Chegou há dias a Primavera, Num gesto de simpatia apareceu o Sol a brilhar e a aquecer. Mas pouco durou. Hoje apareceu a chuva. A montanha do Pico está encoberta por um denso lençol de nuvens escuras. Nem apetece chegar à janela, pois as ruas estão desertas. Parece que o inverno voltou. E cá ficamos “amarrados” a esta cadeira que está em frente da mesa onde rabisco estas linhas para dar um pouco de expansão a este isolamento que me atrofia constantemente.
Quero escrever a crónica que prometi mas não me chega o assunto que desejo. O espírito paira em outros campos, que desconheço, porque por lá nunca passei.
Do correio chega a correspondência. Não é muita. Também mais não esperava, pois os meus velhos correspondentes vão desaparecendo aos poucos. Os que restam não têm por hábito escrever-me mas apenas telefonam, de tempos a tempos. Alguns jornais chegam, mas também o que trazem pouco interesse me desperta. São os crimes, as desavenças políticas, as revoltas em certas nações, os impostos que ora sobem ora descem para tornar a subir, as eleições que ocorrem ou se preparam em determinados países, e já a campanha anda na rua para o próximo acto eleitoral. E os bilhetes que os políticos vão enviando uns aos outros, demonstrando a sua incapacidade de governar com seriedade as nações que habitam. Presidentes que desfazem o lar por motivos de lana caprina, são capazes de governar uma nação? São capazes de publicar leis justas e de defesa da moral e dos sãos costumes? Mas isso acontece naquelas nações que outrora eram conhecidas como exemplares .
Deixemos, porém, essa política brejeira com os seus mentores que, embora se considerem os barões da ciência e da intelectualidade, não passam de aventureiros inexperientes, sequiosos do mando e das alcavalas que possam usufruir.
Os políticos de ontem, que por acaso morreram pobres e andaram de solas rotas, porque os proventos dos cargos mal davam para socorrer algum necessitado que a eles recorria, são classificados de destruidores da Nação que governaram. Os de agora são os grandes beneméritos e os salvadores da Pátria. Esquecem que encontraram os cofres cheios de ouro e que o esbanjaram, para agora andarem na pedincha…
Eu volto à minha janela. Olho o céu e aqui e ali descubro uns raios de sol. Lembro-me que hoje é sábado e que, segundo o velho ditado popular, “não há sábado sem sol…” Não continuo porque, infelizmente, hoje a parte final já não tem aplicação… O horizonte vai desanuviando e daqui a pouco teremos o pôr do sol. Será belo e esplendoroso como são habitualmente os pôr do sol primaveris e outonais?
Estou e sempre estive, desde o recuado momento em que vim ao mundo, numa ilha. Na frente tenho o Oceano, manso e belo no verão mas bravo e impetuoso no inverno. Além apresenta-se a bela montanha, que, durante o dia, oferece diversos aspectos, ora belos ora anunciando tempo agreste. A montanha que mal sabemos apreciar mas que os outros, nossos visitantes, param e nela se extasiam, está hoje coberta com o seu habitual manto de neve, branco, espelhento, a dar vida e encanto a quem a contempla. Depois, esses montes e vales verdejantes, outrora férteis no pão abundante que nos ofereciam, embora com algum trabalho e, que hoje são matagais abandonados onde viceja toda a casta de espécies daninhas. Mas, no seu conjunto, não deixam de nos dar paisagens luxuriantes e amenas, onde a vista se recreia e o espírito descansa na sua contemplação .
Nas encostas, um pouco distantes, por entre os arvoredos, descobrem-se as risonhas habitações dos nativos que por lá se fixaram há séculos e que, mercê do seu trabalho duro e cansativo, transformaram os lugares abandonados, alguns deles ainda com a vala vulcânica fumegante, em sítios de prazer onde levantaram as habitações, os centros de recreio, as pequenas igrejas onde se recolhem, em prece de agradecimento e petição. São as nossas pequenas aldeias, dispersas pelas encostas da ilha, onde vivem povos trabalhadores, sérios e honestos que, em trabalhos de mutua ajuda, vão fazendo progredir exemplarmente os lugares que habitam e deles não querem sair.
Hoje é sábado, como acima disse. Nas ruas não circulam os alunos da Escola Preparatória e Secundária. Ficaram pelas suas terras para voltarem na segunda-feira e para novamente circularem nos próximos cinco dias da semana escolar, como acontece durante todo o ano lectivo. Como eles alegram e dão vida a estas ruas e praças, que diariamente percorrem nos intervalos das aulas! E são os estabelecimentos comerciais – o supermercado, os cafés, as pastelarias e até os restaurantes que têm uma vida nova, que a todos eles empresta essa juventude brincalhona e hilariante. E são as ruas que se enchem de veículos dos funcionários dos diversos Serviços, que estacionam durante o dia enquanto os proprietários cumprem nos serviços os respectivos horários. Entristeço, porém, quando penso que todo esse movimento um dia desaparecerá e a vila irá entrar, maldosamente, nos estertores da morte…Principalmente quando a juventude for aliciada para outras zonas…
Vila das Lajes,
5 de Abril de 08
Ermelindo Ávila
Quero escrever a crónica que prometi mas não me chega o assunto que desejo. O espírito paira em outros campos, que desconheço, porque por lá nunca passei.
Do correio chega a correspondência. Não é muita. Também mais não esperava, pois os meus velhos correspondentes vão desaparecendo aos poucos. Os que restam não têm por hábito escrever-me mas apenas telefonam, de tempos a tempos. Alguns jornais chegam, mas também o que trazem pouco interesse me desperta. São os crimes, as desavenças políticas, as revoltas em certas nações, os impostos que ora sobem ora descem para tornar a subir, as eleições que ocorrem ou se preparam em determinados países, e já a campanha anda na rua para o próximo acto eleitoral. E os bilhetes que os políticos vão enviando uns aos outros, demonstrando a sua incapacidade de governar com seriedade as nações que habitam. Presidentes que desfazem o lar por motivos de lana caprina, são capazes de governar uma nação? São capazes de publicar leis justas e de defesa da moral e dos sãos costumes? Mas isso acontece naquelas nações que outrora eram conhecidas como exemplares .
Deixemos, porém, essa política brejeira com os seus mentores que, embora se considerem os barões da ciência e da intelectualidade, não passam de aventureiros inexperientes, sequiosos do mando e das alcavalas que possam usufruir.
Os políticos de ontem, que por acaso morreram pobres e andaram de solas rotas, porque os proventos dos cargos mal davam para socorrer algum necessitado que a eles recorria, são classificados de destruidores da Nação que governaram. Os de agora são os grandes beneméritos e os salvadores da Pátria. Esquecem que encontraram os cofres cheios de ouro e que o esbanjaram, para agora andarem na pedincha…
Eu volto à minha janela. Olho o céu e aqui e ali descubro uns raios de sol. Lembro-me que hoje é sábado e que, segundo o velho ditado popular, “não há sábado sem sol…” Não continuo porque, infelizmente, hoje a parte final já não tem aplicação… O horizonte vai desanuviando e daqui a pouco teremos o pôr do sol. Será belo e esplendoroso como são habitualmente os pôr do sol primaveris e outonais?
Estou e sempre estive, desde o recuado momento em que vim ao mundo, numa ilha. Na frente tenho o Oceano, manso e belo no verão mas bravo e impetuoso no inverno. Além apresenta-se a bela montanha, que, durante o dia, oferece diversos aspectos, ora belos ora anunciando tempo agreste. A montanha que mal sabemos apreciar mas que os outros, nossos visitantes, param e nela se extasiam, está hoje coberta com o seu habitual manto de neve, branco, espelhento, a dar vida e encanto a quem a contempla. Depois, esses montes e vales verdejantes, outrora férteis no pão abundante que nos ofereciam, embora com algum trabalho e, que hoje são matagais abandonados onde viceja toda a casta de espécies daninhas. Mas, no seu conjunto, não deixam de nos dar paisagens luxuriantes e amenas, onde a vista se recreia e o espírito descansa na sua contemplação .
Nas encostas, um pouco distantes, por entre os arvoredos, descobrem-se as risonhas habitações dos nativos que por lá se fixaram há séculos e que, mercê do seu trabalho duro e cansativo, transformaram os lugares abandonados, alguns deles ainda com a vala vulcânica fumegante, em sítios de prazer onde levantaram as habitações, os centros de recreio, as pequenas igrejas onde se recolhem, em prece de agradecimento e petição. São as nossas pequenas aldeias, dispersas pelas encostas da ilha, onde vivem povos trabalhadores, sérios e honestos que, em trabalhos de mutua ajuda, vão fazendo progredir exemplarmente os lugares que habitam e deles não querem sair.
Hoje é sábado, como acima disse. Nas ruas não circulam os alunos da Escola Preparatória e Secundária. Ficaram pelas suas terras para voltarem na segunda-feira e para novamente circularem nos próximos cinco dias da semana escolar, como acontece durante todo o ano lectivo. Como eles alegram e dão vida a estas ruas e praças, que diariamente percorrem nos intervalos das aulas! E são os estabelecimentos comerciais – o supermercado, os cafés, as pastelarias e até os restaurantes que têm uma vida nova, que a todos eles empresta essa juventude brincalhona e hilariante. E são as ruas que se enchem de veículos dos funcionários dos diversos Serviços, que estacionam durante o dia enquanto os proprietários cumprem nos serviços os respectivos horários. Entristeço, porém, quando penso que todo esse movimento um dia desaparecerá e a vila irá entrar, maldosamente, nos estertores da morte…Principalmente quando a juventude for aliciada para outras zonas…
Vila das Lajes,
5 de Abril de 08
Ermelindo Ávila
2 comentários:
Imagino daqui de longe como deve ser lindo ver o Pico com neve.
Espero que alguem nos mande umas fotos.
E da rua Direita, também com neve...
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