NOTAS DO MEU CANTINHO
A Quaresma
está a findar. No próximo domingo, celebra a Igreja Católica o dia
em que Jesus Cristo entrou triunfalmente em Jerusalém, depois haver
jejuado quarenta dias no deserto.
Antigamente,
o povo cristão denominava as domingas da Quaresma com títulos mal
definidos e cujo significado não nos foi possível averiguar: Ana,
Bagana, Rabeca, Susana, Lázaro, Ramos, na Páscoa estamos.
Seja como for, os cristãos respeitavam o tempo quaresmal, com jejuns
e abstinência de carnes; um tempo forte de penitência, preparatório
para a Festa da Ressurreição. Era, sobretudo, o tempo da desobriga
pascal: Confessar-se ao menos uma vez cada ano
(Cânone 989) “ e receber a Eucaristia ao menos uma vez em cada
ano, se possível no tempo pascal...” (Catecismo da Igreja
Católica, nº 1319).
No
primeiro domingo de Quaresma era tradicional a Procissão de
Penitência, com as imagens do Bom Jesus, ou Senhor Jesus das Preces,
como tradicionalmente é conhecida a imagem do Senhor Crucificado
que, segundo a história, foi arrojada à praia desta vila aquando da
reforma protestante da Inglaterra, por volta de 1550-1560 (1).
De recordar também que foi em 1864 que, - no primeiro domingo de
Quaresma que nesse ano ocorreu no dia 14 de Fevereiro, - saiu pela
primeira vez a Filarmónica Lajense. (No corrente ano celebra 150
anos de existência.)
Na
procissão de Penitência incorporava-se o andor duplo com Santo
Elisiarco e Santa Delfina, (os bem-casados, dizia o povo) e o andor
de S. Francisco de Assis. Terminada a procissão havia o Sermão de
Calvário. Na Igreja armava-se um “calvário” em verdura de
cedro, na Capela mor, onde era colocado um Crucifixo, e sobre o
estrado de verdura as insígnias da Paixão do Senhor: a lança, o
escadote, a corda. No terceiro domingo, realizava-se a procissão de
Passos. Na vila existiam cinco passos, pertencentes à Misericórdia.
Dois desapareceram na rua Direita, com as construções urbanas ali
realizadas.
Nos
outros domingos de Quaresma havia na igreja, à tarde, a Via-Sacra
cantada e com a leitura de extensa “meditação”. A afluência de
fiéis era sempre grande.
Durante
a Quaresma não se realizavam divertimentos de quaisquer espécies.
Quando muito, alguns grupos ensaiavam as “danças” dos pedreiros,
dos arcos, ou dos
cadarços, para saírem no domingo de Páscoa e/ou de Espírito
Santo. Alguns homens faziam de mulher, pois era vedado ao elemento
feminino tomar parte nestes divertimentos. Mas essas danças há
muito caíram em desuso.
À
Semana Santa, o povo chamava-lhe a ”semana dos nove dias”, porque
fazia dias santos na parte da manhã da quinta-feira e da
sexta-feira. Da quinta para a sexta-feira, o Santíssimo ficava
exposto no trono e era “velado” toda a noite pelos irmãos da
confraria do Santíssimo, que era numerosa, com as respectivas opas
vermelhas.
Na
Quinta-feira e na Sexta-feira, à noite, realizavam-se as Matinas,
cantadas, usando a Capela partituras clássicas. Tinham grande
afluência de fiéis. Nelas usava-se o candelabro, cujos círios eram
apagados quando iam terminando os “nocturnos”.
O
sábado era o grande dia para a rapaziada. Quando os sinos tocavam
festivamente, a anunciar a Ressurreição, era a ocasião de estrear
os piões novos, no meio de grande alegria.
Na
igreja, por vezes, uma das filarmónicas, postada no coro alto,
executava um passo - dobrado, após as campainhas tocarem depois do
Glória. Os sinos repicavam, festivamente, e um dos turiferários
distribuía pelos sacerdotes e elementos da capela, raminhos de
flores, artisticamente arranjados pela florista D. Virgínia de
Lacerda.
As
amêndoas eram raras mas, nas mesas de pobres e remediados, porque
ricos eram bem poucos, não faltava, no dia de Páscoa, o folar com
um ovo para cada membro.
As
festas pascais, no domingo, terminavam com a procissão da
Ressurreição, pelas ruas da vila, acompanhada pela Filarmónica,
seguindo-se a Missa solene. E, na Segunda-feira, considerada
dia-santo, o Senhor era levado aos enfermos, em solene procissão.
Hoje
a liturgia pascal está muito simplificada com as normas
estabelecidas pelo Concílio Vaticano II.
________
1)
Silveira de Macedo, A.L. – História Quatro Ilhas..., Vol.I, 1871,
pág.220.
Lajes
do Pico, 7-4-2014
Ermelindo
Ávila
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