No decorrer dos tempos, a ilha do Pico teve diversas indústrias, algumas de carácter artesanal. Mesmo assim, sem grandes maquinismos, a actividade industrial desenvolveu-se em vários sectores que, produzindo embora em pequena escala, bastavam para as necessidades locais. Outras, algo mais desenvolvidas, produziam para a exportação, como seja, em épocas que podemos considerar já remotas, a produção da laranja, do vinho verdelho e lacticínios, ficando por isso célebre o especial “queijo do Pico!”
Deixo de referir, porque por tantos abordada, a actividade baleeira que aqui nesta ilha nasceu há século e meio, para terminar, ingloriamente, vai para mais de quarenta anos.
Mas outras indústrias existiram no Pico. Até a de pirotecnia, que fabricava o chamado fogo de artifício que animava os arraiais das festividades religiosas da ilha. Foram exímios pirotécnicos Tomé Mamede e António Francisco da Silveira, conhecido por António Félix do Cais do Pico.
Na década de oitenta do século XIX, a freguesia da Santíssima Trindade tinha dezasseis sapateiros, um alfaiate, nove carpinteiros, dois tanoeiros, e três serradores; onze ferreiros e nove pedreiros, um moleiro e um caiador, além de um sangrador e de um veterinário... A freguesia tinha 3.229 habitantes e 1.142 eram do sexo masculino, adultos. Havia 496 menores de sete anos.
A maioria da população ou empregava-se ou na agricultura ou na pesca.
Em 1888, encontramos um oleiro. Sabemos que era natural de ilha de Santa Maria donde importava o barro utilizado no fabrico de diversas peças de uso doméstico.
Em 1899, foi licenciado o funcionamento de um forno de cal, pertencente a Manuel Joaquim de Azevedo e Castro, António Homem da Costa e José Francisco Fidalgo Baptista, “ no terreno que foi Forte de Santa Catarina”. Conheci o operário que lá trabalhou e que ficou conhecido pelo caleiro. A pedra calcária era importada do continente. Ainda resta o respectivo forno.
O Pico possuiu, a um tempo, doze fábricas de lacticínios, três fábricas de conservas de peixe, das quais apenas uma sobrevive, - a COFACO - instalada na Areia Larga; foi dirigida por Francisco Pessanha e a quem o concelho da Madalena ficou a dever o notável desenvolvimento que ali se verificou na segunda metade do século passado. De registar ainda as duas fábricas de extracção de óleos de baleia, e duas fábrica de refrigerantes, primeiro na Madalena e depois nas Lajes.
Aqui deve incluir-se a indústria de espadana, também conhecida na ilha por piteira, existente em São Mateus e de que era proprietário o professor José Inácio Garcia de Lemos Jr. Possuía vários terrenos na ilha e no Faial, onde cultivava essa planta que, depois do corte, era seca, tratada e exportada para o continente. Nessa actividade empregava muita mão-de-obra, principalmente, do sexo feminino. E eram duas ou três centenas de operárias. A cultura era feita de maneira que, a do Faial só fosse colhida depois de trabalhada a do Pico para que as operárias de cá se deslocassem depois para aquela ilha. Uma forma simpática de garantir trabalho, quando ele era escasso. Nem todos, naturalmente, compreendiam a atitude do industrial mas o que é certo é que o prof. José Lemos, procurava servir a freguesia.
Diz um seu biógrafo que o Prof. Lemos era “Empreendedor e dinâmico no comércio e indústria”. Realmente assim foi. Basta ter presente o que dele afirma o escritor Dias de Melo: Em S. Mateus, onde nascera, exercia, com notável competência, o magistério primário e dedicava-se a várias actividades industriais. Proprietário de uma armação fundada por antepassado e há muito encerrada, resolveu, dada a conjuntura favorável aos altos lucros, também reabri-la. (1)
Aquando do seu falecimento, em 27/12/1968, dele se escreveu: Era inteligente e prático. Revelou-se chefe. Desfrutava do tacto de mandar, de administrar. Distinto, desde os bancos da escola. Jornalista de vocação aos doze anos dirigia o jornal em miniatura, “O cartão de visita”. Amador teatral com destacada presença. Professor competente e probo. Orador vibrante. Empreendedor e dinâmico no comércio e na indústria. Espírito culto e actualizado assinalou a sua passagem na vida política e administrativa do concelho e do distrito com dois mandatos (l935 e 1943) na presidência da Câmara da Madalena, o último dos quais por doze anos. Músico por intuição e por estudo o prof. Lemos foi alma de muitas associações musicais de São Mateus, estando a seu cargo o órgão da sua igreja paroquial. Era de facto o mais competente organista do Pico. Por muitos anos foi o organizador dos festejos cívicos da festa do Bom Jesus. (2)
Este um dos vultos picoenses que anda esquecido.
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1) Dias de Melo, “A Montanha cobriu-se de negro”, pág.93.
2) “Ecos do Santuário”, Fev. de 1969, Ano I, nº 7
Vila das Lajes,
2 de Março de 2012.
Ermelindo Ávila
1 comentário:
É pena que a memória das pessoas seja curta, principalmente as de S. Mateus.
Felizmente, ainda há quem fale de José Inácio Garcia de Lemos como um benemérito da freguesia que muito ajudou o povo daquele tempo.
Continuemos à espera da homenagem que lhe é devida.
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