NOTAS
DO MEU CANTINHO
Chegámos
ao mês de Junho, o mês da alegria. Este ano é mesmo em cheio. No
segundo domingo é o dia de Pentecostes, e nele principiam os
“impérios”, com excepções do sábado anterior e do dia de S.
Mateus, em que se realizam, na Silveira e naquela freguesia, impérios
com distribuição de pão e rosquilhas, respectivamente, em
cumprimento de votos feitos por ocasião das erupções vulcânicas
de 1718 e 1720, que tanto abalaram as gentes do Sul do Pico.
No mês de
Junho, para além das festas tradicionais de Santo António, São
João e São Pedro, na ilha do Pico têm lugar os “impérios do
Espírito Santo” .
Escreve
Lacerda Machado:”No ano de 1523
desenvolveu-se na ilha de S. Miguel uma desoladora peste, que
ocasionou 2.000 vítimas e se comunicou ao Faial no mês de Julho. O
pânico foi geral em todas as ilhas e os povos aterrados recorreram a
preces públicas, procissões e invocaram em especial o Espírito
Santo, prometendo distribuir pelos pobres anualmente, pela festa de
Pentecostes, as primícias de seus frutos, se escapassem do terrível
flagelo, que se não comunicou ao Pico. – Instituíram-se
irmandades em honra do Espírito Santo, celebrando-se em seu louvor
bodo solenes, com folias e bailes ao uso do tempo.”(1)
Com as
excepções atrás referidas, os impérios realizam-se na ilha nos
três dias do Pentecostes e no domingo seguinte, ou domingo da
Trindade.
Segundo
investigação publicada pelos jornais picoenses, Jornal
do Pico e Ilha Maior,
respectivamente das vilas de S. Roque e Madalena, realizam-se na ilha
do Pico 45 impérios. Nesses dias há jantares para cerca de vinte
mil convidados, e rosquilhas, pão ou vésperas, consoante as
localidades, para quarenta a cinquenta mil pessoas, aproximadamente.
Nos impérios distribuem-se cerca de trezentas mil vésperas. Em
alguns impérios mantêm-se a tradição de distribuir pão de “água”
ou de “ovos”, como é o caso da Silveira e Ribeira do Meio. No
lado Sul da Ilha, da Calheta à Madalena, faz-se a distribuição de
rosquilhas e, na parte Norte, de “vésperas”, um bolo especial,
de fabrico trabalhoso mas muito apreciado.
Quaisquer
que sejam, todas as “vésperas” são bastante apreciadas, não
somente pelos residentes como também por quantos se deslocam ao
Pico, nessa época.
Na
realidade os dias do Espírito Santo são os dias da autêntica
Caridade, Fraternidade e Partilha. Todos os picoenses, remediados ou
pobres (que ricos quase não existem) terão pão com fartura em suas
mesas e em muitas haverá também a carne que, além da utilizada nos
jantares, é distribuída ou em cumprimento de promessas ou até
mesmo e só em louvor do Divino Espírito Santo.
O tempo do
Espírito Santo é, na verdade, época festiva, onde reina a paz, a
amizade, a fraternidade, em “nossa casa” e em “casa do
vizinho”. É para além de tudo, o tempo da partilha, que não deve
ser esquecido.
Sobre o
culto popular ao Espírito Santo diz o Doutor Hélder Fonseca Mendes
no seu douto e erudito trabalho, “Do
Espírito Santo à Trindade” um dos mais
profundos tratados sobre a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade,
na opinião autorizada de um crítico teológico:
“Pelos
ritos e símbolos, dá-se uma comunicação e auto-comunicação
comunitária unificadora; dá-se uma renovação das relações
comunitárias e das tarefas e compromissos comuns; manifesta-se a
identidade da “communitas”
e a identificação dos membros com ela, relembrando os valores
comuns, actualizando os sentimentos de pertença; cresce-se na
igualdade e fraternidade, em equilíbrio e abertura criadora;
articula-se e estrutura-se a própria vida da comunidade, sobre os
seus sinais visíveis celebrativos de referência, segundo os
diversos papeis e funções.”
(2)
E em
“Conclusões” escreve o mesmo distinto Autor:
“As
razões para a permanência do culto nos Açores devem-se ao facto
destas festas serem as que melhor permitem o entendimento entre os
diversos povoadores e se enquadram num espírito de solidariedade
necessário na luta contra as dificuldades (...).” (3)
Os
açorianos, em todas as ilhas e até aqueles que vivem na Diáspora,
estão a viver estes tempos do Espírito Santo de uma maneira muito
especial e peculiar. A ementa dos jantares é a mesma por toda a
parte. O cerimonial litúrgico não difere. Apenas os cortejos se
adaptaram aos próprios meios onde se realizam, por razões muito
especiais. Mas, acima de tudo, está o louvar ao Senhor Espírito
Santo. Bem hajam!
_______
- Lacerda Machado, F.S., “História do Concelho das Lages”, 1939, pág.127.
- Mendes, Hélder Fonseca, “Do Espírito Santo à Trindade, Um Programa Social de Cristianismo Inculturado”, 2006, pág. 231.
- Ibidem, pág. 257.
Lajes do
Pico,
Junho de
2014
E. Ávila
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