domingo, 20 de novembro de 2016

A “MATANÇA”

NOTAS DO MEU CANTINHO

                                             

        Não se trata daquelas que, dia a dia, os noticiários da TV e da Rádio nos trazem e, de tanto repetir a notícia, nos obriga, por vezes, a desviar para outro canal, pela maneira indiferente como a notícia é tratada.
        Nas zonas rurais já se vai falando nas matanças dos porcos. Uma festa de família que, a partir dos finais do Outono e durante o Inverno, tinha lugar em todas as freguesias da Ilha.
        E que interessante era. Para a gente miúda era uma grande festa se bem que, para os adultos representava dias de intenso trabalho doméstico.
        Nem sei hoje como são as tradicionais matanças de porcos. Refiro, pois, o que acontecia há umas dezenas de anos, quando as famílias eram, geralmente, numerosas e os suínos eram tratados cuidadosamente durante o ano para que a matança fosse um acontecimento familiar e festivo.
        A preparação do acontecimento já era de festa. Desde o apanhar das vassouras (urze), que se punham a secar no quintal, com a devida antecedência, até à apanha e preparação das cebolas, cultivadas especialmente para as morcelas, tudo representava para muitos, quase actos festivos.
        Marcado o dia da matança, - e tinha de ser combinado com os familiares para não coincidir com os dos outros amigos ou familiares - iniciavam-se os trabalhos de preparação dos utensílios, além de outros indispensáveis, para que tudo estivesse pronto no dia aprazado.
         Moíam-se os cereais – trigo e milho – para o fabrico do pão de milho e de trigo, e bolo de milho, em quantidades suficientes para os dias da matança. Os dias antecedentes eram destinados à cozedura dos pães de trigo, por vezes maça sovada, de milho ou de  “duas farinhas”, a limpeza da casa e da loja, ou rés-do-chão, onde era pendurada a carcaça do animal, a enxugar algumas horas ou um dia e noite .
         Convidavam-se o “matador” e os ajudantes, com a devida antecedência, bem como as mulheres que iriam ajudar nos trabalhos de cozinha; e, geralmente, moças para “picar as cebolas”, na véspera do dia.
         De madrugada alguém ia chamar os que iriam ajudar nos trabalhos da matança, bastante cansativos, pois era necessário que todo o trabalho se fizesse de madrugada e os homens que o executavam pudessem almoçar antes do nascer do Sol, pois tinham de estar livres para o caso de “aparecer baleia”, visto que todos ou quase todos eram baleeiros.
          Os mais miúdos aguardavam o dia com ansiedade: não iam à escola e aguardavam a bexiga para a encherem de ar e com ela fazerem na rua os seus jogos de futebol, brincadeira que hoje se tornaria impossível, dado o trânsito automóvel que desde cedo circula.
          Hoje é tudo diferente. Os animais são levados ao Matadouro e lá são abatidos e preparados, restando às famílias apenas os trabalhos de cozinha: derreter as carnes para os torresmos, e preparar as morcelas, a linguiça e pouco mais, porque as arcas frigoríficas fazem o resto.
          Mesmo assim, o dia da matança não deixa de ser um dia especial para as famílias que ainda seguem a tradição. Ainda se fazem os presentes, serviço que as crianças aguardam com interesse pelas gorjetas que normalmente recebem.
          Há dias assisti, com muitos lajenses, a um almoço comunitário de porco, abatido no matadouro. E não faltaram as morcelas e os torresmos. Um repasto apetitoso e um convívio agradável, que todos apreciaram, e eram umas dezenas. Uma maneira simples de nos encontrarmos, já que a maioria, embora residente na vila, pouco ou quase nenhum convívio tem. E bem necessários que eles são pois, o isolamento que se vive é atrofiante e cada vez mais isso se nota, com a paralisação de serviços, repartições e oficinas, que antes existiam e, nestas, muitas vezes se juntavam para amena cavaqueira.
          O convívio foi uma maneira de reunir fundos para um fim comunitário e de juntar os lajenses, que poucos faltaram. Aguardemos outro...

Lajes do Pico,
24. Outº- 2916

Ermelindo Ávila

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