Quem
escreve é que sabe a dificuldade que encontra quando “lança a mão
à pena...” Mas isso era antigamente...Hoje é colocar as mãos
sobre o teclado do computador, já não da máquina de escrever, e
deixar correr... Pois que seja.
A
propósito daquele “lança a mão à pena”, veio-me à lembrança
a “Carta para longe” de Armando Cortes-Rodriguesi.
Actualmente, já não se escrevem cartas para as Américas e quase
para parte nenhuma. Até as de negócios foram substituídas pela
Internet.
No
entanto, vale a pena lembrar o que escreveu o Poeta :
“Maria manda dizer
o que por aí tens
passado
Triste velhice de
quem
Não tem os seus a
seu lado.
“
Não te esqueças de teu pai
lembra-te sempre de mim
Adeus...adeus...que as saudades
Só
à vista terão fim!”
“Triste velhice de
quem
não tem os seus a seu
lado!
E
quantos partiram para não mais voltar...Viveram envoltos numa
saudade permanente, recordando “o craveiro do balcão” ou a
figueira do quintal...
A
saudade era tamanha que, nem a língua da nova pátria, quiseram
aprender. A terra pequena e humilde, bastante distante, estava sempre
presente. Recordavam os feitos de criança, os irmãos e os pais com
uma saudade amarga. Aos filhos ensinaram a língua materna para que,
em casa, só esse idioma se falasse...E nunca puderam voltar às
pedras negras do cantinho natal...
Por
c á os pais viveram, e partiram para sempre, embalados na esperança
de um dia eles regressarem, porque,
”Depois
que daqui saíste
Nunca mais houve alegria,
Que
do céu da nossa vida
Veio a noite e foi-se o dia”.
Essa
gente que ficou foi envelhecendo, sempre a olhar para o horizonte, na
esperança de um dia o barco voltar ao porto e trazer o seu Manuel,
rico e bem trajado, a espalhar alegria e lembranças aos que deixara
num dia longínquo. Mas isso raro aconteceu. O Manuel não mais
voltou... Todavia,
“A
tua cadeira baixa
Lá
está (ainda) junto à janela
Como quem ainda espera
Que
te venhas sentar nela.”
Quem conseguisse reunir as cartas que se trocavam entre as famílias
açorianas e os familiares que emigraram para o Brasil e, mais tarde,
para os Estados Unidos, ficaria de posse de um extraordinário acervo
sobre a história destas ilhas.
Muito
embora não fossem assíduas as cartas, pois os meios de transporte
eram raros, nem por isso deixavam de levar daqui, não só as
notícias da família mas igualmente das ocorrências que se haviam
dado nos tempos anteriores.
Havia
escreventes habituais. Respondiam com certa graça às cartas que
vinham das terras de imigração e muitas vezes aproveitavam para dar
notícias da escrevente e dos acontecimentos por vezes os mais
dispares. Mais assíduas eram as cartas dos Estados Unidos e do
Canadá. Do Brasil eram poucas e cada vez iam rareando mais. Até
havia o ditado: O Brasil é a terra dos esquecidos. E
esquecidos porque, passados uns tempos, os que lá estavam imigrados,
esqueciam a terra e a própria família. Poucos eram os que voltavam
à terra. Que me lembre, apenas uma ou duas famílias cá vieram. Uma
por cá ficou e passou a ser conhecida pela terra para onde havia
emigrado.
Uma questão
psicológica, que interessante seria averiguar, pois é sabido que
existem nas terras de Santa Cruz imensos descendentes de açorianos,
desde os históricos Casais – cerca de quarenta – que emigraram
para Santa Catarina aquando das erupções vulcânicas do século
dezoito e, depois, para outras regiões. Alguns deles fixaram-se mais
tarde no Uruguai,
onde ainda existe uma
colónia de descendentes açorianos, que há poucos anos fundou uma
sociedade açoriana-uruguaia, para defesa da língua
portuguesa, como rezam os respectivos estatutos.
E todos eles, quer no
Brasil quer no Uruguai, tem muito orgulho em serem descendentes de
gentes emigradas destas ilhas. Mas só.
Existem “Casas dos
Açores” em diversas cidades do Brasil, algumas com grande
actividade, como seja a “Casa dos Açores” do Rio de Janeiro.
O mesmo acontece agora
no Canadá, onde se encontram dezenas de associações com sedes
próprias as quais foram fundadas pelos imigrantes portugueses e
açorianos. Só em Toronto, consta-me, há mais de duas dezenas.
Afinal, as Casas dos
Açores proliferam por toda a parte onde se haja fixado um grupo de
açorianos. A de Lisboa, por certo a mais antiga, tinha,
inicialmente, a denominação de “Grémio dos Açores”, fundado
em Março de 1927.
Não são de esquecer as
seculares sociedades, “União Portuguesa do Estado da Califórnia”,
fundada em 1880 pelo picoense António Fontes, e a “Sociedade do
Divino Espírito Santo”, também fundada pelo picoense Pe. Manuel
Fernandes, conjuntamente com outros imigrantes, em 1896, ambas da
Califórnia. Em New Bedford existia o “Montepio Português”. Mas
não somente estas. Outras mais há, como a “Casa da Saudade”.
Servem elas,
meritoriamente, para conservar vivo o espírito e as tradições das
terras de origem, desde as matanças de porco até às festividades
do Espírito Santo, não esquecendo os Santos Padroeiros das
respectivas localidades de origem.
E, não só as sedes
sociais, algumas de grandeza enorme, tenha-se presente a de
Mississauga, Canadá, como até os belos e modernos Templos, quase
sempre providos de clero português.
De referir também a
Imprensa portuguesa, mantida com entusiasmo em terras da Diáspora. É
o caso da Califórnia e de Massachusetts. Só na Califórnia, até
1979, fundaram-se vinte e seis periódicos. Lá existem ainda jornais
portugueses desde longa data. Outros, embora portugueses na sua
origem, já utilizam a língua estrangeira.
E há
ou houve programas portugueses na Rádio e na Televisão. Lembro aqui
o programa Castelos Românticos iniciado em 1930 pelo nosso
conterrâneo Arthur Ávila e esposa Celeste Ávila, o qual teve
grande audiência entre a comunidade portuguesa da Califórnia.
E
nunca mais voltaram... E os pais foram envelhecendo, sempre na
esperança de um encontro que não se realizou!...
E o referido Poeta
continuou a registar:
”Saudade é
como o luar
Que só de
noite é que brilha... “
É simples mas
repleta de encanto a prece final:
“A bênção
de Deus te cubra
Com amor, paz
e saúde
E lembra-te
que a riqueza
Verdadeira é
a virtude.”
A crónica acabou.
“Até à vista...”
Vila das Lajes,
Junho de 2013
Ermelindo Ávila
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