domingo, 26 de março de 2017

A QUARESMA

A MINHA NOTA


Quando reinava a Monarquia, a Igreja Católica estava um tanto submetida ao domínio do Monarca. Com a Implantação da República, em 1910, tudo se modificou e a separação do poder civil da Igreja, passou a dominar a vida dos povos com um autoritarismo que deixou profundas mazelas nos indivíduos. Foi um verdadeiro tempo de perseguição religiosa que veio a acabar a meados do século passado, mas cuja acção anticlerical não deixou de marcar os indivíduos e a própria sociedade. Houve, porém, sectores da vida religiosa que se mantiveram, muitas vezes pela influência que certos dirigentes católicos exerciam e continuaram a manter essa situação junto da sociedade civil.
As Misericórdias eram e são, presentemente, instituições canónicas – o Prelado é que tem poder para aprovar os respectivos estatutos – que, em parte, estavam sujeitos à jurisdição civil.
Tenha-se em atenção o que aconteceu com os hospitais que acabariam por ser nacionalizados pelo Estado.
As obrigações canónicas das Santas Casas, como eram e ainda hoje são conhecidas as Misericórdias, mantiveram-se, principalmente, na celebração das procissões quaresmais, como é ainda hoje a Procissão de Passos que, ao menos em todas as ilhas da Diocese, se realizam com grande esplendor e concorrência de fieis.
A essa instituição pertencem os conhecidos “Passos”, pequenos altares incrustados nas paredes de muros de habitações, onde há a paragem do cortejo processional, para a prática litúrgica adequada.
A freguesia da Piedade ainda conserva alguns Passos que denominam  os sítios: Passos Novos ou Passos Velhos. Na Vila das Lajes existem, também, alguns Passos, muito embora, por motivo de construções urbanas, outros hajam desaparecido. Todavia, no dia da Procissão, os moradores do sítio têm o cuidado de “armar” altares apropriados onde há a tradicional paragem.
Em Angra conheci, há umas dezenas de anos, passos fechados com portas durante o ano, naturalmente para se evitarem actos de vandalismo.
Ainda bem que a tradição se conserva, sinal do catolicismo, tão tradicional das gentes açorianas, que não deixa de ser praticado, no Tempo Litúrgico da Quaresma com respeito, e certa solenidade. É o que vai acontecer, uma vez mais durante o corrente ano, segundo está anunciado pelas respectivas paróquias.
No tempo quaresmal realizavam-se também os chamados “quartéis”. A paróquia era dividida em diversos sectores com um certo número de paroquianos por dia, a fim de facilitar o cumprimento do preceito pascal. Curioso que algumas paróquias, ao menos aquelas que me foi dado conhecer, organizavam o registo de toda a população paroquial onde faziam a “descarga” daqueles que cumpriam o preceito. Registavam todos os habitantes da paróquia, por idades e sexos e, por esse registo, aqueles que restaram, decorrido mais de um século, sabe-se qual era a população da freguesia respectiva. Assim, no ano de 1888 a freguesia da Matriz da Santíssima Trindade da Vila das Lajes do Pico, no dia 31 de Dezembro de 1887, tinha 1110 indivíduos do sexo masculino, 1614 do sexo feminino, 246 crianças do sexo masculino até aos 7 anos e 200 do sexo feminino. O total da população, aquele ano, do Soldão às Terras, era de 3.270 habitantes, salvo erro. Em parêntesis, registe-se que é curioso notar que todos os que tinham idade para isso, cumpriram o preceito pascal.
Coisas de outros tempos, dirão. Pois que sejam.
Lajes do Pico,
Março de 2017

Ermelindo Ávila

Sem comentários: