segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

ANTIGOS COSTUMES


NOTAS DO MEU CANTINHO


Há cinquenta ou sessenta anos para trás a vida destas terras eram bastante diferente. Até então, predominavam os costumes trazidos de longe, pois o isolamento dos povos era bastante acentuado. Não havia transportes regulares, nem telefones, nem rádio ou, ainda mais tarde, televisão. Só na década de vinte é que apareceu o primeiro automóvel na ilha. O isolamento era, pois, tremendo.
Os jornais, quase sempre de vida efémera e mais voltados para a política de então, raramente traziam notícias de fora. E só quando se dava um acontecimento mais grave ou de maior relevo é que publicavam um telegrama enviado por alguma agência noticiosa. E isso mesmo aconteceu ainda com a guerra de 1939-45. Já existiam os aparelhos de rádio, mas só um ou outro os possuía. Nesta vila o primeiro que aqui apareceu, veio para o Grémio Lajense e, consequentemente, pouco acessível àqueles que não eram sócios.
Mais tarde vieram as emissões dos Clube Asas do Atlântico, Rádio Clube de Angra e Emissor Regional dos Açores e, a seguir, alguns rádios. Foi então que tudo se principiou a modificar.
Voltando atrás, recordemos, os arraiais das festas religiosas, de cada freguesia ou paróquia, eram o motivo de reunião dos povos vizinhos. E era então que se encontravam amigos e conhecidos, se conversava sobre os mais diversos assuntos, individuais ou públicos, e se ficava um pouco a par do que ia acontecendo por esse mundo de Deus.
Nas épocas próprias, pelo Espírito Santo, pela festa do padroeiro, pelo Natal, ou nas matanças de porcos, é que, geralmente, se juntavam familiares e amigos e então, e nessas ocasiões, a cavaqueira prolongava-se algumas vezes pela noite dentro.
Pelo Natal, trocavam-se algumas ofertas, até mesmo de produtos da terra, havia um ou outro brinquedo para as crianças, e faziam-se licores caseiros e passavam-se figos das figueiras do quintal para servir as visitas.
Durante os Domingos Comuns, à saída das missas dominicais, encontravam-se os amigos e conhecidos e aí se trocavam cumprimentos, havia “um dedo de conversa” e até os vizinhos e conhecidos combinavam os serviços da semana. É que era habitual haver uma inter-ajuda para os trabalhos sazonais, pois só assim alguns deles se podiam realizar. Até o dia da matança de porco, um acontecimento familiar de relevo, era combinado para que não se sobrepusesse, permitindo a ajuda de familiares e vizinhos.
Logo a seguir ao Natal vinha o Carnaval, quatro semanas antes da Quaresma. Normalmente, eram festejadas as quintas-feiras: de amigos, amigas, compadres e comadres. Faziam-se filhós, convidavam-se os amigos e a noite era passada com amigos e parentes a bailar umas chamarritas. De vez em quando, apareciam alguns mascarados, que sempre havia quem se dispusesse a percorrer as casas com algum entremez num arremedo de comédia.
Em chegando à Quarta-feira de Cinzas, tudo terminava. Entrava-se na Quaresma e durante esse tempo de penitência não havia folgas, bailes ou outros quaisquer divertimentos. Quando muito ensaiava-se uma dança ou uma comédia para sair pela Páscoa. E todos respeitavam essas semanas. As pessoas vestiam de escuro quando tomavam parte nos actos religiosos, que os havia durante as Domingas quaresmais: via-sacra, procissões, e sobretudo a desobriga feita nos dias próprios de cada família: eram os chamados quartéis, anunciados nas missas do domingo anterior.
Normalmente, era no verão que se realizavam nas paróquias as festas tradicionais com arraiais, onde se exibia uma filarmónica ou duas, e se faziam as arrematações das ofertas ou promessas levadas em cumprimento de votos. Vulgarmente, uma rosquilha, uma cabeça de massa, uma perna ou um menino, consoante a promessa feita em ocasião de doença de um membro da família. Ainda hoje isso se verifica em algumas localidades, apesar do indiferentismo que se instalou nos nossos meios. É, por exemplo, o caso da festa de Nossa Senhora da Piedade, onde aparecem peças de massa sovada dos mais diversos feitios.
E era pelas festas, principalmente as do princípio do Verão, que se estreavam as peças novas de vestuário: vestidos e chapéus para o elemento feminino e fatos e chapéus para o masculino, não faltando igualmente o calçado novo.
E neste escrito recordo o Natal, uma das principais festas do ano, com as tradicionais novenas, depois as Matinas cantadas na véspera, a Noite de Natal... As saudades que ficaram desses tempos simples mas plenos de uma alegria contagiante, principalmente, quando chegava a Noite do Natal, se cantava a Missa do Galo e o Presépio armado com o estábulo, o lago com as vaquinhas, as ovelhas no monte, os pastores caminhando guiados pela estrela e, lá ao longe, os Reis Magos vindos do Oriente. Tudo tão belo!
Nas nossas casas havia o Presépio, limitado a pequeno altar com o Menino Jesus no trono, enfeitado com tacinhas de trigo verdejante e rosas.
Hoje é tudo diferente!... Tão diferente!...
Para todos, os de Casa, os assinantes e os leitores, Boas Festas do Natal !

Lajes do Pico, Dezembro de 2012.

Ermelindo Ávila 

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

EU SOU A IMACULADA CONCEIÇÃO


NOTAS DO MEU CANTINHO

Desde remotas eras, Portugal prestou culto à Imaculada Conceição.
Nesta Vila das Lajes, os franciscanos construíram seu convento junto de uma ermida que Isabel Pereira fundara, acima da Vila cerca de 1559 e lhe doara alguns foros que tinha, e no seu testamento deixara que, se algum tempo do mundo os frades de São Francisco ali quisessem fundar convento, lhe dariam a ermida com todos os foros. A ermida era dedicada a Nossa Senhora da Conceição (que ainda conheci incorporada no edifício do convento). E assim aconteceu. O convento foi fundado junto da ermida, e a Comunidade nela instalada a 31 de Agosto de 1691. Mais tarde, foi aumentado para Norte e construída a Igreja própria, igualmente dedicada a Nossa Senhora da Conceição. Foi inaugurada em 1768, mas só ficou concluída em 1804. Poucos anos depois, na noite de 1 de Fevereiro de 1830, um violento incêndio destruiu, totalmente, a igreja e seus haveres. Em 1832 foi extinto o convento, por decreto de D. Pedro de 17 de Maio. Mas o P. Francisco Salles, último guardião, conseguiu restaurar a Igreja, e nela colocar uma imagem da Imaculada, oferecida pela Misericórdia da Horta, sendo substituída, em 1906, pela actual, uma excelente escultura adquirida com donativos recolhidos pela devota Rita Carolina, uma jovem que, devido à tuberculose contraída nas andanças pelas ilhas em peditório, morreu cedo.
A devoção à Imaculada Conceição, em Portugal, é muito antiga. Em 1618, a Câmara Municipal de Lisboa mandava lavrar em pedra, nas portas principais da cidade, letreiros em que se afirmava que a Virgem Maria fora concebida sem pecado original. E “Nas cortes de 1645-1646 assentou-se em tomar por padroeira do reino a Imaculada Conceição”. (1)
Portugal, desde há longos anos, vivia a fé neste dogma mariano, tendo D. João IV consagrado o reino à Senhora da Conceição. E em 25 de Março de 1646 coroou, solenemente, a Imagem de N. Senhora da Conceição de Vila Viçosa.
A partir daí os reis de Portugal nunca mais usaram coroa.
De assinalar a construção do santuário do Sameiro, Braga, cuja primeira pedra foi benzida, a 29 de Agosto de 1869. (2)
Em 8 de Dezembro de 1864, Pio IX proclama o dogma em que declara que a Virgem foi imaculada desde a sua concepção.
Entretanto, dão-se as aparições da Virgem em Lourdes. Pela primeira vez, a 11 de Fevereiro de 1858, a Virgem aparece na Gruta de Massabielle a uma jovem, hoje Santa Bernardete, mas só na aparição de 25 de Março, dia em que a Igreja celebra a Festa da Anunciação, e depois de muitas insistências da vidente, a Aparição “Abriu então os braços e os inclinou para o solo, como para mostrar à terra suas mãos virginais, cheias de bênçãos. Depois, levantando-as para a eterna região donde desceu, em igual dia, o Mensageiro divino da Anunciação, tornou-as a juntar, fervorosamente e, olhando para o céu com sentimento dum indizível agradecimento, pronunciou estas palavras: Eu Sou a Imaculada Conceição.” (3) Confirmava assim o dogma de Pio IX.
Como acima refiro, o culto da Imaculada Conceição é muito antigo em Portugal e até mesmo nesta vila. Daí terem os franciscanos fundado seu convento junto da ermida que Isabel Pereira havia construído no cimo da vila. O convento franciscano está hoje a servir de Paços do Concelho e nele instaladas algumas repartições do Estado.
A igreja estabeleceu no calendário litúrgico o dia 8 de Dezembro como o dia da Imaculada Conceição. Outrora, era uma das solenidades maiores celebradas nesta Vila, precisamente na Igreja do antigo convento, com novenário e matinas na véspera. A partitura das matinas era uma peça clássica, com magníficos solos cantados, geralmente, por músicos excelentes convidados para o efeito. Mas tudo passou. Ficou, porém, a devoção bastante entranhada na alma do povo crente, pois conta cerca de cinco séculos. Na Matriz das Lajes, até meados do século passado, era o dia escolhido para a celebração da Comunhão Solene (primeira e única).

1) Almeida, Fortunato, “História da Igreja em Portugal”, pág. 558
2) Silva, Heitor Morais, S.J., “História dos Papas”, pág. 322
3) Lasserre, Henrique, “Nossa Senhora de Lourdes”, 1871, pág. 194
Vila das Lajes do Pico, Dezº de 2012
Ermelindo Ávila

domingo, 2 de dezembro de 2012

CULTURA MUSICAL PICOENSE


NOTAS DO MEU CANTINHO


No dia 22 do corrente mês, a Liturgia católica celebra a memória de Santa Cecília, padroeira dos músicos. É uma festividade que aqui teve início, no ano de 1947, quando o Pe. António Filipe Madruga exercia as funções paroquiais na Matriz desta vila, após o falecimento do vigário e ouvidor Pe. José Vieira Soares. A partir daí, a capela da Matriz tem procurado promover essa memória. E fê-lo no passado domingo, com a colaboração de todos os coros paroquiais do concelho.
A vila das Lajes tem, de facto, uma tradição que vem de longos anos, com a cultura da Música. Quando por cá estavam os frades franciscanos, eram eles que colaboravam nas paroquiais, cantando nas festas solenes.
Em 1677 a confraria de S. Pedro “Despendeu da pregação e música na festa do Santo aos Frades mil reis”. Os Frades eram os franciscanos, porque outros não havia por cá.
Só quando os religiosos foram expulsos é que os padres seculares tomaram a seu cuidado a música das celebrações solenes. E excelentes músicos que alguns foram. Recordo os mais recentes: Pe. António Lúcio Ribeiro, Pe. João Pereira da Terra, Pe. Domingos Ferreira da Rosa Ângelo, Pes Manuel e José Ávila, Pe. Joaquim Vieira da Rosa, Pe. José Vieira Soares e até o Pe. António Filipe Madruga, além de João Homem Machado, que fez o curso no Seminário de Macau e que em S. Bárbara, desta ilha, e depois no Rio de Janeiro, Brasil, desenvolveu apreciável actividade musical, sendo o autor da letra e música do hino da Casa dos Açores, de que foi co-fundador. Publicou um importante estudo sobre “O Folclore na Ilha do Pico”. O Pe. José Vieira, ainda seminarista, foi nomeado para o coro da Sé, dada a sua excelente voz, apurado ouvido e conhecimentos musicais. O Pe. João foi o professor de diversos, particularmente, dos Pes. Ávila e Francisco Vieira Beleza. O Pe. José de Ávila foi professor de música no seminário, e de canto coral em diversos Liceus, incluindo o Liceu Camões, em Lisboa. Foi o fundador do orfeão de Angra donde derivaram os actuais grupos orais existentes em diversas ilhas.
De justiça aqui registar o Grupo Coral das Lajes do Pico, fundado e dirigido pelo malogrado Maestro Manuel Emílio Porto, não só ensaiador e regente, como inspirado compositor, um verdadeiro artista que, além de diversos trabalhos publicados, deixou, ao que consta, centenas de partituras inéditas. Do Seminário, onde tiveram Mestres de muito valor, como o referido Pe. José de Ávila e o Dr. Edmundo Machado Oliveira, saíram muitos sacerdotes que foram bons cultores da Música e promotores dos grupos corais em diversas ilhas. Um deles foi o já referido Maestro Emílio Porto.
O Pe. Manuel José Lopes, além de bom músico, foi ensaiador e regente de algumas filarmónicas, já no tempo em que cursou o Liceu da Horta. Em São Mateus, onde exerceu as suas funções sacerdotais, fundou a Filarmónica “Lira Picoense” (salvo erro), que veio a extinguir-se com a sua saída e cujo instrumental foi vendido mais tarde para a Filarmónica da Piedade, fundada pelo Pe. Francisco Vieira Soares.
A Música tem tido bons cultores na ilha do Pico. O concelho das Lajes tem, actualmente, seis Filarmónicas e quatro delas já celebraram cem anos. A Filarmónica Liberdade Lajense, a mais antiga, foi fundada em 14 de Fevereiro de 1864.
Na década de trinta do século passado, fundou-se, nesta vila, a Orquestra Santa Cecília, por Gil Xavier Bettencourt, que deu alguns concertos com notável êxito. Como, depois, uma Tuna de apreciável valor artístico, fundada e mestrada por Manuel Vitorino Nunes Jr..
Antes havia existido a Filarmónica Artista Lajense que, durante vários anos, actuou sob a regência de Manuel Xavier Bettencourt e, depois, do filho Gil Xavier. Constituíam a Família Xavier, músicos notáveis, o que levou a Câmara Municipal, aqui há anos, a dedicar-lhe uma das ruas da Vila, hoje denominada “Rua Família Xavier – Músicos”. Mas não só os citados. Importa lembrar D. Maria Xavier, seu filho o maestro Manuel Xavier Soares, e a sobrinha D. Margarida Xavier, distintos executantes e professoras de piano, que deixaram bons discípulos.
Mas, afinal, na ilha do Pico sempre se cultivou, com muito interesse, a divina arte. Lembro as Filarmónicas Recreio dos Pastores (1904), Lira Fraternal Calhetense (1888) e Recreio Ribeirense (1900), além da Liberdade Lajense, todas já centenárias, a União Musical da Piedade (1944) e a União Ribeirense (1952) de Santa Bárbara; a União Artista de S. Roque (1880), também centenária, a Recreio União Prainhense (1934) da Prainha do Norte e a Recreio Santamarense (1931) de Santo Amaro. A Vila da Madalena tem duas Filarmónicas de elevado nível artístico: a Lira Madalenense (1897) e a União e Progresso (1879). Recentemente, foi fundada a “Lira de S. Mateus”, numa freguesia onde sempre existiram bons cultores da Música. Recordo os professores Manuel José Rodrigues e José Inácio Garcia de Lemos.
E lembro o velho e bom amigo, Manuel Cristiano de Sousa e Simas, além de Rodrigo Ferreira, na Madalena, que, foram bons executantes e inspirados compositores.
E os ranchos folclóricos que mantêm, com entusiasmo, a Música popular e que aí andam, nas festas e arraiais, a divertir o povo?! São vários os que existem na ilha do Pico. Não esqueço também a qualidade dos novos compositores, maestros e executantes das nossas filarmónicas picoenses formados nas escolas públicas, e já com excelentes provas dadas. Presentemente, temos o maestro Antero Ávila autor de alguns trabalhos relevantes. Mas é impossível todos aqui recordar.
Nestes dias em que a Padroeira da Música é lembrada, vale a pena esta pequena homenagem simples mas justa, aos cultores da Arte Musical, na ilha do Pico.

Vila das Lajes do Pico,
Nov.2012
Ermelindo Ávila

A RESTAURAÇÂO


NOTAS DO MEU CANTINHO

Aproxima-se o 1º de Dezembro. Uma data nacional que sempre foi assinalada com diversas solenidades, principalmente nas escolas, onde todos os alunos aprendiam e cantavam com entusiasmo o conhecido “Hino da Restauração”.
Aquando do duplo centenário da Independência e Restauração, em 1940, Portugal comemorou a data com diversas monumentos.
O Poeta Pe. Moreira das Neves, além de muitos poemas, a propósito, publicados na Imprensa, lançou a ideia de se construírem Cruzeiros em todos os concelhos de Portugal a registar a dupla efeméride.
Essa a razão primeira e altamente patriótica da construção do Cruzeiro que se encontra à entrada desta vila, já que a estátua que nela devia ser erguida, se desviou para outro concelho. Mas isso não vem hoje para o caso. Importa, antes, realçar o significado histórico do Cruzeiro da Restauração e Independência de Portugal. (Falta-lhe a placa indicativa que lá existia e que foi retirada, talvez por se encontrar fendida; todavia assim havia sido colocada, como, infelizmente, chegou de Lisboa.)
E tanto mais é de recordar o extraordinário feito, quanto nos custa aceitar que o histórico acontecimento vai passar ao esquecimento com a abolição do feriado comemorativo. Na realidade não se compreende que isso aconteça, quando outros de somenos importância histórica se mantêm, gaudiosamente. É caso para se perguntar: Onde está o patriotismo dos governantes portugueses?
Todos os historiadores dão relevo à Restauração de Portugal. É um feito nacional que qualquer nação se orgulharia de comemorar.
Portugal preocupa-se em manter dois feriados que assinalam revoluções internas, mas relega aquela que restaurou a independência da nação, livrando-a do jugo estrangeiro. Será que a Troika aqui também teve influência? Talvez já não importe a soberania da Nação?

*

Sob ao domínio dos Filipes a situação de Portugal, esmagado de impostos, agrava-se cada vez mais e torna-se lamentável. A Miséria do povo e o seu desenvolvimento chegam ao apogeu e começam a traduzir-se em tumultos...” (1) E há quem julgue que a história se não repete...
No dia 1 de Dezembro de 1640, pelas nove horas da manhã, os quarenta conjurados, além dos seus aderentes, em número de 120, assaltaram o Paço da Ribeira, guardado pelos castelhanos que dominavam Portugal há sessenta anos, imobilizaram o secretário da vice-rainha Duquesa de Mântua, Miguel de Vasconcelos, que estava escondido num armário, abateram-no e lançaram-no à rua. E foi então que outro Miguel, D. Miguel de Almeida, do alto do balcão principal, proclamou a liberdade da Pátria e a realeza de D. João, Duque de Bragança, aclamado como D. João IV, Rei de Portugal.
Era o fim do domínio estrangeiro. A Nação retomava a sua independência que nunca mais seria perdida. Portugal comemora esse feito glorioso há 372 anos! (2)
Será que vamos regressar a 1639 e ficar de novo subjugados por domínios estrangeiros? Surgirão novos Miguéis de Vasconcelos a trair a Pátria lusa?
Portugal vive, na realidade, momentos aflitivos. Não está iminente uma guerra de armas mas outra não menos mortífera: a subsistência das suas gentes. A derrogação dos seus direitos e prerrogativas. A ausência de respeito pelos direitos, liberdades e garantias do seu povo.
Desapareceu a época gloriosa das descobertas e conquistas. Dela ficou, quase somente, o poema de Camões. Mas esse também anda esquecido com a introdução de novas maneiras de expressar a língua pátria.
Estamos reduzidos a uma faixa de terreno na Península Ibérica, “à beira mar plantada” e a uns pináculos no meio do Atlântico, sujeitos às intempéries atmosféricas e às tropelias políticas dos governantes, até que um dia apareçam os novos traidores da Pátria.
Deixem-nos ao menos o feriado do 1º de Dezembro a recordar esses feitos e memórias gloriosas que trouxeram a Portugal a restauração e a independência.

__________

1) “Pequeno Dicionário de História de Portugal”, dirigido por Joel Serrão.
2)Serrão, Joaquim Veríssimo – “História de Portugal” Vol. V -– 1980 -

Vila das Lajes do Pico, Nov.2012
Ermelindo Ávila

Seminário de Angra 1862 – 2012



Segundo o auto lavrado pelo escrivão da Câmara Eclesiástica, José Maria Sodré, as aulas do Seminário Diocesano de Angra iniciaram-se no dia 9 de Novembro de 1862. São decorridos, portanto, 150 anos. Uma efeméride a recordar, com efusivos louvores.
Matricularam-se 26 alunos, número superior ao actual. Desses primeiros fizeram parte 8 alunos da ilha do Pico, entre eles António Lúcio Ribeiro, já viúvo e professor de ensino secundário. Frequentou o último ano e ordenou-se sacerdote, continuando nas Lajes a leccionar Latim e Latinidade.
Com a proclamação da Republica o Seminário foi extinto em Outubro de 1911, tomando o Administrador do Concelho conta das chaves, do recheio e do fundo financeiro.
Os alunos dispersaram-se: uns voltaram para as famílias e outros instalaram-se em residências particulares e recebiam aulas nas residências dos professores. Em 2 de Março de 1914, o Dr. Bernardo Almada, de acordo com o Governador do Bispado, comprou o Palácio do Barão do Ramalho. (Enquanto nele viveu não permitiu que fossem alteradas as salas que ocupava.) Aí principiou a funcionar o seminário, com a denominação de internato, pois não era permitido, pelas leis republicanas, a existência de seminários.
A população escolar voltou a crescer e a casa tornou-se pequena para a albergar. Entretanto, foi comprada uma casa no Pátio do Conde, em S. Luzia, (onde hoje existem os Serviços Meteorológicos) que passou a servir de camarata a uma parte dos alunos. Os outros ficavam numa sala por cima da sacristia da Sé. Mais tarde os teólogos instalaram-se no último andar da Casa das Senhoras Meneses. Hoje, julgo ser a seda das “Obras Católicas”.
Era penosa a deslocação, principalmente no inverno, para as camaratas. Seguia-se pela rua da Esperança e atravessava-se a Rua da Sé, com excepção do domingo. Nesse dia, não se podia ir pela rua da Esperança por causa das sessões de cinema no Teatro. Descia-se, pois, à rua da Sé e subia-se por ela, vendo as montras dos estabelecimentos comerciais, o que já não era pouco... Recolhiam às nove e meia da noite. O despertar era às 5,30 h. da manhã. Na Sé, só ficavam os mais novos e depois uma parte dos médios...
Em disciplina não havia contemplações. Os Prefeitos eram inexperientes mas exigentes. Alguns nem padres eram ainda e tratavam os alunos como “animais bravos”... Daí algumas das desistências. Em 1927 entraram para o Seminário 50 alunos. Terminaram o curso cerca de vinte!...
Diferente era o corpo docente, a quase totalidade formada em Roma. Muitos deles deixaram saudades nos alunos: recordo o Dr. Cardoso do Couto, que foi vice-reitor (reitor era o Prelado) até 1928, e professor de Filosofia, o Dr. Garcia da Rosa, professor de Português, e o P. Costa Ferreira, professor de Literatura e História (e alguns mais). Em 1928, quando ainda era vice-reitor o Dr. Couto, o Orfeão da regência do P. José de Ávila, foi a Ponta Delgada. Os seus concertos fizeram sucesso. E, depois, só uma vez foi permitida a saída ao Teatro Angrense.
Ainda na administração do Dr. Couto foi construída a camarata da Rua do Rego, que passou a ser utilizada pelos mais novos. Era a “Camarata do Dr. Couto”.
Com a entrada de novo vice-reitor, tudo se modificou ou, melhor, complicou. Os alunos, até então, não saíam com vestes talares, até porque o espírito dos antigos republicanos ainda se impunha. A partir daí, e porque a revolução de 28 de Maio havia alterado o sistema político, o novo vice-reitor impôs a saída de batina, até aos mais novos... A medida causou certa perplexidade na cidade, dado até o “isolamento” imposto. Nem era permitido o contacto, durante os passeios, com qualquer estranho... Atribulados foram os anos que se seguiram com as construções que se fizeram, muito embora tivessem permitido o albergue interno de todos os alunos.
Apesar de tudo, é de registar que o Seminário de Angra foi sempre considerado um estabelecimento de ensino superior modelar, pelo Corpo Docente que nele leccionava.
E termino aqui, pois já excedi o espaço que me foi concedido.
Vila das Lajes, 13-11-2012.
Ermelindo Ávila