Nesta época que decorre, era sempre agradável assistir às apanhas dos milhos e às desfolhadas. Eram autênticos dias de festa nas casas dos lavradores.
Quando os milhos estavam maduros e o pasto seco, era a ocasião própria para proceder à apanha e recolha das maçarocas nas “atafonas” ou lojas das residências. E esse dia era um dia especial. Grados e miúdos, todos se dedicavam à derrocada das maçarocas, ao preparar os carros de bois com as sebes bem acauteladas para as receberem e ao trazer os carros, normalmente tirados por dois bovinos, por caminhos algo perigosos, até ao local da recolha. Era um dia grande com jantar (hoje seria almoço) melhorado, preparado em casa e levado, na hora certa, até ao serrado onde se colhia o milho.
Mas, antes, haviam os trabalhos preparatórios. Cortavam-se as espigas que eram encostadas às paredes para secar ao sol, pois construíam bom alimento do gado, no Inverno. Esperava-se, depois, que as maçarocas secassem e era então o tempo da recolha, ou apanha dos milhos, antes que viessem as chuvas.
Aí principiava um trabalho doméstico, de grande importância. Era o descascar das maçarocas. Aproveitava-se o serão e a ajuda de amigos e vizinhos. Para essa ocasião preparavam-se os figos passados ao sol, ou secos no forno, e uma ou mais garrafas de genebra ou aguardente, geralmente de produção caseira. E, quando aparecia uma maçaroca de grãos vermelhos, era uma festa rija, principalmente se havia gente nova no ajuntamento.
Embora no meio de esganiços a praxe tinha de cumprir-se... Não era correcto negar o beijo ao feliz contemplado.
Manhã cedo, a dona da casa acendia o forno da cozinha e preparava a massa de milho, algumas vezes de trigo, para o bolo ou pão para o sustento da família e, depois, aproveitava o calor para secar o milho. Por cá não havia o hábito de deixarem as maçarocas com as capas ou folhas, em burras, no quintal, como é tradição em algumas ilhas do Arquipélago.
Antigamente, quando tudo era cozinhado no lar de fogo e as cozinhas (pequenos casebres construídos fora das habitações, para evitar os incêndios) eram providas de fornos, algumas das casas dos lavradores mais abastados, tinham dois fornos: um para as cozeduras domésticas e um outro maior para a secagem dos milhos ou, mais raramente, para as cozeduras do pão e das rosquilhas, nos gastos do Espírito Santo. Com a modernização das cozinhas, e utilização dos fogões e máquinas eléctricas ou a gás e outros electrodomésticos, vão rareando esses fornos de cozer.
Retiradas as maçarocas do forno, era a debulha, o joeirar o grão no crivo e, depois, arrumá-lo em barricas, arquibancos ou, mais modernamente, em depósitos de latão. E estava, normalmente, garantido o sustento da família durante o ano. Por vezes a produção era fraca e isso colocava o dono da casa em apuros...
Um pormenor é de registar: Quando se procedia à descasca das maçarocas, escolhiam-se aquelas que eram mais sadias e eram dependuradas geralmente nos tirantes dos quartos superiores para aí se conservarem, sem perderem o viço. O milho assim conservado era utilizado no ano seguinte nas sementeiras.
Presentemente, quase ninguém semeia milhos. A quase totalidade do que se consome, é importada. Desmantelaram-se as atafonas, os moinhos de vento que tanto alegravam a paisagem, e as moagens quase não existem. É caso para se dizer: Tudo o vento levou! Ficou-nos a saudade dos tempos da juventude distante.
Quão diferente são os hábitos e os costumes da vida de hoje!
Vila das Lajes, 7 de Nov. de 2009
Ermelindo Ávila
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