A MINHA NOTA
Em
anos passados não era agradável “ir ao Norte”. Tal expressão
significava ser chamado a Tribunal, o que ninguém desejava. Demais,
o Tribunal funcionava, normalmente, sem juiz de carreira. Os juízes
substitutos e bem assim os delegados do Procurador da República,
eram escolhidos pela Política vigente, o que nem sempre dava
garantia de imparcialidade e justiça.
Mais
tarde uma reforma judicial determinava que as funções de Juiz
substituto fossem exercidas pelo conservador do registo predial ou,
quando este funcionário não fosse efectivo, pelo conservador do
registo civil.
O
mesmo acontecia nos Julgados Municipais, nos quais os juízes
“efectivos” eram, por inerência, os conservadores, e os
subdelegados os notários.
O
último dos Juízes substitutos, era o Presidente da Câmara, que,
muitas vezes, se limitava a assegurar o funcionamento da instituição,
mandando que os julgamentos finais “aguardassem a chegada do juiz
proprietário”.
Extintos
os julgados, concentrou-se todo o serviço judicial na comarca, o que
não deixou de causar sérios prejuízos aos utentes, principalmente
quando se tratava de inventários orfanológicos obrigatórios.
Era
por isso que as pessoas do lado Sul da Ilha temiam “ir ao Norte”,
onde estava a sede da comarca, tal como hoje acontece. Demais, o
serviço judicial foi criado em S. Roque, não em razão da densidade
populacional, mas porque o Sul não teve políticos que soubessem
defender os seus direitos cívicos. Nesse aspecto o Norte foi mais
bafejado e assim se mantém.
Também
se ia ao Norte, no mês de Outubro, comprar castanhas, que ali
abundavam. Ia-se e vinha-se, calcorreando veredas e atalhos, com
pisos irregulares que dificultavam o caminhar. Um deles era o
“caminho dos burros”. Descansava-se às “Mesas”, quase no fim
do trajecto.
Mas
hoje ninguém usa a expressão “ir ao Norte”, nem ninguém para
lá vai a pé. O trânsito automóvel é bastante intenso, muito
embora não haja transportes colectivos.
E
há mesmo funcionários que se deslocam com rapidez de uma para a
outra banda, consoante o emprego, percorrendo em meia hora a estrada
que liga as duas sedes de concelho. E foi até para permitir a
deslocação rápida entre o Sul e o Norte que a estrada se
construiu.
Quando
foi extinto o Julgado, na década de quarenta do século passado, os
políticos que pontificaram em Lisboa, conseguiram que a estrada
fosse imediatamente construída, retirando ao Sul o argumento da
distância, uma vez que só existia uma ligação pela estrada
litoral, da qual, a última fase – Lajes – Piedade - Prainha
havia ficado concluída poucos anos antes. (Quase cinco séculos por
ela se esperou! )
O
engenheiro que veio estudar o traçado e elaborar o projecto, chamava
à estrada transversal, a estrada
política. Ele bem
sabia o porquê dessa classificação...
Certo
é que as populações do Sul têm de continuar a caminhar até ao
Norte para dirimir seus direitos... À parte essa circunstância, as
amizades intensificam-se e as relações sociais são exemplares.
E
ainda bem que assim acontece. Como seria agradável que a população
do Pico constituísse um todo harmónico e se respeitassem os
direitos cívicos de cada núcleo populacional. Mas, afigura-se-me
que isso está para tarde.
No
Norte ou no Sul, no Leste ou no Oeste, nestes tempos que correm, em
que a política é a parceira dominante, não falta quem dela se
aproveite para manobrar e conseguir que os seus projectos
ardilosamente preparados se executem...
Há
sempre produtos mal usados que estragam o cozido...
Lajes
do Pico,
15
de Outubro de 2014
Ermelindo
Ávila
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