sábado, 17 de julho de 2010

OUTROS TEMPOS...NOVOS TEMPOS!

NOTAS DO MEU CANTINHO

Sessenta e cinco anos são decorridos sobre o fim da conflagração que ficou conhecida e ficou na história como a “segunda guerra mundial”.
Alguns ainda recordam esses tempos de carestia, de calamidades, de angústias e de sofrimento por vezes.
Portugal não entrou na guerra com as suas forças militares, que, mesmo assim, andavam de prevenção, mas não deixou de passar horas tormentosas e crises tamanhas.
Refiro-me hoje às carências de géneros de primeira necessidade e outros mais.
Tudo ou quase tudo era racionado e só se podia adquirir através de senhas passadas pela autoridade administrativa que as concedia conforme o número de pessoas de cada agregado familiar.
A carne de vaca não era propriamente racionada mas faltava quase sempre nos pequenos talhos que só abatiam uma vez por semana e nem sempre a horas certas.
Dizia-se que muitos desses produtos eram vendidos por candongueiros, através dos pequenos portos da Ilha, para os submarinos alemães que patrulhavam constantemente estes mares atlânticos. E de facto assim acontecia.
Um desses submarinos foi torpedeado pelos navios aliados, no Canal Faial – Pico e um ou dois outros foram atingidos no Canal Pico – São Jorge quando perseguiam um navio de transporte de tropas aliadas vindas da América e que estivera na Horta a reparar as avarias sofridas num anterior ataque.
Desse barco, dizia-se que muita margarina, que aliás ainda era mal conhecida, e cujas embalagens andavam à deriva no Canal, se utilizou nestas Ilhas, como se de manteiga de vaca se tratasse...
Parece que um dos tripulantes do submarino alemão atingido no Canal pelos navios aliados era o piloto o qual se recusou ser recolhido pelo vaso de guerra aliado, preferindo nadar, embora com grande perigo pois o mar estava ou tanto alteroso, até à costa do Pico onde foi recolhido por habitantes da Mirateca.
Mas, apesar disso, a escassez de géneros alimentares continuou.
Certa ocasião a Autoridade Administrativa lajense proibiu a saída de banha de porco, produzida no concelho, dado que aquela, que era posta à venda, não era suficiente para o abastecimento local.
As lanchas das Lajes “Lurdes” e “Hermínia” faziam viagens semanais entre o Sul do Pico e a Horta.
Numa certa semana uma deles carregou, num dos portos do Sul, algumas latas com banha para o Faial e, ao desembarcar no porto da Horta, a Guarda Fiscal, dando execução ao Edital da Edilidade Lajense, apreendeu toda a banha.
Do caso foi dado conhecimento ao Governador, pelos comerciantes importadores e o Magistrado, entrando em contacto com o Administrador Lajense, pediu-lhe para que suspendesse o embargo, visto tratar-se, alegava, de ilhas do mesmo Distrito. Um facto que só servia em dadas circunstâncias...E assim teve de acontecer.
Dado que os produtos eram distribuídos, através de senhas, o que já acontecera na guerra de 1914 – 1918, segundo o número de pessoas de família, como acima ficou dito, notava-se que havia certos açambarcamentos escusados. Isso se confirmou quando um respeitável cidadão, que vivia só e, consequentemente, apenas tinha direito a uma senha, pediu à Autoridade Administrativa para que lhe fosse aumentada a capitação de açúcar, pois era um produto que não podia dispensar para o seu tratamento. Revelou que até ali beneficiava de senhas de uma família numerosa que delas se não utilizava. Isso foi razão para que o assunto fosse levado à consideração da Autoridade Distrital a quem competia regulamentar o fornecimento e distribuição dos géneros pelos concelhos, propondo-se o aumento da quota de importação destinada ao concelho, com a condição da venda ser tornada livre. Assim aconteceu. E logo que foi conhecida a venda livre do produto, não mais foi necessário fazer novo racionamento nem o uso das senhas. Todavia outros produtos tiveram de manter-se sobre aquele regime, pois não era fácil controlar a sua venda aos consumidores.
Houve porém e sempre uma excepção: a farinha de trigo fornecida pela moagem da Horta para os Impérios do Espírito Santo. Para eles não houve racionamento bem como para os gastos de Coroa que se realizaram sem qualquer restrições.
Na realidade foram tempos difíceis quer para as populações quer para as Autoridades Administrativas, as quais até tinham de vigiar, através dos cabos de polícia, a iluminação das habitações com janelas voltadas ao mar para que os submarinos alemães não as pudessem localizar...
Novos tempos vivemos agora sem guerras, sem senhas, mas numa carestia nada inferior àquela que sofremos e suportámos naqueles anos já distantes de 1939-1945.


Vila das Lajes
09/07//2010
Ermelindo Ávila

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