sábado, 18 de janeiro de 2014

O ANO QUE COMEÇA...

Notas do Meu Cantinho



Entramos no ano dos centenários. Um ano que começa por lembrar o crime de Sarajeve de que resultou o assassínio do príncipe herdeiro do trono austro – húngaro, Francisco Fernando e sua mulher. Não havia trinta anos que terminara a guerra franco - prussiana. E foi a Alemanha que declarou guerra à França e à Rússia. À França aliou-se a Inglaterra e depois a América. Nessa Grande–Guerra, como foi denominada, tombou um Lajense, então emigrante nos Estados Unidos. Um outro ficou gravemente ferido e, quase por milagre, não ficou nos campos da batalha. Mas muitos portugueses, por lá ficaram, principalmente, na célebre batalha de 9 de Abril.
A Grande Guerra terminou quatro anos depois. Lembro-me ainda do foguetório que aqui houve quanto se soube, por um telegrama de Agência Noticiosa, que havia terminado a guerra aquele monstro, que se sustenta das fazendas, do sangue, das vidas, e, quanto mais come e consome, tanto menos se farta, no dizer do Pe. António Vieira (1).
Mas, afinal, outra guerra, mais terrível, havia de rebentar em Setembro de 1938, - vinte anos depois! – e que fez desaparecer tantas vítimas inocentes. Na memória de muitos ficaram os tenebrosos campos de concentração, autênticas câmaras da morte para milhares de judeus inocentes. Procuro esquecer o que me foi dado ver num desses campos de morte que ficaram como testemunhas vivas das atrocidades cometidas pelo criminoso Hitler.
Portugal não combateu na segunda grande guerra mundial, 1939-1945. Todavia, não deixou de suportar os efeitos desse monstro cruel, na limitação de géneros, na penúria que viveu e que deixou sinais bem profundos na economia da maioria dos portugueses. “O pai não tinha seguro o filho, o rico não tinha segura a fazenda, o pobre não tinha seguro o seu suor, o nobre não tinha segura a honra, o eclesiástico não tinha segura a imunidade, o religioso não tinha segura a cela, e até Deus nos templos e nos sacrários não estava seguro”. E não foi hoje que o Pe. António Vieira isto proclamou (ou escreveu) num dos seus sermões (1) entre 1608 (seu nascimento) e 1697, ano do seu falecimento.
O mundo vive, presentemente, uma crise moral, social, económica e financeira. Tal, ou bem pior, como aquelas que vivemos e suportamos no século passado, quando as guerras assolavam impiedosamente a humanidade. As acções criminosas sucedem-se. A fome atinge muitas famílias. Nas cidades, principalmente, encontram-se já dezenas ou centenas de seres humanos, os sem-abrigo, a viver na rua. As crianças, aos bandos, a percorrer as localidades, mendigando um naco de pão. E as sopas dos pobres vão debelando, aqui e ali, a fome que muitos atinge. E os governos, fingindo alheamento a tanta miséria, continuam a despedir empregados, a diminuir salários, a reduzir pensões, a criar impostos e as alcavalas suplementares.
Durante e mesmo depois da guerra de 1914, também muito sofreram os povos, com a penúria dos géneros que escasseavam. E até havia um dito do povo: Todos os navios que aparecem no horizonte são os navios do trigo. Mas, raramente, este e outros cereais aqui chegavam. E o povo gritava: Se há para aí quem tenha lixo / ou moinha p´ra vendar / ou cascas de ovos / milho ... faz favor de me dizer/ - pão, pão, pão, pão ...
Na guerra de 1939, os submarinos alemães, dizia-se, acostavam à ilha e daqui levavam a carne, a manteiga, e outros géneros e, no alto mar, recebiam peixe dos barcos de pesca em zonas previamente combinadas.
E o racionamento era de tal grandeza que funcionavam as senhas, distribuídas pelas autoridades administrativas, para o fornecimento do petróleo, do açúcar, da farinha, e não sei que mais. Uma carestia de vida angustiante e dolorosa.
Hoje não temos guerras com armas, por estas bandas. Mas os povos não deixam de suportar as restrições atrozes que lhes são impostas de governos que apregoam ser do povo e pelo povo. Uma autêntica farsa.
Estamos chegados a um novo ano. As perspectivas são tristes e causam angústia pela incerteza do dia que segue.
No entanto, aqui deixamos o nosso voto muito sincero, fraternal e amigo de que todos tenham um ano novo muito feliz.

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  1. Vieira, Pe. António – Sermões, vol. 2º.

Vila das Lajes, Ilha do Pico,
Jan. 2014

Ermelindo Ávila.

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