sábado, 25 de abril de 2009

A "NOSSA CASA"

Notas do meu cantinho


Devido às minhas debilidades físicas pouco saio deste meu cantinho. Daí desconhecer uma boa parte do que vai acontecendo por este nosso burgo.

Há dias passei junto da “nossa casa”, aquela que foi construída pelos meus antepassados. Onde eles e a sua descendência sempre viveram e onde os meus irmãos e eu próprio nascemos. Nela vivi vinte e sete anos!...

Por razões que não interessa para aqui trazer, ela deixou de pertencer à Família há umas duas dezenas de anos.

Como disse, ali nasceu e viveu a minha ascendência materna, até, que eu saiba, aos meus trisavós, Pedro Pereira Madruga e Teresa Rosa Luísa de Jesus, naturais da freguesia Matriz da Santíssima Trindade, desta Vila e pais de meu bisavô Joaquim Maria dos Santos, nascido aos 13 de Setembro de 1790. No entanto o filho mais velho do casal - o Pe. João de Deus Madruga, - havia nascido a 26 de Dezembro de 1785. Foram pais de diversos filhos e, segundo o costume da época, um foi padre, um frade no Convento Franciscano desta Vila,e um formado em direito. Este foi secretário da Câmara e o Padre, cura da Matriz. Meu avô, Ermelindo dos Santos Madruga, ali criou os filhos. Igualmente meus pais. Todos nós, sete filhos, ali nascemos e fomos nela criados. Saí daquela secular casa, por imperativos da vida, com vinte e sete anos... Conheço, pois, todos os cantos e recantozinhos... Meus pais não tiveram uma filha, como desejavam, e nós uma irmãzinha, pois a que lhes nasceu o Senhor levou-a para Si. Sofremos bastante e talvez por isso à nossa Mãe - que também lá nasceu - dedicávamos o duplo sentimento de mãe e irmã...

Contava-me a minha bisavó paterna – falecida com quase um século, pois faltavam-lhe uns escassos meses para atingir a centúria – que, quando alguém adoecia, era a casa de senhor Joaquim Maria que iam buscar um púcaro (pequeno vaso de barro) de água doce para fazer chá, não do chinês mas das ervas medicinais que então cultivavam. É que, na casa dele, havia duas grandes talhas de barro onde era recolhida á agua da chuva, pois ainda não existiam as cisternas, que vieram mais tarde. Ainda conheci esses enormes vasos de barro.

Nela viveu também o filho Pe. João de Deus e a sua escrivaninha quase chegou aos meus dias...

No rés-do-chão ou loja, teve meu pai uma sapataria e eu próprio, mais tarde, nele instalei o serviço público que passei a exercer.

É uma casa com mais de três séculos de existência. Um verdadeiro património, senão pela contextura, pela antiguidade, desta Vila, dos poucos que ainda restam e que merecia, por isso mesmo, um tratamento adequado, com vista à sua conveniente preservação. Está situada a meio da rua principal do burgo e da respectiva varanda descobre-se um extenso panorama da vila, a norte e a sul.

Como disse, actualmente a casa, por motivos vários, não pertence à família. Dois dos meus irmãos estão noutras ilhas, três já partiram e os dois que aqui vivem, estão viúvos... Houve quem a adquiriu, a utilizou e, depois, a abandonou. Desconheço o motivo e ninguém até agora foi capaz de m’o explicar. E eu vivo, sofrendo a amargura de ver a casa dos meus antepassados, onde nasci, me criei e vivi feliz quase três dezenas de anos, com meus pais e meus irmãos, a desmoronar-se, a desaparecer...Devia ser considerada, pelo seu estilo e pela antiguidade, património urbano. Não há entidade alguma que lhe acuda, já que os actuais proprietários julgo que dela estão desinteressados?

Hoje resta-me a saudade, que não tem limites e me traz amargurado e triste.


Segunda-feira da Semana Santa de 2009.

Ermelindo dos Santos M. Ávila

2 comentários:

luciamoules@gmail.com disse...

Querido tio Ermelindo.
Como eu o compreendo! A casa d`Avó, como os netos a chamavam, era a "nossa casa", onde os primos se encontravam para brincar durante o dia e os filhos, noras e netos, à noite seroavam, às vezes provando os saborosos petiscos temperados pela minha Avó e Madrinha...
Eu "vejo" todos os cantos do quintal, do jardim, cada pedra, que servia de abrigo às bonecas de pano, costuradas pela tia Júlia...
Mas, somos caminhantes e seguimos sempre para diante...
Um abraço. Lúcia.

RUI PEDRO ÁVILA disse...

É COM MUITA MÁGOA QUE HOJE ENCONTRO ESTA NOTA NA "NET". UM DIA, ANTES DE COMPRAR A CASA DO SR. MACHADO DIAS, NAS LAJES, QUIZ COMPRAR ESTA CASA, MAS O SEU PROPRIETÁRIO DE ENTÃO PEDIU-ME MAIS DOIS MIL CONTOS DO QUE DEPOIS A VEIO A VENDER À "PLANIPICO"... TENHO MUITA PENA E JÁ NÃO ME REFIRO AO QUANTO LÁ APRENDI COM O MEU TIO JOAQUIM (FALECIDO), SUA EXTREMOSA ESPOSA E SERVA ATENTA DE MEUS AVÓS, TIA JÚLIA E ESSA ÚLTIMA SERVA DE SEMPRE E AMIGA ATÉ AO FIM A QUERIDA TIA ETELVINA, A QUEM "DEVO" O TER HOJE ESSA CASA NAS LAJES, PELA AMIZADE QUE ELA MANTINHA COM A SRA. ARMANDA, MÃE DA Dª MARIA NAZARÉ A QUEM A COMPREI... AINDA NÃO PERDI A ESPERANÇA DE UM DIA A ADQUIRIR, OU UMA DAS MINHAS FILHAS...
UM ABRAÇO A MEU PAI E UM BEIJO À LÚCIA