quinta-feira, 2 de outubro de 2008

PROFESSOR DIAS DE MELO

A notícia chegou-me rápida. Não a esperava e por isso enorme foi a surpresa e a mágoa que senti, muito embora o soubesse bastante doente.
A última vez que falámos, ao telefone, já era difícil entender a sua fala. Depois soube que saía a passeio, curto embora, mas que deixara de escrever. Naturalmente, fiquei preocupado pois sabia que tal atitude era sinal de curta existência.
Morreu o escritor, professor José DIAS DE MELO, um homem que levou a sua vida a cultivar a literatura, a escrever prosa e verso e, sobretudo, a utilizar a baleação como tema apaixonado.
Como poucos escreveu muito sobre a saga baleeira. As três dezenas de livros que deixou isso confirma. O último, A MONTANHA COBRIA-SE DE NEGRO é, com certeza, o seu canto do cisne.
Ainda este verão esteve no Pico, para assistir ao Império da Trindade, na sua freguesia, a Calheta de Nesquim. Na freguesia de São Mateus, onde passava semanas, na sua adolescência e juventude, quando a Tia Professora ali leccionava, foi-lhe prestada uma homenagem – a mais bonita que lhe fizeram, no seu próprio dizer.
Quando cá vinha, não se esquecia de passar por esta casa que conhecia desde a juventude. Nem que fossem escassos minutos. “Vou todas as semanas à vila, às Lajes, encontrar-me com os amigos que lá tenho...”, Poeira do Caminho – Reminiscências do Passado, Vivências do Presente” -2004, p. 211. E não falhava.
Dias de Melo escreveu muito. Era a sua grande paixão. Acompanhava-o o gravador e o bloco de notas. Em casa, na Rua de São Gonçalo, ou no Alto da Rocha do Canto da Baía, uma pequena mesa lhe servia para a máquina de escrever e, mais recentemente, para o computador, a que se afeiçoara como bem poucos. Embora de idade octogenária, tinha um espírito lúcido, jovem mesmo, como bem poucos, que sabia analisar os acontecimentos com uma clarividência extraordinária.
Milhas Contadas foi um dos seus livros preferidos. Julgo que a história triste dele e da Esposa, que falecera muito nova. Depois veio Poeira do Caminho, onde ficaram registadas Reminiscências do passado e vivências do presente.
No Poeira do Caminho escreveu: “ Será Milhas Contadas o meu último livro? Não sei.
“De qualquer modo, sem o deixar da mão, comecei e trabalho neste novo livro de alguns dias, poucos, para cá. Caso o chegue a acabar, gostaria de conseguir um livro diferente, escrito com temas vários anteriormente pensados ou, e principalmente, que me surgissem na altura do próprio texto ou, mais importante, da vida vivida no dia-a-dia, ou por mim no meu o próprio passado, ou por outros, vivos ou mortos, no passado deles e a que eu próprio tenha assistido ou que por eles, ou por outros me tenham sido contados.
” (pág. 19).
E não foram os últimos livros. Como disse, há “A Montanha Cobria-se de Negro”, que somente foi distribuído no Pico e, creio que, no Faial. E talvez outros escritos... pois Dias de Melo não parava de escrever. Tinha esse vício, nobre vício!
José de Melo, como era conhecido na sua freguesia natal – a Calheta de Nesquim, deste Pico que ele tanto amava - não teve tempo para mais... Deixou, todavia, uma obra notável e rica de cultura e de saber. Alguns dos originais dos seus livros ofereceu-os a amigos...
Dias de Melo partiu. Tinha as “milhas contadas” . Mas deixou uma obra literária que muito tarde será igualada. Dedicou-a, principalmente, à baleação pois o mar era a sua grande paixão. Como diria o José Garcia Tavares, que Dias de Melo recorda em Poeira do Caminho (pág.123): “Depois de tudo o que tem escrito sobre nós, os homens do mar, em barco de que eu seja mestre, o senhor não compra nenhum peixe, diz o que precisa e leva-o . E não me fale em pagamentos que me ofende.”
É cedo ainda para lembrar a extraordinária, notável e volumosa obra do Escritor e Poeta, Professor José DIAS DE MELO. Como disse, cerca de trinta volumes. Uma autêntica “Biblioteca”.
E mais não posso escrever. Perdi um Amigo. Amigo que, quando na sua Cabana do Pai Tomás, no Alto da Rocha do Canto da Baía, me visitava semanalmente.
Aqui deixo, comovido e sentidamente, este singelo ramalhete de violetas, a José DIAS DE MELO, Amigo de muitos anos, nem eu sei quantos...
Vila Baleeira,
24 de Setembro de 2008
Ermelindo Ávila

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