sábado, 21 de março de 2015

A BALEAÇÃO

NOTAS DO MEU CANTINHO


Desapareceu a actividade baleeira mas falta fazer a sua história. Não pretendo fazê-la, pois é tarefa impossível para quem esta nota rabisca. Outros, melhor, o poderão fazer e é tempo de empreender esse importante estudo.
O Museu dos Baleeiros é a história viva da baleação, todavia há que passar ao papel, para “ad perpetuam rei memoriam” e enquanto é tempo, para não se perder um século de história económica e social desta ilha.
Verdade que, em 1788, já 200 barcos ingleses andavam pelos nossos mares à caça do cachalote, mas os lajenses só por volta de 1870 iniciaram a baleação, com os emigrantes americanos retornados.
Pouco mais de um século durou a actividade baleeira nestas ilhas dos Açores. No entanto, é vasta a bibliografia que a baleação nos deixou, portuguesa e estrangeira. Recordo, muito rapidamente, as Ilhas desconhecidas (1926) de Raul Brandão, Mau Tempo no Canal, o romance mais consagrado do emérito escritor Vitorino Nemésio, cujo tema básico anda à volta da Margarida e dos baleeiros do Guindaste, um suposto porto de baleação do Pico. A notável obra literária do escritor picoense Dias de Melo tem, quase exclusivamente, como tema único a baleação e as “estórias” que dela ficaram Na Memória das Gentes, cerca de três dezenas de livros alguns em segunda edição e até um com tradução japonesa.
Muitos outros escritores andaram por aqui a recolher elementos para os trabalhos que nos deixaram, versando a baleação. Lembro dos estrangeiros, o The hand of God –Whaling in the Azores, de Trevor Housby, inglês, e Daniel and the Whale Hunters, de Bernard Wolf, traduzido para português em edição da Câmara Municipal das Lajes do Pico. Muitos outros se publicaram, como o Moby Dick de Herman Melville.
Mais recentemente, podemos registar Robert Clarke, a quem se deve, na douta opinião do Coronel José Agostinho, o vocábulo “baleação”.
O estudo científico do Dr. Mousinho de Figueiredo, Introdução ao Estudo da Indústria Baleeira Insular (1946), deu a denominação da sociedade que instalou nas Lajes do Pico a fábrica de aproveitamento do cachalote – SIBIL e um outro estudo do Comandante Zolá da Silva, da mesma época, serviu de base à publicação da legislação sobre as Zonas Baleeiras, que não usufruíram os efeitos desejados.
O período áureo da baleação deu-se a meados do século passado. As Lajes do Pico passaram a ser conhecidas no Mundo e beneficiaram de um turismo especial que aqui aportou no desejo de conhecer a pesca artesanal do monstro marinho. E eles vieram da América, do Canadá e do Brasil; das diversas nações europeias e do Oriente ou, melhor dito, do Japão (mais especificadamente da Televisão Japonesa). Deixaram-nos excelentes testemunhos escritos, desde o espanhol ao japonês, cerca de oitenta (80), que arquivo, muito ciosamente. De 1970 a 1982.
E foi talvez a passagem dessas individualidades que mais valorizou a baleação nas Lajes do Pico.
Da baleação, a que muitos assistiram no alto mar, ficaram largas colecções de fotografias, livros e vários filmes, alguns deles adquiridos, mais tarde, pelo Museu dos Baleeiros que os exibe com regularidade, como é o filme “The last whalers”, de William Neufeld (Bill), um nova-iorquino, que aqui andou diversos verões.
As Lajes – Vila Baleeira- continua a ser o “santuário das baleias”, e foi por isso que aqui foi lançada a simpática actividade “whale watching “ pelo francês Serge Viallelle.
Para a grande maioria das famílias lajenses, a exploração da indústria baleeira representava uma estabilidade económica que nunca mais foi alcançada. A grande maioria dos baleeiros emigrou.
Depois multiplicaram-se as empresas exploradoras da nova actividade que servem para trazer ao porto das Lajes a maioria dos visitantes e levá-los a alojamentos distantes, depois da visita às baleias. Com raras excepções...
As canoas foram dispersas pelos diversos portos dos Açores e são utilizadas em regatas. Nas casas de recolha foi instalado – e muito acertadamente – o Museu dos Baleeiros. Outro grupo de armazéns recolhe as canoas que por cá ficaram e o Clube Náutico. As “vigias” são hoje utilizadas pelos operadores de “whale watching” para lhes darem a posição das baleias. A fábrica, embora conservando todo o equipamento, foi transformada em Centro de Artes e Ciências do Mar.
Desapareceram os estaleiros onde se construíam as canoas, e foi pena! Não pode nem deve esquecer-se que foi um artista lajense – Francisco José Machado – que, por volta de 1894, iniciou a construção da canoa baleeira no seu estilo actual, ainda hoje considerada a mais bela embarcação do mundo. Foi registada na Delegação Marítima com a denominação de São José.
O nome de Francisco José Machado passou ao esquecimento e bem merecia que fosse recordado.
Lajes do Pico,
10 de Março de 2015


Ermelindo Ávila

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