A ilha do Pico, segundo os dados estatísticos de que disponho neste momento, é das ilhas açorianas aquela que tem uma população mais envelhecida. Resulta daí que as Misericórdias da ilha, já que lhe foi vedado possuir hospitais – agora simples centros de saúde – para o tratamento de doentes como aliás era sua “vocação” desde que tais instituições foram estabelecidas em Portugal, passaram a criar asilos, hoje designados por “lares da terceira idade”. Um nome mais elegante mas cuja finalidade é a mesma: tratar dos velhos muitas vezes abandonados pelos familiares.
O primeiro foi criado pela Misericórdia da Madalena, que usufrui do legado de Terra Pinheiro, um benemérito que, no princípio do século XX legou ao concelho uma propriedade e avultada quantia para a criação de um hospital.
Depois foi a Misericórdia de São Roque, aproveitando o edifício do antigo hospital que lhe foi restituído, depois de ter sido construído no concelho um novo edifício hospitalar que, dizia-se, iria possuir as valências necessárias para atender os doentes da ilha, mesmo aqueles que necessitassem de alguma intervenção cirúrgica. A dar crédito ao que se anuncia agora, parece que o hospital de S. Roque não passará de mero centro de saúde, ou seja, concretamente, um conjunto de consultórios clínicos com alguns aparelhos de diagnóstico.
A Misericórdia das Lajes, a mais antiga de todas elas, instalou há anos, na freguesia da idade, um lar da terceira idade e agora um estabelecimento idêntico nas Lajes, que abriu no dia 5 do corrente, aproveitando um excelente edifício doado pela Senhora D. Olívia Santos, viúva do antigo comerciante Calvino Soares da Fonseca Santos, o qual foi convenientemente ampliado e adaptado.
Na sua especialidade o “Lar Calvino Santos” é um estabelecimento modelar, devidamente apetrechado com todos os utensílios e equipamentos modernos, capaz de proporcionar aos seus residentes aquele mínimo de conforto material que não foram capazes de encontrar nas próprias residências. No entanto nada poderá substituir o conforto espiritual e o bem estar de um ambiente familiar. É pena que a sociedade assim não compreenda essa amarga situação.
Hoje, por aqui, não encontramos pessoas de mão estendida a mendigar uma côdea de pão, muito embora aceitemos que haja uma “pobreza envergonhada” que não se manifesta. Todavia já se vêem algumas um tanto abandonadas pelos familiares, pois a instituição familiar passou a ter novas exigências e a ser considerada de maneira diferente. Nem todas, felizmente.
Os filhos são entregues nas creches e “jardins de infância”, enquanto os pais estão, ambos, nos respectivos empregos. Os pais, avós, ou outros familiares de que são responsáveis, são transferid0os para os asilos, que agora se denominam de lares, como quem deita um traste em desuso no caixote de lixo, E é pena. É mesmo doloroso que assim aconteça.
Não se contesta a “obra de misericórdia” que é a instalação e manutenção de um lar de idosos. Condena-se somente a sociedade que “obriga” à sua instalação.
A Misericórdia, ou Santa Casa da Misericórdia das Lajes do Pico, como atrás referi, é secular. O alvará de criação da Misericórdia, concedido pelo Rei D. Filipe I, data de 1592, sendo-lhe concedidos “os mesmos privilégios e liberdades de que gozavam o provedor e os irmãos das Misericórdias da Ilha Terceira e do Faial”.
No entanto, só em 1960 conseguiu ter um estabelecimento hospitalar que acabou por ser “nacionalizado” pela Revolução de Abril. Para o substituir deu-lhe o Governo um edifício para a instalação de um “Jardim de Infância” e, depois, um lar da terceira idade na Piedade, que vem funcionando há anos.
Agora chegou a vez da vila das Lajes possuir um estabelecimento que, refira-se, de concepção moderna servirá uma velhice que, cada vez mais vai aumentando.
No tempos actuais não deixa de representar, mesmo assim, uma nota de progresso, que se regista com aprazimento, pois a velhice do concelho deixará de sair do concelho para viver os últimos dias da sua abalada existência, como vinha acontecendo.
(crónica lida no programa Manhãs de Sábado de 10 Julho 2010)
Vila das Lajes.
Julho de 2010
Ermelindo Ávila
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