Hoje chamam-lhe golfinhos. Botos ou golfinhos ou moleiros, são uma e a mesma espécie de mamíferos que os Lajenses, em tempos passados, aproveitavam para diversos usos. Todavia, não deixam de ser animais interessantes que não atacam o homem e que, em certas e determinadas épocas, cabriolam pelos mares, causando gosto aos observadores.
Não é agora que foi descoberta a observação dos botos. Eles sempre andaram pelos mares das ilhas e, quando foi necessário utilizar o óleo e a carne, constituíram uma excelente ajuda às paupérrimas economias domésticos dos povos insulares.
Aqui há setenta/oitenta anos era agradável viajar nos barcos da Insulana, o “Lima” e o “São Miguel” substituído depois pelo “Carvalho Araújo” e, encostados às amuradas dos navios, ver os botos em correrias a acompanhar os barcos à ilharga, dando cambalhotas e elevando-se por vezes fora das águas. No meio do Oceano, navegando do Pico para São Jorge ou desta ilha para a Terceira, rara era a viagem, e várias fizemos, em que não tivéssemos por agradável companhia os simpáticos animais.
Mas, como todo o ser criado tem seu destino traçado, os botos eram caçados, principalmente no porto desta Vila, para utilização das populações, tal como os outros peixes e animais marinhos e, mais tarde, o cachalote.
Ao criar o mundo “Deus criou os grandes peixes e todos os animais que têm vida e movimentos, os quais foram produzidos pelas águas segundo a sua espécie… E Deus viu que tudo era bom. E os abençoou dizendo: crescei e multiplicai-vos, e enchei as águas do mar…E depois disse: «Façamos o homem à sua imagem e semelhança, e presidia aos peixes do mar, às aves do céu e aos animais selvagens e a toda a terra…»
Utilizando os animais, as aves e os peixes, o homem está a servir-se de um mandato do Criador, que tudo pôs à sua disposição.
Recusar ao homem o direito de fruição dos animais, das aves, dos peixes, das árvores e dos bens da terra é cercear-lhe um direito que lhe foi outorgado pelo Criador, Senhor de todas as coisas criadas. Mas sobre isso não faço comentários.
Valendo-me do Comendador Ernesto Rebelo, falecido em 1902, escritor faialense, em «Notas Açorianas», publicadas no «Arquivo dos Açores», a partir do volume sétimo respigamos:
«Depois de nove horas de jornada, de haver atravessado a serra, subido e descido muita ladeira e cruzado os grandes descampados de pedra roliça e requeimada, entremeada aqui e além por moitas de rasteiras faias, descampados a que se dá o nome de Mistérios por serem estes os sítios por onde passaram as ribeiras de refervente lava das antigas erupções vulcânicas do Pico, chegámos finalmente, ao cair da noite, à Vila das Lajes»…
«Encaminhámo-nos para o velho e estragado Convento de São Francisco, que domina a Vila no qual um amigo obsequioso nos havia permitido permanecer num desguarnecido quarto.» E aqui deixo para trás as peripécias porque passou durante a noite com as chuvas que pingavam do soalho e com o barulho das cagarras que lhe pareciam gritos de vozes humanas.
O rapaz que o acompanhava de manhã, chamou-o para um grande divertimento que iam ter: «Um cardume de botos que foi avistado ao romper da manhã, já saíram algumas lanchas a ver se conseguem metê-los na Lagoa e a povoação toda está de espreita na costa, há-de ter que ver». Ernesto Rebelo descreve a seguir minuciosamente o rodear dos botos para o interior da Lagoa e, depois, a caçada.
«No fim de duas horas de trabalho, estavam estendidos na costa sessenta e nove valentes botos e começou a mais simples faina de os retalhar, para ali mesmo serem derretidos em enormes caldeiras.
«A pesca tinha sido excelente e os lucros importantes, pois quanto azeite houvesse obtinha certo e bom preço, para exportação.
«As tripulações das lanchas em um dia de trabalho, haviam ganho mais do que num ano de pescaria miúda…»
A caça ao boto era um dos principais rendimentos da classe marítima. O azeite não só era exportado, como ainda utilizado nas candeias que alumiavam os serões das famílias e a própria carne era salgada e utilizada na alimentação de suínos e como isco para a pesca. Nada era desaproveitado.
Hoje…fico por aqui.
Vila das Lajes,20 de Julho de 2007
Não é agora que foi descoberta a observação dos botos. Eles sempre andaram pelos mares das ilhas e, quando foi necessário utilizar o óleo e a carne, constituíram uma excelente ajuda às paupérrimas economias domésticos dos povos insulares.
Aqui há setenta/oitenta anos era agradável viajar nos barcos da Insulana, o “Lima” e o “São Miguel” substituído depois pelo “Carvalho Araújo” e, encostados às amuradas dos navios, ver os botos em correrias a acompanhar os barcos à ilharga, dando cambalhotas e elevando-se por vezes fora das águas. No meio do Oceano, navegando do Pico para São Jorge ou desta ilha para a Terceira, rara era a viagem, e várias fizemos, em que não tivéssemos por agradável companhia os simpáticos animais.
Mas, como todo o ser criado tem seu destino traçado, os botos eram caçados, principalmente no porto desta Vila, para utilização das populações, tal como os outros peixes e animais marinhos e, mais tarde, o cachalote.
Ao criar o mundo “Deus criou os grandes peixes e todos os animais que têm vida e movimentos, os quais foram produzidos pelas águas segundo a sua espécie… E Deus viu que tudo era bom. E os abençoou dizendo: crescei e multiplicai-vos, e enchei as águas do mar…E depois disse: «Façamos o homem à sua imagem e semelhança, e presidia aos peixes do mar, às aves do céu e aos animais selvagens e a toda a terra…»
Utilizando os animais, as aves e os peixes, o homem está a servir-se de um mandato do Criador, que tudo pôs à sua disposição.
Recusar ao homem o direito de fruição dos animais, das aves, dos peixes, das árvores e dos bens da terra é cercear-lhe um direito que lhe foi outorgado pelo Criador, Senhor de todas as coisas criadas. Mas sobre isso não faço comentários.
Valendo-me do Comendador Ernesto Rebelo, falecido em 1902, escritor faialense, em «Notas Açorianas», publicadas no «Arquivo dos Açores», a partir do volume sétimo respigamos:
«Depois de nove horas de jornada, de haver atravessado a serra, subido e descido muita ladeira e cruzado os grandes descampados de pedra roliça e requeimada, entremeada aqui e além por moitas de rasteiras faias, descampados a que se dá o nome de Mistérios por serem estes os sítios por onde passaram as ribeiras de refervente lava das antigas erupções vulcânicas do Pico, chegámos finalmente, ao cair da noite, à Vila das Lajes»…
«Encaminhámo-nos para o velho e estragado Convento de São Francisco, que domina a Vila no qual um amigo obsequioso nos havia permitido permanecer num desguarnecido quarto.» E aqui deixo para trás as peripécias porque passou durante a noite com as chuvas que pingavam do soalho e com o barulho das cagarras que lhe pareciam gritos de vozes humanas.
O rapaz que o acompanhava de manhã, chamou-o para um grande divertimento que iam ter: «Um cardume de botos que foi avistado ao romper da manhã, já saíram algumas lanchas a ver se conseguem metê-los na Lagoa e a povoação toda está de espreita na costa, há-de ter que ver». Ernesto Rebelo descreve a seguir minuciosamente o rodear dos botos para o interior da Lagoa e, depois, a caçada.
«No fim de duas horas de trabalho, estavam estendidos na costa sessenta e nove valentes botos e começou a mais simples faina de os retalhar, para ali mesmo serem derretidos em enormes caldeiras.
«A pesca tinha sido excelente e os lucros importantes, pois quanto azeite houvesse obtinha certo e bom preço, para exportação.
«As tripulações das lanchas em um dia de trabalho, haviam ganho mais do que num ano de pescaria miúda…»
A caça ao boto era um dos principais rendimentos da classe marítima. O azeite não só era exportado, como ainda utilizado nas candeias que alumiavam os serões das famílias e a própria carne era salgada e utilizada na alimentação de suínos e como isco para a pesca. Nada era desaproveitado.
Hoje…fico por aqui.
Vila das Lajes,20 de Julho de 2007
Ermelindo Ávila
2 comentários:
Pois é, Senhor Ermelindo.Mais uma questão pertinente. Julgava eu que a proibição da caça a qualquer espécie se justificaria sempre que esta corresse, ou pudesse vir a correr, risco de extinção. Salvo douta opinião em contrário, as toninhas andam por aí aos milhares, não correndo, porventura, esse risco!(?)...
Uma dúvida: alimentam-se de quê? Não será do ar que respiram, pois não!?
Respeitosos cumprimentos e votos de boa saúde.
Bem, penso que caçar ou não uma espécie não terá apenas a ver com a sua extinção mas também com as necessidades de uma população, de acordo com o código de valores que cada civilização vai construindo. No passado comeu-se toninhas porque havia necessidade e não se conhecia a inteligência nem a docilidade deste animal, penso eu.
Por outro lado, nós não aceitamos criar cães ou gatos para comer, enquanto que os chineses e outros asiáticos o fazem.
Penso até que se caçássemos os golfinhos seríamos olhados pelos europeus como selvagens ou canibais, com as respectivas perdas de fundos comunitários e de turistas.
Contudo, o passado da caça à baleia (ou à toninha) não deve ser reescrito nem colorido e juntamente com as lanças e arpões fazem parte da nossa história que urge preservar.
Penso eu de que...
Enviar um comentário