NOTAS DO MEU CANTINHO
Na Terra da Forca rebentou um foguetão.
Alguém, no Meio da Vila, gritou: Baleia! Baleia!” Da “casa de Pasto” do Tibério
saíram dois ou três mocetões e correram para a Pesqueira. Mas os outros ficaram
quietos... Na Lagoa, estavam ancoradas algumas embarcações, mas a “Lourdes”, a
“Margarida” e a “Zélia” não estavam lá... Entraram nas antigas “Casas dos
Botes” e só viram um – o “Santa Teresinha”- que ainda hoje lá se encontra como
peça do Museu. O restante espaço estava completamente transformado...
Olharam para a “Lagoa de Cima” e ali
não havia qualquer movimento. Não aparecia o oficial Domingos Inteiro, nem o
José de Brum, para mestrar a “Zélia”, nem o “Portugal”, nem mesmo o grande
remador “Palim”. Da Granja, da Canada de Jorge Dutra, do Cabeço do Geraldo, e
de outros sítios, onde muitos tinham as suas terras de cultivo, não aparecia
nenhum baleeiro, nem mesmo das habitações haviam saído pressurosas, como era
costume, as mulheres dos baleeiros com a saca ou a cesta com o pão ou bolo, o
peixe ou o queijo, para “matar a fome” no alto mar.
Aqueles
que haviam corrido na vila para “apanhar os primeiros botes que se fizessem ao
mar”, pararam e espreitaram para a “Vigia” da “Terra da Forca” onde não havia
qualquer sinal de baleia. Nem foguetes, nem bandeirolas pretas ou brancas ou as
duas cores em conjunto, cujo significado toda a gente conhecia: preta - baleia
à vista; branca - botes fora; preta e branca - botes fora e baleia à vista.
A vida das pessoas, dentro da Vila e
mesmo no subúrbio da Ribeira do Meio, continuava calma e sem movimentação
especial.
Pararam e reflectiram: Afinal, uma “arriada em falso”.
Já não há baleação, nem se caminha, depois de correrias loucas por essas terras
abaixo, para apanhar os primeiros botes, para chegar, antes dos outros, junto
da baleia grande, do bule, ou do cardume (baleias pequenas).
Hoje vai-se somente ver as baleias.
Elas vêm cá bem dentro, pachorrentamente, banquetear-se nos “bancos de chicharros”,
nas “marcas” das cavalas, e de outros peixe que, em cardume se aproximam da
costa à procura de “ruama”.
E não são os velhos baleeiros que
aproveitam a sua aproximação. Esses não podem “tocar-lhes”. Desde 1987, ano em
que se caçou, com o arpão e a lança, a última baleia (cachalote, melhor dito).
É crime caçar um cetáceo, seja cachalote, golfinho ou toninha. E a lei é
severa!...
Deixou de se produzir o óleo que era
exportado para países estrangeiros e trazia para a terra boas divisas. Uma actividade
na qual se empregavam umas dezenas de homens do Mar, e cuja proibição a muitos
deixou na penúria. Até o pequeno comércio foi prejudicado, pois era habitual
vender “fiado” durante o ano para receber os créditos, quando “se faziam as
contas e se distribuíam as “soldadas da baleia”.
Aqueles que mandam e impuseram a
proibição conhecem – creio - o enorme cetáceo unicamente pelos livros... Nem pensam
sequer que a Natureza se mantém em equilíbrio, quando o homem, seu “rei”, a
sabe aproveitar dignamente e em proveito próprio...
Nas ruas da vila, outrora deserta de
veículos automóveis, onde o rapazio brincava, despreocupadamente, desapareceram
os jogos baleeiros, aliás, como outros, Mas estes praticam-se em recintos
apropriados, enquanto os baleeiros nem conhecidos são...
Não cause espanto que volte a este
assunto. Estou certo que tempo virá em que o homem terá necessidade de utilizar
todos os meios que a Natureza lhe proporciona para poder subsistir. Não se vão tornar
antropófagos, mas saberão colher da Natureza o que ela gratuitamente põe à sua
disposição para sobreviver.
Concedo que jamais voltará a ouvir-se o
sinal de “baleia à vista”, porque outros meios estarão à disposição dos seres
humanos. Creiam ou não os actuais cientistas...
Enquanto elas por cá andarem, haverá
a prática do “whale watching”, enquanto outra modalidade “desportiva” não
surgir.
Ontem foi a caça ao moleiro, de que Ernesto
Rebello nos deixou interessante descrição; depois foi a caça à baleia para fins
industriais – e quanto valeu no período de guerra de 1938-45! Agora visitam-se
os cardumes que chegam esfomeados ao “santuário das baleias”, como já se diz. E
depois?...
Vila Baleeira,
25-09-2016
Ermelindo Ávila
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