terça-feira, 2 de abril de 2013

PESCADOS E LOTA


NOTAS DO MEU CANTINHO


Os lajenses vivem uma grave crise de alimentação com a falta de peixe. Outrora, abundava no “limpo” o chicharro e, em certas “marcas”, as cavalas e os bonitos. Outras espécie apanhavam-se todo o ano, com mais ou menos abundância, pois havia certos pescadores que só a elas se dedicavam: o Mestre Bento, o Mestre João Luís, os Garcias, o Luís Sabina, o Henrique Ávila, o Manuel Caiador, o João Maurício, o João Brão, o Manuel da Silva... o Manuel Machadinho e tantos outros, que os havia, mestres de verdade, e que à pesca iam quando não aparecia baleia, pois esta caça estava em primeiro lugar. Pescava-se a garoupa, a veja, o sargo, e outras espécies mais. Durante a noite, iam, geralmente à pesca de fundo, principalmente as abróteas e os gorazes. Hoje tudo é diferente.
Se ainda há barcos de pesca, e não são poucos os que estão amarrados no porto interior das Lajes, e bons marítimos que sabem da sua profissão como os melhores, o pescado quase desapareceu porque uma instituição denominada Lota se fixou na Vila da Madalena, onde todo o pescado deve ser apresentado. Resultado: só cá aparece aquele restolho que não tem qualidade para ser exportado para o continente.
Recordar as pescas antigas do bonito, da cavala e do chicharro (no continente chamam-lhe carapau), é trazer à memória de muitos uma época de abundância em que o peixe aparecia por aí, ora fresco, ora o salgado ou seco. E seco porque as grandes quantidades de chicharro, apanhado durante a noite, eram preparadas para secar ao sol e, durante os meses de inverno, vendidas nas freguesias rurais ou trocadas por milho e outros produto agrícolas, quer aqui no Sul do Pico quer na ilha do Faial para onde os pescadores iam transaccioná-lo por milho e outros produtos agrícolas.
O peixe constituía a base principal da alimentação das populações destas ilhas. Hoje é negócio que não se faz. O “Limpo” está limpo. Os cardumes de chicharro desapareceram dali. Há quem diga que a baleia ou o cachalote dele se alimentam e de outras espécies; de tudo o que lhes chega à grande “bocarra” e onde são absorvidos às toneladas. Se esta não for a explicação, para onde caminhou o peixe que tanto abundava nestas costas? Não será motivo de estudo para os cientistas interessados, que muitos há?
Presentemente passamos a viver, quase só, de congelados, com a saúde por eles um tanto agravada.
Ainda há quem se lembre do caldo de peixe cozinhado com pescado fresco, acabado de chegar do mar e que era uma verdadeira delícia.
Até os marinheiros dos antigos iates – os inesquecíveis “barcos do Pico” - o sabiam cozinhar e, quando conseguiam adquirir bons peixes nos portos de São Jorge, a caminho da Terceira, faziam uma jantarada excelente para si e para alguns passageiros convidados, pois nem todos podiam suportar o cheiro e as baforadas do caldo a ferver em grandes tachos. Esse tempo passou, deixou saudades, mas não vale recordá-lo....
Hoje, poucos dele se lembram. Todavia há quem recorde ainda o ”caldo de peixe à moda do Pico.”
O que venho de recordar não é assunto novo nestes crónicas. Há meses (17-10-2011) falei dele, neste mesmo “Cantinho”. Que eu saiba, ninguém lhe “ligou”. E continuamos a ter um espaço para a venda de peixe da Lota (congelado?), instalado num antigo contentor quando, antes das obras do porto, tínhamos uma casa - pesqueira, construída pela Câmara Municipal, que foi demolida por motivo das obras e não foi substituída.
Está-se a fazer obras na zona do antigo campo de jogos, que vão passar pela Lagoa, mas nada se vê que seja para dar um melhor arranjo à venda de peixe ao público. O pescado chega do mar e desaparece. Um carro da Lota leva-o para a Madalena a trinta e cinco quilómetros de distância, para voltar, depois de ali arrematado pelos próprios pescadores, nem sei quando, para o contentor que serve de Peixaria local, embrulhado em gelo que lhe dá o aspecto de fresco... É o que nos fornecem. Assim acontece em toda a ilha. Não se compreende que, uma ilha tão longa e com habitações dispersas, só haja de consumir o peixe concentrado numa localidade para, depois, voltar aos portos de origem.
E as baleias continuam a aproximar-se da costa, fazendo desaparecer o chicharro, a cavala outras espécies mais...Não será? Estarei enganado?
Continua a proibição da apanha de lapas. Os polvos desapareceram. As redes e os tresmalhos que eram deitados, principalmente no Inverno, nas lagoas da Maré e do Caneiro, e que faziam boas colheitas, estão proibidos, bem como as tarrafas.
Quase tudo se proíbe e assim vão sendo prejudicados os nossos direitos de cidadãos livres...
É tempo de se rever a situação. O pescado do porto das Lajes deve ficar nas Lajes. A reconstrução do porto permite, nas imediações, a reconstrução da antiga Pesqueira. Admito que o pescado excedente do consumo local seja adquirido pela Lota que lhe dará o destino que tiver por conveniente. Tal como se processa o negócio do pescado é intolerável, por lesivo dos interesses das gentes desta banda Sul, onde, afinal, existem os mais importantes portos de pesca: S. João, Lajes, Santa Cruz, Calheta, Manhenha e Calhau. Quem o ignora?

Lajes do Pico,
25-01-2013
Ermelindo Ávila

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