quinta-feira, 6 de março de 2008

OS IRMÃOS BULLAR'S

Precisamente há 170 anos chegaram aos Açores, “depois de uma tormentosa viagem de vinte e três dias, os irmãos Drs. Joseph e Henry Bullar, para aqui se demorarem “Um Inverno nos Açores e um verão no vale das Furnas”, titulo do diário que escreveram e que veio a ser traduzido, já em 1948, pelo Dr. João Hickling Anglin. Tem prólogo do Dr. Armando Cortes-Rodrigues.
Os Irmãos Bullar’s chegaram ao Faial no dia 15 de Abril e no dia 8 de Maio “Partiram ao meio dia do Faial para o Pico num barco que faz a travessia do canal, barco grande, tosco e por acabar no interior, com duas velas latinas estendidas em varas que mais se assemelhavam a ramos de árvores descascados.”
“A casa, que por amabilidade de Mr. Dabney, (consul americano), fora posta à nossa disposição, está um pouco acima do desembarcadoiro.” Pelo que se deduz do texto, devem ter desembarcado na Areia Larga, pois, dizem: ”Fomos a pé até à vizinha vila da Madalena, a principal povoação da ilha (sic), por uma vereda de areia grossa entre rochedos da costa de um lado e terrenos de vinha, negros e rochosos, do outro.”
A Igreja da Madalena, a meio da praça, está sem torre nem campanário, “assemelhando-se mais a um armazém abandonado do que às bem conservadas igrejas destas ilhas…”
Fazem larga referência ao vinho, “o melhor do que em qualquer das outras ilhas.” Aludem ao “vinho de estufa”, por ser preparado em estufa ou coisa semelhante e exportado em grandes quantidades para a Inglaterra e América. E acrescentam: “No nosso pais, embora os importadores o conheçam por “vinho do Faial”, é em geral procurado por consumidores incautos, sob o agradável rótulo de xeres. Além disto, produz-se grande quantidade do vinho vulgar do Pico…” Em nota de rodapé referem que “se remetem todos os anos do Pico para o Faial, 25 mil cascos de vinho para exportação.”
Queixavam-se de que não havia cavalos, mulas ou burros para alugar, pois “o forasteiro que não seja andarilho, não poderá dar a volta à ilha e, mesmo assim se o fizer, corre o risco de não arranjar cama nem poisada para a noite, visto não existirem nem hospedarias nem outros alojamentos.” Isso impediu que conhecessem toda a ilha, pois os caminhos tortuosos não eram convidativos a grandes caminhadas. Ficaram todavia, presos à casa que lhes foi cedida, contemplando as vinhas e saboreando os vinhos que, mesmo assim, não eram muito do seu grado. “O piso da lava, de cor parda, apresentava regos regulares, abertos pelas rodas dos carros de bois; os muros de pedra, de cada lado do caminho, tinham a mesma cor sombria e, na frente, recuando à medida que avançávamos, a montanha, coberta de uma rede de pedras negras, projectava para as nuvens soturna cor de azeitona.”
No dia 9 de Maio, acompanhados de dois guias, partiram para a subida da montanha. Um dos guias, natural do Pico, vivera na América e falava inglês. O outro guia era um homem casado que também estivera entre americanos e sabia algumas palavras de inglês.
Chegaram ao cume da Montanha mas, muitas milhas de neblina se acumulavam sobre o oceano, ocultando por completo as ilhas Terceira e Graciosa. No entanto, “livres de nuvens, viam-se claramente as ilhas do Faial e de São Jorge”. Pessoas amantes do maravilhoso dizem que, em dias muito claros, se enxerga do Pico a ilha distante de São Miguel”.
Os visitantes ingleses estranharam os diferentes trajes que encontraram nas ruas da Horta. E descrevem: “Alguns aldeões do Pico vestem-se inteiramente de vermelho. Usam jaqueta curta de estamenha, vermelha, colete e calções do mesmo tecido e cor, com polainas abotoadas sobre os pés. Estes andam descalços ou cobertos de sandálias de coiro (onde não raras vezes ficaram restos do pêlo do boi), atadas sobre o dedo grande.
“Parece, porém, que o receio do ridículo inibe estes homens de visitarem o Faial, onde os seus trajes tanto chamam a atenção e de tal modo dão motivo a troças que raramente eles se dispõem a submeter-se à prova; “e como é apenas numa parte do Pico que os habitantes se vestem por aquela forma, sucede que eles dificilmente são vistos no Faial.”
Nota-se aqui uma certa contradição, pois anteriormente haviam escrito: “Nas ruas, a que os trajes da gente do campo e dos pobres da cidade dão um ar alegre, nota-se muita animação”.
Hoje seria diferente. As modas modificam os trajes quase todas as épocas. Aquilo que ontem era simples traje do trabalhador do campo, parece que passou a ser para uma maioria, e não apenas da juventude, quase o vestuário de luxo. Usar uma calça ou uma jaqueta de ganga, mesmo com um remendo nas joelheiras, é moda e fica bem!… Se voltassem a estas paragens os Irmãos Bullar’s que diriam ?!

Vila das Lajes,
1 de Março de 2008
Ermelindo Ávila

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