sábado, 2 de junho de 2018
quinta-feira, 19 de abril de 2018
sexta-feira, 16 de março de 2018
NA PÁSCOA ESTAMOS…
NOTAS DO MEU CANTINHO
Vive-se o
silêncio da Quaresma.
Por estas
bandas não é habitual a realização das romarias como acontece na
ilha de São Miguel. No entanto realizavam-se, durante as Domingas
Quaresmais, diversas procissões próprias do tempo litúrgico. No
primeiro domingo era a procissão da Penitência, com o Senhor Morto
e diversos andores com imagens de Santos de Penitência. Até havia
um casal, Santa Delfina, se não estou em erro e o marido, Santo
Ildefonso, se não estou em erro, e no terceiro domingo a procissão
de Passos. À noite os devotos percorriam aos grupos os mesmos
passos, fazendo suas preces.
No Domingo
de Penitência comemorava-se a crise sísmica que ocorreu nesta Ilha
nos anos de 1718 – 1720 (está a decorrer o terceiro centenário) e
que tão devastador foi para a Ilha, obrigando a uma emigração
precipitada para o Brasil.
A Semana
Santa era celebrada com grande esplendor litúrgico, havendo matinas
cantadas na Quinta e Sexta Feiras Santas. A população, geralmente
católica, acorria a estes actos com recolhimento e devoção.
Uma das
razões que levava a igreja a celebrar a Semana Santa com tão grande
aparato residia no facto de haver muito clero disponível que
auxiliava no canto e na pregação.
Hoje, de
facto, isso não acontece levando o povo a tornar-se ausente dos
brilhantes actos litúrgicos que terminavam com a grande Procissão
da Ressurreição realizada esplendorosamente no Domingo de manhã a
encerrar o cerimonial.
Tudo agora
é muito diferente. A população, por estes lados, diminuiu, tem
além disso outras obrigações e para a realização das cerimónias
já não existe o clero suficiente. Outras razões haverá mas julgo
que estas são as principais. De referir que até à Semana Santa os
paroquianos cumpriam o dever Pascal, subindo à igreja paroquial para
esse preceito. Assim, o que praticamente resta da Semana Santa são
um ou outro cerimonial litúrgico e uma ou outra procissão.
Sinais dos
tempos - dirão. Sinal da indiferença religiosa que o mundo
atravessa - direi…
Lajes do
Pico, 6 Março de 2018
E. Ávila
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Semana Santa
segunda-feira, 12 de março de 2018
REGISTOS, A PROPÓSITO
NOTAS
DO MEU RETIRO
Volto
no ritmo que me é possivel (e o leitor que desculpe a deficiência…)
a este meu instrumento de trabalho (quando posso ainda trabalho…),
para rabiscar umas notas referentes a assuntos que bailam
constantemente no meu pensamento e que desejaria tratá-los com a
devida clareza e erudição, o que já não é possível.
Durante
muitos anos, as ruas, canadas e veredas tinham o nome que a tradição
lhes atribuía: Rua Direita, Rua do Conde, do Conselheiro, etc.
A
vila das Lajes, sob o aspecto toponímico, tem a classificação
merecida. Estão assinalados os sítios principais com placas que
elucidam os transeuntes das zonas onde se encontram. Para além
destas, existem monumentos e bustos, e os nomes de ruas passaram a
ser utilizados para homenagear certas personalidades ou registar
acontecimentos notáveis. É desta forma que aparecem por cá as ruas
já referidas e outras como a Rua do P. Xavier Madruga, o Largo
General Lacerda Machado e outros mais.
O
primeiro monumento a ser erguido data de 1940, um cruzeiro dedicado à
Independência e Restauração de Portugal. Trata-se de uma obra, com
projecto do desenhador António Garcia, trabalhada em basalto da
Terra, por Artistas lajenses, e inaugurada em 1 de Dezembro de 1940.
Uma placa que nela existia indicava a razão da sua colocação. O
camartelo, como em outros feitos, encarregou-se de a retirar, talvez
porque, desde a sua colocação ou aquisição, apresentava umas
fendas, sem prejuízo da leitura dos dizeres…
É
tempo de voltar a colocar a que lá se encontrava, ou outra, não
interessa. O monumento tem de estar assinalado. Assim é um desleixo
que não se pode consentir. E não há responsáveis?
Todos
devem respeitar os bens públicos.
Em
1960, na Maré, local onde desembarcou o primeiro povoador, foi
levantada pela Câmara Municipal uma coluna a lembrar o feito dos
portugueses, em 1 de Dezembro de 1640, por cópia da que existe no
Monte Brasil, em Angra do Heroismo, da autoria de António Garcia
Pedro, lajense radicado naquela cidade.
Mais
recentemente, entendeu a autarquia, alterar o monumento, demolindo-o
e passando a uma coluna de quatro faces.
Como
monumentos nacionais devidamente classificados, conserva-se também a
Ermida (antiga paroquial) de S. Pedro e o Castelo (Forte) de Santa
Catarina.
No
Largo Lacerda Machado presta-se homenagem a dois insignes lajenses,
com a ereção dos respectivos bustos: Bispo de Macau, Dom João
Paulino de Azevedo e Castro e General Francisco Soares de Lacerda
Machado. Da Toponímia lajense, além de outros, fazem parte os nomes
de Garcia Gonçalves Madruga e do Vigário Gonçalves Madruga, a quem
foram confiscados os bens pela justiça de Castela.
Outras
homenagens deviam ser prestadas, se o espaço fosse maior e
apropriado… Mesmo assim, trata-se de uma plêiade ilustre de
personalidades e acontecimentos que prestigiam e enaltecem a história
do pequeno burgo, o primeiro que, na segunda ilha maior e a mais alta
de Portugal, foi instalada por gentes do Infante. Um acontecimento
relevante da História que não pode ser esquecido, nem ignorado.
Lajes
do Pico,
28
Fev.2018
E.
Avila
domingo, 4 de março de 2018
DO MEU SENTIR
Crónicas
da minha ilha
De
vez em quando, sou surpreendido com o título de qualquer outro
jornalista ou colaborador, muito embora ao seu e erudito Director, o
consagrado jornalista e escritor, Padre Xavier Madruga se fique a
dever a criação deste “cantinho” a cujo autor sempre procurei
prestar homenagem.
Outro
refiro hoje, aqui, para lembrar os notáveis trabalhos que nos deixou
o Historiador probo e respeitado e não menos erudito, o Gen. Lacerda
Machado. Escreve o distinto Lajense: “À
falta de forno, cozeram na laje
o pão rudimentar das suas refeições frugais, e mais tarde o bôlo
(…); assavam a carne no borralho; o funcho substituiu a hortaliça,
que inda não houvera tempo de cultivar, ou de que faltavam sementes,
uso que ainda subsiste, pôsto que raramente; inventaram môlhos,
gratos ao paladar, para suprir a falta do azeite de oliveira, tardia
em frutos, costume que perdura, pois só recentemente se começou a
tentar a sua cultura.” (1)
Mais:
até tarde, durou o primitivo, principalmente nos quintais, junto das
habitações.
A
Leste da Vila das Lajes muitos procuram o funcho como hortaliça
alimentar. Como hortaliças, outras ervas se iam descobrindo nas
hortas e nos terrenos baixos, que entraram no catálogo das plantas
preferidas.
Logo
se foram construindo os fornos caseiros (para a cozedura do bolo -
pão da época). Outros fornos construiram os lavradores, ao lado
daquele, muito maiores em área, para a secagem do milho colhido nas
terras dos proprietários. (Conheci dois: um grande e o outro pequeno
ainda em uso semanal).
Já
há muitos anos que deixou de utilizar-se a “Burra” para guardar
o milho, com a capa de casca, destinado ao consumo familiar. Passou a
ser arquivado em barricas ou “arquibancos” nas próprias
residências.
Com
a cultura do trigo modificaram-se alguns usos domésticos, passando o
trigo a ser utilizado em boa parte da ementa caseira, pois é sabido
que o milho cá apareceu depois de descoberto nos Estados Unidos da
América e, de lá, para aqui importado.
As
atafonas ou instrumentos de triturar o milho até ficar em farinha,
devem ter sido trazidos pelos povoadores - refiro a atafona e o
moinho de vento. Nas cozinhas existiam as pequenas atafonas para moer
a cevada. As atafonas movidas pelo “gado da porta”, serviam para
a farinação do trigo e do milho e para acudir à falta de pão.
Além
dos géneros de produção local já indicados, usava-se não somente
as carnes extraídas dos diversos animais, como ainda o peixe
cozinhado de diversas formas.
Nesta
zona Pico o peixe é bastante utilizado pela população e faz
excelentes “pratos”. Lembro o caldo de peixe fresco, que não só
os lajenses, como até os visitantes apreciam.
Aqui
há umas dezenas de anos chegou a esta vila um casal com filhos, que
aqui se fixou, cujo chefe vinha exercer funções oficiais. Voltando
à Metrópole um dos filhos tornou-se jornalista e, numa das suas
crónicas, escreveu sobre o caldo de peixe. E usou esta expressão ou
outras idênticas – foi há tantos anos!: ”Caldo de peixe como o
que se cozinhava na vila das Lajes do Pico, nunca mais encontrei!”.
1)Lacerda
Machado, História
do Concelho das Lages, 1991, pag. 78.
Lajes
do Pico, 15 Fev. 2018
E. Ávila
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Lajes do Pico
sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018
INVERNO E PRIMAVERA
CRÓNICAS
DO MEU SENTIR
Vamos
a meio do Inverno. As colheitas já se fizeram e, nas casas da
lavoura, principalmente, prepara-se o ano novo. Toda a gente está
voltada para a grande tarefa de preparar e arrumar os cereais,
principalmente o milho, que vai constituir a grande parte da
alimentação das famílias agrícolas. Uma tarefa exaustiva que
ocupa a maior parte da estação outonal. Já ficou para trás, mas é
saboroso lembrá-la nestes últimos meses do ano, pois nem todos se
apercebem do valor económico que representa, para a família
agrícola, o colher e armazenar esse precioso cereal que bem recente
é na mesa da família agrícola (repete-se).
Não
é intenção referir a idade do milho que aqui apareceu já depois
destas ilhas do Atlântico andarem povoadas. Deixo isso para o grande
escritor português, Júlio Dinis que tão bem soube descrever, no
seu excelente livro de crónicas – A Esfolhada – os trabalhos de
recolha e desfolha do milho em casa do lavrador. Aliás, este sistema
de recolha, esfolhada ou desfolhada e armazenamento é muito
semelhante, ou quase, ao que por estas ilhas, na generalidade, se
pratica. Mas vale a pena recordar.
O
dia da “apanha” era, na realidade um dia festivo, com refeições
melhoradas, por vezes confeccionadas na própria propriedade, se nela
havia casa de recolha. De contrário tudo acontecia na residência do
proprietário.
Cada
acto da desfolhada era um motivo de festa. No prédio produtor,
arrumam-se as maçarocas para os carros de bois, depois de
devidamente empilhadas e enfeitadas com arcos de verdura em sinal de
festa. Os carros, em cortejo, se são dois ou mais, caminham
(caminhavam) em fila, ao som do “guinchar” dos eixos. Hoje já
isso não acontece. O chiar dos carros deixou de ser permitido,
quando um surto de febres assolou a vila nos anos Vinte. Então, o
administrador do concelho obrigou-se a publicar editais proibindo o
chiar dos carros. Para o evitar, passaram a usar sabão azul em
substituição do cebo, como era usual.
À
chegada a casa havia sempre recepção festiva. Os acompanhantes eram
normalmente “brindados” com aguardente e licores e figos passados
e doces. Nas noites seguintes, tinham lugar as “esfolhadas”, já
relatadas em notas anteriores.
Hoje,
praticamente, não há desfolhadas. Passando por esses campos
encontram-se relvados transformados, somente, em campos de silagem.
Os gados desapareceram e os poucos que existem parece que estão
destinados à exportação. Daí que a indústria de lacticínios
esteja, praticamente, a desaparecer. Até quando? Não estará aí a
crise da lavoura, que muitos anunciam?
Vila
das Lajes,
Fev-2018
E.
Ávila
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milho
sexta-feira, 26 de janeiro de 2018
REGRESSO…
REGRESSO….
Há muitos anos que não
dava notícias. A mãe, a esposa e sua filhinha que acabara de nascer após o
casamento, não o conheciam. Partira numa noite esplendorosa da Primavera, num
dos primeiros navios a motor que por aqui passaram, com viagem paga aos
Furtados, em moeda nacional.
Fora para não mais dar noticia
suas…
A filha foi crescendo
naquele tugúrio que nenhum conforto tinha. Uma casa antiga, com tecto de telha
corrida, por onde o vento entrava desalmadamente nas noites de Inverno, e nem
havia água canalizada, nem electricidade. Na cozinha continuava a candeia alimentada
a azeite de toninha. No quarto de dormir, única sala existente, uma vela de
cebo e, por vezes de estearina. Tudo muito pobre e rude.
Ao canto deste pequeno
cubículo, uma mesinha, em cima, uma estampa de Nossa Senhora de Fátima e no
centro uma pequena Imagem do Menino Jesus, mal enroladinho.
No inverno o frio era
terrível e as três tinham de deitar-se cedo, envoltas num cobertor de lã de
ovelha, tecido nos anos em que a avó era ainda moça. Normalmente, dormiam
vestidas pois não suportavam o frio da noite.
O outro filhinho do casal
morrera de desinteria, há algum tempo, após o embarque do pai.
Os emigrantes que regressavam
à terra não sabiam dar notícias do João das Grotas, pois nunca se encontraram
com ele nas terras de Imigração. É que o João chegara a Montevideu e metera-se
por terra dentro – para o interior – e deixara de contactar com os conterrâneos.
O mesmo com a mulher e mãe. Um silêncio tenebroso que obrigou-as a andarem
trajadas de preto, como as viúvas.
A mãe trabalhava nas
casas vizinhas para angariar sustento. A mulher empregara-se como mulher a dias
e, nos intervalos, trabalhava na fábrica do peixe. A filha, já crescida, frequentava
a escola primária, e nos intervalos fazia mandaletes às famílias vizinhas….
Todavia, nos domingos e
dias santificados não deixavam nunca de cumprir os seus deveres religiosos e a
filha, com vestes emprestadas, fizera a Comunhão Solene. Todos tinham pena das três
mulheres, mas mais não lhe podiam fazer porque a terra também era habitada por
gente pobre.
Mas, um dia, aconteceu o
imprevisto…
+++
Chovia torrencialmente há
dias. As pessoas mal podiam sair de casa. Nem à novena…Era já noite de Natal. A
Igreja, como acontecia habitualmente todos os anos, estava iluminada. Os sinos
da torre da velha igreja da paróquia, tocavam festivamente e aproximava-se a
meia noite - a Meia Noite de Natal, quando a Igreja Católica celebra o
Nascimento do Menino Jesus, em Belém, há mais de dois mil anos. À igreja iam
chegando somente aqueles que tinham meios de condução. Os outros ficavam por
casa esperando que o tempo abrandasse para irem à Missa do Galo.
As mulherzinhas, entretanto,
recolhidas num canto junto ao lar a saborear umas sopas mal cozidas e pior
temperadas, ouvem bater à porta, apressadamente e ficam muito preocupadas. O
bater insiste e uma voz do exterior chama apressadamente: - Ó Izabel, abre a
porta, está aqui teu marido!... Era a voz do vizinho e compadre que a chamava.
O marido chegara na última camioneta da carreira e estava ali, junto dele. Ela lá foi, e atrás, a mãe e a filha, até à
porta do tugúrio. Na sua frente um homem bem-falante, rodeado de malas de
viagem. Chegara há poucas horas e imediatamente procurara a casa, mas nem se
lembrava onde ficava ela. Há tantos anos que dali partira…
Na sua frente estava um
homem bem-posto, inquieto por abraçar as três. Não é possível descrever o
resto.
Depois de explicações e
respostas, parece que não estavam separados há tantos anos… Era quase dia de
Natal quando a conversa acabou e se deitaram para descansar um pouco das
emoções e fadigas.
Mas o dia seguinte, o dia
de Natal, foi o grande dia. Para trás ficava um tempo horrível de sofrimento e
miséria. Na frente de todos uma nova época de fartura e de esperança.
Um milagre autêntico do
Menino Jesus!
Pico, Dezº 2017
E. Ávila Acidente natalício
À LAIA DE CONTO
Um grupo de
insurreptos, certa manhã, assaltou a freguesia e assumiu a administração de
todas as forças vivas. Invadiram as repartições e quartéis públicos, expulsaram
os dirigentes e passaram a dar ordens de comando.
Toda a gente ficou espavorida e fugiu dos seus locais de trabalho
e residências e refugiou-se em outras localidades. Foi um autêntico vendaval.
Imediatamente, os chefes dos inssurreptos assumiram o centro de
comando e chefia dos serviços e expediram as suas ordens aos funcionários que
se mantiveram nos seus postos de trabalho. Os outros, os mais perseguidos,
abandonaram a terra que ocupavam.
Os filhos, porém, solicitavam aos Pais para voltarem aos seus
lugares, onde tinham deixado tudo o que lhes havia pertencido: brinquedos,
familiares, e amigos e colegas de infância, todos com quem haviam crescido,
frequentavam as escolas e conviviam em criança.
Algumas mães escutavam os pedidos dos
filhos com mágoa e, em suas orações, imploravam do Senhor que lhes valesse em
semelhantes agruras.
Os mais novos nunca esqueceram o
presépio do Menino Jesus: o da sua Igreja, da sua casa, da sua catequese e da
sua escola.
Um dia, porém, tudo pareceu encontrar
rumos novos. Ia-se a meio do Verão.
As forças políticas entraram em acção.
Aqui e ali iam acontecendo motins revolucionários, e os chefes desses motins
principiaram, em surdina, a afastar-se para outros lugares.
Durante a noite, tiros de armas de fogo
eram disparados, causando o pânico entre as populações indefesas. Todos estavam à escuta… As mães,
principalmente, ao deitar os seus meninos, rezavam com eles ao Menino Jesus,
cuja festa do nascimento se aproximava, pedindo que viesse socorrê-los, em
momentos tão aflictivos, e que tudo voltasse aos tempos de tranqiolidade e de
ordem.
Certo dia, porém, alta madrugada, forças
do Exército vindas de paragens distantes, invadiram a localidade, ocuparam
diversos serviços públicos e convocaram os antigos funcionários para as chefias
e lugares que anteriormente ocupavam. Tudo foi aparentemente fácil.
Os antigos revolucionários fugiram e os
que dali haviam sido expulsos, voltaram à terra e às antigas ocupações.
A vida citadina começou, vagamente a
normalizar-se: a vida religiosa acalmou-se, as igrejas reabriram-se.
Jorge, um dos filhos das famílias
expulsas e regressadas à sua antiga residência, já um pouco crescido,
dirigiu-se à Mãe e perguntou-lhe: -Como é que isto aconteceu? O ano passado
não tivemos nem árvore do natal, nem Missa do Galo, nem Presépio na nossa casa,
e este ano é tudo diferente? O nosso presépio voltou, na nossa antiga sala vejo
muitas caixas com brinquedos e prendas, os estabelecimentos estão iluminados
com muitos produtos natalícios e há todos os dias festa na Igreja...
Foi-lhe então explicado, a ele e aos
irmãozinhos, que aquilo que estava guardado nos embrulhos era um verdadeiro
milagre do Menino Jesus, que assim, generosamente, atendeu às preces deles e de
outros meninos, seus companheiros, que durante aqueles anos todos os escutara,
acabando com a revolução.
Na realidade, as preces dos inocentes
meninos foram satisfeitas, naquele e em anos futuros. Jamais, naquela terra se
falou ou houve sinal de qualquer revolta e todos os seus habitantes passaram a
viver fraternalmente e em paz.
Vila Baleeira
dos Açores,
Natal de 2017.
E. Ávila
O ÓRGÃO DA MATRIZ DAS LAJES
Notas simples
Trago hoje à liça uma figura notável da
Música portuguesa - António Xavier Machado e Cerveira (1756-1828). Foi um dos
mais notáveis construtores de orgãos do período do barroco.
Os seus 103 órgãos, econtram-se dispersos por diversas
igrejas portuguesas, tendo chegado aos Açores e à Ilha do Pico, 14
instrumentos.
O primeiro órgão de Cerveira, já desaparecido, pertenceu ao
Mosteiro dos Jerónimos, seguindo-se o da Igreja de São Roque e da Basílica dos
Mártires, todos em Lisboa. “Com este órgão, o número
3 da sua autoria, o artista obteve grande reputação, tendo sido incumbido de
construir todos os órgãos que as igrejas de Lisboa tiveram que readquirir, na
reedificação da cidade, após o terramoto de 1755. 1
Mas com o passar dos anos, uns vão desaparecendo pelo mau
tratamento de conservação que os proprietários lhes foram dando no decorrer dos
tempos, enquanto outros, mais cautelosos, vão tratando os instrumentos musicais
com maior cuidado. Mas, infelizmente, os desastres também acontecem.
O histórico Órgão da Matriz das Lajes do Pico foi construído,
em 1804. É o 66º exemplar e o mais pequeno de toda a obra de Machado e
Cerveira, foi o sexto órgão feito para os Açores pelo Artista e o primeiro a
vir para a Matriz das Lajes.2
Que eu saiba, já teve duas intervenções que o beneficiaram. A
primeira foi da responsabilidade de um organeiro continental que aqui se
deslocou, propositadamente; a segunda foi no século findo, comparticipada pela
Direcção Regional da Cultura, a pedido do antigo Ouvidor e Vigário Dr. António
Rogério Gomes e executada pelo organeiro micaelense Dinarte Machado. Este
organeiro fez a limpeza interior do instrumento e modificou-lhe o sistema de
ar.
Actualmente, o órgão da Matriz das Lajes do Pico é um
instrumento de concerto e alguns se têm nele efectuado.
Antes da sua aquisição, o acompanhamento do canto, na antiga
Igreja Matriz, era feito pelos frades franciscanos, com violoncelo e rabecão.
Quando surgiram os órgãos, as igrejas do Pico foram das
primeiras a promover a aquisição de um desses instrumentos.
O P. Thomé Gregório, pároco da Calheta de Nesquim,
deslocou-se à ilha de S. Miguel para ouvir e observar o trabalho que estava a
executar o clérigo P. Joaquim Silvestre Serrão que dirigia a construção do
orgão mais pequeno da Sé de Angra. E a partir daí foi lançada a construção do
órgão destinado à Igreja da Calheta de Nesquim.
Thomé Gregório de Lacerda, jorgense, tio do Maestro Francisco
de Lacerda, construíu o órgão da Piedade, o primeiro das igrejas do Pico,
infelizmente desaparecido.
O órgão da Igreja de São João é um trabalho de António
Nicolau Machado Ferreira, de Ponta Delgada. Tem 479 tubos e foi restaurado no
ano 2000 por Dinarte Machado.
Outras mais
referências podia aqui fazer mas, por hoje, fico por aqui.
VILA DAS LAJES,
9 de Dez.º de 2017
ERMELIND0 AVILA
ABERTURA DAS COMEMORAÇÕES DO 5º. CENTENÁRIO DO CONCELHO DAS LAJES DO PICO - 28Jan2001
ABERTURA DAS COMEMORAÇÕES DO 5º.
CENTENÁRIO DO CONCELHO
DAS LAJES DO PICO
Alegro-me em ter chegado
aqui e poder celebrar o 5º Centenário do nosso Concelho e, simultaneamente, da
nossa Ilha do Pico. É .um acontecimento ímpar que bem merece ser lembrado por
esta geração homenageando aqueles dos nossos Maiores que um dia aqui chegaram,
desbravaram as terras, abriram os caboucos, construíram, ao longo dos tempos,
as moradias, modestas ou mais artísticas, fundaram as vilas e povoações, e aqui
se fixaram heroicamente. Hoje somos
apenas uns escassos dezasseis mil. Todavia, muitos mais fomos, atingindo
cerca de trinta e cinco mil em tempos passados, quando a emigração ainda não
constituía um fenómeno inquietante e
perturbado da nossa estabilidade social. E é pela emigração, que hoje,
espalhados por terras da Diáspora, ontem em Santa Catarina do Brasil, onde até
fundaram um povoado que se denomina cidade LAJES, e também no Uruguai, onde se
fixaram alguns casais idos na época da crise sísmica do século l8, para depois
se encaminharem para a América e
recentemente para o Canadá; somos centenas de milhar e constituímos
Comunidades fortes, cheias de prestígio, respeitadas e consideradas.
Essas gentes estão connosco,
vivendo os nossos problemas sociais e económicos, numa saudade permanente que
as faz transportar muitas das nossas tradições, da nossa religiosidade e da
nossa própria língua, para as terras da Diáspora, onde se radicaram, num culto
exemplar pelos valores da terra mãe
No entanto, para nós que
aqui fi0camos e teimosamente aqui vivemos ,
vale a pena o sacrifício da vida pelas belezas das paisagens verdejantes;
pelo ar ainda puro que respiramos; pelos aromas deliciosos dos pomares e
vinhedos que haurimos; pela imponência da nossa Montanha, envolta em mantos
diáfanos ou embranquecida pela neve que por vezes nela se fixa; pelo sol que
nos ilumina e aquece e que, ao fim do dia, nos poentes multicolores de uma
beleza magnificente, quando se aproxima do horizonte e por detrás dele se some,
oferece, aos que aqui vivem, espectáculos sempre belos e inéditos.
Afinal, quem sou eu para
tentar enaltecer as belezas desta ilha que saindo das entranhas do monstro
marinho, um dia se ergueu, por entre estrondos
e uivos medonhos, em labaredas de fogo, para passar além das nuvens ,
num desafio constante, já lá vão uns milhares de anos!
Mas, vamos ao que importa
aqui trazer nesta ocasião solene.
Valendo-me da expressão
de Ferreira Deusdado, não ficará mal dizer que a nobiliárquica Vila das Lajes do Pico, que outrora foi assinalada
com este evento festivo, celebra cinco
séculos de vida administrativa.
Na realidade, o primeiro documento oficial que a
História regista, foi um Alvará do Capitão-Donatário das Ilhas do Faial e Pico,
datado de l4 de Maio de l501, que conferia poder e autoridade a Fernão Alvares
para dar licenças diversas aos povoadores.
Antes, porém, na
opinião de Lacerda Machado , probo e erudito historiador lajense, a Vila das
Lajes, que havia sido povoada cerca de l460, não possuía alvará, pois os homens
que o Infante para cá enviou, vieram comissionados com os poderes
indispensáveis à governação da Ilha. Só por volta de l500 se há procedido à
eleição da primeira vereação, que não deixou
de prestar ao astuto Capitão-Donatário sua vassalagem.
Crê-se que os primeiros
povoadores vieram da Ilha Terceira, já então
povoada. Segundo Frei Diogo das Chagas, que o primeiro foi a escrever a
história destas ilhas - o
“Espelho Cristalino em Jardim de Várias Flores” -
que só veio a ser publicado há poucos anos, muito embora fosse já conhecido
o Capítulo referente à ilha do Pico, publicado
pelo escritor Ferreira de Serpa, -
-Fernão Alvares Evangelho desembarcou com o seu cão no “Penedo Negro”, no
fundo da pequena enseada do Castelete, ao sul da que viria a ser a Vila das
Lajes.
Não vou repetir o
interessante episódio, já conhecido dos Lajenses. Referirei, porém, que Fernão
Alvares, vendo-se só na ilha, pois os companheiros voltaram meses passados,- procurou um sítio capaz de se
fixar. Encontrou-o junto da Ribeira que
corria ao norte do monte de Santa Catarina. Aí construiu uma minúscula casa
que, segundo a tradição, ainda ali se encontra e cujas ruínas, recente e
plausivelmente, foram adquiridas pelo Município.
E valho-me ainda de Frei
Diogo das Chagas, frade florentino e irmão
do guardião do convento franciscano desta vila, que aqui se demorou
alguns meses, de visita ao irmão e na qualidade de Visitador da Ordem, o que
lhe permitiu recolher muitos documentos dos arquivos oficiais e noticias
da tradição popular.
Diz Diogo das Chagas que “!... muitos annos não
teve esta ilha outra freguesia mais que esta, e de todas as partes aonde
moravam os povoadores vinham a ella, que foi uma pequena Igreja do Apóstolo São
Pedro (que hoje é ermida), sua paróchia, que fica a um cabo da Villa a nordeste
da barra, e porto d’ella, pegado a um braço de mar, que ahi entra, & faz
rio morto, a qual por ser pequena trataram de fazer outra em o meio da Villa,
como de efeito fizeram, no logar em que está, do orago da Santíssima
Trindade,para cujo efeito lançaram finta em todos os moradores da Ilha e nas
fazendas dos Auzentes , conformne cada um tinha de cabedal, a qual taixa por
bem mostrar o que no artigo proponho boto aqui como em seus livros achei
fielmente tresladados.”
Os moradores eram 45 e a
população, segundo os cálculos de Lacerda Machado, devia andar à volta de 250 almas ou pessoas. Estava-se no ano de
l506.
A igreja nova foi
construída no centro da vila, no local onde se ergue a actual Matriz. Na frente
situava-se a Casa da Câmara e, ainda, no
meio da Praça, o Pelourinho. Dedicaram-na os povoadores à Santíssima Trindade,
naturalmente porque Fernão Alvares ou os companheiros, aqui chegaram em dia da
Santíssima Trindade, como aconteceu em Santa Maria, São Miguel e São Jorge.
Ao longo destes cinco
séculos a ilha do Pico tem sofrido diversos revezes, e já não falo na erupção
vulcânica de 1562 no chamado “Pico dos Cavaleiros” e, depois, nas de 1718 e 1720 que deram origem aos “Mistérios” de Santa Luzia , São
João e Silveira.
O mais gravoso,
porém, deve ter sido o facto de Álvaro de Ornelas haver recusado a capitania do
Pico, ficando-se pela Madeira onde residia, o que permitiu ao Donatário do
Faial pedir ao Rei a Capitania da Ilha do Pico, sendo, pois, o primeiro Capitão
do Faial e o segundo da ilha do Pico.
Afinal, uma pecha que, drasticamente, atingiu a ilha durante este meio milénio. E o
Pico nunca mais foi capaz de reabilitar-se de tamanha afronta.
A Câmara era eleita
anualmente, num dos meses de verão e a ela competia velar pelos interesses dos
seus munícipes. Foi assim que em 4 de
Novembro de 1583 acordaram “Os homens bons“ da Câmara (assim se denominavam
os respectivos membros) em que nenhum cristão novo pudesse viver na terra e nela vender suas
mercadorias.
De recordar que a
antiga “Casa da Câmara” já existia em 1503 e media l2 varas de comprimento e 5
de largo. No piso superior, servido por duas
escadarias de pedra com um alpendre ao centro, onde se situava a porta
de entrada, ficava a secretaria e a sala das sessões. O rés-do-chão servia de
arrecadação e de “curral do concelho” onde eram arrecadados os animais vadios.
Ao lado, no canto da rua da “Família Xavier”, vulgo da Cadeia, existia o
edifício da Cadeia.
Os serviços municipais foram transferidos para este
edifício dos franciscanos em 1840, mediante portaria da Rainha, datada de 3 de
Janeiro daquele ano.
Com o
desenvolvimento da população, uma parte fixou-se no lado Norte da Ilha, onde
existiam excelentes terrenos de cultivo.
Ai fundaram importantes núcleos populacionais.
E foi assim que, um
século decorrido após o povoamento, os povos daqueles lados pediram ao Rei a
criação do seu concelho. Não foi fácil a solução, pois duas das principais
povoações reivindicavam a elevação a
cabeça do novo concelho. A Câmara das Lajes, naturalmente pelos laços
familiares existentes entre os dois povos, superiormente consultada, decidiu-se
por São Roque, ficando preterida a Prainha, que só muito tarde perdoou o
agravo.
O concelho das Lajes
é constituído, actualmente pelas
freguesias de:
- São João, que passou a
paróquia independente em 1616 e cuja igreja, então situada no lugar da Arruda,
foi destruída pelas erupções de 1720;
- Santíssima Trindade,
primeira povoação da Ilha;
- Santa Bárbara das
Ribeiras, a segunda mais antiga da Ilha, fundada por Jordão Alvares Carauta,
companheiro de Fernão Alvares Evangelho;
-
Calheta de Nesquim (ou de Morro Cão), já existente em 1506 e cuja primitiva
igreja (uma capela) existia no século XVI.
O edifício actual é já do século XIX.;
- Freguesia de Nossa
Senhora da Piedade, ou da Ponta do Calhau Gordo, como refere Gaspar Frutuoso,
uma das mais ricas em produção agrícola. A primitiva igreja foi destruída pelo
sismo de 1755. Situava-se no lugar do Império. A construção da actual paroquial
foi iniciada em 1758. É tradição que ficou concluída oito anos depois; e,
- a actual freguesia da
Ribeirinha . Uma das localidades mais antigas
do concelho, Gaspar Frutuoso, em crónica do Século XVI a ela se refere. A
actual igreja já existia em 1762. Foi elevada a freguesia por Decreto
Legislativo Regional de 15 de Setembro de 1980.
São estes e outros
factos que, durante o ano, a Câmara Municipal pretende recordar, assinalando,
com eventos diversificados, que hoje se iniciam, os cinco séculos de existência
do concelho que o primeiro foi e, durante um século, o único da Ilha do Pico.
No entanto, não deixou de apoiar a criação dos outros dois: São Roque em 10 de
Novembro de 1542 e a Madalena em 8 de Março de 1723. Sendo este extinto em
1895, representou a Câmara das Lajes ao Governo de Sua Magestade para que o
concelho fosse restaurado, o que veio a acontecer por Decreto de 13 de Janeiro
de 1898.
É meio milénio de
trabalhos e sacrifícios, de lutas e dores, de crises e de fomes, por vezes (a
História regista alguns “anos da fome”), de sismos e vulcões, de ciclones e
enchentes de mar... que o povo suportou heroicamente. Mas, também, de momentos
felizes, de vitórias e alegrias que lhe deram seus varões ilustres, aqueles
que, nas artes e letras, quer no
Ocidente quer no Oriente, na pátria ou em terras da Diáspora se tornaram
notáveis por feitos assinalados.
Gente ilustre “... que por obras valerosas / se vão (ou
foram) - ontem e hoje - da lei da Morte libertando ...” como diria Camões.
Vila das Lajes, Ilha do Pico,
28 de Janeiro de 2001
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