Nos recenseamentos da população, ordinariamente realizados de dez em dez anos, os inquiridos tinham de responder (ainda terão?) qual a religião que professavam. A grande maioria dos portugueses declarava ser católica, embora alguns esclarecessem que não eram praticantes.
Raros eram os casamentos civis, e a ninguém era proibido fazê-los. Quase todos os jovens optavam pelo casamento católico. Além do mais, uma tradição de longos séculos e que ninguém contestava, embora tivesse liberdade para o fazer.
Todavia, mais de um século decorrido, algo era bem diferente. Quem examinava os roteiro paroquiais raramente encontrava um freguês que não tivesse cumprido os preceitos da Igreja Católica. E podemos mesmo acrescentar que, v.g., no ano de 1878 – há precisamente cento e trinta anos, a população da freguesia da Santíssima Trindade, Ilha do Pico, era constituída por 1141 indivíduos do sexo masculino, 1575 do sexo feminino e 541 eram de idades inferiores a sete anos. No total, 3257 indivíduos. Curioso referir que, nesse ano, estavam ausentes ou emigrados, vinte e sete maridos.
Todos os que estavam na idade canónica de cumprirem os preceitos pascais o haviam feito sem qualquer excepção.
Este pequeno preâmbulo vem a propósito do livro “Entre o Culto e o Sentido – Fé professada, calculada e vivida em meio urbano” que o Professor da Universidade dos Açores, Doutor Octávio H. Ribeiro de Medeiros acaba de publicar.
Na “Introdução” escreve o Autor: “Em Portugal a percentagem de católicos é agora de 89,9% - 9,4 milhões de pessoas. Contudo, segundo o Recenseamento da Prática Dominical de 2001, o numero total de praticantes não chegou aos 2 milhões de fiéis.”
Para esta descida preocupante de praticantes da Religião Católica, o Autor apresentou diversas causas e recorda as palavras de ordem segundo o Papa: ”É precioso mudar o estilo de organização da comunidade clerical portuguesa e a mentalidade dos seus membros para se ter uma Igreja ao ritmo do Concílio Vaticano II, na qual esteja bem estabelecida a função do clero e do laicado, tendo em conta que todos somos um, desde quando fomos baptizados e integrados na família dos filhos de Deus, e todos somos corresponsáveis pelo crescimento da Igreja."
Na realidade, há um desinteresse, uma apatia da parte da família católica que está a concorrer para a desintegração da própria Igreja local.
Fazem-se as festas tradicionais com alguma concorrência mas mais presente nos actos externos...
“Legalizam-se” situações aberrantes dos indivíduos, com reflexos naqueles que se confessam (confessavam) católicos. E julga-se natural certas práticas que antes eram atentatórias da dignidade humana.
“Fé e Sentido”, com 266 páginas de texto, é um trabalho exaustivo de estudo e análise da época sócio-religiosa em que vivemos; trabalho bastante documentado com gráficos e dados estatísticos, que termina com esta afirmação do douto Mestre da “Sociologia Católica Açoriana”: “Na sociedade actual, a valorização do hic et nunc, vai dominando cada vez mais a vida fazendo com que a vivência do homem moderno tarda a circunscrever-se em coordenadas humano-temporais, dando origem a uma forma diferente de ser homem, empenhado em outras buscas e entregue a outras esperanças, de preferência intra-mundanas.”
A hora que se vive é de autêntica tribulação. Não se assume a responsabilidade da prática de determinados actos e vive-se num labirinto de incertezas e contrariedades, de consequências bastante funestas.
O Mundo, o mundo que nos fica ao pé da porta, abandonou os seus dogmas essenciais e entregou-se ao desvario, à apatia dos seus próprios valores.
Um materialismo bárbaro transformou-se em pseudo doutrina privilegiada, mas pertinente.
Quando voltará o homem a ocupar o seu lugar numa sociedade honesta, disciplinada, respeitadora dos valores sagrados, que transforme a iniquidade em valores humanos, dignos e capazes de promoverem uma vida de respeitabilidade, seriedade, responsabilidade e amor?
Vila das Lajes,
11 de Outº de 2008
Ermelindo Ávila
Raros eram os casamentos civis, e a ninguém era proibido fazê-los. Quase todos os jovens optavam pelo casamento católico. Além do mais, uma tradição de longos séculos e que ninguém contestava, embora tivesse liberdade para o fazer.
Todavia, mais de um século decorrido, algo era bem diferente. Quem examinava os roteiro paroquiais raramente encontrava um freguês que não tivesse cumprido os preceitos da Igreja Católica. E podemos mesmo acrescentar que, v.g., no ano de 1878 – há precisamente cento e trinta anos, a população da freguesia da Santíssima Trindade, Ilha do Pico, era constituída por 1141 indivíduos do sexo masculino, 1575 do sexo feminino e 541 eram de idades inferiores a sete anos. No total, 3257 indivíduos. Curioso referir que, nesse ano, estavam ausentes ou emigrados, vinte e sete maridos.
Todos os que estavam na idade canónica de cumprirem os preceitos pascais o haviam feito sem qualquer excepção.
Este pequeno preâmbulo vem a propósito do livro “Entre o Culto e o Sentido – Fé professada, calculada e vivida em meio urbano” que o Professor da Universidade dos Açores, Doutor Octávio H. Ribeiro de Medeiros acaba de publicar.
Na “Introdução” escreve o Autor: “Em Portugal a percentagem de católicos é agora de 89,9% - 9,4 milhões de pessoas. Contudo, segundo o Recenseamento da Prática Dominical de 2001, o numero total de praticantes não chegou aos 2 milhões de fiéis.”
Para esta descida preocupante de praticantes da Religião Católica, o Autor apresentou diversas causas e recorda as palavras de ordem segundo o Papa: ”É precioso mudar o estilo de organização da comunidade clerical portuguesa e a mentalidade dos seus membros para se ter uma Igreja ao ritmo do Concílio Vaticano II, na qual esteja bem estabelecida a função do clero e do laicado, tendo em conta que todos somos um, desde quando fomos baptizados e integrados na família dos filhos de Deus, e todos somos corresponsáveis pelo crescimento da Igreja."
Na realidade, há um desinteresse, uma apatia da parte da família católica que está a concorrer para a desintegração da própria Igreja local.
Fazem-se as festas tradicionais com alguma concorrência mas mais presente nos actos externos...
“Legalizam-se” situações aberrantes dos indivíduos, com reflexos naqueles que se confessam (confessavam) católicos. E julga-se natural certas práticas que antes eram atentatórias da dignidade humana.
“Fé e Sentido”, com 266 páginas de texto, é um trabalho exaustivo de estudo e análise da época sócio-religiosa em que vivemos; trabalho bastante documentado com gráficos e dados estatísticos, que termina com esta afirmação do douto Mestre da “Sociologia Católica Açoriana”: “Na sociedade actual, a valorização do hic et nunc, vai dominando cada vez mais a vida fazendo com que a vivência do homem moderno tarda a circunscrever-se em coordenadas humano-temporais, dando origem a uma forma diferente de ser homem, empenhado em outras buscas e entregue a outras esperanças, de preferência intra-mundanas.”
A hora que se vive é de autêntica tribulação. Não se assume a responsabilidade da prática de determinados actos e vive-se num labirinto de incertezas e contrariedades, de consequências bastante funestas.
O Mundo, o mundo que nos fica ao pé da porta, abandonou os seus dogmas essenciais e entregou-se ao desvario, à apatia dos seus próprios valores.
Um materialismo bárbaro transformou-se em pseudo doutrina privilegiada, mas pertinente.
Quando voltará o homem a ocupar o seu lugar numa sociedade honesta, disciplinada, respeitadora dos valores sagrados, que transforme a iniquidade em valores humanos, dignos e capazes de promoverem uma vida de respeitabilidade, seriedade, responsabilidade e amor?
Vila das Lajes,
11 de Outº de 2008
Ermelindo Ávila
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