quinta-feira, 8 de junho de 2017

“O DEVER” E O SEU FUNDADOR

NOTAS DO MEU CANTINHO
                                  
            Nestes dias em que se comemora os cem anos de existência do semanário “O Dever” não é possível falar do jornal sem se recordar a memória saudosa do seu fundador, Pe. João Vieira XAVIER MADRUGA.
            Tão ligados estiveram enquanto o Pe. Madruga foi vivo, que não é fácil ignorar a sua existência e o que foi para o jornal que fundou, dirigiu e manteve com entusiasmo, dedicação e sacrifício.
            Sacrifício, porque era quase só o redactor. Escrevia o editorial, a crónica, o noticiário. Fazia a revisão e orientava a paginação. Afinal, era o director, o redactor, orientador da composição e o mais que necessário era. Todas as suas economias iam para o jornal, uma vez que os assinantes ou não pagavam, ou a assinatura era insuficiente para as despesas do ordenado do tipógrafo, da compra do papel e tinta e o mais necessário.
            Como uma parte da tipografia ficasse atrás aquando da transferência do jornal para esta vila das Lajes, uma vez nos Estados Unidos, lá adquiriu uma Minerva e uma guilhotina para que se pudessem executar na tipografia, além do jornal, outros trabalhos tipográficos.
            O P. Madruga era um jornalista distinto, dos mais distintos de Portugal. “O Dever” foi considerado, na opinião do Conselheiro Fernando de Sousa, director da “Voz”, o melhor Semanário Português.
            Todos os dias o Pe. Xavier Madruga vivia para o jornal. Tinha um sistema de vida extraordinário. Celebrava Missa muito cedo, mesmo quando estava recolhido a casa, pois havia conseguido, da Santa Sé, autorização para celebrar na sua residência, almoçava normalmente e ficava no seu pequeno escritório, lendo os jornais que lhe chegavam de todas as ilhas e alguns do continente, por permuta, escrevia o editorial (ou fundo), o seu “Cá e Lá” nota crítica dos acontecimentos nacionais e internacionais, as notícias que lhe levavam, e os artigos de interesse local. A ele se deve o reinício das obras da igreja Matriz, suspensas com a proclamação da República, a construção e o calcetamento da Estrada Lajes – Piedade, a muralha de defesa das Lajes e tantos outros mais que é fastidioso estar a lembrar.
            Quando as forças o foram abandonando, preferiu transferir o jornal para a Paróquia, no desejo bem firme de lhe dar continuidade.
            “O Dever” foi o jornal onde muitos jovens principiaram as suas actividades jornalísticas. Recordo alguns: Dr. Manuel Rocha, Samuel Amorim, Dr. Fernando Maciel, Pe. José Carlos, José Gabriel, além de diversos alunos e ex-alunos do Seminário de Angra, e outros do Liceu da Horta ou do externato das Lajes do Pico, pois a todos acolhia com estima e ajudava-os a ingressarem na actividade.
            Ao terminar o curso do Seminário, o P. Xavier Madruga foi nomeado professor e prefeito do mesmo instituto. Entretanto, e a pedido de Mons. Ferreira, mantinha assídua colaboração no “Peregrino de Lourdes”.
            Por ocasião do seu falecimento, em 30 de Março de 1971, escreveu o “Boletim Eclesiástico”: ”Além da cura de Almas que exerceu com proficiência, dedicou-se às lides jornalísticas, fundando o jornal semanário “O Dever” que dirigiu na qualidade de Director, durante 53 anos. Salientou-se pela sua dedicação e consagração à Igreja e, sem respeito humano, propagou sempre a verdade duma forma clara e integérrima. O seu estilo fluente e acessível proporcionou aos seus leitores uma leitura agradável e proveitosa. Prestou sem dúvida um relevante serviço à Igreja e honrou a Diocese de Angra ao longo da sua vivência sacerdotal.”
            Aquando da ocorrência do centenário do nascimento do P. João Xavier Madruga, o então Bispo da Diocese de Angra, D. Aurélio Granada Escudeiro, escreveu no “Boletim Eclesiástico”: “Vejo nele (P. Xavier Madruga) o sacerdote culto, zeloso e persistente em seu múnus pastoral, utilizando os meios ao seu alcance.
            Entre estes meios esteve “O Dever”, folha pequena, despretensiosa e sem especial apresentação, iniciada em S. Jorge, onde então paroquiava o Pe. Xavier Madruga, transferida mais tarde pelo seu director e proprietário, para as Lajes.
            Cresceu depois, alargou o seu âmbito, sendo hoje “O Dever conceituado órgão de imprensa regional, nomeadamente do Pico. (…) Sirva o exemplo do Pe. Xavier Madruga de conforto e estímulo a quantos, limitados em meios, desejarem alargar sua acção e levar a todos uma palavra de luz e um aceno de amor fecundo (…) Aproveitarei esta oportunidade – recordando o encontro que tive, há anos com o Pe. Madruga nas Lajes – para sublinhar os bons serviços prestados por ele e por toda uma plêiade de sacerdotes nascidos nestas ilhas.
            Aquando da celebração das “Bodas de Ouro sacerdotais, em 5 de Novembro de 1955, que tiveram a presença do Cardeal Dom José da Costa Nunes, seu amigo ex-corde a Câmara Municipal homenageou o P. Xavier Madruga, descerrando uma placa, na rua onde nasceu e sempre viveu, com a denominação de Rua Pe. Xavier Madruga.
            Como já anteriormente escrevi, é pouco. Algo mais importa fazer.
            Lajes do Pico
            30 de Maio de 2017

            Ermelindo Ávila

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