correios eram demorados, recebia carta da família, que, aqui e ali lhe davam notícias da Maria. E por aí ficava.
Foram decorrendo os anos. A saúde não lhe faltou, felizmente, o que lhe permitiu trabalhar sempre. Mas um dia, deu contas à vida. Pediu ao “bosse” autorização para ir ao “taum”, para ver a quantas andava a sua conta no Banco.
Recebido cortezmente pelo funcionário do balcão, disse o que desejava. Foi levado ao gerente que o recebeu com todas as amabilidades, pois era um dos melhores depositantes do Banco. Nem sabia quanto tinha mas, pelas suas contas, devia andar por alguns centos. Afinal, não eram centos mas milhares que lá estavam na sua conta bancária.
Sabia já qual o preço do dólar na sua ilha. Fez contas e concluiu que tinha já um bom pé-de-meia que lhe permitia comprar umas terrinhas e viver sem muito trabalho.
A partir daí começou a preparar-se para regressar. Comprou na “estoa” algumas roupas para si e outras para os pais e irmãos, uns “alvarozes” e umas navalhas para oferecer aos amigos. Pediu à patroa que o auxiliasse na compra de alguns vestidos para a sua Maria. Encheu dois ou três baús. Não se esqueceu de comprar sementes de arvoredo, pois sempre teve intenção de fazer uma mata com madeiras exóticas (americanas). Tudo emalado, com a devida segurança, fez as despedidas e tomou o carro de fogo (comboio) para o Leste, até “Bastão” (Boston). Ali embarcou num navio da Fabre Line, única companhia que navegava para as ilhas. A viagem durou oito dias, até chegar ao Faial. Ninguém o esperava.
Despachada a bagagem na Alfândega da Horta, sem grandes dificuldades (não trazia contrabando), foi até ao cais para fazer viagem no barco do Pico. Na Madalena tomou o carro do Caetano e seguiu para a sua terra. Escusado será dizer que, quando alguém o viu e o reconheceu, foi um alvoroço na freguesia. Improvisou-se em casa dos pais uma grande festa, pois era preciso festejar a chegada do filho que há anos partira dali e poucas notícias dava.
Deu-se depois o encontro com a Maria. Foi acertado o dia do casamento e a boda foi motivo para reunir toda a família.
Entretanto, o nosso Frank não descansou. Principiou logo a indagar onde comprar algumas terras para pão e outras para pastagem, além de terrenos abandonados, nos matos, onde faria a sua “mata”.
Fora da freguesia comprou dos melhores terrenos para semeadura. Para as pastagens adquiriu gado do melhor que havia: vacas de bom leite e bois do Faial.
Estava organizada a sua vida. E tudo passou a decorrer normalmente embora com muito trabalho. Ainda lhe restaram alguns dólares que depositou no Banco. Mas, com esses, teve pouca sorte porque, passados poucos anos, o banco faliu. Valeram-lhe os terrenos comprados em boa ocasião e a mata que ia desbastando e vendendo a madeira para construções.
Os prédios de longe foram arrendados, não por dinheiro mas por milho: um alqueire de terreno, tantos alqueires de milho. E assim foi vivendo sem dificuldades. Cresceram os filhos. Alguns estudaram, o que só era possível a pessoas de rendimentos.
Os rendeiros, pessoas honestas e sérias, cumpriam escrupulosamente seus contratos.
Certo ano, porém, a produção foi muito baixa, pois um grande vendaval estragou os milheiros quando eles estavam ainda verdes. O pobre do rendeiro viu-se aflito, sem ter novidade com que pagar a renda. Mesmo assim, não desanimou. Não queria perder os prédios que lhe davam grande jeito e resolveu, embora com sacrifício, comprar o milho necessário para o pagamento da renda.
No dia habitual, deitou os sacos com milho no carro de bois e seguiu o seu destino até à casa do dono dos prédios, a alguns quilómetros de distância. Quando lá chegou o Frank ficou admirado de ele lhe trazer o milho, pois sabia que, naquele ano, os prédios nada tinham produzido. E assim sendo, não deixou que o rendeiro descarregasse o milho. “Não tiveste culpa do temporal. O prejuízo deve ser para nós os dois. Volta com o milho para a tua casa e para o ano pagarás a renda deste ano que vai correr.”
E assim aconteceu. E a amizade entre aqueles dois homens durou até à morte.
O facto é real. Os nomes são fictícios. Os lugares nem os indico.

Vila das Lajes,
16 de Abril de 2008
Ermelindo Ávila