domingo, 31 de março de 2013

F e s t a s P a s c a i s




Notas do meu cantinho


Estamos na Páscoa. A Quaresma passou, assinalada com alguns actos litúrgicos, celebrados pelos católicos, como preparação para a celebração do grandioso acontecimento: a Ressurreição de Cristo, depois de sofrer o martírio do Calvário – Sua Paixão e Morte. Ele, de facto, disse que havia de ressuscitar ao terceiro dia.
          É esse acontecimento histórico que a Igreja celebra todos os anos, com mais ou menos esplendor litúrgico, consoante as disponibilidades eclesiásticas.
          As Domingas que antecedem a Páscoa da Ressurreição eram tempos de luto e penitência. Os párocos começavam por organizar, anualmente, o chamado “roteiro paroquial”, ou seja o registo de todas as famílias, com a descrição do estado, profissão e idade de cada membro, anotando se era crismado e se cumprira, no ano, os preceitos de confissão e comunhão. O roteiro ou “Rol dos confessados no ano de 1886”, diz-nos que, nesse ano, a freguesia da Santíssima Trindade das Lajes do Pico – do Soldão às Terras, pois ainda não havia sido criada a paróquia de S. Bartolomeu – tinha 1142 indivíduos do sexo masculino e 159l do sexo feminino, 251 menores de sete anos do sexo masculino e 245 do sexo feminino. A população total era de 3.229 indivíduos. Nesse ano, como aliás se verifica, geralmente, nos
demais, nenhum paroquiano deixou de cumprir os preceitos quaresmais (confissão e comunhão), o que não deixa de ser assombroso.
          Para facilidade do serviço de confissões, a paróquia era dividida em “quartéis” diários, reunindo um grupo de famílias, segundo o número dos seus membros. Esse era um dia considerado “dia santo” na família. Só se trabalhava o indispensável.
As semanas de Quaresma eram verdadeiros tempos de recolhimento e penitência. Os adultos trajavam, geralmente, de escuro. As crianças não brincavam com certas modalidades de jogos, principalmente o pião, que só
era usado depois do sino da Igreja, em repique festivo, anunciar a Aleluia Pascal.
          Durante a Quaresma assistia-se com maior assiduidade aos actos religiosos e, aos domingos à tarde, à Via-Sacra solenizada com cânticos apropriados.
Na quinta-feira e sexta-feira realizavam-se, à noite, as Matinas, com grande solenidade. Eram executadas partituras clássicas com os músicos da
capela local auxiliados pelos melhores cantores da Ilha. A concorrência era sempre notável em todas as celebrações.
          A procissão do Senhor Morto da Sexta-feira fazia-se pelas ruas da vila, acompanhada pela Filarmónica local que executava algumas marchas fúnebres. Nos intervalos, uma menina seguida por três companheiras, cantava a “Verónica”. Depois o coro da Matriz entoava o “Miserere”. A Procissão da Ressurreição, que tinha lugar logo ao amanhecer, antes da Missa solene, igualmente, percorria as ruas do burgo enfeitadas com artísticos tapetes de flores e verduras.
 No sábado, só após o anúncio da Ressurreição, era a ocasião dos adolescentes e jovens experimentarem os seus novos piões, numa luta renhida que atraía a curiosidade dos mais adiantados em idade. Costumes que igualmente deixaram de existir.
          Lembrar a festa da Páscoa é trazer à memória dos mais idosos uma época singular, vivida com piedade e respeito, sempre no propósito de recordar com sentimento e fé a Morte do Senhor Jesus que ao mundo veio para redimir a Humanidade da desobediência de nossos primeiros Pais – Adão e Eva. Vem nos livros históricos - A Bíblia - e ainda hoje ninguém se atreveu a duvidar da sua autenticidade.
Mas algo foi mudado pelas normas litúrgicas vindas do Concílio Vaticano II.      Facilitou-se a vida mas isso não evitou que a prática religiosa viesse a cair quase no desconhecimento e ignorância da generalidade das pessoas.
Boa e Santa Páscoa!

Lajes do Pico, 11 de Março de 2013
 Ermelindo Ávila

Ressuscitou, não está aqui!



 -A MINHA NOTA-


Os quatro Evangelistas, ou sejam: Marcos, Mateus, Lucas e João, aqueles que escreveram e nos deixaram a vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo, são unânimes em descrever a maneira como Ele foi flagelado, crucificado e morreu no meio de dois ladrões, que, com Ele, haviam também sido condenados ao suplício da cruz. Os dois autênticos criminosos. Ele, o Filho de Deus, condenado sem culpa. Trata-se de um acontecimento histórico que ninguém, por mais erudito que seja, é capaz de negar,
          Mas ELE ressuscitou dos mortos, como havia dito.
          No primeiro dia da semana Maria de Magdala foi ao sepulcro logo de manhã, ainda escuro, e viu a pedra retirada do sepulcro. Correu, pois, e foi ter com Simão Pedro e como outro discípulo, aquele que Jesus amava (João) e disse-lhes: ”Levaram o senhor do sepulcro e não sabemos onde O puseram. “ Isto escreve o evangelista João, 20, 1-3.
          No seu Evangelho, São Lucas 24,1-6,refere: “No primeiro dia da semana, ao romper do dia, foram ao sepulcro, levando os perfumes que haviam preparado. Encontraram a pedra do túmulo removida e, entrando, não acharam o corpo do Senhor Jesus. Estando elas perplexas com o caso, apareceram-lhe dois homens em trajes resplandecentes. Como estivessem amedrontadas e voltassem o rosto para o chão, eles disseram-lhes: ”Porque buscais entre os mortos Aquele que vive? “Não está aqui; ressuscitou!
O mesmo afirmam S. Marcos e S. Mateus: Surrexit, non est hic.
          Madalena ficou sozinha à porta da caverna tumular. Roubaram o seu Senhor e ela, inconsolável, tinha a seu lado os frascos de alabastro e outros perfumes com os quais ia embalsamar o Senhor. Mas Ele não estava. Ressuscitara como havia predito. É então que lhe aparece um Homem  vestido de branco que lhe pergunta: Mulher porque choras? - Roubaram Aquele que há três dias havia sido aqui depositado. Foi levado e não sei onde o puseram. E foi então que o Senhor se revelou, chamando: Maria! Ela reconheceu a voz e respondeu: Mestre! E Ele volta a falar: Não me detenhas porque ainda não subi para o Pai. Ela não espera um momento. Alvoroçada, parte e vai anunciar a boa nova aos onze que continuavam refugiados no Cenáculo. Isto nos narra Plínio Salgado na sua monumental ”Vida de Jesus”.
          Mas Guedes de Amorim, autor que principiou como materialista marxista e evoluiu para um espiritualismo franciscano, na sua notável obra “Jesus passou por aqui”, afirma: “Temos só que defender a Ressurreição perante quantos a negam!”.
          Depois de uma Quaresma silenciosa e triste, surge radiante a Páscoa da Ressurreição. Os cristãos – e não só ... - celebram os dois tempos, ora em recolhimento, ora dando expansão às alegrias pastais, cantando com entusiasmo o Aleluia solene. É a alegria perene da Ressurreição do Senhor. E vêm os cumprimentos, melhoram-se as refeições, e aparecem os folares e as amêndoas. Uma alegria que atinge grados e miúdos.
          O Senhor RESSUSCITOU! Aleluia!”
                   
Páscoa de 2013
Ermelindo Ávila       

quarta-feira, 6 de março de 2013

No cabo do mundo


NOTAS DO MEU CANTINHO

Para estas bandas do Sul da Ilha, quando a estrada andava ainda nos gabinetes de desenho do Ministério da Obras Públicas, sem que se vislumbrasse quando a ilha teria uma estrada que ligasse todas as povoações, era vulgar ouvir-se: estamos no cabo do mundo. E assim era.
Quem desejasse deslocar-se da Piedade às Lajes tinha de sair de casa pela madrugada e calcorrear esses caminhos e veredas, subindo e descendo montes e atalhos, para chegar à vila ao abrir das repartições que, no tempo, era às dez horas da manhã. E se desejasse seguir no “Carro da mala” para a Madalena, para tomar a lancha do Canal, mais cedo teria de chegar à vila-Fronteira, pois a camioneta – antes o carro de bestas do Caetano – partia de madrugada. Cheguei a fazer essas viagens: sair de casa de manhã, no Inverno, para chegar à Piedade ao anoitecer. E só poder regressar no dia seguinte, com o mesmo itinerário. Que terrível era passar na “Ladeira do Barriga” (descia-a a pé e em outras mais).
Na Piedade, valeu-me o empregado do Dr. Machado Soares que tomou conta do cavalo e o tratou. Era o cavalo de João Machado Soares (Capitão) e pelo aluguer paguei 50 escudos. Pernoitei na casa de hóspedes de Manuel Serrador, ao Império, única que existia a dar camas para a algum visitante.
Durante quase cinco séculos, a população do concelho das Lajes viveu este tormento das deslocações. Na década de vinte do século passado, apareceram duas lanchas a motor – a “Lourdes” e depois a “Hermínia” que começaram a fazer as ligações da Calheta à Horta, passando pelos portos de S.ta Cruz, Lajes, S. João e S. Mateus. Foi uma melhoria mas só útil àqueles que se davam bem no mar.
A estrada Lajes-Piedade, inaugurada em 28 de Maio de 1943, veio acabar com esse isolamento, mas não passou pelo centro das freguesias das Ribeiras e Calheta, obrigando à construção, mais tarde, dos respectivos ramais.
Presentemente, as ligações estão facilitadas, mas não deixam de ser dispendiosas, pela distância que as separa.
A Ilha é a segunda em área das nove do Arquipélago, e desenvolve-se, praticamente, no sentido Norte-Sul. Quem desejar ir da Piedade ou Ponta da Ilha, como era conhecida, até à Madalena para ir a uma consulta, v.g. ao hospital da Horta, o que, infelizmente, é vulgar, tem de percorrer 56 quilómetros. Ou seja: para tomar a lancha do canal terá de sair de casa ao amanhecer, e se não tiver veículo próprio, voltar à noite, nos meses de Inverno, principalmente. E se não tiver veículo próprio, terá de tomar a camioneta da carreira, o que torna a viagem mais demorada.
A estrada chamada “transversal”, ou seja das Lajes a S. Roque, e que atravessa a ilha, foi uma “estrada política”, como a designava o respectivo engenheiro que a projectou, pois serviu, nos anos quarenta, para justificar a extinção do Julgado Municipal que estava instalado nas Lajes, uma vez que era mais movimentado, em processos cíveis, do que a própria Comarca. Tudo isso tem acontecido e os lajenses suportado como uma afronta ignominiosa à sua cidadania. Que mais os espera?
O concelho das Lajes é o mais “rico” em agricultura. Só a freguesia da Piedade tem mais de 16 mil prédios rústicos registados na respectiva Matriz Predial. O concelho e a Ilha prosperaram com a indústria baleeira e, depois, com a de conservas de atum. Mas esta só a deixaram funcionar pouco mais de vinte anos... “Cortaram-lhe as pernas”. O concelho chegou a ter trinta e cinco traineiras de pesca, que acabaram por ser vendidas para outras zonas de pesca, porque a respectiva fábrica deixou de funcionar. Nem trago as razões desse tremendo colapso.
Não estou a lamuriar mas a lembrar factos concretos e a chamar a atenção para uma situação que, a repetir-se, provocará o desaparecimento do chamado “Sul da Ilha do Pico”. E se isso acontecer, não serão mais precisos nem portos nem estradas. Tudo ficará como na época do descobrimento: terra selvagem...

Vila das Lajes do Pico,
Fevereiro de 2013
.
Ermelindo Ávila

segunda-feira, 4 de março de 2013

PROTESTO!


NOTAS DO MEU CANTINHO


E repito: Protesto! Protesto pelas delapidações que ultimamente e sistematicamente se vão fazendo aos serviços instalados no concelho das Lajes do Pico. E há razões sérias e ponderáveis para lavrar o meu protesto, que julgo ser o de todos os Lajenses, pelo que se tem feito no concelho. E não vou repetir os vários serviços públicos que daqui têm sido transferidos para outros concelhos. Ultimamente, o mais beneficiado tem sido o da Madalena sem razões sérias para que se justifique essa atitude dos Poderes Centrais. Até que se leve à extinção do concelho...
No meu último cantinho lembrava, sem que tivesse em nota este de hoje, que “O concelho das Lajes é o mais “rico” em agricultura. Só a freguesia da Piedade tem mais de 16 mil prédios rústicos registados na respectiva Matriz Predial”.
Apesar de terem desaparecido duas importantes indústrias, a de conservas e a da baleia, mesmo assim no concelho situam-se duas outras bastantes importantes para a economia da Ilha: O Matadouro Industrial e a fábrica de lacticínios da Lacto-Pico. Apesar da crise que atravessa, “O Presidente do Governo Regional, Vasco Cordeiro reafirmou a disponibilidade do executivo para ajudar a viabilizar o sector cooperativo da Região, nomeadamente a Lacto-Pico...” (1)
Agora, e segundo informações fidedignas, vão centralizar-se na vila da Madalena os Serviços de Finanças, desaparecendo as repartições das Lajes e de S. Roque. Não sei qual a posição tomada pelas autarquias dos dois concelhos. Julgo que deve ser imediata, forte, intransigente e firme. Está em jogo o desenvolvimento e o futuro dos dois concelhos que, a partir dessa drástica e perniciosa determinação do Governo da República, ficarão defraudados e diminuídos, principalmente o concelho das Lajes, pois o de São Roque ainda fica com a vantagem de conservar a Comarca!...
Não se compreende porque tudo se há-de concentrar na vila que quer ser cidade e que só assim, com a ajuda dos poderes públicos, o poderá conseguir.
Não estou a levantar esta questão por acintoso bairrismo. Está fora do meu pensar. Somos todos picoenses e é pela defesa dos interesses picoenses que me move.
Extinguir serviços que são diariamente utilizados pelos cidadãos contribuintes é uma das mais drásticas medidas governamentais, que só prejudica o desenvolvimento económico e a normalidade de vida dos cidadãos, todos os dias obrigados a cumprir certas exigências do fisco.
Pode alegar-se que, na época actual, algumas obrigações podem ser cumpridas através dos meios electrónicos, evitando a deslocação às Finanças, como dizem. Mas quem possui esses meios? Nos meios rurais eles quase se desconhecem.
Fazer deslocar um contribuinte da Ponta da Ilha à Madalena é fazê-lo percorrer mais de cem quilómetros, perder um dia de trabalho, além das despesas com a indispensável alimentação. E quem isso suporta?
É preciso que as chamadas”forças vivas” do concelho tomem medidas imediatas para evitar o desaparecimento de um serviço e/ou a sua centralização a tão longa distância.
Os concelhos foram criados para comodidade dos povos e primeiro e único na ilha do Pico foi o das Lajes. O de São Roque veio mais de um século depois, quando a população se foi desenvolvendo naquela zona. O da Madalena só apareceu no século dezoito e, mesmo assim, extinto nos finais do século dezanove, para ser restaurado poucos anos depois, com o parecer favorável dos outros dois concelhos que assim reconheciam os direitos dos povos daquela zona.
Além disso é bom ter em consideração que o concelho das Lajes é o maior em área territorial, possui o maior número de prédios rústicos e o mais desenvolvido, dada a natureza do seu terreno, na agro-pecuária. As matrizes prediais são a prova oficial do que venho de alegar. E é isso que os governantes devem ter em atenção. As actividades comerciais são oscilantes e, daí as constantes falências que se vão verificando, não só por estas ilhas como pelo próprio continente. E ainda não se encontrou solução para tão perniciosos males para a economia e para o bem-estar dos povos.
É tempo das entidades concelhias tomarem posição e fazerem valer, a tempo e horas, os direitos que se projectam defraudar, dos cidadãos. Ao povo impõe-se uma união de esforços reivindicativos para que se evitem medidas defraudantes dos seus legítimos direitos.
E só mais esta referência: a repartição de finanças da Calheta de São Jorge foi encerrada e o arquivo transferido para as Velas. O povo manifestou-se e protestou, veementemente, de maneira ordeira e pacífica. Passados meses, voltou o arquivo à Calheta e a repartição entrou em funcionamento. Não quero lembrar a revolta popular de 1862 que tantos prejuízos causou ao concelho, precisamente por causa da instituição de novos impostos. Desejo somente que os direitos dos lajenses sejam acautelados e o povo possa viver em tranquilidade, cumprindo as leis nacionais e usufruindo dos direitos de cidadãos livres.
Com vista a quem de direito!
Lajes do Pico,
Março de 2013
Ermelindo Ávila
___________
(1) “Diário dos Açores, nº 40 016 de 22-02-1913 – pág. 20