domingo, 23 de novembro de 2014

A AGRICULTURA

NOTAS DO MEU CANTNHO



A Ilha do Pico, tal como as demais do Arquipélago dos Açores, são constituídas por terrenos que permitem uma normal e satisfatória produção agrícola. E foi assim desde os seus primórdios.
Quando os homens do Infante aqui aportaram, eram portadores de sementes de trigo que, deitadas à terra, permitiram boas colheitas. (Não assim na Povoação, onde as sementes produziram grossas canas, e nenhuma semente, dada a sua natureza excessivamente forte, como diz Gaspar Frutuoso.)
Mais tarde apareceu o milho, trazido dos Estados Unidos onde os índios o cultivavam, com pouco esforço e grande êxito, para a sua alimentação.
E foi o milho, por mais produtivo, que substituiu o trigo, cereal de produção mais delicada e a exigir um tratamento mais cauteloso, principalmente pela praga que o procurava e devastava.
O milho passou a ser a base da alimentação e, por isso, quando os temporais devastavam os milheirais, a fome atingia quase toda a população açoriana, obrigando à importação do cereal de outras terras.
Havia mesmo o ditado: boa colheita, ano farto.
O trigo só era cultivado especialmente quando o casal “levava a coroa” e pouco mais. Todavia, normalmente, a casa do lavrador fazia a sementeira de um determinado terreno – o serrado do trigo – para ter farinha de trigo para a “mistura” da massa de milho, para utilizar o pão de trigo nas matanças e em certas e tradicionais festividades, quer religiosas quer domésticas.
Hoje, nem milho há. Tudo é importado, não só porque falta a mão de obra para trabalhar os campos - os trabalhadores rurais ou emigram ou passam a exercer outras profissões, - e os terrenos ficam abandonados, ou porque é mais fácil e menos trabalhoso, utilizá-los em pastagens para o gado.
Todavia, causa pena ver para aí tantos terrenos abandonados e ocupados por uma vegetação selvagem que quase chega às ruas por onde transitamos.
Não há muitos anos, v.g., toda a encosta leste da vila das Lajes era utilizada na cultura do milho . E produzia moios...
Nessa época, os proprietários faziam a colheita, por vezes com a ajuda de vizinhos e amigos, e arrecadavam o cereal em recipientes apropriados – as barricas, os depósitos de ferro zincado, os arquibancos, para ser utilizado durante o ano. Por cá não se utilizava o sistema de “burra”, como em outras ilhas.
Já Júlio Dinis, em “As Pupilas do Senhor Reitor”, há mais de cem anos, nos descrevia a Esfolhada como um acontecimento tradicional da Província portuguesa, tal como nestas ilhas acontecia.
Hoje tudo se perdeu. Os terrenos estão abandonados. A ilha do Pico, não passa de uma mata de espécies daninhas. As culturas, praticamente, desapareceram, para se importar, do continente e/ou do estrangeiro, tudo o que é indispensável à subsistência das pessoas. Mas não passa de um sistema errado, para o qual as entidades oficiais têm de voltar a sua atenção. Não basta aproveitar os terrenos baixos para a produção de forragens para o gado leiteiro ou de exportação. Há que pensar na população em geral e facilitar-lhe a produção ou a aquisição dos elementos essenciais à sua subsistência.
Quando chegará o tempo, em que os terrenos sejam aproveitados em culturas e a ilha deixe de ser um todo, onde só aqui e ali se vêem alguns campos de vinha e raros de semeadura, e no seu conjunto, um matagal imenso de faias e incensos?
Não verei esse dia, pois pelas premissas actuais se podem tirar as conclusões. E as conclusões são tristes e amargas.
Repito: Há que voltar ao princípio e arrotear os terrenos, utilizando-os em culturas necessárias à alimentação do ser humano: o milho, a batata branca ou doce, a hortaliça, os primores agrícolas, as fruteiras!... Que excelente era a fruta! - os figos, as uvas, as peras e maçãs, as laranjas, que na Ilha se produzia e os Barcos do Pico, no verão, levavam para as outras Ilhas!...
E, a propósito, há que trazer ao de cima as precárias instalações dos serviços agrícolas nesta vila. Ocupam um barracão construído aquando da construção da muralha de defesa da Lagoa, para os serviços de ferreiro e carpinteiro e devia ter sido demolido na altura da conclusão das obras. Mas ficou e continua. É tempo de estarem aqueles serviços condigna e convenientemente instalados para que possam promover o fomento agrícola desta parte da ilha, a mais rica em terrenos aráveis, e terem a autonomia que ainda agora merecem.
Já o disse e continuo a afirmar: os serviços agrícolas devem estar instalados no Sul e nunca, como julgo, afastados, num extremo inóspito da Ilha. Não será tempo de acabar-se com a política bairrista e de se fazer justiça?...
Finalmente, uma pergunta que pode parecer incómoda, mas que é inofensiva: Os titulares do Sector Agrícola da Região, conhecem a parte da ilha que vai da estrada transversal à Ponta da Ilha? Já calcorrearam suas pastagens montes e vales? Valia a pena.
E quedo-me aqui. Não careço de resposta.
Lajes do Pico, 29-l0-2014

Ermelindo Ávila 

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