sábado, 4 de abril de 2009

Faleceu o João Azevedo


Não posso deixar de o recordar nestas notas. Sinto que é um dever quase fraterno. Fazíamos anos no mesmo dia e éramos do mesmo ano... Ele porém, com o seu sorriso um tanto trocista, dizia-me sempre que era mais velho do que eu uma hora! Que assim fosse. Talvez por isso partiu mais cedo .
O João era inteligente e tinha uma cultura razoável, embora poucos dele fizessem caso. Era muito interessado pela sua freguesia. Mas, neste particular, a freguesia era Santa Bárbara...
Estudamos na mesma instituição embora fosse eu um ano mais adiantado. Fez propedêutica e o primeiro ano de filosofia o qual teve de abandonar, por lhe haver aparecido uns sintomas de doença grave, da qual veio a curar-se mais tarde.
Com falecimento da Mãe e, depois do Pai, valia-lhe uma tia, que o acarinhava como filho. E foi aí que veio a terminar seus dias, entregue aos cuidados de casal amigo.
Andou pelas Lajes num escritório particular e, depois, estabeleceu-se em Santa Bárbara com um estabelecimento comercial, onde não faltava um pequeno compartimento onde se reuniam os seus amigos, todas as tardes e serões para um jogo de cartas. E, apesar de ter encerrado o estabelecimento há anos, aquele espaço conservou-se aberto e iluminado até há bem poucos meses, segundo me informaram.
Como disse, o João Azevedo foi um interessado pela sua terra. Fez parte da Junta de Freguesia das Ribeiras, que tinha e tem a sua sede em Santa Bárbara, a parte mais antiga da freguesia.
Em certa ocasião correu a notícia de que a sede da freguesia seria transferida para Santa Cruz. O João e os companheiros da Junta de Freguesia, - mestre António da Silva Azevedo, presidente, Manuel Joaquim da Costa e Silveira, secretário e o João Azevedo, tesoureiro – ficaram aflitos e sem saberem o que fazer. Vieram até à vila e aqui encontraram a solução: construir. no adro da igreja, uma sede para a Junta, aproveitando uma pequena casa que, creio, era antiga copeira do Espírito Santo, que estava abandonada.
João era amigo do Presidente da Junta Geral da época e conseguiu um subsídio para as obras. A casa ergueu-se e nela foi instalada a Junta. Estava afastado o fantasma da mudança de sede.
Mas a Junta mais fez: Construiu uma pequena capela no Cemitério Paroquial e uma capela para o Divino Espírito Santo, mesmo em frente da sede da Junta. E ela ainda lá está. Nunca se falou no João Azevedo, mas ele andava sempre por detrás do activo Presidente, o Mestre António do Arrife, como era conhecido.
João Azevedo esteve também na fundação da Filarmónica de Santa Bárbara, embora fosse o tio materno, o comendador António Porto, quem financiasse a aquisição do instrumental. Com o desentendimento entre a Sociedade que havia sido constituída com o nome de Ferreira Porto e o próprio comendador, João, colocando-se naturalmente ao lado do tio, sofreu com o incidente, que muito o penalizou. E julgo que nunca mais se interessou pelas iniciativas locais.
O João Azevedo era um solitário. Depois do falecimento dos tios, que o amparavam, foi-se isolando e deixou de ser aquele homem calmo e dedicado que sempre fora, pelas coisas da freguesia.
Sofreu com o falecimento do irmão, Engenheiro Técnico Agrário que, depois do curso, ficou pelo continente como técnico da Federação dos Vinhos, salvo erro, vivendo na mesma pensão onde se hospedou no primeiro dia que ali chegou e onde veio a falecer solteiro, há dois ou três anos. O João visitou-o nos últimos tempos, mas sofreu quando lhe deram conhecimento do falecimento.
Há meses recolheu-se a casa. Nunca mais nos encontrámos. Senti o seu falecimento como amigo velho, desde os recuados tempos da adolescência, há cerca de oitenta anos.
Devia-lhe estas duas palavras de amizade e sentimento.
Que o Senhor o haja recebido em Sua Glória !

Vila das Lajes,
15 de Março de 2009
Ermelindo Ávila

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