NOTAS DO MEU CANTINHO
O
Carnaval ou Entrudo está na memória das gentes, principalmente
daqueles que já passaram à idade dos patriarcas. Não faz mal, por
isso, recordar esses tempos de diversão e festa popular em que as
pessoas, de quase todas as idades, se divertiam de maneira ordeira e
sem ofender terceiros.
Em
poucas semanas estamos no mês do Carnaval. Quatro semanas que
antecedem a Quaresma, mas que, talvez por isso, eram de dar largas à
alegria prazenteira, antes que o tempo da penitência e do jejum
chegasse. Isto para os católicos que, nestas bandas, eram a
totalidade das pessoas. E aqui vale a pena recordar que, no ano de
1875, a população da paróquia da Santíssima Trindade, constituída
por quase três mil pessoas, de ambos os sexos e idades, e de todas
as condições sociais, e segundo o “Rol dos Confessados”,
cumpriu o dever da desobriga pascal. Ninguém faltou!
O
Carnaval iniciava-se com a “quinta-feira
de amigos”. Um dia
especial em que os amigos se reuniam para a tradicional ceia.
E
depois vinham as outras: quinta-feira
de amigas, compadres e comadres. A
seguir eram o
Domingo de Entrudo, também designado
Domingo Gordo e os
dois dias seguintes a festejar o rei mono, que a Quarta-feira, ou
Quarta feira de Cinzas, davam início à Quaresma.
Numa
rubrica do Missal Romano, consta a seguinte informação: “Nos
primeiros séculos da igreja, os cristãos, que haviam prejudicado a
comunidade cristã com escândalos públicos, expiavam-nos, durante a
Quaresma.” E depois: “Na sociedade moderna, em que tudo se
permite e tudo se procura contestar, não só se está a perder a
consciência das repercussões sociais do pecado, como também o
próprio sentido do mesmo.”
Felizmente
que, por estes lados, o Entrudo não tem sido motivo para grandes
distúrbios.
Na
freguesia da Piedade, há a tradição do “Bando” ou o
“Testamento do Burro”, com a distribuição dos seus membros e
órgãos pelos parceiros mais contestatários. E não passa de cena
hilariante.
Por
aqui, que me lembre, somente um caso fortuito, nos anos trinta.
Porque os figurantes punham a ridículo o clero trajando vestes
talares e procurando desconhecer um edital da Autoridade
Administrativa que isso proibia, aquela autoridade mandou-os prender
e passaram uma noite na cadeia. Porém, no dia imediato, foram postos
em liberdade e nada mais aconteceu.
Os
ditos mascarados, (muitas vezes nem máscara usavam)
aproveitavam
factos ocorridos no ano, até mesmo familiares, para os trazer a
público de maneira jucosa, mas sem referir nem locais nem pessoas.
Serviam de divertimento sem, contudo, ridicularizarem, directamente,
as pessoas. Note-se, porém, que nas danças não entrava o elemento
feminino. Eram os homens que trajavam de mulheres a fazer o papel
destas. Outros tempos...
Nos
chamados dias de Entrudo exibiam-se, pelas localidades, danças com
argumentos picarescos que causavam a hilaridade dos assistentes. Por
vezes, percorriam as freguesias da ilha e, simultaneamente,
aproveitavam para entrudar, enviando farinha àqueles que se
aproximavam. Não era costume usar água, até porque esse líquido,
naqueles recuados tempos, não abundava. Outros, mais
cerimoniosamente,
usavam pó
de arroz...
As
danças, os jogos ou encontros de carnaval davam-se durante o dia,
mais propriamente na segunda e terça-feira. À noite, era nas casas
que recebiam máscaras, que se juntavam as famílias, os vizinhos e
amigos para “ver mascarados”. Aí não se “entrudava”. Só
se viam as máscaras ou se bailava, normalmente a chama-rita e,
ainda, os “bailes de roda”, danças antigas de grande efeito e
exibição artística, um tanto difíceis de executar e que,
praticamente, desapareceram.
Hoje
o Carnaval é “festejado” nas
boites. E parece que
não faltam frequentadores.
Lajes
do Pico
Jan.
2014
Ermelindo
Ávila
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