NOTAS DO MEU CANTINHO
Era o título de uma secção que o Fundador e antigo Director deste Semanário utilizava semanalmente, quando tratava de assunto algo especial.
Não foi para plagiar o título que o adoptei recentemente nestas minhas crónicas mas para recordar Alguém a quem devo um montão de deferências e amizade sem limites.
Foi O DEVER a minha escola jornalística, como a de tantos outros que, depois, foram excelentes jornalistas, escritores e poetas, porque a todos o seu Director acolhia com simpatia e disponibilidade.
Lembro-me do meu primeiro escrito. Uma pequena notícia da Festa de São Tomás de Aquino, que, ao tempo, constituía o maior acontecimento cultural de Angra, naqueles recuados anos trinta. Enviei-a ao Pe. Xavier Madruga com algum receio. Respondeu-me na mala a seguir, indicando-me algumas deficiências que tinha corrigido e informando-me que o artigo seguia para S. Jorge, (o Padre Madruga já estava a paroquiar na Candelária do Pico), para ser publicado. E assim aconteceu. (Guardo o jornal com muito cuidado). Estávamos em 1932. Já se passaram quase setenta e sete (77) anos! Mas o imprevisto aconteceu. Quando o jornal chegou a Angra e um dos professores, que era referido na crónica, veio junto de mim agradecer as referências elogiosas que, no escrito, fazia à sua Pessoa. Fiquei seriamente confundido e se houvesse ali, onde me encontrava, um buraco, com certeza me tinha afundado nele... Depois foi um continuar sem mais parar. E ainda hoje, bem ou mal, aqui estou.
O Jornal, que foi considerado o melhor Semanário Português da década de quarenta, por personalidade distinta do jornalismo, tinha secções várias, quase todas elas da autoria e responsabilidade do Director. O “artigo de fundo” ocupava normalmente as colunas centrais da primeiras página. As “Crónicas da Guerra” de tendência notória dos Aliados – o Director não suportava o nazismo - causavam furor a Hitler, que chagava a enviar-lhe mensagens diabólicas através da Emissora alemã. Embora a censura portuguesa proibisse a audição daquela emissora, havia quem escutasse o programa em língua portuguesa e dele desse conhecimento ao Pe. Madruga que dava gargalhadas a bandeiras despregadas.
Nos contactos que havia tido na sua viagem pela Europa, a quando do Congresso Eucarístico de Budapeste, havia tomado conhecimento do estado de verdadeira ebulição bélica em que já se encontrava a Europa e isso deu-lhe um conhecimento bastante real da situação e das tendências do Sucessor de Edimburgo, permitindo-lhe que aqui, à distancia, fosse analisando com grande profundidade o desenrolar da nefasta II Grande Guerra Mundial. A colecção de “O Dever” aí está para o confirmar.
Quando na Calheta de São Jorge, o Jornal inseria quinzenalmente uma crónica - “Correio das Ilhas” – que mais não era senão um verdadeiro suplemento dedicado às Lajes do Pico, onde eram dadas as notícias e os acontecimentos aqui ocorridos, principalmente depois do encerramento do antigo jornal “As Lages”, em 1920.
Se porque transferiu “O Dever” os respectivos serviços – Redacção, Administração e Oficinas” – para esta Vila? O P. Xavier Madruga havia sido colocado na freguesia da Candelária, desta ilha. O jornal ficara em S. Jorge, à conta do Administrador, Pe. José Joaquim de Matos. No entanto, por sistemática perseguição do censor, na Calheta, o Pe. Madruga conseguira que o jornal ficasse sujeito ao Censor da Horta, um distrito diferente, o que não deixava de levantar certas dificuldades.
Entretanto faleceu o Padre Matos e assumiu a administração do jornal o colaborador e distinto jornalista, Samuel da Silveira Amorim. Mas era uma situação precária e foi assim que o Pe. Xavier Madruga, como director e proprietário do jornal, pediu a sua transferência para as Lajes, onde já então residia na situação de “Manente”. E “O Dever” para cá foi transferido, com a respectiva Tipografia – embora ficasse na Calheta a parte tipográfica destinada à secção de trabalhos, a cargo de um Senhor, cunhado do Padre J. J. Matos, que já a explorava desde anos passados.
“O Dever” apareceu pela primeira vez, na vila das Lajes, em 3 de Setembro de 1938. Era o número 983 do ano de XXII. O Jornal havia sido fundado em 2 de Junho de 1917. Vai atingir em Junho 92 anos. (A “Crença”, de Vila Franca do Campo é o Semanário mais antigo, pois foi fundado em Dezembro de 1915. Nenhum outro jornal –não contando com o “Açoriano Oriental”, “Diário dos Açores,” e “A União” atingiram tão provecta idade. “Telegrafo”, da Horta, também chegou aos 100 anos mas desapareceu pouco depois...)
Disso podem e devem orgulhar-se os picoenses. Nele está feita a história da Ilha e particularmente desta vila e seu concelho, nos últimos setenta anos. E não refiro as lutas travadas e a defesa intransigente dos diversos problemas picoenses.
Este recordar não é mais do que uma homenagem sincera ao Homem que, fechado nos últimos anos, no seu pequeno quarto de trabalho lutou e defendeu a Igreja e a Pátria que sempre serviu, o Padre João Vieira XAVIER MADRUGA.
Vila das Lajes,
29 de Março de 2009
Ermelindo Ávila
Era o título de uma secção que o Fundador e antigo Director deste Semanário utilizava semanalmente, quando tratava de assunto algo especial.
Não foi para plagiar o título que o adoptei recentemente nestas minhas crónicas mas para recordar Alguém a quem devo um montão de deferências e amizade sem limites.
Foi O DEVER a minha escola jornalística, como a de tantos outros que, depois, foram excelentes jornalistas, escritores e poetas, porque a todos o seu Director acolhia com simpatia e disponibilidade.
Lembro-me do meu primeiro escrito. Uma pequena notícia da Festa de São Tomás de Aquino, que, ao tempo, constituía o maior acontecimento cultural de Angra, naqueles recuados anos trinta. Enviei-a ao Pe. Xavier Madruga com algum receio. Respondeu-me na mala a seguir, indicando-me algumas deficiências que tinha corrigido e informando-me que o artigo seguia para S. Jorge, (o Padre Madruga já estava a paroquiar na Candelária do Pico), para ser publicado. E assim aconteceu. (Guardo o jornal com muito cuidado). Estávamos em 1932. Já se passaram quase setenta e sete (77) anos! Mas o imprevisto aconteceu. Quando o jornal chegou a Angra e um dos professores, que era referido na crónica, veio junto de mim agradecer as referências elogiosas que, no escrito, fazia à sua Pessoa. Fiquei seriamente confundido e se houvesse ali, onde me encontrava, um buraco, com certeza me tinha afundado nele... Depois foi um continuar sem mais parar. E ainda hoje, bem ou mal, aqui estou.
O Jornal, que foi considerado o melhor Semanário Português da década de quarenta, por personalidade distinta do jornalismo, tinha secções várias, quase todas elas da autoria e responsabilidade do Director. O “artigo de fundo” ocupava normalmente as colunas centrais da primeiras página. As “Crónicas da Guerra” de tendência notória dos Aliados – o Director não suportava o nazismo - causavam furor a Hitler, que chagava a enviar-lhe mensagens diabólicas através da Emissora alemã. Embora a censura portuguesa proibisse a audição daquela emissora, havia quem escutasse o programa em língua portuguesa e dele desse conhecimento ao Pe. Madruga que dava gargalhadas a bandeiras despregadas.
Nos contactos que havia tido na sua viagem pela Europa, a quando do Congresso Eucarístico de Budapeste, havia tomado conhecimento do estado de verdadeira ebulição bélica em que já se encontrava a Europa e isso deu-lhe um conhecimento bastante real da situação e das tendências do Sucessor de Edimburgo, permitindo-lhe que aqui, à distancia, fosse analisando com grande profundidade o desenrolar da nefasta II Grande Guerra Mundial. A colecção de “O Dever” aí está para o confirmar.
Quando na Calheta de São Jorge, o Jornal inseria quinzenalmente uma crónica - “Correio das Ilhas” – que mais não era senão um verdadeiro suplemento dedicado às Lajes do Pico, onde eram dadas as notícias e os acontecimentos aqui ocorridos, principalmente depois do encerramento do antigo jornal “As Lages”, em 1920.
Se porque transferiu “O Dever” os respectivos serviços – Redacção, Administração e Oficinas” – para esta Vila? O P. Xavier Madruga havia sido colocado na freguesia da Candelária, desta ilha. O jornal ficara em S. Jorge, à conta do Administrador, Pe. José Joaquim de Matos. No entanto, por sistemática perseguição do censor, na Calheta, o Pe. Madruga conseguira que o jornal ficasse sujeito ao Censor da Horta, um distrito diferente, o que não deixava de levantar certas dificuldades.
Entretanto faleceu o Padre Matos e assumiu a administração do jornal o colaborador e distinto jornalista, Samuel da Silveira Amorim. Mas era uma situação precária e foi assim que o Pe. Xavier Madruga, como director e proprietário do jornal, pediu a sua transferência para as Lajes, onde já então residia na situação de “Manente”. E “O Dever” para cá foi transferido, com a respectiva Tipografia – embora ficasse na Calheta a parte tipográfica destinada à secção de trabalhos, a cargo de um Senhor, cunhado do Padre J. J. Matos, que já a explorava desde anos passados.
“O Dever” apareceu pela primeira vez, na vila das Lajes, em 3 de Setembro de 1938. Era o número 983 do ano de XXII. O Jornal havia sido fundado em 2 de Junho de 1917. Vai atingir em Junho 92 anos. (A “Crença”, de Vila Franca do Campo é o Semanário mais antigo, pois foi fundado em Dezembro de 1915. Nenhum outro jornal –não contando com o “Açoriano Oriental”, “Diário dos Açores,” e “A União” atingiram tão provecta idade. “Telegrafo”, da Horta, também chegou aos 100 anos mas desapareceu pouco depois...)
Disso podem e devem orgulhar-se os picoenses. Nele está feita a história da Ilha e particularmente desta vila e seu concelho, nos últimos setenta anos. E não refiro as lutas travadas e a defesa intransigente dos diversos problemas picoenses.
Este recordar não é mais do que uma homenagem sincera ao Homem que, fechado nos últimos anos, no seu pequeno quarto de trabalho lutou e defendeu a Igreja e a Pátria que sempre serviu, o Padre João Vieira XAVIER MADRUGA.
Vila das Lajes,
29 de Março de 2009
Ermelindo Ávila
3 comentários:
Caro tio Ermelindo
É sempre muito agradável recordar pessoas e factos da minha Terra de origem. No Jornal "O Dever" vinha uma foto que recordava também a "minha professora", por isso pedia que colocassem a foto na net, pode ser?
Obrigada.
Um abraço, Lúcia.
Caro Senhor
Os meus sinceros parabéns pelo seu «blog notas».
Tendo familiares oriundos da «sua ilha», foi com prazer que li as suas notas.
Que tenha saúde para muitas.
Já agora, creio que o sucessor do Sr. Padre Madruga foi o Sr. Padre Freitas Fortuna.
Estarei correcto?
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