NOTAS DO MEU CANTINHO
Andou
em “discussão pública” o Plano Director Municipal. O segundo,
porque o primeiro foi elaborado e aprovado há anos.
Trata-se,
afinal, de um documento de interesse para os munícipes pois através
dele se acautelam os valores patrimoniais do concelho, o que bastante
importante é. Mas, nem sempre os documentos dessa natureza são
respeitados, alterando-se, aqui e ali, os princípios basilares.
Aqui
há anos, era o Plano de Urbanização de cada localidade que os
Municípios elaboravam para que as construções não fossem
implantadas a capricho dos seus proprietários e não ficassem, aqui
e ali, autênticos monstrengos que ainda hoje existem.
Durante
vários anos, esteve no salão e sala das sessões da Câmara, um
projecto de modernização
da vila onde o seu autor, entre outras
sugestões, indicava um arruamento que, ligando a rua do Saco com a
rua da Miragaia, vinha sair no centro da vila, permitindo, além da
possibilidade de construções urbanas, que houvesse um “escoamento”
das pessoas em ocasiões de “enchentes de mar”, vulgares naqueles
recuados anos. Além disso, propunha a urbanização da zona do
Juncal onde, durante muitos anos, esteve instalado o campo de jogos.
Mas isso não aconteceu. Só nos últimos anos se procedeu ao arranjo
daquele largo espaço. Mas parece que algo mais há ainda a fazer.
O
projecto da autoria de Lacerda Machado, que estava exposto em quadro,
desapareceu há vários anos. Nem dele me lembro. E, em vez do
arruamento previsto, foi permitida a construção de prédios urbanos
nas entrada e saída, impossibilitando-se que mais uma rua
valorizasse o traçado urbano da vila.
Há
prédios urbanos, na antiga Rua Direita que, pela sua antiguidade,
deviam ter sido classificados como imóveis de interesse público, e
que acabaram por ser abandonados, caindo em ruínas. Um deles vem do
século XVIII e é o prédio mais antigo da vila. Os outros são do
século XIX. (Segundo a tradição, para a
construção de um desses prédios o proprietário contratou um
ferreiro e, no fim do dia, contava os pregos que ele havia feito,
pois sabia quantas
pancadas do martelo na bigorna eram precisas para fazer um prego...)
Mas,
segundo informações que vieram a público, a vila parece que vai
deixar de ser o centro urbano, tal como aconteceu há anos, com a
vila de S. Roque, que transferiu
a sede para o Cais. O mais antigo centro urbano da ilha e com melhor
traçado arquitectónico, na opinião de urbanistas consagrados que
por aqui hão passado, vai tornar-se um simples subúrbio?
Em
artigo publicado no antigo jornal “As Lages”, o articulista que
se acoberta com as iniciais F.C. (Fernando Castro ?) escreve:
“O assunto de que vamos tratar hoje, refere-se à execução da
planta feita e oferecida à câmara municipal deste concelho, pelo
nosso ilustre patrício, capitão Francisco S. de Lacerda Machado,
sobre a projectada avenida que acompanha o muro que circunda a vila.
É certo que as vereações transactas se descuraram no embelezamento
da vila, mas também não convém que estas e as outras que virão,
sigam pelo mesmo trilho.1)
E no jornal de 15 de Novembro de 1914 - um
século é decorrido ! – escreve Lacerda
Machado: “Não se trata de aprovar este ou
aquele projecto, mas um qualquer, que seja maduramente ponderado e
que dê unidade de sequencia a tudo o que de futuro se construir ou
modificar”. E depois de referir o
alinhamento da avenida marginal e a arrematação dos terrenos
sobrantes, propõe: A verba proveniente da
venda dos terrenos poderia ser aplicada, por exemplo, na abertura
das Ruas do Saco e da Miragaia, ligando-as com a rua Nova e no
alinhamento da Rua Direita “. 2)
O
próprio jornal, a 15 de Março de 1915,
(ocorrem hoje cem anos) em artigo da
Redacção, analisa o assunto de maneira contundente, escrevendo: “É
inacreditável que nada de bom se pode fazer, no intuito de modificar
e melhorar as deficiências da planta actual da nossa vila, sem que
tudo obedeça a plano conscienciosamente elaborado. Fora desta norma,
nunca se poderá atingir o grau de beleza tão desejado para a nossa
vila, que como sede do concelho, de que tem o nome¸ é merecedora de
mais alguns benefícios e atenções.” 3)
Como
disse, um século é decorrido. Verdade que os municípios viveram
horas atribuladas, sem receitas e com dificuldades diversas,
incluindo as alterações políticas que os atingiram. Mas esse tempo
já passou há muito.
Será
que, decorridos estes anos todos, o PDM vai permitir um cuidado mais
atempado da mais antiga povoação da Ilha e sede de concelho ou,
pelo contrário, abandoná-la para criar outros centros urbanos? A
ver vamos.
________
- “As Lages”, nº13, de 13-10-1914
- Ibidem, nº 15 de 15-11-1914
- Ibidem, nº 23 de 15-3-1915
Lajes do Pico,
15-Março-2015
Ermelindo Ávila
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