CRÓNICAS DO MEU CANTINHO
Dou-lhe
este título como podia dar-lhe outro, talvez mais apropriado. Mas
vai o primeiro que saiu do teclado, pois, neste caso, o título pouco
importa.
Até
meados, ou pouco antes, do século passado, as donas de casa
cozinhavam com lenha colhida nos prédios do alto. Era uma
trabalheira para a conseguir. Tinha de ser cortada com antecedência
de alguns meses e, depois, trazida em feixes à cabeça das
mulheres, aos ombros dos homens, nos burros ou cavalos ou em carros
de bois, para as residências e nelas preparada (aturada) para os
lares.
Aqui nas
Lajes as terras do alto, a Leste do burgo, só produziam lenhas,
(faias e incensos) como ainda hoje. A lenha, depois de cortada ficava
a secar e, quando própria para ser utilizada, era preparada em
pequenos feixes, ou molhos, e atada a uma roldana de ferro, e esta a
um fio que ligava o alto ao quintal da habitação. Normalmente era
ao entardecer, no fim do trabalho, que os operários faziam os
pequenos feixes e os enviavam pelo fio para as residências. O
deslizar da roldana no fio produzia uma réstia de fogo durante o
percurso. Para a miudagem, era um regalo ver o deslizar precipitado
dos pequenos molhos. Com a construção da estrada Lajes - Piedade
(1943) os fios que tinham forçosamente de atravessar a estrada,
foram retirados.
O
fogo para as cozeduras era mantido no “lar” e a grelha, ou
trempezinha que nele se colocava, suportava os “caldeirões” e
tachos onde eram cozinhados os alimentos. Depois apareceram as achas
trazidas em carros tirados por um só animal bovino, pelos carreiros
da freguesia de S. João, que abatiam a lenha no interior do Mistério
onde ela (faias e incensos) ia crescendo. Geralmente, nos chamados
dias úteis, o Manuel de Simas e o Inácio traziam à vila os seus
carros tirados, cada um por um animal bovino, com achas, normalmente
meio milheiro, para fregueses certos. Todos os dias vinham às Lajes
com os seus carretos e, na volta, levavam os géneros que lhes haviam
sido encomendados. Um serviço útil e simpático.
As
achas, para serem utilizadas nos fogões, tinham de ser cortadas ao
meio e desse trabalho se encarregava o Jaime (Jaime Teixeira) que
outra coisa não fazia. E que fragoso era !...
As
achas, passaram a ser utilizadas, principalmente, nos fogões vindos
dos Estados Unidos ou importados do continente, até que os ferreiros
locais os foram construindo à semelhança daqueles.
Continuaram,
porém, e ainda hoje são utilizados, os fornos a lenha onde são
cozidos o pão e o bolo e outros manjares e até assada a carne de
vaca.
A
meados do século surgiram os fogões a gás e, a partir daí, foram
desaparecendo os fogões a lenha. As cozinhas passaram a ser providas
de fogões a gás ou eléctricos. As salgadeiras, onde se conservava
o peixe e a carne, foram substituídas pelas “arcas frigoríficas”
e pelos frigoríficos.
Mas,
recuando um pouco, e antes que fossem instaladas as redes eléctricas,
ou mesmo existisse à venda o petróleo, as casas eram iluminadas
com velas de cebo e, depois, de esteriarina e as cozinhas,
normalmente, com candeias de azeite de moleiro, toninha, ou albafar.
Raro era utilizarem óleo de baleia. Mesmo nas casas de abegoaria,
onde nos serões do Outono decorria a desfolhada, a candeia servia
para a ofuscada iluminação. Quando era “espevitada”, havia um
dito popular: “O que cai da candeia de cima
fica na candeia de baixo.”
O cheiro
não era nada agradável e a luz muito ténue, mas os candeeiros a
petróleo ainda não tinham cá chegado.
É por isso
que, ainda na década de vinte, o Administrador do Concelho fez
publicar um Edital determinando que o derretimento das carcaças de
toninha ou boto só poderia fazer-se a partir das nove horas da
noite. Era a hora do recolher. A partir dessa hora não era permitido
andar pelas ruas. A Câmara dava sinal, no sino próprio. E até
houve um tempo, ainda no século dezanove, que o sino avariou e o
presidente da Câmara oficiou ao vigário da Matriz pedindo para ser
utilizado o sino da igreja a fim de anunciar a hora de recolher...
Os tempos
eram outros. Hoje seria muito diferente.
Quando o
petróleo apareceu, a vila passou a ser iluminada com candeeiros a
petróleo, até que um pobre louco, conseguindo fugir do recinto onde
se achava detido, encontrou no caminho um carro de bois estacionado
junto à moradia do proprietário, retirou de lá um fueiro e passeou
pela vila partindo alguns dos candeeiros que já então iluminavam as
ruas até à hora de recolher. A partir de então, e até que
surgisse a electricidade (1932 ?) andou a vila às escuras...
E por hoje,
aqui fico.
Lajes do
Pico,
13 de
Outubro de 2015.
Ermelindo
Ávila
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