sábado, 18 de abril de 2009

Milho e Trigo

Trigo e milho. Este para colher lá para o Outono. O trigo, porém. mais cedo e a sua colheita dá-se em pleno verão. Mas isso era em tempos passados. Se a “praga” o não atingia muito, era bom ano de colheita. Mesmo assim, ao amanhecer, interessante passar pelas searas e ver a maneira como rapazes e raparigas o vigiavam da praga.

Outrora, nesta época, era extasiante passar por esses campos, no lado Sul da Ilha, e apreciar os imensos terrenos cultivados de trigo ou de searas já em maturação e escutar as moças a espantar a bicharada. Aqui e ali eram colocados monos de trapos. E era a matraca a ensurdecer o espaço. Ou as cantigas das raparigas a procurar espantar a praga que procurava tomar conta da produção. Mas, nem por isso, os canários, principalmente , se afastavam e, se o faziam, voltavam dali a pouco. Por vezes uma tarefa difícil e ingrata.

Se bem que o trigo foi o primeiro cereal trazido para estas ilhas pelos que primeiro as habitaram, dado tratar-se de um cereal de fraca e melindrosa produção, apareceu mais tarde o milho, vindo da América do Norte. Foi ele que contribuiu para a completa e substancial alimentação dos ilhéus. Todavia, enquanto esse cereal não apareceu, valeu o inhame, que nem se sabe quando aqui foi introduzido, mas que já no século dezasseis era conhecido porque terrenos de inhames fizeram parte das heranças de alguns falecidos.

O trigo merecia um tratamento especial, principalmente nos anos em que os lavradores tinham a seu cargo o cumprimento das coroações do Divino Espírito Santo, nas domingas intermédias da Páscoa ao Pentecostes. Isso verificava-se não há muitos anos, principalmente no lugar das Terras, subúrbio desta vila

A colheita do trigo e a debulha, na eira, eram sempre dias especiais para a família. Das pastagens traziam-se quatro ou cinco animais de raça vacum, para andarem na eira a puxar o trilho, à volta do moirão. O jantar (hoje seria almoço) desse dia era melhorado. E a rapaziada da família divertia-se em cima da palha do trigo já dela separado. Depois era o “aventejar” e o ensacar, até à sua utilização no ano seguinte.

Os trabalhos dos campos tinham o seu horário próprio, ao qual não se fugia, antes se cumpria com a devida atenção.

Era assim com o trigo e igualmente com a colheita do milho, embora esta fosse e seja mais trabalhosa e árdua.

Mas, quando tudo terminava e os cereais estavam recolhidos, os lavradores alegravam-se, pois tinham a casa cheia, ou garantido o sustento da família durante o ano.

Tudo tinha o seu tempo próprio. Normalmente regulavam-se pelas luas e não saiam daí. Era o tempo da sementeira do trigo e do milho e as respectivas colheitas, como era igualmente dos inhames ou cocos e das batatas, branca ou inglesa e da batata doce, também de duas qualidades: rocha ,a mais abundante, de 4 meses e a branca, de 6 meses.

O terreno junto da casa de habitação, ou horta, era destinado aos primores hortícolas. Ninguém comprava ou vendia couves ou nabos, alhos ou cebolas, alfaces ou tomates. Se um vizinho não tinha outro lhe dava, enquanto a horta produzisse. Cultivava-se o açaflor que substituía o colorau.

Hoje tudo é diferente. Vão proliferando os super mercados e os hipers, e os campos estão-se a encher de vegetação selvagem., Não levará muito,e os arvoredos passarão a zonas protegidas para obrigar às importações dos países dominadores da economia mundial.

E, se não houver divisas disponíveis, que se aperte o cinco...

Vila das Lajes, 13 de Abril de 2009

Ermelindo Ávila.

(crónica para o programa da RDP-Açores, Manhãs de Sábado)

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