Notas do meu cantinho
Estamos na Páscoa. A Quaresma passou, assinalada com
alguns actos litúrgicos, celebrados pelos católicos, como preparação para a
celebração do grandioso acontecimento: a Ressurreição de Cristo, depois de
sofrer o martírio do Calvário – Sua Paixão e Morte. Ele, de facto, disse que
havia de ressuscitar ao terceiro dia.
É esse acontecimento histórico que a
Igreja celebra todos os anos, com mais ou menos esplendor litúrgico, consoante
as disponibilidades eclesiásticas.
As Domingas que antecedem a Páscoa da
Ressurreição eram tempos de luto e penitência. Os párocos começavam por
organizar, anualmente, o chamado “roteiro paroquial”, ou seja o registo de
todas as famílias, com a descrição do estado, profissão e idade de cada membro,
anotando se era crismado e se cumprira, no ano, os preceitos de confissão e
comunhão. O roteiro ou “Rol dos confessados no ano de 1886”, diz-nos que, nesse
ano, a freguesia da Santíssima Trindade das Lajes do Pico – do Soldão às Terras,
pois ainda não havia sido criada a paróquia de S. Bartolomeu – tinha 1142
indivíduos do sexo masculino e 159l do sexo feminino, 251 menores de sete anos
do sexo masculino e 245 do sexo feminino. A população total era de 3.229
indivíduos. Nesse ano, como aliás se verifica, geralmente, nos
demais,
nenhum paroquiano deixou de cumprir os preceitos quaresmais (confissão e
comunhão), o que não deixa de ser assombroso.
Para facilidade do serviço de
confissões, a paróquia era dividida em “quartéis” diários, reunindo um grupo de
famílias, segundo o número dos seus membros. Esse era um dia considerado “dia
santo” na família. Só se trabalhava o indispensável.
As semanas de Quaresma eram verdadeiros tempos de
recolhimento e penitência. Os adultos trajavam, geralmente, de escuro. As
crianças não brincavam com certas modalidades de jogos, principalmente o pião,
que só
era
usado depois do sino da Igreja, em repique festivo, anunciar a Aleluia Pascal.
Durante a Quaresma assistia-se com
maior assiduidade aos actos religiosos e, aos domingos à tarde, à Via-Sacra
solenizada com cânticos apropriados.
Na quinta-feira e sexta-feira realizavam-se, à noite,
as Matinas, com grande solenidade. Eram executadas partituras clássicas com os
músicos da
capela
local auxiliados pelos melhores cantores da Ilha. A concorrência era sempre
notável em todas as celebrações.
A procissão do Senhor Morto da
Sexta-feira fazia-se pelas ruas da vila, acompanhada pela Filarmónica local que
executava algumas marchas fúnebres. Nos intervalos, uma menina seguida por três
companheiras, cantava a “Verónica”. Depois o coro da Matriz entoava o
“Miserere”. A Procissão da Ressurreição, que tinha lugar logo ao amanhecer,
antes da Missa solene, igualmente, percorria as ruas do burgo enfeitadas com
artísticos tapetes de flores e verduras.
No sábado, só após o anúncio da Ressurreição, era a
ocasião dos adolescentes e jovens experimentarem os seus novos piões, numa luta
renhida que atraía a curiosidade dos mais adiantados em idade. Costumes que
igualmente deixaram de existir.
Lembrar a festa da Páscoa é trazer à
memória dos mais idosos uma época singular, vivida com piedade e respeito,
sempre no propósito de recordar com sentimento e fé a Morte do Senhor Jesus que
ao mundo veio para redimir a Humanidade da desobediência de nossos primeiros
Pais – Adão e Eva. Vem nos livros históricos - A Bíblia - e ainda hoje ninguém
se atreveu a duvidar da sua autenticidade.
Mas algo foi mudado pelas normas litúrgicas vindas do
Concílio Vaticano II. Facilitou-se a
vida mas isso não evitou que a prática religiosa viesse a cair quase no
desconhecimento e ignorância da generalidade das pessoas.
Boa e Santa Páscoa!
Lajes
do Pico, 11 de Março de 2013
Ermelindo Ávila
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