segunda-feira, 30 de junho de 2008

AS FESTAS DE SÃO PEDRO


(foto: retábulo do altar da Ermida de São Pedro, cuja imagem se encontra ao centro)
Devem ser das mais antigas da ilha, pois a sua igreja (hoje ermida) foi a primeira casa de Deus, onde se realizou o baptizado do primeiro picoense, nascido na ilha, onde teve lugar o primeiro casamento e onde se encomendou o primeiro defunto.
Foi nela que Frei Pedro Gigante celebrou a primeira Missa e consagrou as hóstias produzidas do primeiro trigo que a ilha deu. Uma história linda que até os nossos avós, quase todos desconhecendo as letra do alfabete, sabiam de cor e transmitiam a filhos e netos. Tudo por volta de 1460.
Era solene a festa do orago. Os frades do convento franciscano, enquanto D. Pedro, não extinguiu o convento de Nossa Senhora da Conceição, desta vila, por decreto de 17 de Maio de 1832,(são decorridos 176 anos), deslocavam-se à ermida de S. Pedro para solenizar os actos religiosos.
Em 1677 era mordomo da confraria de São Pedro, o Pe, Pedro Toledo. (Todos os santos de maior devoção tinham a respectiva Confraria, que arrecadava as esmolas e fazia as despesas das festas). Besse ano, a receita da confraria foi de oito mil e trinta reis. Era constituída por esmolas, rendas, um foro, do “tresmalho da rede de peixe do Barco de Francisco Lopes” e de acompanhamentos da cruz em funerais.
Nesse ano a Igreja foi restaurada. As despesas, que no livro de “Receita e Despesa” estão registadas, dizem respeito aos salários dos pedreiro, cal, telha, fretes e carretos, serragem de madeiras, canteiros, pregaduras e varões de ferro, Reformação do Santo. Pregação e Missa da Festa do Santo aos frades, despesas do junco e uma Missa perpetuo por alma de Maria da Cruz
O junco servia para atapetar o chão térreo, pois nessa época as sepulturas eram feitas dentro das próprias igrejas, por ser chão sagrado. Nesse ano o junco custou cem reis.
Pela construção do arco da capela mor, foram pagos aos pedreiros, no ano de 1780, quatro mil e oitenta reis.
Já nos finais do século dezanove, era mordomo João de Deus Macedo, comerciante e pessoa de prestígio no meio, Tanto assim que era o Provedor da Santa Casa, quase perpétuo, e Administrador do Concelho. Tinha grande emprenho nas festas que as Irmandades promoviam. Vale a pena lembrar aqui o que, acerca da Festa, escreveu neste jornal, em 7 de Novembro de 1959, Gilberto Paulino de Castro,” um dos lajenses que, apesar de estar há longos anos afastado desta vila, vivia continuamente os seus problemas e estava sempre presente em todas as iniciativas que visassem o progresso desta terra e a elas jamais furtou o seu apoio”, como estão se escrevia no jornal: Estou a ver a “malta” desse tempo, “engodada” com punhados de alfarroba que o não menos popular e típico João de Deus Macedo, nas vésperas dela (festa) apressado e trepidante, às mãos ambas, arremessava ao formigueiro do rapazio que o seguia até ao largo onde se preparava o arraial (quadrilátero compreendido entre a ‘casa da escola’, a margem Norte da Maré e muros dos quintais dos prédios Sul e Leste) enquanto aquela mocidade esfusiante, assim estimulada, despredregava febrilmente o pavimento enxurrado pelas ‘enchentes’ do último inverno, para que se não molestassem os sapatos de verniz que se ‘espelhariam’ nos vistosos arraiais da véspera e dia de festa”, aos quais não faltava o combate entre o navio e o castelo (peças de fogo de artifício).
No arraial do dia da festa, já quando abrilhantado pela Filarmónica Lajense, distribuíam-se pela assistência rosquilhas de aguardente (de pequeno formato) e na véspera havia vistosa iluminação à veneziana e fogo preso. Mas, com a entrada da República, essas tradições foram caindo no esquecimento.
Em 1940 a Nação Portuguesa celebrou o duplo centenário da Independência e Restauração de Portugal. Promoveram-se pelo País diversas comemorações. O concelho das Lajes, por iniciativa do Município, organizou um programa festivo e nele incluiu o Império de São Pedro, com a distribuição de rosquilhas idênticas às dos Impérios do Espírito Santo. Foi o início. Os lajenses, felizmente, nunca mais deixaram de celebrar a festa com o respectivo Império, Nos últimos anos a Irmandade, alem do Império, começou a distribuir um jantar “do Espírito Santo” em que tomam parte os irmãos, mais de cem, e familiares, além de diversos convidados. Algumas centenas.
Nesse ano de 1940 foi construído e inaugurado no l.º de Dezembro, o Cruzeiro da Independência e Restauração de Portugal, no novo largo, à entrada da Vila, que, felizmente, ainda hoje se conserva para prestígio dos lajenses..
E porque a festa ocorre normalmente em dia de semana – no presente ano é excepção – a Câmara Municipal solicitou superiormente para que o dia 29 de Junho fosse decretado feriado municipal, substituindo o antigo feriado que tinha lugar no dia 15 de Agosto e que, pela Concordata com a Santa Sé, passou a feriado nacional.
Creio que já estas coisas escrevi. No entanto, vale a pena recordá-las como factos históricos cuja memória importa acautelar.

Vila das Lajes,
Junho de 2008
Ermelindo Ávila

quarta-feira, 18 de junho de 2008

OBRAS MARÍTIMAS

No dia 8 do corrente mês foram solenemente inauguradas, pelo Presidente do Governo Regional e com a presença de diversos Secretários Regionais, da Presidente do Município Lajense, outras entidades oficiais, e muitos picoenses, as obras de construção do quebra-mar para a protecção da Vila; o canal de entrada no Porto das Lajes, dragado e alargado; e a construção do núcleo de recreio náutico, na Lagoa (Porto interior) desta vila. Cerimónia que coincidiu “com a evocação do Dia Mundial dos Oceanos”.
Nesta ocasião vale a pena recordar um pouco, num enquadramento histórico que vem a propósito, o que os lajenses têm sofrido e lutado pela defesa da sua Vila.
“O ano de 1725 foi memorável para os habitantes da Vila das Lajes, por uma tempestade marítima que lhes inundou a Vila, causando muitos estragos, nos dias 14 a 20 de Abril. (Hist. 4 Ilhas, Vol. I. pág.219). Nessa ocasião fizeram um voto ao Senhor Jesus das Preces, (cuja imagem tem em muita veneração).”
No dia 26 de Agosto de 1893 um grande ciclone assolou a Vila das Lajes, invadindo o mar alteroso a vila, destruindo as culturas e fazendo outros grandes prejuízos em toda a Ilha. A Família Dabney, ao tempo na Horta, importou dos E. U. muitas toneladas de milho cujo cereal foi distribuído pelos povos sinistrados destas ilhas.
Um jornal da época, “Cartão de Visita”, citado pelo historiador Francisco Borba (Boletim do Museu Etn. da Ilha Graciosa, vol. n.º 5, pág. 107), narra esse acontecimento, dizendo que o povo se reuniu na igreja a fazer preces e concluídas estas, saiu em procissão levando o vigário a pesada imagem do Sr. Bom Jesus. E acrescenta: “Estavam ancorados na Lagoa o hiate S. João Baptista, o cahique Espírito Santo e o Barco Bom Jesus.” As tripulações conseguiram ir a bordo acautelar as amarrações mas, no “Bom Jesus” ficou um jovem de 20 anos, Manuel Machado, que, por não saber nadar, acabou por ser levado pelas vagas não mais sendo visto.
Construído o muro de acesso ao caneiro, a bacia interior era utilizada como ancoradouro das embarcações locais, principalmente no verão, onde permaneciam, ainda em nosso tempo, as lanchas a motor “Lourdes” e “Hermínia”, que faziam o tráfego de carga e passageiros entre os portos da ilha e a Horta. Depois foram também as baleeiras “Margarida”, “Zélia”, “Aliança”, “Gigana”, “Rosa Maria” e os batelões de descarga da E.I.N. que faziam serviço, primeiro ao velhinho “Funchal” e, depois, aos navios “Lima”, “Corvo”, “Terceirense” e a outros cargueiros. Mais tarde foram as traineiras da pesca do atum, enquanto a malfadada fábrica de conservas funcionou…
Em 1936 um violento ciclone derrubou a muralha que suportava a rua marginal da Pesqueira. As obras de reconstrução foram imediatamente iniciadas e, dois anos depois, estavam concluídas. Era Director das Obras Públicas o Engenheiro Angelo Corbal Hernandez que, apesar do seu esforço e da técnica utilizada, não deixou de ser acusado de estar a fazer uma obra onde gastava imenso dinheiro. Não demorou a inspecção que só serviu para louvar o distinto técnico.
(Nessa altura consolidou o muro de acesso ao caneiro de entrada na Lagoa, que nunca fora concluído, muito embora a sua construção fosse autorizada por alvará de 17 de Setembro de 1851.Com o remanescente orçamental, alargou a plataforma da entrada do caneiro, pelo lado mar, pois tencionava instalar aí o porto de desembarque, na zona do Poção. Foi afastado pela política que então aqui se implantara e nunca mais o Engenheiro Angelo Corbal voltou às Lajes. “Voltou-se”,antes, para a Calheta de Nesquim e Ribeiras…)
Em 1843, segundo a “História das Quatro Ilhas”, a Câmara Municipal das Lajes reclamava já a construção de uma muralha em torno da Vila das Lajes. Quase um século decorrido, é iniciado, em 1914, o muro de defesa da Vila, mas o alinhamento que lhe deram não foi aquele que os lajenses desejavam e tecnicamente o mais aconselhável. Lacerda Machado, em artigo publicado no jornal “As Lages”, escreveu que a muralha devia ter sido construída a partir do redondo do muro do caneiro, junto da orla marítima, até ao “Calhau Grosso”. E o mesmo quinzenário, sob o título “Obras da Muralha”, em 15 de Maio de 1914, escreveu: “A largura da muralha que ia seguindo 2 metros, passou para 1,50 portanto menos de meio metro. “
E foi decorrer, novamente, quase cem anos, para que o quebra mar de protecção da Vila fosse construído. No entanto, parece que só vai impedir a entrada do mar bravo na parte norte da Vila, permitindo mesmo assim maior segurança na entrada e no porto interior (Lagoa). Todos se congratulam, pois, com as obras – quebra-mar e construção do núcleo de recreio náutico realizadas – agora inauguradas. Mas parece que não bastam. A parte sul da Vila fica ainda sem segurança. O tempo poderá vir a demonstrar que, as obras agora realizadas são insuficientes para a defesa total da Vila. E a Vila não se pode ser mudada… Já sofreu bastante delapidações. Não continuem com as mutilações que lhe têm imposto e continua a sofrer.
Congratulo-me com as obras realizadas, que trouxeram alguma segurança e valorização à minha terra. Mas espero que não se fique por aí. Algo mais há a realizar. É indispensável continuar com a obra que agora foi principiada. Os lajenses não podem esperar mais um século por novos empreendimentos de fomento e desenvolvimento.
Por hoje mais não adianto.
Vila Baleeira,
13 de Junho de 2008
Ermelindo Ávila

quarta-feira, 11 de junho de 2008

O PICO - A QUINTA ILHA MUNDIAL

Estão a chegar ao fim, pelo que nos é dado observar, os trabalhos de construção da futura marina – porquê, somente “porto de recreio” ? -- do porto das Lajes do Pico. Tudo faz crer que aquele espaço, conquistado à lagoa interior, com óptimo resultado, poderá ser utilizado pela navegação de recreio ainda no corrente ano, o que não deixa de ser uma excelente valia para a Vila Baleeira dos Açores.
Está também a concluir-se a ampliação do Museu dos Baleeiros, que vai trazer àquele instituição melhores condições de funcionalidade.
Mas, para que o turismo se possa implantar nesta terra e venha a ser um factor económico de assinalada valia, importa que outros empreendimentos se realizem com brevidade, pois só assim, todo o conjunto estrutural poderá ser convenientemente utilizado e ser um forte elemento de progresso e desenvolvimento a renovar a economia local.
Interessante o que no Pico se tem feito no sector hoteleiro, principalmente no chamado turismo rural e nas residenciais, já que os hotéis, infelizmente, andam daqui arredados, (propositadamente?) evitando que até as entidades regionais daqui se afastem pela carência de camas condizentes com a categoria dos ocupantes…
Porque se tem protelado a construção do Hotel previsto para o Mistério? Porque se evitou a construção de um estabelecimento hoteleiro junto do parque de campismo?
Um parque jamais poderá substituir um hotel. Demais os ocupantes, durante o verão, são grupos de estudantes, nacionais ou estrangeiros, ou outros visitantes de recursos económicos limitados e que pouco contribuem para a economia local.?!
Afastar qualquer construção de interesse público do meio urbano da vila é contribuir para o seu atrofiamento e aniquilamento. É preciso que isso se compreenda e se tenha em consideração, sem prejuízo do seu património artístico e da sua classificação de zona urbana histórica.
Todavia o turismo não exige somente bons hotéis, devidamente classificados e equipados, servidos por profissionais experientes e simpáticos.
O Whale Watching é uma atracção de comprovados êxitos, mal grado a concorrência de que vai sofrendo. Mas até esses que vêm para observar baleias e outros animais marinhos que aqui, na nossa frente, estacionam meses e anos, pouco se demoram, ou raramente pernoitam, na sua quase totalidade por falta de hotel nas Lajes. Isto sem esquecer a “Aldeia da Fonte”, algo desviada.
O turista deseja, também, ocupar os chamados tempos livres. Aqui recorda-se uma vez mais a necessidade de concluir o campo de golfe. A propósito, chega-nos a notícia de que a empresa “Picogolfe” encontrou novo proprietário que adquiriu “uma participação na Picogolfe com vista ao desenvolvimento de um campo de golfe e um Resort nas Lajes do Pico…”
Mas não há somente que providenciar sobre os momentos de lazer. Algo mais há que ter em atenção, como ainda há dias diziam os intervenientes no programa semanal da RTP, “Prós e Contras”. Cada ilha deve dispor de serviços de saúde capazes de atenderem não somente os casos resultantes de sinistros ocasionais como de outras doenças que surjam ao visitante durante a sua estadia na ilha. E esses serviços não devem ficar simplesmente pela transferência, (embora rápida), em transporte adequado, para uma das ilhas “capitais”. Isso não aceita o visitante estrangeiro, habituado a ter junto da residência a assistência imediata para qualquer caso de doença que lhe surja.
Tudo isso deve ter-se em consideração, se queremos promover as ilhas da Região e nela explorar um turismo eficiente e positivamente promotor de melhoria económica.
A Ilha do Pico, com um potencial turístico enorme, que quase desconhecido e mal aproveitado anda, tem de ser considerada com medidas, embora de excepção, eficientes e rápidas, se não desejamos ver passar ao largo um bem que à Ilha pertence.
Sabemos que “Roma e Pavia não se fizeram num dia”, mas cruzar os braços perante um potencial que, noutras bandas, seria avaramente aproveitado, não deixa de nos causar pena e angústia. Há quantos anos estamos a alertar os Poderes Públicos, sem que haja alguém que nos dê atenção!
Saibamos “vender” por bom preço aquilo que é nosso, que muito é e muito vale: as paisagens, dominadas pela alta montanha, os pôr de sol, o ar que respiramos, a água que bebemos e usamos, o clima ameno e confortável, as frutas deliciosas que mal aproveitadas são, esses mairoços que se espalham pelas terras e que são um testemunho eloquente dos muitos penares e canseiras dos nossos avós que tanto lutaram para nos deixarem os campos verdejantes, as vinhas e as pastagens que ainda desfrutamos… afinal, esse extraordinário património que aí está, agora mal aproveitado e quase abandonado.
Todavia chega-nos a notícia de que o Pico é a 5ª Ilha Mundial em potencialidades turísticas. Será por isso que investidores estrangeiros estão a adquirir terrenos na ilha, por interpostos compradores? Ao menos consta…
Vila Baleeira dos Açores,
Abril de 2008
Ermelindo Ávila