quarta-feira, 16 de setembro de 2009

HORAS TRÁGICAS

Não é possível trazer todos os pormenores dos cataclismos ocorridos no Pico nos anos de 1718 e 1720 que atingiram, principalmente, as freguesias de Santa Luzia e de São João, levando D. João V a decretar a transferência de quarenta casais para o Sul do Brasil
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Várias vezes tenho referido o assunto. Nunca é demais lembrar as horas trágicas que os picoenses hão sofrido ao redor dos tempos.
O mês de Setembro não deixou saudades aos picoenses. Grandes e funestas erupções vulcânicas assolaram a ilha, causando a desolação, a morte e a destruição de freguesias e haveres de muitos picoenses.
A um simples arrazoado não é possível trazer todos os pormenores dos cataclismos ocorridos no Pico nos anos de 1718 e 1720 que atingiram, principalmente, as freguesias de Santa Luzia e de São João, levando D. João V a decretar a transferência de quarenta casais para o Sul do Brasil. E lá estão no Estado de Santa Catarina os descendentes desses picoenses que nunca esqueceram a terra-mater, ainda hoje bem presente nos hábitos e costumes, na cozinha e nas festas tradicionais e até nas próprias embarcações – uma cópia autêntica das velhas e históricas canoas baleeiras.
Dos sismos do século XVIII ficaram os mistérios, que hoje são extensas matas de arvoredo bravio.
Convém, no entanto, recordar o que se encontra registado numa memória arquivada no livro de tombo da Igreja Matriz das Lajes, que Silveira de Macedo transcreveu na sua obra, “História das Quatro Ilhas...”, livro há muito desaparecido: “No dia 1º de Fevereiro de 1718 tremeu a terra em horríveis convulsões, e abriram quatro bocas na montanha do Pico entre as freguesias de Santa Luzia e Bandeiras”. Foi nessa ocasião que os lajenses se lembraram de fundar a sua Igreja da Misericórdia, cuja irmandade existia nesta vila desde remota antiguidade.
A segunda crise deu-se em 1720, entre Prainha e São João e esta freguesia e a da Santíssima Trindade. O Povo foi obrigado a evacuar a freguesia fixando-se, principalmente, no sítio da Almagreira, da última freguesia. A freguesia de São João Baptista ficou completamente arrasada. Um pequeno monumento assinala o local onde se supõe ter existido a antiga igreja. Serenada a crise, a população voltou à freguesia, instalando-se nas casas que restavam e passando a exercer o culto na antiga capela de Santo António, na Ponta Rasa, recentemente restaurada pela actual família proprietária.
Na noite de 9 para 10 de Julho de 1757 um violento terramoto atingiu a freguesia da Piedade, destruindo a respectiva igreja paroquial e outras habitações e fazendo doze vítimas. O mesmo terramoto fez grandes estragos na ilha de S. Jorge, vitimando 1.034 pessoas nos concelhos da Calheta e Topo.
A actual igreja da Piedade, que estava concluída oito anos após o sismo, é um dos mais valiosos templos da ilha. Foi, recentemente, restaurada na sua primitiva traça o que bastante a valorizou. O “magnifico templo, que é um dos maiores da ilha, nada sofreu com o sismo de 1926...tem de comprimento 42 metros e 16 de largura, possui um bonito frontispício em pedra lavrada e uma só torre”. E o Prof. Ávila Coelho na sua monografia “A Freguesia de N. Senhora da Piedade na Ilha do Pico” (Boletim do Núcleo Cultural da Horta, Vol. 2, nº 3, 1961), escreve que aquela igreja possuía um admirável conjunto de imagens, entre elas a da Padroeira. Estas imagens devem vir do tempo da construção do templo uma vez que as que existiam na anterior igreja ficaram totalmente destruídas. (Pena é que a Imagem da Padroeira, embora restaurada na pintura somente, não tivesse sido conservada ao culto.)
A 23 de Novembro de 1973, um novo sismo foi sentido no Pico, fazendo muitos estragos em S. Mateus, o que obrigou uma parte da população a refugiar-se na vila das Lajes, onde foram carinhosamente recebidos.
Mais destruidor foi o sismo de 9 de Julho de 1998 que danificou, grandemente, diversas igrejas e algumas centenas de habitações da Ilha, o que obrigou ao dispêndio de avultadas quantias, quer dos Serviços públicos quer dos próprios proprietários. E por aí ainda se encontram alguns prédios arruinados e sem possibilidade de restauro o que não deixa de ser agravante para o aspecto urbanístico da própria ilha.
A freguesia de São Mateus celebra, no dia 21, a festa do Padroeiro. Nesse dia, e segundo a tradição, cumpre o voto de distribuir vésperas (rosquilhas) em gesto de gratidão, pelos vulcões de 1718 e 1720 não terem atingido a freguesia.

Vila das Lajes,
Setembro de 2009
Ermelindo Ávila

1 comentário:

Anónimo disse...

Parabéns ao jovem amigo, companheiro de uma viagem a Estrasburgo, por nunca ter desistido de nos ensinar a viver em juventude.

Bem haja.