NOTAS DO MEU CANTINHO
Vão desaparecendo dos nossos meios ilhéus os costumes
e tradições que herdamos de nossos avós. É fácil de compreender a razão desse
“esquecimento”, digamos.
Os emigrantes retornados, trouxeram
consigo os novos sistemas de vida que colheram
nas terras da Diáspora, quer na maneira de vestir, quer nos hábitos sociais e alimentares.
Por outro lado, os turistas das diversas partes do mundo, que aqui chegam, não seguem
os hábitos e costumes das terras que visitam. Antes, sem o imporem, deixam por aí novos sistemas de
vida e de trajar que os nativos vão imitando, por lhes parecer mais elegante.
Estamos na época das grandes tradições.
Mas, para onde foram elas ?
As semanas que antecediam a Quaresma ou,
melhor dito, a quadra do Entrudo ou Carnaval, era um tempo de festas familiares
muito apreciado e desejado. Ainda hoje se vão juntando, em ágapes festivos, os
amigos e amigas, compadres e comadres. Estamos mesmo a meio do Entrudo, e ainda
há notícia de alguns jantares, aqui e ali, a recordar os velhos tempos.
Felizmente que isso acontece, pois é uma maneira simpática das pessoas se
reunirem e conviverem.
Era nestas semanas que, em dia escolhido
com a devida antecedência, se realizavam as matanças dos porcos, criados
durante um ano, para serem abatidos antes da Quaresma chegar. E que luzida era
a festa! Juntavam-se as famílias e,
por vezes, aproveitava-se para se reconciliarem algumas desavindas; combinava-se
os dias para que não houvesse atropelos, e preparava-se os utensílios e tudo o
necessário para que a festa fosse digna. No quintal havia-se plantado o
cebolinho adquirido aos fornecedores da Candelária, principalmente, para estar
em condições de ser utilizado como cebolas, na matança. Trazia-se do mato o
queiró quê se punha a secar nas paredes do quintal, moía-se o trigo, se o
havia, ou adquiria-se a farinha de trigo para as massas que deviam ser
apresentadas nas refeições: pão de trigo e pão de “duas misturas” -milho e
trigo (pão de milho, propriamente). Não faltava o peixe, nem a boa carne para
as refeições principais do dia da matança. Esta dava-se de madrugada, porque os
homens que nela tomavam parte tinham de estar desembaraçados e almoçados antes
de amanhecer. É que alguns deles eram baleeiros e o sinal de baleia podia ser
dado, logo que raiava a Aurora. Depois era o lavar das tripas na costa, se o
mar permitia, (não havia ainda água canalizada) e, a seguir, o encher e cozer
as morcelas. O rapazio nesse dia estava dispensado da escola e aproveitava a
bexiga do animal para os seus jogos, enquanto ela durava...
À noite, era o jantar aos amigos e
familiares e, depois, a reunião na sala principal, ou em outra de algum
vizinho, para as “chamarritas” e as máscaras. Geralmente, o desmanchar da
carcassa do animal fazia-se no dia seguinte. Seleccionavam-se as carnes: para
os “presentes”, para os torresmos, juntamente com os ossos, donde se extraía a
banha a utilizar durante o ano, para a linguiça e para a salga.
Na vila das Lajes, desapareceu a
criação de suínos e, consequentemente, deixou de haver as “matanças dos porcos”.
Mantém-se, porém, esse velho costume nas zonas rurais e freguesias. No entanto,
a primeira parte - a matança, o chamuscar, o limpar, etc. – praticamente
desapareceu com a instalação do Matadouro Industrial.
Ainda há dias, tive o prazer de tomar
parte num jantar de “matança”, num dos subúrbios da vila. Os familiares
juntaram-se e abateram, na véspera, os seus animais. No dia em que lá estive, preparavam-se
as carnes para as linguiças. Uma “mestra” fazia as caldas para o curtume das
carnes já picadas e preparadas. Em grandes caldeirões, derretiam-se as gorduras
para as banhas a utilizar na cozinha durante o ano. Tudo previsto e bem
cuidado. Dezenas de pessoas, amigos e conhecidos, participaram no jantar que
decorreu entre sorrisos, ditos amigos e conversas agradáveis. Um verdadeiro dia
de festa para aqueles famílias.
E era assim em outros tempos.
Lajes
do Pico,
Quinta-feira
de Amigas de 09/02/2017.
Ermelindo
Ávila
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