sábado, 16 de setembro de 2017

ARRAIAL…

NOTAS DO MEU CANTINHO

Um arraial que é uma vergonha e continua, sem que haja quem lhe dê uma solução razoável. Até quando, não sabemos, mas não deixa de ser um verdadeiro escárnio para as Lajes e até para quantos nos visitam, e já são bastantes, principalmente nesta quadra de estio em que o calor se faz sentir já em demasia.
Há dias deram-me a oportunidade de dar um pequeno passeio pela muralha do Caneiro, que circunda a Lagoa interior do porto das Lajes. Estava esta cheia de embarcações de recreio que são aquelas que agora ali mais abundam, principalmente nesta época de verão.
E são as locais, algumas de outros portos e até estrangeiras que ali estacionam. O espaço está praticamente ocupado e algumas das embarcações estão junto a outras, por falta de espaço de amarração.
Mais fora está a lagoa formada pelo molhe que aqui há anos foi construído para defesa da Vila e que tem dado bons resultados, apesar de ir perdendo o coroamento com as vagas que o atingem, deixando-o todo “dentado”. No entanto, não deixa de ser chocante ver as bandeirolas ali colocadas em pequenos mastros a sinalizar os montículos submersos que estão espalhados naquele espaço, indicativos do perigo que é deles se aproximarem as embarcações que demandam o porto. E já houve arrombamentos…
Pouco custará meia dúzia de velas de dinamite que destruam aqueles obstáculos, permitindo a circulação segura da navegação e acabando com o espectáculo, algo ridículo, do “arraial” que representam. Será necessário abrir subscrição para a aquisição de tão diminuta quantidade de material explosivo?

Sem grandes custos prestava-se, no modesto entendimento do articulista, uma boa ajuda ao serviço portuário. Estarei certo ou o que venho de expor não passa de uma opinião ultrapassada? E por aqui fico. Outros melhor informados, tratarão deste caso. O que não deixa de ser uma realidade é que a navegação de recreio tem dificuldades em demandar o porto pelos vários cabeços submersos que evitam o livre trânsito naquele espaço.

Lajes do Pico

26-Julho-2017

Pequenas notas…

Notas do meu cantinho

            Volto a este meu cantinho … Nem sei se os leitores deram pela sua falta. Pouco importa. No entanto, vou deixando as minhas singelas notas que outros, tempos passados, poderão aproveitar para os seus trabalhos e estudos.
            Estamos, aqui no Pico, nas chamadas “festas de verão”. Tiveram início, no dia 22 de Julho, com as festas de Santa Maria Madalena, padroeira do mais novo concelho picoense. No decorrer dos anos, as Festas da Padroeira têm beneficiado de tratamentos vários. Recordo, v.g., “Os Maiores Dias da Vila da Madalena”, em que se comemorou, naquele concelho, em 1960, o “Duplo Centenário” do culto da excelsa titular da Paróquia, Santa Maria Madalena.
            Mais tarde, a solenidade da Padroeira tomou novo incremento com a declaração oficial do dia 22 de Julho como feriado municipal. A Câmara promoveu grandes festejos externos com uma brilhante iluminação que esteve a cargo de um artista angrense, creio que Fausto Cristóvão. A partir de então as festas externas em honra da Padroeira tomaram esplendor maior.
            Logo a seguir, a paroquial de São Mateus celebra a solenidade do Bom Jesus Milagroso, no dia 6 de Agosto, precedida de novenário solene e com pregação a cargo de oradores consagrados. Até há uns anos passados, eram às dezenas os sermões votivos, o que obrigava, por vezes, o mesmo orador a pronunciar dois e três seguidos, sistema que, creio, desapareceu. Há muitos devotos que, em cumprimentos de votos, se deslocam a pé, todos os dias a S. Mateus para assistirem às novenas solenes e com pregação por oradores convidados das ilhas ou do continente.
            Sobre a festa do Bom Jesus escreveu Dom João Paulino, ao tempo vice-reitor do Seminário Diocesano, no antigo “Peregrino de Lourdes”, de Angra, o seguinte: Em 1882 no mês de Agosto, passava pela freguesia de S. Mateus da ilha do Pico, por ocasião da festa que anualmente ali se celebra no dia 6 de Agosto em honra do Bom Jesus, um sacerdote da vila das Lajes da mesma ilha. Viu e admirou o entusiasmo religioso da imensa multidão de fiéis que de todos os pontos da ilha e de fora dela ali haviam concorrido impelidos pela devoção à imagem do Senhor Ecce Homo que sob aquela invocação se venera na Igreja da freguesia.”
            No dia 15 de Agosto, realizam-se em algumas paróquias picoenses festas litúrgicas em honra de Nossa Senhora. É o caso da paróquia da Silveira que, desde longa data, soleniza de maneira brilhante, a Mãe de Deus.
            As festas religiosas normalmente constavam de Missa da Comunhão Geral, Missa Solene, cantada, de três padres e procissão.
            Presentemente, deixou de haver a Missa da Comunhão Geral, pois em todas as Missas se distribui a Sagrada Comunhão, uma vez que o actual Direito Canónico, promulgado depois do Concílio Vaticano II, estabelece no cânone 919 que o jejum, de comida ou bebida, só deve observar-se por espaço de uma hora antes, excepto água ou remédios.
            No último domingo de Agosto celebra-se na Matriz da Santíssima Trindade das Lajes do Pico a Festa de Nossa Senhora de Lourdes. Vem de 1883, ano em que chegou às Lajes a Imagem da Virgem aparecida na Gruta de Massabielle.
            Num dos seus brilhantes artigos publicados no citado jornal terceirense escreve ainda D. João Paulino;”Festa de tamanho luzimento jamais fora vista dentro dos muros daquele templo desde que ressurgiu dentre os escombros a que o reduzira um pavoroso incêndio aí por 1830.” E “a festa teve lugar não na igreja Matriz, à qual fora ofertada a imagem, mas na igreja do extinto convento de Sã Francisco, por esta, em consequência da sua situação, forma arquitectónica e estado de conservação, poder dar maior realce aos simpáticos festejos.”
            Escreve ainda D. João Paulino, no artigo de 20 de Julho de 1889:
            “A ornamentação do templo dirigida por um hábil armador expressamente chamado da ilha Terceira, - a música executada pela capela da Matriz e por alguns músicos de fora acompanhada a instrumental – a boa execução das cerimónias religiosas, - o entusiasmo piedoso dos fiéis, - a novidade da festa - tudo dava aos actos religiosos uma grandeza e majestade nunca dantes ali presenciada pelos filhos da actual geração.”
            A Imagem foi adquirida nesse ano por vinte e sete paroquianos, da lista fazendo parte uma armação baleeira “de que era gerente Amaro Adrião de Azevedo e Castro”.
Os lajenses, no final do mês de Agosto que se aproxima, vão, uma vez mais, celebrar as grandiosas festas em honra de Nossa Senhora de Lourdes. Ainda é cedo para mais adiantar…
Lajes do Pico, Julho de 2017

Ermelindo Ávila

DE NOVO, O TURISMO

Notas do meu cantinho

Trata-se, afinal, de um assunto que está na “ORDEM DO DIA”. Interessa dele falar porque nessa actividade se encontra, presentemente, a base da economia local, uma vez que outras actividades económicas não existem por cá, nem se descobrem iniciativas para as instalar, que não deixa de ser uma mazela perniciosa para o progresso e desenvolvimento desta terra, que já foi uma das mais progressivas desta ilha açorianas,
O “Posto de Turismo” foi há anos, nem sei há quantos, instalado no antigo forte de Santa Catarina, imóvel declarado oficialmente de “Interesse Público”. No qual se fizeram algumas adaptações, embora as menos aconselháveis. Desapareceram algumas ameias do lado do Mar e conservou-se o forno, construído em 1885 para funcionar como forno da cal, que ali esteve instalado, colocando-se uma cúpula em plástico para desvio das águas das chuvas.
No actual “Posto de Turismo” funciona uma pequena livraria, quase toda de edição municipal ou com títulos patrocinados pela Câmara Municipal, o que não deixa de ser importante, já que não existe estabelecimento congénere no comércio local. 
Com a construção de um novo edifício na praça do Museu dos Baleeiros, é motivo para perguntar: o que vai acontecer ao antigo Castelo? Não será de preservá-lo, embora voltando um pouco à sua traça primitiva, e fornecendo aos visitantes um pequeno historial, que não será difícil de organizar?

         No antigo posto de Santa Catarina, ao norte da Vila das Lajes, foi construído o castelo ou forte, em cumprimento da ordem régia que mandava edificar fortalezas em todas as ilhas, como precaução contra as invasões dos Exércitos de Napoleão. Decorria o ano de 1792. A Revolução Francesa havia acontecido em 1789. Estava iminente a invasão de Portugal pelos exércitos franceses.”[1]

É tempo de dar solução à construção iniciada. Os turistas vão aumentando e tem de haver alguém, convenientemente preparado, que os saiba orientar e conduzir na Vila das Lajes. Não é somente o whale whatching que interessa. A Vila, a mais antiga e de interesse turístico melhor aspecto arquitectónico e com variado tem de ser patente aos visitantes na sua realidade cultural e histórica.

Vila das Lajes, 7 de Agosto de 2017
Ermelindo Ávila



[1] ÁVILA, Ermelindo. FIGURAS & FACTOS (Notas Históricas), 1993

AS GRANDES FESTAS DOS LAJENSES

Notas do meu cantinho

Não são de ontem nem de hoje. Celebram-se poucos anos após o grandioso acontecimento das Aparições da Virgem na Gruta de Massabielle, em França, no dia 11 de Fevereiro de 1858.
As festas iniciaram-se aqui, junto ao porto da vila, quando os baleeiros, regressando de uma arriada, se viram impedidos de atravessar a entrada por ciclónicas vagas do mar alteroso. O povo, que não somente os familiares dos baleeiros, porque nesses momentos de angústia há uma solidariedade entre as gentes do Mar que a todos une em preces fervorosas, clamando alto, invocou a Virgem aparecida alguns anos antes à Vidente (hoje canonizada) Bernardete. Isso nos narra o lajense, ao tempo Vice-Reitor do Seminário, Dr. João Paulino de Azevedo e Castro que viria a ser mais tarde Bispo de Macau.
Decorridos alguns instantes, o tempo melhorou, o mar acalmou e os botes puderam entrar calmamente no porto sem qualquer dado.
Mais do que o autêntico “milagre”, estava instituída a devoção pública a Nossa Senhora e, por assim dizer, inauguradas as festas anuais em honra de Nossa Senhora de Lourdes. Isto que toda a gente sabe, convém aqui repetir, para que os novos, se este arrazoado lerem, se apercebam que a Festa de Lourdes, integrada na Semana dos Baleeiros, não nasceu nos últimos anos, com a chamada Semana dos Baleeiros, mas já conta 134 anos de celebração, dentro do autêntico espírito cristão que a anima, muito embora os festejos externos, uma verdadeira homenagem de filial respeito tributado pelo baleeiros à sua padroeira, venham do início das solenidades promovidas em 1883.
A primeira festa teve lugar na Igreja de S. Francisco, “por esta, em consequência da sua situação, forma arquitectónica e estado de conservação, poder dar maior realce aos simpáticos festejos.” [i]
“Festa de tamanho luzimento jamais fora vista dentro dos muros daquele templo desde que ressurgiu dentre os escombros a que o reduziu um pavoroso incêndio, aí por 1830”.
“A ornamentação do templo dirigida por um hábil armador expressamente chamado da ilha Terceira, - a música executada pela capela da Matriz e por alguns músicos de fora, acompanhada a instrumental (…) – tudo dava aos actos religiosos uma grandeza e magestade nunca dantes ali presenciada pelos filhos da actual geração! “
A festa tem lugar na 4.ª Dominga de Agosto, “dia em que a igreja reza do Imaculado Coração de Maria”.
“Durante o dia da festa e na véspera, as proximidades da igreja acham-se vistosamente embandeiras, e na noite dum destes dias, conforme o tempo permite, tem lugar uma bonita iluminação chinesa que atrai concurso imenso de espectadores.” (…) “O espectáculo que oferece a iluminação – sempre de bonito efeito de qualquer parte que seja observada.”
(A iluminação chinesa ou veneziana, era feita com balões em armações de folha de Flandres forradas de papel transparente de multicores, onde era colocada uma vela de estearina. Hilariante era, por vezes, quando o vento inclinava os balões e o fogo consumia a cobertura.
A partir do surgimento da electricidade desapareceu a iluminação à veneziana e passou-se a fazer artísticas iluminações, sendo para o efeito contratado um artista terceirense, o que agora deixou de acontecer…)
 Com a celebração do centenário, os festejos externos tomaram grande desenvolvimento, estendendo-se por uma semana a que se denominou “Semana dos Baleeiros”. Apesar da actividade baleeira ter desaparecido, a denominação da Semana festiva continua com o mesmo entusiasmo e brilhantismo. Aliás, como vem acontecendo por estas ilhas açorianas. Pena que dos programas tivessem desaparecido as conferências proferidas durante a “Semana” por ilustres literatos e cientistas, alguns deles Professores Universitários, que aqui se deslocavam com muito agrado, tendo sempre a escutá-los uma larga assistência que muito os apreciava. Nunca é tarde para recomeçar, pois os encargos eram diminutos.
Estamos chegados, uma vez mais, às tradicionais festas de Nossa Senhora de Lourdes, as maiores que por estas ilhas se realizam em honra e louvor da Senhora Aparecida em Lourdes.
A procissão pára na Pesqueira (Porto), tem sermão votivo, colocando-se o Orador na proa de um antigo bote baleeiro; depois, a Veneranda Imagem percorre todos os outros botes de velas enfunadas, onde os velhos  baleeiros, aqueles que ainda existem, se postam em gesto de homenagem à sua Padroeira, enquanto estrugem dúzias de foguetes, não tantos como outrora, quando as baleias eram o sustento e o amparo  de muitas famílias picoenses.
As festas continuam. Hoje é a Semana dos Baleeiros. E continuará, embora algo diferente, mas sempre em louvor da Virgem que há 135 anos (1882) aqui foi invocada publicamente, pela primeira vez, em terras açorianas.
Lajes do Pico,13-Agosto-2017
    Ermelindo Ávila




[i] Estas e as restantes citações são de crónicas de Dom João Paulino de Azevedo e Castro publicadas no jornal “Peregrino de Lourdes”, Julho, 1889.

AS FESTAS DO VERÃO

NOTAS DO MEU CANTINHO

            Praticamente terminaram as festas de verão, se bem que, numa ou noutra paróquia, ainda se realizem as festas dos Padroeiros, como são os casos de Piedade e São Mateus. Festas de menor luzimento não deixam de atrair os naturais da freguesia que vivem fora e que, anualmente, regressam ao torrão natal para tomar parte nas celebrações. É um costume ou tradição que vem de longe e que se mantém, agora que as comunicações são mais facilitadas, por terra, mar ou ar.
            É sempre agradável encontrar os nossos conterrâneos de volta à terra, a reviver os cantinhos onde nasceram e foram criados.
Eles partiram um dia para conseguirem melhor viver e um futuro mais próspero para os filhos. Mas não esquecem o lugarzinho que lhes foi berço. Lá longe, não escrevem tanto como antigamente, mas a TV e o telemóvel estão sempre ligados para saberem notícias dos seus e novidades da terra. É, na realidade, uma aproximação mais simpática. E, até acompanham com interesse as novidades da terra, através dos próprios jornais, embora as notícias sociais, e disso se queixam, sejam raras ou quase inexistentes.
            Mesmo assim, os jornais são lidos e os artigos ou notícias de interesse recortados e cuidadosamente guardados, até para deixarem aos filhos…
            Alguns emigrantes ainda aí estão para assistirem às festas das suas freguesias, que, para eles, têm um interesse muito especial. É o que acontece, v. g., na freguesia da Piedade, onde as festas da Padroeira e a de Nossa Senhora das Mercês, esta festejada no fim de Setembro, são lembradas com enternecido amor, até porque alguns desses visitantes há muito que cá não vinham e agora chegam saudosos do seus e da própria terra-mãe.
            São Mateus vai celebrar a 21 de Setembro a festa do Padroeiro. Nesse dia cumpre o voto feito em 1718-1720, quando as erupções vulcânicas atingiram Santa Luzia e, depois, os locais onde deixaram, a testemunhar tamanhos cataclismos - os “Mistérios”. São decorridos trezentos anos!
            O voto é representado pela distribuição de rosquilhas a todos os que ali vivem ou por ali passam no dia de São Mateus. Houve até anos em que a Paróquia contribuía com algumas “contas” de rosquilhas para que ninguém voltasse a casa sem levar um “arrelique”. Afinal, um “império” idêntico aos que se realizam nas diversas freguesias da Ilha, durante o tempo litúrgico do Pentecostes.
É caso para louvar o povo picoense que será ainda hoje, se não erro na afirmativa, aquele onde o pão, nalguns lugares também o vinho, são distribuídos a todos os forasteiros e aos doentes ou impossibilitados de comparecer no arraial.
Vale a pena recordar estes acontecimentos históricos que continuam a dar testemunho da crença e do respeito pelos votos dos antepassados, que se cumprem com escrupuloso cuidado e que são transmitidos de pais a filhos e a netos. E tal é o respeito por tão antiga tradição que, presentemente, algumas festas recentes vão introduzindo prazenteiramente, os tradicionais “impérios”.
Este povo do Pico é excepcional. Não lhes evitem cumprir as honrosas tradições. Ajudem-nos quando as dificuldades surjam para que a memória dos antepassados não caia no esquecimento.
Lajes do Pico, 29 de Agosto de 2017

Ermelindo Ávila

A ESTÁTUA DE D. DINIS

A MINHA NOTA

            Há setenta anos (1940) a Nação Portuguesa celebrou o Duplo Centenário da Independência e Restauração de Portugal (1140-1640). A Ilha do Pico não esqueceu o histórico acontecimento e inaugurou, no antigo porto do Cais do Pico, a estátua do Rei-Lavrador, D. Dinis. Para a cidade da Horta veio a estátua do Infante Dom Henrique, com a diferença de que esta era em mármore e o tempo encarregou-se de a desfazer aos poucos, enquanto a de D. Dinis, sendo de bronze, tem resistido a todas as intempéries.
Era Vice-Presidente da Comissão Nacional dos Centenário o Coronel Henrique Linhares de Lima, natural do Cais do Pico, que havia exercido ou ainda exercia o cargo de Presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Tendo aquelas estátuas sido retiradas das praças públicas e devolvidas a armazém, entendeu Linhares de Lima enviá-las para o seu distrito natal, e mais: na Assembleia Nacional, de que era deputado, apresentou um projecto de Lei mudando o nome da ilha do Pico para ilha de Dom Dinis. O projecto foi largamente contestado e mereceu a recusa da Câmara Corporativa de então. Um dos grandes opositores do projecto foi o General Lacerda Machado. “O Dever” arquiva diversos artigos de opinião desaprovando a proposta. No entanto, a estátua do Rei veio para a ilha do Pico e, embora devesse ter ficado nas Lajes, primeira terra povoada, Linhares de Lima, porque era ele que determinava a colocação, levou-a para a sua terra. Tinha, como soe dizer-se, a faca e o queijo na mão…
A inauguração realizou-se a 16 de Agosto de 1940, dia da festa do Padroeiro, São Roque e decorreu, diga-se em boa verdade, com solenidade e esplendor.
Era presidente da Câmara Municipal de São Roque Celestino Freitas e ao acto compareceram os presidentes dos outros dois concelhos da Ilha. Presidiu ao acto inaugural o Governador Civil do Distrito, Capitão Moreira de Carvalho que navegou da Horta para o Cais num vaso de guerra que estacionava no porto daquela cidade. Trouxe consigo numerosa comitiva. Na inauguração, falou, em nome do Município de São Roque, Almério Tavares que desempenhava as funções de chefe da Secretaria do Tribunal Judicial. Na residência de Raimundo Mesquita, em São Roque, foi servido o almoço ao Governador e demais entidades presentes.
Na Matriz de São Roque, realizou-se a solenidade em honra do Padroeiro, sendo orador o ouvidor das Lajes, P. José Vieira Soares. A seguir, realizou-se a Procissão, tendo, em todos os actos, estado presente o Governador e Comitiva.
Decorreram já, como acima referi, setenta anos. A estátua continua no mesmo local onde foi colocada mas, virada para o Canal, quase ninguém dá por ela, uma vez que foi construído novo porto, bastante distante, onde se processa todo o movimento portuário.
A ilha continua a ser do Pico, com a montanha sempre em frente, mais procurada do que nunca pelos visitantes nacionais e estrangeiros. Simples e bela, na sua majestade deslumbrante, é o encanto dos picoenses que a contemplam embevecidos, ao declinar da tarde, quando o sol se põe ou mesmo, com os raios de luz a anunciar o novo dia que vem chegando. Mas isso é para os poetas que sabem aproveitar o encanto e a beleza de uma ilha que, sem ser de bruma, para os naturais parece esquecida e adormecida… 
Lajes do Pico,
Agosto de 2017

Ermelindo Ávila

RECORDANDO…

 Notas do meu cantinho
                            
 Há dias, já no corrente mês, um dos meus filhos proporcionou-me uma viagem das Lajes à Madalena. Há dias acrescentados que não fazia este percurso. Recordei os anos sessenta do século passado em que fazia o mesmo trajecto em razão das funções que então desempenhava e que me obrigavam a uma deslocação diária. Tempos que já passaram e que, apesar de tudo, deixaram no nosso íntimo um misto de saudade e de bons recordares.
          No sainte de São João, terminus do concelho das Lajes, recordei a história e lembrei-me que só em 1723, aquando da criação do terceiro concelho da ilha do Pico, a freguesia de São Mateus deixou de pertencer ao concelho das Lajes e ficou incorporada no novo concelho, a Madalena, levando consigo os lugares da Terra do Pão e São Caetano, que hoje constituem uma freguesia independente.
          Ao passar na Terra do Pão, com as suas casas típicas, voltadas a Sul, desde o Mistério até à Igreja de Santa Margarida, recordei aqueles ditosos anos sessenta quando ali passava e via, nos balcões das cozinhas, os pratos a fumegar com os dejejuns da manhã…  
         O que não deixa de impressionar é que as referidas habitações mantêm o mesmo estilo arquitectónico: as frentes principais voltadas a Sul, com um ou dois balcões externos de serventia à sala principal e cozinha, cada um junto das empenas Norte e Sul. Um estilo que se conserva, ao contrário do resto da ilha, com uma arquitectura moderna mas desconfortante. E isso vai-se verificando em redor da Ilha, com mais incidência no concelho da Madalena, onde um modernismo exasperado, está a alterar constantemente a fisionomia das zonas urbanizadas, sem estilo nem sentido artístico.
         Um pouco além, já na freguesia de São Mateus, e aqui lembrei o Padre Filipe Madruga que esforços fez para que a freguesia fosse elevada a Vila. Os novos ramais de entrada e saída do centro da freguesia já estão ocupados por habitações, cada uma do seu estilo, a testemunhar a importação dos trazidos pelos emigrantes retornados e não só.
         Mas, o mais notado é a transformação da sede do concelho, numa ambição discutível de nova classificação, tornando o burgo numa discutível mistura de estilos urbanísticos.
         Nos anos quarenta, São Roque, a segunda vila da Ilha, com a expulsão dos franciscanos, abandonou o edifício municipal e desceu até ao Cais a ocupar o respectivo convento. Nessa altura procedeu-se a uma urbanização do respectivo território, abrindo algumas ruas que, mesmo assim, pouco alteraram a estrutura urbanística. Para quem se recorda o que era o antigo “Cais do Pico”.
         Com a abertura da Estrada do Sul, em 1943, a freguesia da Piedade tem procurado modernizar-se. Mas o que mais se tem notado é a modificação das adegas do antigos lugares de veraneio – Calhau, Cais do Galego e Manhenha, e a construção de exagerados prédios modernos, segundo os modelos das terras de emigração.
         Aqui há anos um deputado regional picoense apresentou no respectivo grupo parlamentar um projecto para que as vilas sede de concelho fossem elevadas a cidade, acabando-se com os esforços bairristas para que uma ou outra beneficiasse, atabalhoadamente, desse título. Foi rejeitado o projecto, ao contrário da Região Autónoma da Madeira, onde parece, essa medida foi oportuna e sensatamente tomada.
         Da minha última viajem pela ilha saiu este modesto escrito. Não será aproveitado por alguém muito menos pelos políticos actuais. Se resistir às destruições dos “papéis velhos” alguém lhe dará  certo acolhimento…  
Lajes do Pico, 6 de Julho de 2017

Ermelindo Ávila