A MINHA NOTA
Aproximava-se a festa do Menino Jesus. Raquel era uma
menina de poucos anos. Loirinha do cabelo, de olhos azuis, mãos
papudas e andar saltitante. Vivia quase só, pois era a filha única
de um casal já entrado em idade e que não aguardava outros filhos.
Daí ser o “aí-Jesus” da família, que não apenas dos pais.
Tinha umas tias, relativamente novas, que lhe faziam
todas as vontades. Nunca a contrariavam para que a menina andasse
sempre alegre e bem disposta.
Na escola - Raquel já frequentava o primeiro ciclo - as
colegas faziam-lhe todas as vontades, pois ela era amiga de todas as
companheiras e normalmente distribuía por elas daquilo que levava
para o seu lanche.
Um dia Raquel faltou à escola e as colegas foram
procurá-la em casa e saber do motivo da ausência. A razão era
simples: tinha-se magoado num pé, quando fora à praia tomar banho
com os pais e por esse motivo não podia calçar sapatos. E descalça
não saía de casa.
Todos os anos, quando se aproximava a festa do Natal, os
pais, em segredo, tinham por hábito preparar uma grande festa. A
pouco e pouco, costumavam adquirir objectos vários, para esse dia
que era celebrado com muitas festinhas, principalmente depois que a
Raquel deixara de ser bebé.
Contudo os brinquedos iam ficando para trás pois a
menina interessava-se agora muito mais por livros de histórias. E
lia com interesse as histórias do Tio Patinhas e outras mais. Mas
não guardava os livros. Tinha por hábito distribuí-los pelas
amigas que muito os apreciavam, dado que algumas delas eram pobres e
os pais não podiam comprar-lhes livros de estórias e era talvez
por isso que as amigas não lhe faltavam.
Raquel melhorou e voltou à escola e a brincar com as
companheiras amigas.
Mas um dia, quando menos se esperava, a fatalidade
chegou. A fábrica de lanifícios onde trabalhava o pai faliu e todos
os empregados foram despedidos. Só restou ao pai de Raquel e
companheiros, irem para o desemprego, uma situação angustiosa e triste
que nunca esperara. A mãe nunca trabalhara pois só se dedicava ao
serviço doméstico.
Escusado será dizer que nesse ano tudo foi diferente.
Quando chegou a Noite de Natal, quase nenhuns
brinquedos foram destinados à Raquel. Os livros de histórias
ficaram na Livraria, e a Raquel não recebeu nenhum. Como é
natural, ficou muito triste.
As colegas de escola, desconheciam a situação familiar
da amiga e andavam surpreendidas e sem compreender a atitude
da Raquel. Ela, nesse ano, como é compreensível, não teve os
livros de histórias para lhes dar, e na escola, já não repartia
com as amigas o pequeno lanche que a mãe lhe preparava com
sacrifício. Naturalmente que ficaram sentidas e afastaram-na um
pouco.
Quando a Professora soube a razão da atitude das
alunas, interveio muito discretamente. Fez às colegas uma larga
explicação da situação em que se encontravam os pais da Raquel e
outros mais, que haviam ficado desempregados, e aconselhou-as a
continuarem com a mesma amizade, pois ela estava a ser vítima de uma
situação muito amarga que atingia já muitas famílias daquela
zona.
E mais lhes disse: Que, como católicas que eram, todas
ou quase todas, pedissem ao Menino Jesus que interviesse na situação
amarga porque se estava a passar, para que os homens soubessem
encontrar soluções condignas e o emprego voltasse àqueles que só
dele viviam e sustentavam as famílias.
Mas foi então que o imprevisto aconteceu: Aceitando os
conselhos da Mestra, as colegas da Raquel resolveram juntar alguns
euros e com eles comprar um pequeno livro de histórias, que ela
tanto apreciava, uma pequena boneca e alguns doces, organizando assim
um pequeno cabaz de Natal que,
na véspera do grande dia, foram levar à Raquel. Escusado será
dizer a comoção que dela se apossou e dos próprios Pais, que não
sabiam como agradecer àquelas meninas o seu gesto tão carinhoso e
simpático e em dia tão lembrado.
E o Natal daquele ano não deixou de trazer à Raquel
alguma alegria, embora não tanta como nos anos anteriores.
Que o MENINO JESUS a todos traga um Natal Feliz, são os
votos sinceros que aqui deixamos.
Novembro,
2014
Ermelindo Ávila
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