CÁ & LÁ
A umas
dezenas de anos de distância, recordo, com um misto de saudade,
esses tempos distantes em que sair de casa, deixar os pais, irmãos
mais novos e outros familiares, para ir para qualquer outra ilha
continuar a estudar, era um acto heróico ao qual bem poucos se
atreviam.
Se para
o Faial a distância era curta, mesmo assim, por lá se ficava o
trimestres inteiro sem se vir a casa, muito pior era a deslocação
para a Terceira ou São Miguel, as únicas três ilhas do Arquipélago
que dispunham de ensinos secundários. No Pico, nas Flores ou em São
Jorge não se ia além da Instrução Primária e somente quando se
tinha a sorte de, na terra, estar colocado um bom professor, o que
nem sempre acontecia, é que se ia até ao exame de quarta classe,
que já permitia colocação em serviços públicos.
Os que
não tinham essa oportunidade, caminhavam para a terra, ou para
alguma oficina: pintor, carpinteiro, ferreiro ou serralheiro, caiador
ou pedreiro. E, quando essa aprendizagem não era facilitada, feitos
os catorze anos, caminhava-se para a pesca, quando se encontrava um
mestre amigo que o incluía na sua tripulação. Muito raramente um
ou outro, por ser mais “esperto” conseguia um emprego de marçano
numa das mercearias, aqui ou no Faial. E era tudo o que podia
acontecer.
Curso
superior só para algum privilegiado. Todavia, esses que em Coimbra,
e só se falava nessa Universidade, talvez por mais antiga e ser
melhor o acolhimento nas “repúblicas”, conseguiam tirar um curso
superior, raramente voltavam às terras de origem. Ficavam pelo
continente ou fixavam-se nas capitais dos distrito insulares,
“encostando-se” a algum médico ou advogado que já tinha
escritório conhecido e afreguezado.
Alguns,
bem poucos, iam para o Seminário de Angra mas nem todos conseguiam
prosseguir o curso, por razões as mais diversas. A disciplina era
algo rigorosa e pouco pedagógica. Os companheiros, oriundos das mais
diversas classes sociais, nem sempre eram acolhedores e camaradas, o
pessoal de serviço, rústico e muito dele mal educado. Tudo isso
fazia que a debandada principiasse nas primeiras semanas da chegada e
continuasse pelos anos adiante. Uma situação que os dirigentes,
talvez porque igualmente deficientemente preparados na mesma escola,
jamais compreenderam. E o resultado está agora visível na ausência
quase total de vocações, mesmo que o funcionamento daquele
estabelecimento presentemente só exista para o curso superior –
teológico. E é pena. As nossas ilhas são, na generalidade, de
formação católica. Nas freguesias e lugares, onde exista um núcleo
habitacional, há uma igreja paroquial ou ermida preparadas com
alfaias para os actos do culto, principalmente a Eucaristia ou Missa,
mas nem todas têm o privilégio de nelas se celebrar a missa
dominical nem em horário fixo. A falta de clero, dizem, justifica a
carência. É pena...
Na época que passa,
as ilhas são verdadeiras terras de missão. Urge, pois, que a
anomalia seja encarada de frente e resolvida com presteza para que
amanhã, num amanhã que se afigura bastante próxima, os católicos
não vão caindo no indiferentismo e, principalmente aqueles que
obtenham cursos superiores, enveredem por outros caminhos. É tempo
de se lhes acudir, nem que sejam atraídas para estas ilhas ordens
religiosas com sacerdotes professos.
Adiantei-me na
apreciação de uma situação que a todos é presente? Talvez não!
LAJES DO PICO,
3 de Setembro de
2013.
Ermelindo Ávila
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