NOTAS DO MEU
CANTINHO
Nestes dias em que se comemora os
cem anos de existência do semanário “O Dever” não é possível falar do jornal
sem se recordar a memória saudosa do seu fundador, Pe. João Vieira XAVIER
MADRUGA.
Tão ligados estiveram enquanto o Pe.
Madruga foi vivo, que não é fácil ignorar a sua existência e o que foi para o
jornal que fundou, dirigiu e manteve com entusiasmo, dedicação e sacrifício.
Sacrifício, porque era quase só o
redactor. Escrevia o editorial, a crónica, o noticiário. Fazia a revisão e
orientava a paginação. Afinal, era o director, o redactor, orientador da
composição e o mais que necessário era. Todas as suas economias iam para o
jornal, uma vez que os assinantes ou não pagavam, ou a assinatura era
insuficiente para as despesas do ordenado do tipógrafo, da compra do papel e
tinta e o mais necessário.
Como uma parte da tipografia ficasse
atrás aquando da transferência do jornal para esta vila das Lajes, uma vez nos
Estados Unidos, lá adquiriu uma Minerva e uma guilhotina para que se pudessem
executar na tipografia, além do jornal, outros trabalhos tipográficos.
O P. Madruga era um jornalista
distinto, dos mais distintos de Portugal. “O Dever” foi considerado, na opinião
do Conselheiro Fernando de Sousa, director da “Voz”, o melhor Semanário
Português.
Todos os dias o Pe. Xavier Madruga
vivia para o jornal. Tinha um sistema de vida extraordinário. Celebrava Missa
muito cedo, mesmo quando estava recolhido a casa, pois havia conseguido, da
Santa Sé, autorização para celebrar na sua residência, almoçava normalmente e
ficava no seu pequeno escritório, lendo os jornais que lhe chegavam de todas as
ilhas e alguns do continente, por permuta, escrevia o editorial (ou fundo), o
seu “Cá e Lá” nota crítica dos acontecimentos nacionais e internacionais, as
notícias que lhe levavam, e os artigos de interesse local. A ele se deve o
reinício das obras da igreja Matriz, suspensas com a proclamação da República,
a construção e o calcetamento da Estrada Lajes – Piedade, a muralha de defesa
das Lajes e tantos outros mais que é fastidioso estar a lembrar.
Quando as forças o foram
abandonando, preferiu transferir o jornal para a Paróquia, no desejo bem firme
de lhe dar continuidade.
“O Dever” foi o jornal onde muitos
jovens principiaram as suas actividades jornalísticas. Recordo alguns: Dr.
Manuel Rocha, Samuel Amorim, Dr. Fernando Maciel, Pe. José Carlos, José
Gabriel, além de diversos alunos e ex-alunos do Seminário de Angra, e outros do
Liceu da Horta ou do externato das Lajes do Pico, pois a todos acolhia com
estima e ajudava-os a ingressarem na actividade.
Ao terminar o curso do Seminário, o
P. Xavier Madruga foi nomeado professor e prefeito do mesmo instituto.
Entretanto, e a pedido de Mons. Ferreira, mantinha assídua colaboração no
“Peregrino de Lourdes”.
Por ocasião do seu falecimento, em
30 de Março de 1971, escreveu o “Boletim Eclesiástico”: ”Além da cura de Almas que exerceu com proficiência, dedicou-se às lides
jornalísticas, fundando o jornal semanário “O Dever” que dirigiu na qualidade
de Director, durante 53 anos. Salientou-se pela sua dedicação e consagração à
Igreja e, sem respeito humano, propagou sempre a verdade duma forma clara e
integérrima. O seu estilo fluente e acessível proporcionou aos seus leitores
uma leitura agradável e proveitosa. Prestou sem dúvida um relevante serviço à
Igreja e honrou a Diocese de Angra ao longo da sua vivência sacerdotal.”
Aquando da ocorrência do centenário
do nascimento do P. João Xavier Madruga, o então Bispo da Diocese de Angra, D.
Aurélio Granada Escudeiro, escreveu no “Boletim Eclesiástico”: “Vejo nele (P. Xavier Madruga) o sacerdote
culto, zeloso e persistente em seu múnus pastoral, utilizando os meios ao seu
alcance.
Entre
estes meios esteve “O Dever”, folha pequena, despretensiosa e sem especial
apresentação, iniciada em S. Jorge, onde então paroquiava o Pe. Xavier Madruga,
transferida mais tarde pelo seu director e proprietário, para as Lajes.
Cresceu
depois, alargou o seu âmbito, sendo hoje “O Dever conceituado órgão de imprensa
regional, nomeadamente do Pico. (…) Sirva o exemplo do Pe. Xavier Madruga de
conforto e estímulo a quantos, limitados em meios, desejarem alargar sua acção
e levar a todos uma palavra de luz e um aceno de amor fecundo (…) Aproveitarei
esta oportunidade – recordando o encontro que tive, há anos com o Pe. Madruga
nas Lajes – para sublinhar os bons serviços prestados por ele e por toda uma
plêiade de sacerdotes nascidos nestas ilhas.”
Aquando da celebração das “Bodas de
Ouro sacerdotais, em 5 de Novembro de 1955, que tiveram a presença do Cardeal
Dom José da Costa Nunes, seu amigo ex-corde
a Câmara Municipal homenageou o P. Xavier Madruga, descerrando uma placa, na
rua onde nasceu e sempre viveu, com a denominação de Rua Pe. Xavier Madruga.
Como já anteriormente escrevi, é
pouco. Algo mais importa fazer.
Lajes do Pico
30 de Maio de 2017
Ermelindo Ávila
Sem comentários:
Enviar um comentário