domingo, 30 de outubro de 2011

Artesãos e artífices

Há muito que o artesanato – arte e técnica de trabalhos manuais e caseiros – constitui uma actividade picoense de valoroso interesse.

Podemos considerar como artesanato as antigas rendas de bilro, croché e outros tipo executados pelas chamadas rendeiras, as mulheres que, quase exclusivamente, se dedicavam à manufactura dessas maravilhas que ainda hoje despertam curiosidade e interesse nos que nos visitam.

Primitivamente, eram manufacturadas rendas de diversos tipos para enviar, como oferta, aos parentes e amigos imigrados nos Estados Unidos, em retribuição das roupas e de algum calçado que de lá enviavam pelo correio, nos tradicionais “sacos da América” ou em mão de emigrantes que vinham de visita à terra natal.

Actualmente, é outro o tipo de artesanato que mais procurado é pelo Turismo. Refiro, especialmente, o conhecido “scrimshaw”, ou trabalhos em osso e dente de baleia de grande procura. Não menos procuradas são as miniaturas de utensílios diversos, executadas em madeira pelos artesãos picoenses, uma classe de artistas exímios que, hoje, estão a contribuir imenso para o desenvolvimento da apreciada actividade.

Nas Lajes existem, ao menos, duas casas de artesanato com representação nacional e cujos artefactos já receberam prémios em exposições nacionais e internacionais, pela beleza dos objectos e pela arte e inspiração artística que revelam.

Conheci, no primeiro quartel do século passado, o Capitão de baleeiras americanas, José Francisco Fidalgo, senhor de respeitável trato e notável artista de “scrimshaw”. Na sua residência possuía uma pequena oficina onde executava, como recreio, trabalhos em dente de baleia (cachalote), matéria prima que, ao tempo, abundava e era gratuita.

Outro bom artesão foi João Soares de Lacerda. Possuía, igualmente, uma pequena oficina onde executava trabalhos em osso de baleia e não só.

Mais tarde apareceram Manuel Rodrigues Quaresma Jr. e Clarence Moniz da Rosa. Foram destes dois artistas os objectos, em osso e dente de baleia, que a Câmara Municipal ofereceu ao Presidente Carmona, e a alguns membros da Comitiva presidencial, aquando da visita que fez aos Açores, em 1940. Salvo erro, um jogo de xadrez, um conjunto de peças de escritório, uma garrafa e cálices, tudo em dente de cachalote. Maravilhas de confecção, arrumadas em artísticos estojos, e que foram bastante apreciados.

Santo Amaro do Pico é uma freguesia de notável relevância artística. Lá existiram os célebres estaleiros da construção naval, hoje praticamente inactivos, donde saíram as mais belas embarcações de pesca e de tráfego local. Recordo sobretudo as traineiras de pesça de atum que, a meados do século passado, foram construídas nos estaleiros dos Mestres José Costa, Júlio Matos, Manuel Joaquim e João Alberto, que tanto movimentaram a freguesia, hoje praticamente paralisada...

Recordo até que a traineira “Ponta da Ilha” foi a primeira construída pelo Mestre Júlio Matos, nas cercanias do porto da Manhenha, para uma sociedade daquela freguesia, antes de instalar a sua oficina em Santo Amaro.

Algumas das embarcações ainda navegam pelos mares dos Açores na faina da pesca do atum. Outras foram abandonadas, como abandonadas foram as célebres lanchas do Canal “Espalamaca” e “Calheta”, também remodeladas nos estaleiros de Santo Amaro.

Na “Calheta” , construída pelos Mestres Oliveira, da Aguada, Ribeiras, antes de pertencer à Empresa das Lanchas do Pico, naveguei entre a Terceira e o Pico, como igualmente na “Lourdes” e Hermínia”, estas construídas pelos mestres Francisco José Machado e Filhos. Elegante era a “Margarida”, primeira lancha baleeira, construída nas Lajes pelo Mestre António dos Santos Fonseca, que igualmente construiu belas canoas baleeiras.

Os calafates lajenses, que os houve e bons artistas, tinham como missão principal a construção de canos baleeiras, depois do Mestre Experiente, Francisco José Machado, ter construído a primeira, o “São José”. Nos estaleiros das Lajes construíram-se e dezenas de canoas e lanchas a motor para a caça da baleia, e que foram utilizadas nos diversos portos dos Açores e até na Madeira e Continente. E não deixo de referir os inúmeros batéis de pesca local.

De lembrar também a Escola de Artesanato de Santo Amaro. Nela as Irmãs Neves preparam várias jovens para a maravilhosa arte, além de executarem os mais diversos artigos em renda e costura e dos mais diversificados géneros. Interessante por lá passar e admirar a multiplicidade de artesanato ali confeccionado.



Engrade, Ilha do Pico,

24 - 09 – 2011

Ermelindo Ávila



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