NOTAS DO MEU CANTINHO
Conheci-o na minha juventude. Figura simpática e cortês, dele só me recordo de ele ter um amigo, com o qual passava os serões, pois ficava-lhe quase ao pé da porta como soe dizer-se: o senhor Capitão José Francisco Fidalgo.
Não era lajense. Nasceu na Horta a 2 de Fevereiro de 1850 e quando foi senhor de uma avultada quantia, parece que deixada pela mãe, mudou-se para esta vila. Tinha dezanove anos. Aqui estabeleceu-se com fazendas num barracão, no sítio onde hoje fica o edifício da Delegação Marítima.
Alguns anos decorridos deu-se o ciclone de 29 de Agosto de 1893 que lhe provocou estragos no estabelecimento. O comendador António Homem da Costa, era o seu nome, afligiu-se e retirou dali o estabelecimento, construindo para a sua instalação, na rua Direita, o prédio que ainda hoje mantém no frontispício uma pequena placa com o seu nome e a data de 1910. Trata-se de um dos melhores prédios urbanos da vila e a planta e construção devem-se ao mestre Francisco San Miguel, um dos mais hábeis construtores que existiram nesta terra. O comendador não o desejava tão grande e parece que só pretendia fazer uma casa de um só piso. Foi o Mestre Francisco que, aproveitando a ida do comendador à quinta da Miragaia, viagem que empreendia todas as semanas em dia certo, onde se demorava até à noite, para evitar o Sol, lançou os alicerces do actual prédio, o que o Comendador não pôde evitar, no dia seguinte, por já estarem gastas umas dezenas de mil reis e ele não era homem para “deitar dinheiro ao mar”.
O Comendador António Homem da Costa viveu solteiro e faleceu, aos 79 anos, em Agosto de 1929. Não deixou herdeiros, legando em testamento os seus haveres ao empregado que lhe assistisse ao falecimento.
Diz um seu biografo: “Afável, cavalheiroso e honesto, o seu estabelecimento adquiriu voga especial naquele meio, e portanto os seus lucros corriam a par dos seus méritos de cidadão e comerciante. Casualmente encontra-se funcionário público.”(1) Durante sete anos foi tesoureiro da Câmara Municipal, até que resolveu pedir a exoneração para melhor se dedicar aos seus negócios.
Depois foi eleito vereador da Câmara e escolhido para seu presidente, cargo que desempenhou por diversas vezes e por alguns anos, sempre com geral agrado, embora não estivesse filiado em nenhum partido político. Durante o seu mandato, além de outros melhoramentos públicos, instalou na vila a iluminação pública, a petróleo, até que um pobre louco entendeu, certa noite, destruir os candeeiros.
Em 12 de Junho de 1890 foi agraciado com o grau de cavaleiro da Ordem Militar de N. S. Jesus Cristo, e em 27 de Agosto de 1896 com o grau de comendador da mesma ordem.
No serão que fazia no estabelecimento não tinha luz acesa. Quando algum freguês lhe batia à porta, acendia um naco de vela e servia-o. Logo a seguir apagava a luz.
Fazia uma economia extrema, não somente no que lhe pertencia mas igualmente nos sectores que administrava. Em certa ocasião aumentou o preço do petróleo. Era então Presidente da Câmara. Solução: diminuir uma hora no horário da iluminação pública.
No entanto, trajava bem e tinha as indumentárias próprias para as ocasiões solenes. Fraque ou casaca e chapéu de coco ou de pelo.
Lembro-me dele como comerciante, já muito limitado, e como Presidente da Câmara. A ele se ficou a dever a concessão do terreno para o Campo de Jogos do Clube Desportivo Lajense, em 1922.
E para finalizar esta nota: Certo dia passava junto do estabelecimento do Senhor Comendador, quando ele me chamou e pediu-me para levar uma pequena saca com dinheiro, ao senhor Ouvidor, Pe. José Vieira Soares. Eram quinhentos mil reis, em moedas de prata, que ele oferecia à Igreja para a construção do retábulo do altar do Senhor Jesus, na Igreja de São Francisco, então a servir de paroquial. Estávamos na década de Vinte e a antiga moeda já não tinha o valor facial. Mesmo assim a dádiva representava algo de importante.
Estando em férias, fui ao seu funeral.
Mais poderia aqui trazer do comendador António Homem da Costa. Fico por estas notas apenas a recordar alguém que foi uma figura importante nesta vila, na segunda metade do século dezanove e primeiro quartel do século vinte.
É vasta a biografia do Comendador António Homem da Costa. Fico por aqui, lembrando uma personalidade que se distinguiu nesta terra que adoptou como sua.
Vila das Lajes
21 de Fevº. de 2010
Ermelindo Ávila
1) Álbum de Contemporâneos Ilustres. Fascículo 45. S/ data.
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