domingo, 8 de março de 2009

AGRICULTURA TRADICIONAL

NOTAS DO MEU CANTINHO


Com a entrada de Portugal na CEE, hoje UE, a ilha do Pico sofreu um grande revés na sua agricultura.

Antes, todos os nacos de terra eram aproveitados com culturas diversas e o milho era a principal base da alimentação dos povos. Quem tinha o arquibanco ou a barricas cheias de milho – mais tarde foram os latões – tinha garantido o sustento no ano da própria família.

Era agradável olhar para essas encostas e ver os “serrados” cuidados e verdejantes e, nas épocas próprias, as culturas tratadas tratadas como verdadeiras plantas de jardins.

As chamadas “Ladeiras”, com os serrados limpos, tudo produziam. Os serrados junto das habitações, ou “hortas”, eram destinados, ao menos uma parte voltada a Norte, por abrigada pela parede divisória, à cultura dos “primores” agrícolas: o feijão, a ervilha, a fava, a cenoura, o alho, a cebola, a couve e o nabo, a açafroa, hoje substituído pelo colorau, a batata branca, etc. Afinal, tudo o que era indispensável na cozinha. As “velgas” ou serrados a seguir, eram quase sempre destinados à sementeira do trigo e os outros ao cimo da ladeira, destinados às sementeiras de milho. E quando este se colhia, nos meses de Outubro, os Lavradores (aqueles que, não sendo os proprietários, tinham a seu cuidado a lavoura das terras) semeavam as “ervagens de Outono”, para alimentação dos seus animais nos meses de Primavera.

Nos cimos das “Ladeiras” da Vila sempre existiram pequenas matas de faias e incensos que forneciam a lenha para a cozinha dos próprios proprietários. Até 1940 existiam fios de verga, que ligavam os cimos as Ladeiras aos quintais das casas da parte leste e conduziam, em roletas, pequenos feixes de lenha utilizada nas cozinhas, pois a electricidade e o gaz não eram ainda por cá conhecidos. Normalmente um trabalho feito ao fim do dia e que constituía regalo para a petizada Mas com a passagem da estrada havia que retirá-los...

Tudo foi abandonado. A mão-de-obra faltou. Deixou de haver o clássico “homem de fora”, ou aquele que a soldo trabalhava os campos estranhos.

Havia nas Lajes um bom homem, já um tanto idoso, que tinha a seu cuidado os quintais das habitações de certos habitantes. E tratava-os como autênticos jardins, com um cuidado como seus fossem. Era o João Francisco dos Passos. Com certeza que já ninguém dele se lembra. Um excelente contador de estórias, que eram o enlevo dos miúdos, aos serões das noites de Inverno.

Todos os géneros passaram a ser importados, da Espanha ou da América Central, e as terras foram, a pouco e pouco, abandonadas. O resultado está à vista.

É uma tristeza olhar para essas encostas e vê-las cheias de matas selvagens, sem qualquer utilidade, quase até às portas das cozinhas, pois até as criptomérias que alguns proprietários nelas plantaram, apresentam um desenvolvimento atrofiado e nenhuma utilidade terão.

A guerra mundial de 1938-1945 obrigou à arroteia de muitos terrenos do alto, para a produção de cereais, impossível de serem importados. E foi excelente o resultado. A Junta - Geral de então criou subsídios para a arroteia e despedrega que foram utilizados por alguns proprietários.

Os terrenos que passaram a pastagem de gado leiteiro, não terão de voltar ao primitivo estado de utilização? O trigo e o milho podem neles ser produzidos com vantagem e debelar a crise que dizem, existir na exploração leiteira, com a célebre questão das “quotas”, inicialmente bastante contestadas e hoje a serem abandonadas.

Com a crise económica que nos está a atingir, julgo que haverá necessidade de voltar aos tempos antigos e desbravar os terrenos abandonados, muitos deles que eram boas terras de pão, como se dizia. E se nos falta a mão-de-obra, pode ser substituída por pequenas máquinas agrícolas, ou importada das ilhas onde abunda, como acontecia em tempos passados. A Lavoura é uma arte que a ninguém desonra. Tal como a exploração das pastagens onde só se cria o gado leiteiro.

Posso estar errado neste meu pensar, mas a maturidade da vida ensinou-me que devemos aproveitar ao máximo as nossas potencialidades e, só depois, aproveitar os recursos estranhos.

Vila das Lajes,

1 de Março de 2009

Ermelindo Ávila

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